Acórdão nº 356/21 de Tribunal Constitucional (Port, 27 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Maria José Rangel de Mesquita
Data da Resolução27 de Maio de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 356/2021

Processo n.º 121/21

3.ª Secção

Relatora: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), em que é recorrente A. e é recorrido o Ministério Público, o primeiro interpôs recurso ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual versão (Lei do Tribunal Constitucional, adiante designada pela sigla «LTC»), da decisão proferida pela Juíza Conselheira Vice-Presidente do STJ em 18 de dezembro de 2020 (fls. 67-70), a qual indeferiu a reclamação deduzida contra a decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), notificada ao ora recorrente em 6/11/2020 (cf. fls. 61 com verso e 62), de não admissão do recurso interposto para o STJ dos acórdãos proferidos pelo mesmo Tribunal da Relação em 23/6/2020 e 8/9/2020 – tendo o primeiro julgado improcedente a exceção de prescrição invocada pelo arguido A., ora recorrente, e o segundo julgado improcedentes o incidente de incompetência e a reclamação deduzidos contra o precedente acórdão de 23/6/2020 (cf. Acórdão de 8/9/2020, fls. 36 a 47-verso).

2. Na Decisão Sumária n.º 239/21 (cf. fls. 105-121), ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, decidiu-se não conhecer do objeto do recurso, com os seguintes fundamentos (cf. II – Fundamentação, 7. e segs.):

«II – Fundamentação

7. Mesmo tendo o recurso sido admitido por despacho do Tribunal a quo, com fundamento no n.º 1 do artigo 76.º da LTC, essa decisão não vincula o Tribunal Constitucional, conforme resulta do n.º 3 do mesmo preceito legal.

Cabendo aos recorrentes delinear o objeto do recurso (norma ou interpretação normativa cuja constitucionalidade pretendem ver apreciada), a aferição do preenchimento dos requisitos de que depende a admissibilidade de recurso para o Tribunal Constitucional e, bem assim, a delimitação do objeto do recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade devem ter por base o invocado no requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional e reportar-se à decisão recorrida (ou decisões recorridas), tal como identificada(s) pelo recorrente no requerimento de interposição de recurso (e respetivo aperfeiçoamento) e que fixam o respetivo objeto – in casu, a decisão proferida pela Conselheira Vice-Presidente do STJ em 18/12/2020 (fls. 67-70), a qual indeferiu a reclamação deduzida contra a decisão proferida pelo TRL de não admissão do recurso interposto para o STJ dos acórdãos proferidos pelo mesmo Tribunal da Relação em 23/6/2020 e em 8/9/2020.

Nos termos do requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional aperfeiçoado (supra, I, 6.), a questão de constitucionalidade que o recorrente pretende ver apreciada é reportada aos artigos 400.º, n.º 1, alínea c) e 432.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal (CPP) «na interpretação de que o recurso sobre as nulidades arguidas sobre um Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa não é admissível» (cf. resposta ao convite para aperfeiçoamento do requerimento de interpretação de recurso, supra transcrita em I, 6., B- Normas Cuja Inconstitucionalidade ou Ilegalidade se Pretende que o Tribunal Constitucional Aprecie, 15.).

8. O recurso de constitucionalidade foi interposto ao abrigo do disposto na alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º da LTC, sendo que, nos termos do artigo 280.º, n.º 1, alínea b), da Constituição da República Portuguesa (CRP), e do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC, cabe recurso para este Tribunal das decisões dos tribunais «Que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo». Segundo jurisprudência constante do Tribunal Constitucional, a admissibilidade do recurso apresentado nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC depende da verificação, cumulativa, dos seguintes requisitos: ter havido previamente lugar ao esgotamento dos recursos ordinários (artigo 70.º, n.º 2, da LTC); tratar-se de uma questão de inconstitucionalidade normativa; a questão de inconstitucionalidade normativa haver sido suscitada «durante o processo», «de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer» (artigo 72.º, n.º 2, da LTC); e a decisão recorrida ter feito aplicação, como sua ratio decidendi, das dimensões normativas arguidas de inconstitucionalidade pelo recorrente (vide, entre outros, os Acórdãos deste Tribunal n.ºs 618/98 e 710/04 – também disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt).

Faltando um destes requisitos, o Tribunal não pode conhecer do recurso.

Vejamos.

9. Resulta dos autos que não está preenchido o pressuposto, essencial e cumulativo, de admissibilidade dos recursos interpostos ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC relativo à prévia suscitação adequada de uma questão de inconstitucionalidade normativa perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida em termos de este estar obrigado a dela conhecer (artigo 72.º, n.º 2, da LTC).

