Acórdão nº 00673/12.1BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 02 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução02 de Junho de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: L. e M.

, vieram interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, de 11.07.2017 pela qual foi julgada parcialmente procedente a acção administrativa especial intentada contra o Município (...), C. e L. e Z. e M.

, em que pedem, essencialmente, a condenação do Réu Município a: 1. declarar que o edifício construído pelos segundos Réus, composto por casa de habitação, não se encontra legalizado nem é suscetível de legalização; 2. ordenar a demolição de tal edifício, no prazo de 30 dias; e 3. condenar os demais Réus a reconhecerem os pedidos efetuados.

Invocaram para tanto, em síntese, que a decisão recorrida errou de facto e de direito, pelo que deveria, ao contrário do decidido, ter declarado que o prédio em causa não se encontra legalizado nem é suscetível de legalização e, portanto, deveria ter ordenado, tal como pedido, a demolição do edifício, no prazo de 30 dias.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.

*Cumpre decidir já que nada a tal obsta.

* I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: 1. Os Autores pediram fundamentadamente na sua petição inicial a condenação do Réu Município a (1) declarar que o edifício construído pelos segundos Réus, composto por casa de habitação, não se encontra legalizado nem é suscetível de legalização e a (2) ordenar a demolição de tal edifício, no prazo de 30 dias.

  1. O Tribunal a quo concluiu que em conformidade com o art. 102º do RJUE, perante operações urbanísticas ilegais, a entidade administrativa será efetivamente obrigada a adotar medidas adequadas de tutela e restauração da legalidade urbanística.

  2. Mas que, no entanto, ao Réu Município assiste a possibilidade de adotar umas das diversas medidas elencadas no nº 2, correspondendo a opção por uma delas, bem como o tempo da respetiva aplicação, a uma opção discricionária, própria do exercício da atividade administrativa.

  3. Acrescentando ainda que a demolição é uma medida de tutela da legalidade urbanística que apenas deve ser utilizada na impossibilidade de recurso a outras medidas, como seja a da legalização da construção, em conformidade com o nº 2 do art. 106º do RJUE.

  4. O Tribunal a quo veio assim concluir na sentença que, não obstante nos presentes autos vir pedida a condenação à determinação da demolição de uma construção ilegal, a Administração apenas se encontra vinculada a adotar medidas de tutela urbanística, sem que o respetivo conteúdo se encontre legalmente pré-determinado.

  5. Atendendo à ampla margem de decisão de que dispõe o Réu Município face ao disposto nos arts. 102º e ss do RJUE, não seria possível condená-lo à emissão de um ato prédeterminado, ainda que sem especificação do respetivo conteúdo, nos termos previstos pelo art. 71º, nº2, do CPTA.

  6. Nesse sentido, ao Tribunal restaria apenas condenador o Réu a diligenciar no sentido de apreciar a pretensão formulada.

  7. Com base nestes fundamentos, o Tribunal a quo considerou improcedentes os pedidos de condenação concretamente formulados, por estar em causa uma atuação em que o Réu Município dispõe de uma ampla margem de atuação, mas condenou este Réu a apreciar a pretensão dos Autores, proferindo decisão sobre a medida de tutela urbanística a adotar.

  8. Em bom rigor, na sequência do início da construção clandestina, foi efetuada uma queixa no Município contra a dita construção, tendo sido em 17.01.2001 elaborado Auto de Notícia de Contraordenação, ao Réu C., pela construção de uma moradia de rés-do-chão e 1º andar.

  9. Em 28.02.2001, foi elaborado Auto de Embargo, para o qual não foi estipulado prazo para o embargo e nunca foi elaborado qualquer auto ou comunicação de desobediência do referido Auto.

  10. Na sequência desse embargo, o proprietário da construção, aqui segundo Réu, foi notificado pelo Município na pessoa do seu vereador, no dia 16 de Fevereiro de 2001 de que “em virtude de a construção se situar no quintal de uma habitação antiga e não confrontar com arruamento público, não poderá ser licenciada”.

  11. Porém, apesar de ter sido ordenada a suspensão das obras, as mesmas foram reiniciadas e concluídas! 13. O Presidente da Câmara, uma vez confrontado com a edificação não licenciada, além de acionar um procedimento sancionatório, de acordo com o nº 10 do art. 98º do RJUE e de embargar a obra, deveria ter desencadeado um procedimento de legalização da mesma! 14. Em nome do princípio da prossecução das boas práticas administrativas, entendemos que deverão ser respeitados os prazos para decisão estatuídos para o procedimento de licenciamento.

  12. Se o cumprimento destes prazos se revelar obstaculizado por omissão do construtor clandestino na apresentação dos elementos pedidos, ou por manobras meramente dilatórias da sua parte, parece-nos que, a fim de se evitar a eternização da ilegalidade, deveria a autoridade administrativa, em nome da proteção da legalidade urbanística, decidir pela insusceptibilidade de legalização.

