Acórdão nº 337/21 de Tribunal Constitucional (Port, 26 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Pedro Machete
Data da Resolução26 de Maio de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 337/2021

Processo n.º 142/21

1.ª Secção

Relator: Conselheiro Pedro Machete

Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I. Relatório

1. A. e B., notificados da Decisão Sumária n.º 234/2021, que não conheceu do objeto dos recursos de constitucionalidade por si interpostos, em virtude da falta de pressupostos (inutilidade do recurso, inidoneidade do respetivo objeto e ilegitimidade do recorrente) vêm reclamar para a conferência ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 3, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional – “LTC”).

2. Os reclamantes, recorrentes nos presentes autos, em que são recorridos C., D., E., F. e G., interpuseram recurso para o Tribunal da Relação do Porto de diversas decisões proferidas em primeira instância, no âmbito dos autos inventário requerido pela ora recorrente.

O Tribunal da Relação do Porto, por acórdão de 18 de dezembro de 2018, decidiu:

– Quanto aos recursos interpostos por B., julgar improcedente o recurso interposto do despacho de 17 de maio de 2010 (indeferiu a arguição de nulidade do inventário) e não conhecer do recurso interposto da sentença homologatória da partilha, por falta de legitimidade substancial do recorrente;

– Quanto aos recursos interpostos por A., julgar parcialmente procedente o recurso da sentença homologatória da partilha, determinando a elaboração de novo mapa de partilha e, em consequência, anular a sentença homologatória da partilha e os atos subsequentes que dela dependam, e julgar improcedentes os demais recursos.

A ora recorrente arguiu nulidades deste acórdão e requereu a sua reforma quanto a custas, mas, por acórdão de 11 de abril de 2019, o Tribunal da Relação do Porto decidiu considerar legalmente inadmissível a requerida reforma e não verificadas as nulidades invocadas.

Inconformados, cada um dos ora recorrentes interpôs recurso de revista do referido acórdão de 18 de dezembro de 2018.

O Supremo Tribunal de Justiça, por decisão singular da relatora, de 27 de fevereiro de 2020, não conheceu do objeto do recurso interposto por B., pelo que julgou tal recurso findo; e, no que respeita ao recurso interposto por A., admitiu o recurso na parte em que o acórdão do Tribunal da Relação do Porto conheceu do recurso interposto da decisão da 1.ª instância de 24 de março de 2017, não tendo conhecido do objeto do recurso respeitante à parte do acórdão então recorrido em que o mesmo conheceu das restantes decisões interlocutórias proferidas em 1.ª instância.

Na sequência da referida admissão parcial do recurso interposto pela ora recorrente, o Supremo Tribunal de Justiça, por decisão singular da relatora, de 28 de abril de 2020, julgou a revista procedente nessa parte, revogando o acórdão então recorrido na parte em conheceu e julgou improcedente o recurso de apelação que havia sido interposto do despacho da 1.ª instância de 24 de março de 2017.

Da referida decisão singular de 27 de fevereiro de 2020, cada um dos recorrentes apresentou reclamação para a conferência. Por acórdão de 10 de setembro de 2020, o Supremo Tribunal de Justiça indeferiu ambas as reclamações.

Cada um dos ora recorrentes requereu então a reforma deste acórdão, mas, por acórdão de 26 de novembro de 2020, o Supremo Tribunal de Justiça indeferiu tais pedidos de reforma.

3. Notificado deste acórdão, B. veio interpor recurso de constitucionalidade, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC, do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 10 de setembro de 2020, bem como do acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 18 de dezembro de 2018.

No requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, este recorrente, ao identificar o objeto do presente recurso, começa por referir que o tribunal a quo «ao interpretar que a cedência do quinhão hereditário, exclui o herdeiro legítimo da conferência de interessados e demais atos processuais, nomeadamente o artigo 1352º do Código Processo Civil 1961, viola o princípio da igualdade das partes, tornando este artigo 1352.º inconstitucional por violação do princípio da igualdade consagrado no artº 13º da CRP» (cf. o ponto 7 do requerimento de recurso). Seguidamente sustenta que «[e]m processo de inventário é legalmente exigida a notificação pessoal do interessado, para a marcação e participação na conferência de interessados, ou seja, o despacho que designa o dia para a conferência dos interessados a que alude o artº 1352.º do Código Processo Civil 1961, deve ser notificado aos herdeiros, independentemente do local de residência dos mesmos ou da constituição de mandatário judicial» (cf. o ponto 8, ibidem), concluindo que «[a] interpretação de considerar a figura jurídica de herdeiro cedente, como Não Interessado no processo de inventário, tendo como consequência, não ser chamado aos autos (notificação), não pode ser permitida pela lei fundamental, constituindo uma gravíssima violação do princípio da igualdade das partes, consagrado no art.º 3º-A do Código Processo Civil, e é mesmo inconstitucional a figura do herdeiro cedente ao ser interpretada desta forma, por violação do princípio da igualdade, consagrado no artº 13º da Constituição da República Portuguesa e acesso ao direito, artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa» (cf. o ponto 9, ibidem).

