Acórdão nº 5253/18.5T8VNG-O.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 27 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelFILIPE CAROÇO
Data da Resolução27 de Maio de 2021
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 5253/18.5T8VNG-O.P1 (apelação - 3ª Secção) Comarca do Porto - Juízo de Comércio de Vila Nova de Gaia – J 2 Relator: Filipe Caroço Adj. Desemb. Judite Pires Adj. Desemb. Aristides Rodrigues de Almeida Acordam no Tribunal da Relação do Porto I.

Na sequência de declaração de insolvência da sociedade B…, S.A., o Sr. Administrador da Insolvência requereu a abertura do Incidente de Qualificação da Insolvência, fundamentando parecer no sentido da sua qualificação como culposa.

No essencial, alegou que os responsáveis não cumpriram o dever de apresentação à insolvência por parte da insolvente, sendo que o administrador da sociedade não lhe prestou a colaboração a que estava obrigado, mesmo depois de várias vezes instado para informar sobre a localização do ativo da insolvente, motivo pelo qual parte do mesmo nunca foi apreendido para a massa, o que consubstancia um prejuízo concreto para os credores.

Também o Ministério Público se pronunciou no sentido da qualificação da insolvência como culposa, com afetação dos seus administradores, C… e D…, alegando a falta de colaboração de ambos para com o Administrador da Insolvência, designadamente no fornecimento de todos os documentos de suporte da existência, proveniência e destino da totalidade do saldo de caixa da insolvente, no valor de € 301.633,41, transferido para a conta 27, do balancete analítico reportado a março de 2018. Acrescentou que, de acordo com a informação prestada pelo anterior contabilista certificado da sociedade insolvente, Dr. E…, técnico da F…, Lda., a contabilidade da insolvente está nas instalações dela e, consequentemente, na posse dos respetivos administradores, desde agosto de 2015. Alegou ainda que, a não prestação de tais elementos contabilísticos, impossibilitou ou, pelo menos, dificultou o conhecimento da real situação patrimonial e financeira da insolvente.

Mais alegou o Ministério Público que aqueles dois administradores nem após notificação pelo Administrador da Insolvência e pelo tribunal para o efeito forneceram informação (no âmbito do apenso de apreensão de bens) quanto à real existência, localização e destino dos bens/valores que não foram apreendidos para a massa, mas que constam da contabilidade da sociedade.

Concluiu pela existência de prova suficiente de que os mesmos administradores violaram o dever de colaboração para com o Administrador da Insolvência e o tribunal, assim preenchendo a presunção de insolvência culposa prevista no art.º 186º, nº 2, al. i), do CIRE[1], o que conduz necessariamente à qualificação da insolência como culposa.

Por falta de cumprimento de exigências legais, foi ordenado o desentranhamento da oposição apresentada pelo Requerido C….

A oposição do Requerido D… também ficou em falta.

Por despacho de 15.12.2020, determinou-se a notificação das partes para se pronunciarem quanto à possibilidade de imediata prolação de decisão de mérito e quanto a eventuais consequências para os Requeridos caso a presente insolvência devesse ser declarada culposa.

Os Requeridos e o Ministério Público nada disseram.

O Administrador da insolvência declarou nada ter a opor à prolação de sentença, reafirmando o que nesta matéria expôs no seu parecer.

Foi depois proferida sentença que culminou com o seguinte dispositivo, ipsis verbis: «Face ao exposto, decide-se: 1. Qualificar a insolvência da sociedade “B…, SA” como culposa; 2. Declarar afetados pela qualificação da insolvência como culposa os requeridos Administradores da insolvente C… e D….

  1. Decretar a inibição de C… e D… para administrarem patrimónios de terceiros pelo período de quatro anos.

  2. Declarar C… e D… inibidos para o exercício do comércio, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de atividade económica, empresa pública ou cooperativa pelo período de quatro anos.

  3. Determinar a perda de quaisquer créditos dos requeridos C… e D… sobre a insolvência ou sobre a massa insolvente, condenando-os na restituição dos bens ou direitos já recebidos em pagamento desses créditos.

  4. Condenar os requeridos C… e D… a indemnizarem os credores da insolvente no montante dos créditos não satisfeitos, após o término da liquidação do ativo da insolvente, até às forças do respetivo património, valor a apurar em liquidação de sentença.

    Custas pelos requeridos.

    Fixo o valor da presente ação em €30.000,01.

    (…).

    »* *Inconformado, dela apelou o Requerido D…, tendo produzido alegações com as seguintes CONCLUSÕES: ……………………………… ……………………………… ……………………………… Pretende o recorrente a revogação a sentença e a sua substituição por outra que conclua pela sua absolvição.

    *Não foram apresentadas contra-alegações.

    *Foram colhidos os vistos legais.

    *II.

    O objeto do recurso está delimitado pelas conclusões da apelação, acima transcritas, exceção feita para o que for do conhecimento oficioso (cf. art.ºs 608º, nº 2, 635º e 639º do Código de Processo Civil).