  13. No entanto, neste caso, houve uma completa inércia por parte da Administração e consequentemente, por parte do particular.

  14. O embargo não foi comunicado aos respetivos Serviços de Fornecimento de água e luz, em plena violação do nº3 do art. 103º do RJUE.

  15. Também não foi participado ao Ministério Público o crime de desobediência previsto no art. 100º do RJUE e art. 348º do Código Penal.

  16. Os segundos Réus fizeram ainda constar da inscrição matricial que o prédio urbano identificado nos autos se situava na Rua Professor Francisco Corujo, o que não corresponde à verdade.

  17. Fizeram ainda os Réus afixar no acesso à habitação e na própria, um número toponímico (140-A), que estranhamente dizem haver sido atribuído pela EDP! 21. Perante tantas incongruências, a verdade é que ninguém avançou com o processo de legalização da obra.

  18. Nos termos do Art. 106º do RJUE, se o Município praticou ato administrativo, endereçado ao contra-interessado, notificando-o para proceder à demolição, o que se pede ao Tribunal é que faça cumprir o Princípio da Legalidade.

  19. Perante tal inércia/omissão ilegal, podia e devia o Tribunal a quo, condenar o Município a repor, ainda que coercivamente, a legalidade urbanística.

  20. Não obstante a sentença remeter para o Município, a escolha da solução ideal para o caso concreto, simultaneamente, fá-lo, erigindo e positivando os limites a observar por aquele no ato a praticar (exigências do nº2 do art. 71º do CPTA).

  21. Não há ilegalidade ou invasão no controlo feito pelo Tribunal relativamente aos atos administrativos praticados pela Administração, no uso dos seus poderes, em concretização da discricionariedade de que goza ou mesmo de conceitos indeterminados legalmente fixados.

  22. Nem sequer se coloca em causa o princípio da proporcionalidade, uma vez que o mesmo não é configurável no uso de poderes vinculados.

  23. Face à existência de anteriores atos administrativos consolidados a determinar a demolição e do seu incumprimento voluntário impunha-se o prosseguimento do procedimento camarário para reposição e tutela da legalidade administrativa urbanística.

  24. Em conformidade com o Princípio da Legalidade (nos termos do nº1 do art. 3º do CPA e art. 2º e o nº2 do art. 266º da CRP) deve cumprir-se a lei e, por conseguinte, ser ordenada a demolição daquilo que é insuscetível de ser legalizado.

  25. Nos termos do disposto do art. 106º do RJUE a demolição de obra de construção não pode ser ordenada se for suscetível de ser licenciada ou autorizada ou se for possível assegurar a sua conformidade com as disposições legais e regulamentares que lhe são aplicáveis mediante a realização de trabalhos de correção ou de alteração, o que constitui uma manifestação dos princípios da necessidade, adequação, indispensabilidade ou melhor ingerência possível, decorrentes do princípio da proporcionalidade – cfr. Ac. de 7/10/2009 do STA.

  26. A demolição das obras ilegais deve ser precedida de um juízo relativo à possibilidade de as mesmas poderem vir a ser legalizadas e desse juízo ser negativo.

  27. Ora, ficou provado no decorrer do processo que a construção dos presentes autos, em virtude de estar implantada para além dos 30 metros do eixo da via, em clara violação do disposto no art. 7º do Regulamento do Plano do Diretor Municipal de (...) nem pode estar licenciada, nem pode vir a ser licenciada! 32. Enquanto construção clandestina, está destinada à demolição em conformidade com o disposto no art. 106º do RJUE, aprovado pelo DL 555/99, de 16 de Dezembro, na redação que lhe foi dada pelo DL nº 26/2010, de 30 de Março.

  28. Trata-se de um prédio urbano destinado à habitação, que tendo sido construído em 2005, em plena vigência do Regime Geral da Edificação Urbana e do Plano Diretor de (...), não confronta com o arruamento público de lado nenhum – em plena violação da alínea b) do nº2 do art. 24º do RGEU.

  29. Em momento algum o Município considerou que tal edificação observava ou era compatível com o PDM, para dessa forma se mostrar como legítima uma possível construção.

  30. Foi determinado, por despacho do Senhor Vereador responsável pelas obras particulares em 16.02.2001 que se notificasse o segundo Réu de que “em virtude de a construção se situar no quintal de uma habitação antiga e não confrontar com arruamento público, não poderá ser licenciada”.

  31. Em 04.11.2003, o Senhor Vereador veio decidir que os segundos Réus construíram uma obra “(…) sem que para o efeito tivessem apresentado projeto ou requerido licença”.

  32. No despacho em que considerou que os factos descritos e dados como provados integram o ilícito de mera ordenação social, previsto...

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