10. Sendo a decisão recorrida para o Tribunal Constitucional a Decisão da Vice-Presidente do STJ de 18/12/2020 que indeferiu a reclamação apresentada contra a precedente decisão do TRL de não admissão do recurso interposto pelo ora recorrente para o STJ do acórdão do TRL de 8/9/2020 que indeferiu a arguição da exceção de incompetência e a reclamação (com arguição de nulidades) de Acórdão anterior (de 23/6/2020) e deste último acórdão, o momento processual adequado para a suscitação das questões de constitucionalidade, de modo a constituir o Tribunal a quo no dever de as mesmas decidir, seria a reclamação apresentada pelo ora recorrente nos termos do artigo 405.º do CPP, constante de fls. 3 a 4 com verso dos presentes autos.

Recorde-se que o recorrente, quando questionada sobre a peça processual em que teria suscitado as questões de constitucionalidade (cf., supra I, 5.), vem informar que suscitou as questões de constitucionalidade na «Reclamação para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça apresentada no Tribunal da Relação de Lisboa pelo ora recorrente em 6 de janeiro de 2021» e no «Requerimento de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça apresentado pelo ora recorrente no Tribunal da Relação de Lisboa em 21 de Setembro de 2020» no recurso interposto, em 31/11/2019 para o Tribunal da Relação de Lisboa da Sentença condenatória proferida, em 1ª instância, em 30/10/2019» (cf. resposta transcrita supra em I, 6., C, 26. e 27.).

Relativamente às alegações de recurso para o STJ, para além de não ser esse o momento processual adequado para a suscitação de questões de constitucionalidade relacionadas com normas sobre a admissibilidade do próprio recurso para o STJ (como é o caso das bases legais invocadas como objeto do presente recurso de constitucionalidade), certo é que tal suscitação não é feita nas invocadas alegações de recurso (reproduzidas a fls. 49 a 60 dos presentes autos).

Cumpre, no entanto, aferir do cumprimento do ónus de suscitação prévia e adequada das questões de constitucionalidade perante o Tribunal a quo, de modo a delas conhecer, em face do teor do requerimento da reclamação apresentada nos termos do artigo 405.º do CPP (cf. fls. 3 a 4 com verso dos autos).

Todavia, resulta com evidência que também aí não é suscitada, previamente e de modo adequado, a questão de inconstitucionalidade reportada a uma determinada interpretação das normas dos artigos 400.º, nº 1, alínea c) e 432.º, n.º 1, alínea b) do CPP que o recorrente enuncia como objeto do recurso de constitucionalidade.

Da respetiva leitura resulta que o ora recorrente não logrou proceder, perante o Tribunal recorrido, à identificação das bases legais de que entende derivar as inconstitucionalidades invocadas nem enunciou os exatos critérios normativos que entende violadores de normas e princípios constitucionais, de modo a submeter ao Tribunal uma questão de constitucionalidade normativa de que o mesmo devesse conhecer e decidir.

Com efeito, nos pontos 2. a 10. da reclamação, o reclamante começa por informar que o acórdão do TRL de 8 de setembro de 2020 (recorrido para o STJ) não atendeu nenhuma das nulidades e julgou improcedentes o incidente de incompetência e a reclamação (deduzidos contra o precedente acórdão de 23/6/2020), para afirmar, seguidamente, que «no Direito Penal Português vigora o duplo grau de jurisdição», que a Constituição admite expressamente o direito ao recurso, no artigo 32.º, n.º 1, invocando jurisprudência do Tribunal Constitucional (e do STJ) que reconhece a garantia de um duplo grau de jurisdição nos recursos penais, para concluir que «o decidido por esse acórdão [Acórdão do TRL de 8/9/2020] respeita a direitos fundamentais, em especial o agravamento da responsabilidade criminal do arguido» e que «por isso mesmo, o acórdão, está sujeito ao duplo grau de jurisdição, isto é, a recurso para o Tribunal Superior, no caso o Supremo Tribunal de Justiça».

Ora, a breve referência no texto da reclamação às normas de direito infraconstitucional que o reclamante erigiu a objeto do presente recurso (apenas constante do introito da reclamação, por referência aos fundamentos de não admissão do recurso constantes do despacho de 29/9/2020, então reclamado) não constitui, em qualquer caso, uma suscitação prévia de modo adequado de uma qualquer questão de inconstitucionalidade normativa. Para além de não enunciar qualquer dos pretensos critérios...

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