Acórdão nº 331/14.2T9EVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 08 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelNUNO GARCIA
Data da Resolução08 de Junho de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

ACORDAM OS JUÍZES QUE INTEGRAM A SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇAO DE ÉVORA RELATÓRIO Findo o inquérito no âmbito do processo 331/14.2T9EVR.E1 foi a arguida CSRD acusada pela prática de um crime de falsificação ou contrafação de documento previsto e punido pelo artigo 256.º, n.º 1, alíneas e) e f), e n.º 3, com referência ao artigo 255.º, alínea a), ambos do Código Penal, e um crime de condução de veículo a motor sem a necessária habilitação legal previsto e punido pelo artigo 3.º, n. ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro

Inconformada com a acusação, a referida arguida requereu a realização da instrução e finda a mesma foi proferida decisão instrutória não conhecendo do mérito relativamente ao crime de falsificação e não a pronunciando pela prática do crime de condução sem habilitação legal

Em desacordo com tal decisão instrutória, o Ministério Público recorreu tendo terminado a motivação de recurso com as seguintes conclusões: “1.º- A arguida CSRD foi acusada nestes autos pela prática, em autoria material, sob a forma consumada e concurso efetivo, de um crime de falsificação ou contrafação de documento previsto e punido pelo artigo 256.º, n.º 1, alíneas e) e f), e n.º 3, com referência ao artigo 255.º, alínea a), ambos do Código Penal, e um crime de condução de veículo a motor sem a necessária habilitação legal previsto e punido pelo artigo 3.º, n. ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro

  1. - Remetidos os autos à Distribuição para Instrução, no dia 20.12.2020 foi proferida Douta Decisão pelo Mmº Juiz de Instrução Criminal nos seguintes termos (fls. 676 a 687-v): “a) Não conhecer o mérito em relação ao crime de falsificação ou contrafação de documento previsto e punido pelo artigo 256.º, n.º 1, alíneas e) e f), e n.º 3, com referência ao artigo 255.º, alínea a), ambos do Código Penal, imputado à arguida CSRD

    1. Não pronunciar a arguida CSRD pela prática de um crime de condução de veículo a motor sem a necessária habilitação legal previsto e punido pelo artigo 3.º, n.º 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro. (…).” 3.º- Ora, é desta decisão que não pronunciou a arguida CD pelos dois crimes de que vinha acusada que se recorre

  2. - No que respeita ao crime de falsificação de documento, o Mmº JIC fundamentou na decisão recorrida que “é procedente a excepção de direito penal de caso decidido, e, em consequência, não se conhece do mérito relativamente ao crime de falsificação de documento.” 5.º- Todavia, a reabertura do inquérito é um ato da exclusiva competência do MºPº, não podendo ser apreciada a pertinência da decisão por parte de Juiz de Instrução Criminal

  3. - Citando o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 07.03.2018, processo 38/16.6PBFUN.L1-3, relator Vasco Freitas, disponível em dgsi.pt, “a reabertura do inquérito é um acto não jurisdicional, e como tal não sujeito a recurso ou a controle judicial, sendo da exclusiva competência do MºPº.” 7.º- Desta forma, conhecedora da reabertura do inquérito e reapreciação daquela factualidade, caso não se conformasse com essa decisão, podia a arguida ter invocado tais argumentos junto do Magistrado titular no inquérito e/ou ter suscitado a questão junto do superior hierárquico do MºPº nos termos do artº 279º do CPP

  4. - A arguida foi notificada do despacho que determinou a reabertura do inquérito (referência 28435258, Data: 21-02-2019; e Referência 28435537 Data: 21-02-2019, constantes do sistema eletrónico citius), bem como foi interrogada no decurso da reabertura do inquérito (conforme auto de interrogatório de fls. 463 a 465 e onde foi confrontada com os factos da falsificação de documento), não tendo invocado perante o Ministério Público qualquer vício durante o inquérito ou na sequência da notificação da acusação pública

  5. - O despacho do Ministério Público que aprecia a possibilidade de reabertura do inquérito pode ocorrer oficiosamente ou por impulso de um interveniente processual

  6. - Assim, ao decidir como decidiu violou o Tribunal a quo o disposto nos artigos 48.º, 267.º, 268.º, 269.º, 279.º, n.ºs 1 e 2, todos do CPP, e artigo 32º, nº 5, da CRP, o que constitui uma nulidade insanável de conhecimento oficioso – artigo 119.º, alínea e), e 122.º, n.º 1, ambos do CPP - que se argui para todos os efeitos legais

  7. - Ainda que se entenda de modo diverso, consideramos que foram produzidos novos elementos de prova, capazes de colocar em crise o arquivamento

  8. Na verdade, verificando-se que a arguida CD foi detetada a conduzir veículo automóvel e a usar aquela carta de condução que obteve através de troca com título de condução emitido na República da Guiné-Bissau, essa situação permite o surgimento de indícios suficientes de que a arguida sempre teve a intenção de conduzir veículos automóveis com conhecimento de que a carta que lhe foi emitida pelo IMT tinha na sua base um título de condução emitido de forma ilegítima pois nunca havia sido submetida aos competentes exames escritos e teóricos naquele país