    Seguindo uma ordem de precedência lógica, estão para apreciar e decidir as seguintes questões, suscitadas na apelação: 1. Negação da prorrogação do prazo de oposição; 2. Nulidade da sentença; 3. Erro de julgamento em matéria de facto; 4. Erro de julgamento em matéria de Direito.

    *III.

    São os seguintes os factos considerados provados na 1ª instância: A) Nos presentes autos atendendo à não oposição dos requeridos e aos documentos juntos ao processo com interesse para a decisão resultaram provados os seguintes factos: 1. A “B…, SA.” intentou, em setembro de 2015, um processo especial de revitalização que correu termos no Juízo do Comércio de Vila Nova Gaia – Juiz 3, sob o n.º 8318/15.1T8VNG.

  5. Por acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 14 de setembro de 2017 foi recusada a homologação do plano de revitalização apresentado no processo mencionado em 1.

  6. Em 17 de maio de 2018 o Sr. Administrador Judicial Provisório apresentou, no referido processo, parecer de insolvência da “B…, SA”.

  7. Foi, então, extraída certidão desse parecer e remetido o mesmo à distribuição como processo de insolvência, dando origem ao processo de insolvência n.º 5253/18.5T8VNG a que os presentes autos estão apensos.

  8. No processo de insolvência foi, então, determinada a citação da “B…, SA.” para, querendo, deduzir oposição, não tendo a mesma deduzido qualquer contestação.

  9. Por sentença proferida em 10 de agosto de 2018 foi a “B…, SA.” declarada insolvente.

  10. Em 17/9/2018 o Sr. administrador da insolvência nomeado no processo de insolvência juntou aos autos o relatório a que alude o art. 155.º do C.I.R.E., ao qual juntou o mapa de depreciações e balancete sintético de março de 2018 respeitante à insolvente que lhe fora facultado pelo contabilista certificado da insolvente.

  11. De acordo com os elementos contabilísticos da insolvente, designadamente IES de 2015, 2016 e 2017 e Balancete sintético a 31/03/2018, esta, em 31/12/2017, detinha em armazém mercadorias/inventários no valor de €392.080,58, valor que permanece inalterado no balancete de 31/03/2018.

  12. De Ativos Fixos Tangíveis a sociedade tinha registados: Equipamento Básico no valor de 940,63 €, Equipamento Administrativo no valor de 1.227,17 €, outros ativos tangíveis no valor de 73.581,61 €, num total de 2.560.477,17 €.

  13. Sobre a insolvente foram reconhecidos créditos no valor de 5.330.994,21 € por sentença proferida no apenso de reclamação de créditos, já transitada em julgado.

  14. As últimas contas da sociedade depositadas na Conservatória do Registo Comercial, dizem respeito ao ano de 2017.

  15. O capital próprio da sociedade apresenta valores negativos em 31/12/2017 no valor de €1.042.184,17.

  16. A insolvente apresentou resultados positivos no ano de 2015 e a partir daí os resultados foram sempre negativos.

  17. A contabilidade da insolvente foi realizada, até ao ano de 2016, pelo gabinete “F…, Lda.”, sendo que, desde agosto de 2015 e por decisão da administração da insolvente, a contabilidade e toda a documentação inerente foi transferida para as instalações da insolvente, ficando o gabinete de contabilidade apenas responsável pelo envio das declarações únicas.

  18. Em 2016 a “F…, Lda.” deixou de prestar serviços de contabilidade à insolvente, passando a contabilidade a ser organizada por outro contabilista.

  19. O Sr. administrador da insolvência remeteu aos requeridos várias comunicações solicitando-lhes informações sobre o ativo da insolvente.

  20. Entre outras, enviou, em 20/1/2019, aos requeridos um email solicitando-lhes que lhe fossem sejam entregues os documentos que titulam o ativo intitulado "Concessões – G…" no valor de €32.500,00.

  21. Em 19/2/2019 o requerido C… remeteu ao Sr. administrador da insolvência um email dizendo que “o material existente do inventário algum se encontra no armazém de Vila Real (lote …) e outra parte em Mondim de Basto no lote .. da zona Industrial ….” 19. Em 20/2/2019 o Sr. administrador da insolvência remeteu ao requerido C… um email solicitando, que, no prazo de 5 dias, o esclarecesse sobre o concreto local de cada bem identificado no Inventário enviado aos autos e esclarecer onde se encontram em concreto os bens, nomeadamente quais, em concreto, é que se encontram no armazém de Vila Real (lote …) e outra parte em Mondim de Basto no lote .. da zona Industrial … e o destino dado aos que não se encontrem num lado ou no outro. Solicitou também a entrega imediata dos documentos que titulam o ativo intitulado "Concessões – G…" no valor de €32.500,00 20. O requerido não prestou mais nenhuma informação ao Sr. administrador da insolvência sobre a localização de bens da insolvente.

  22. O Sr. administrador da insolvência apreendeu para a massa: - Um armazém para garrafas ou outros arrumos e logradouro, a confrontar de norte – H…, sul – caminho, nascente - estrada municipal poente – H…, situado em: … - …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Pouca de Aguiar, Freguesia …, sob o n.º 1036/20010202 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 1259 (Teve origem no artigo 1331), freguesia …, com o...

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