Finalmente, defende que «[n]ão houve habilitação, pelo que, não existe substituição processual, na medida em que, a qualidade de herdeiro legítimo é um direito indisponível, constitucionalmente protegido» (cf. o ponto 10, ibidem).

4. A recorrente A., notificada do referido acórdão de 26 de novembro de 2020, recorreu igualmente daquelas duas decisões, respetivamente, do Supremo Tribunal de Justiça e do Tribunal da Relação do Porto, e com base no mesmo normativo da LTC.

Segundo fez constar do seu requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, a recorrente pretende ver apreciadas duas questões de constitucionalidade.

Relativamente à primeira questão, depois de referir que ao processo de inventário se aplicam as regras especiais de recurso previstas no artigo 1396.º do Código de Processo Civil de 1961 (“CPC de 1961”) e que «a razão do legislador em reunir todos os recursos, que antes da reforma de 2013 apenas subiam a final, para a solução de terem de ser impugnados com a sentença a final, deve-se somente a uma razão de conveniência processual e não de preclusão do direito a recorrer, ou sequer, a uma redução do direito a recorrer aos Tribunais superiores» e que «por regra, permaneceram como recursos de Apelação autónoma, os recursos que antes eram designados como de Agravo com subida imediata, deixando assim, os Agravos com subida diferida para serem impugnados a final com a sentença», a recorrente sustenta que «[é] inconstitucional a interpretação de que os recursos de decisão interlocutória – a subirem juntamente com o que vier a ser interposto da decisão final – são considerados extemporaneamente apresentados, ofendendo os princípios de acesso a justiça, de igualdade de armas, de defesa, previstos nos artigos 20.º da CRP».

Quanto à segunda questão, a recorrente começa por referir que o tribunal a quo ao «invés de prosseguir com o incidente de reclamação de bens e aceitando que existem fundamentos para a anulação da licitação, da conferência de interessados e demais atos necessários, […] fundamentou a lei qualificando a situação como emenda de Partilha», considerando que «[e]sta subsunção constitui uma impossibilidade jurídica, pois a emenda da partilha opera-se apenas após a sentença da homologação de partilha ter transitado em julgado e com o acordo de todos os interessados», conforme prevê o artigo 1386.º do CPC de 1961. Entende, por isso, que «deve reconhecer-se, ser de todo impossível a emenda antes da sentença homologatória da partilha» e que «interpretando o Tribunal desta forma, impede completamente o direito da recorrente ver o vício da sua vontade e o erro sobre os bens da licitação completamente inutilizados», concluindo que, «[ao] aplicar o artigo 1386.º do [CPC de 1961], onde o vício e erro é conhecido durante o processo, torna o artigo inconstitucional, por violação do artigo 2.º, 13.º e 20.º da CRP».

5. Na sua reclamação, e no que ora releva, o recorrente B. afirma o seguinte:

«3. A questão de inconstitucionalidade e os problemas constitucionais provocados pela aplicação das leis em referência foram suscitadas nas alegações de recurso de Agravo e mantidas no Recurso de revista e reclamações e o Tribunal recorrido teve a oportunidade de pronunciar-se sobre elas.

4. O Tribunal ao interpretar que a cedência do quinhão hereditário, exclui o herdeiro legitimo da conferência de interessados e demais atos processuais, nomeadamente o artigo 1352º. do Código Processo Civil 1961, viola o princípio da igualdade das partes, tornando este artigo 1352.º inconstitucional por violação do princípio da igualdade consagrado no art. 13º da CRP.

5. Em processo de inventário é legalmente exigida a notificação pessoal do interessado, para a marcação e participação na conferência de interessados, ou seja, o despacho que designa o dia para a conferência dos interessados a que alude o artº 1352º. do Código Processo Civil 1961, deve ser notificado aos herdeiros, independentemente do local de residência dos mesmos ou da constituição de mandatário judicial.

6. A interpretação de considerar a figura jurídica de herdeiro cedente, como “Não Interessado” no processo de inventário, tendo como consequência, não ser chamado aos autos (notificação), não pode ser permitida pela lei fundamental, constituindo uma gravíssima violação do princípio da igualdade das partes, consagrado no artº 3º-A do Código Processo Civil, e é mesmo inconstitucional a figura do herdeiro cedente ao ser...

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