  9. - A factualidade referente aos novos factos (condução de veículo automóvel no dia 27 de agosto de 2019) não é desligável do apuramento da existência de título de condução e sobre a forma (legitima ou ilegítima) como foi obtido

  10. - Pelo exposto, pugna-se junto do Venerando Tribunal da Relação que revogue a decisão que considerou procedente a exceção de direito penal de caso decidido, e, em consequência, julgando verificada a nulidade insanável invocada, seja a arguida CD pronunciada por todos os factos descritos na acusação pública e pelo crime de falsificação ou contrafação de documento previsto e punido pelo artigo 256.º, n.º 1, alíneas e) e f), e n.º 3, com referência ao artigo 255.º, alínea a), ambos do Código Penal, devendo ser pronunciada pelos factos descritos na acusação pública de fls. 576 a 587, designadamente os artigos constantes do artigo 1.º ao artigo 13.º da descrição, que se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais. 15.º- Para não decidir como indiciada com suficiência a factualidade imputada à arguida CD e integrante do crime de condução sem habilitação legal, consignou o Tribunal recorrido na motivação que os poderes estavam limitados pois havia decidido anteriormente considerar procedente a exceção de direito penal de caso decidido, e, em consequência, não conhecia do mérito relativamente ao crime de falsificação de documento

  11. - Todavia, caso seja provido o presente recurso com os fundamentos vindos de elencar e referentes ao crime de falsificação e documento, deverá ser dada como suficiente indicada a factualidade imputada à arguida CD e integrante do crime de condução de veículo a motor sem a necessária habilitação legal previsto e punido pelo artigo 3.º, n. ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro

  12. - Com efeito, os fundamentos usados em sede de decisão instrutória para indiciar com suficiência a factualidade quanto ao arguido JCSC servem para indiciar com suficiência a arguida CD

  13. - Da conjugação do regime previstos nos artigos 161.º, n.ºs 1 e 2, e 162.º, n.º 1, ambos do CPA, o ato administrativo que atribuiu o título de condução à arguida é nulo por ter sido determinado pela prática de um crime e não produz quaisquer efeitos jurídicos, independentemente da declaração de nulidade

  14. - A conclusão do referido em 18.º- ocorre ainda que se venha a entender que a arguida não deve ser pronunciada pelo crime de falsificação de documento

  15. - Com efeito, entendemos ser de chamar à colação o princípio da suficiência do processo penal previsto no artigo 7.º do CPP, ainda que analisado com as devidas adaptações

  16. - O Tribunal não se encontrava limitado nos poderes de aferir da existência ou não de título de condução, pelo que podia e devia ter apreciado a legitimidade do título de condução invocado pela arguida

  17. - Pelo exposto, pugna-se junto do Venerando Tribunal da Relação que revogue a decisão que não pronunciou aa arguida e, em consequência, pronuncie a arguida pela prática de um crime de condução de veículo a motor sem a necessária habilitação legal previsto e punido pelo artigo 3.º, n. ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro, praticado no dia 27.08.2019, decidindo indiciados com suficiência os factos descritos na acusação pública de fls. 576 a 587, nos artigos constantes dos artigo 14.º ao artigo 19.º da descrição, que se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais

  18. - Porquanto, ao decidir como decidiu violou o Tribunal a quo o disposto no artigo 7.º do CPP, nos artigos 161.º, n.ºs 1 e 2, e 162.º, n.º 1, ambos do CPA, e no artigo 3.º, n.º 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro.” # A arguida respondeu ao recurso, tento terminado a resposta com as seguintes conclusões: “1. Não se conformando com a douta Decisão Instrutória proferida a fls. e seg.s dos autos, veio o recorrente interpor o presente recurso, por entender, sumariamente, que “ ao decidir como decidiu violou o Tribunal a quo o disposto nos artigos 48º, 267º, 268º, 269º, 279º, nºs 1 e 2, todos do CPP, e artigo 32º, nº 5, da CRP, o que constitui uma nulidade insanável de conhecimento oficioso- artigo 119º, alínea e), e 122º, nº 1, ambos do CPP- que se argui para todos os efeitos legais”; 2. “Considerando que foram produzidos novos elementos de prova.”; 3. “Que o acto administrativo que atribuiu o titulo de condução à arguida é nulo por ter sido determinado pela prática de um crime e não produz quaisquer efeitos jurídicos, independentemente da declaração de nulidade” 4. Salvo o devido respeito, não partilhamos esse entendimento

    1. Dúvidas não restam que, os factos pelos quais a arguida se mostra acusada, são totalmente coincidentes com aqueles que foram objecto de decisão do MºPº de arquivamento, não constando qualquer surgimento de novos elementos de prova que invalidem os fundamentos invocados pelo MºPº no despacho de arquivamento

    2. O M.P. não pode considerar como surgimento de elemento de prova, a condução da arguida, quando única e exclusivamente contribuiu para...

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