Acórdão nº 324/21 de Tribunal Constitucional (Port, 25 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelCons. José João Abrantes
Data da Resolução25 de Maio de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 324/2021

Processo n.º 115/2021

1ª Secção

Relator: Conselheiro José João Abrantes

Acordam, em Conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – A Causa

1. No âmbito do processo comum coletivo n.º 1875/18.2PBMTS.P1, que corre termos no Juízo Central de Vila do Conde – J3, foi o Arguido A., ora Reclamante, absolvido da prática de dois crimes de violência doméstica e condenado, em convolação, pela prática de um crime de ameaça agravado, na pena de cento e vinte (120) dias de multa, à taxa diária de € 7,00.

1.1.1. Inconformado com esse acórdão, o Arguido interpôs recurso para o Tribunal da Relação do Porto, extraindo-se da respetiva motivação as seguintes conclusões, com relevância para a presente decisão:

“1.º Não se pode aceitar nem se concorda que o Tribunal "a quo" tenha condenado o recorrente, por convolação, num crime de ameaça agravado, sem que ao aqui recorrente lhe tivesse sido dada sequer a oportunidade de se poder pronunciar.

2.º Entendemos, na nossa modesta opinião, que, desta forma, foi violado pelo tribunal "a quo", entre outros, que V.ªs Ex.ªs mui superiormente sempre podem suprir, o disposto no nº1 do artigo 32º da C.R.P.”

1.1.2. Por acórdão de 9/12/2020, o TRP negou provimento ao recurso e manteve nos seus precisos termos a condenação da primeira instância (cfr. fls. 9 a 14).

Nesse aresto, com interesse para a presente decisão, lê-se o seguinte:

“Invoca o recorrente a inconstitucionalidade da interpretação dada pelo Tribunal recorrido relativamente ao artigo 358.° do CPP, pois não comunicou ao arguido a nova tipificação criminal que adaptou na sua incriminação e, consequentemente, diremos nós, a nulidade do acórdão a que alude na alínea b) do nº 1 do artigo 379° do Código Processo Penal.

Para o efeito, aduz o recorrente que o tribunal a quo procedeu à alteração da respetiva qualificação jurídica, considerando ter o arguido cometido um crime de ameaça agravado, p.p. pelos artigos 153°, n.º 1 e 155°, n.º 1, al. a), ambos do CP, e não dois crimes de violência doméstica, p.p. pelo artigo 152°, n.º 1 e b) e n.º 2, al. a) do CP, tal qual vinha acusado, sem que tivesse sido dado cumprimento ao disposto no artigo 358°, nºs. 1 e 3 do Código Processo Penal.

Entende que tal situação viola o princípio constante do nº 1 do artigo 32° da Constituição da República.

(…)

Contudo, a obrigação de comunicar ao arguido a alteração da qualificação jurídica e conceder-lhe prazo para preparação da respetiva defesa, não é aplicável quando não se mostram colocadas em causa as garantias de defesa. Como refere Oliveira Mendes in Código Processo Penal Comentado, António Henriques Gaspar, José António Henriques dos Santos Cabral, Eduardo Maia Costa, António Jorge de Oliveira Mendes, António Pereira Madeira e António Pires Henriques da Graça, 2016, págs. 1083/1084 «(... ) consabido que a defesa do arguido não se basta com o conhecimento dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, sendo necessário àquela o conhecimento das disposições legais com base nas quais o arguido irá ser julgado (... ). Assim e atenta a ratio do instituto, vem-se entendendo que só nos casos e situações em que as garantias de defesa do arguido - artigo 32.º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa - o exijam (possam estar em causa), está o tribunal obrigado a comunicar ao arguido a qualificação jurídica e a conceder lhe prazo para preparação da defesa. Por isso, se considera que a alteração resultante da imputação de um crime simples ou "menos agravado", quando da acusação ou da pronúncia resultava a atribuição do mesmo crime, mas em forma qualificada ou mais grave, por afastamento do elemento qualificador ou agravador inicialmente imputado, não deve ser comunicada, visto que o arguido ao defender-se do crime qualificado ou mais grave, se defendeu, necessariamente, do crime simples ou "menos agravado", ou seja, defendeu-se em relação a todos os elementos de facto e normativos pelos quais vai ser julgado(... )».

(…)

Daí que, como tem sido entendimento jurisprudencial pacífico do Supremo Tribunal de Justiça, não está o tribunal obrigado a tal cumprimento quando da alteração resulte a imputação de crime menos grave em consequência da redução da matéria factual ou quando seja afastado o elemento qualificador ou agravador inicialmente imputado.

É este o caso dos autos, pois apenas se verifica uma alteração da qualificação jurídica dos factos já constantes da acusação, razão pela qual o arguido ao defender-se da matéria da acusação teve oportunidade de se defender da factualidade que, por si sé', integra o crime de ameaças agravado, sendo certo que o crime de violência doméstica pelo qual vinha acusado estabelece com o crime de ameaças uma relação de consumpção sendo que o primeiro protege de forma mais enérgica a vitima que sofre comportamentos tipificáveis como de ameaça;

Assim e com o devido respeito não se verifica a apontada inconstitucionalidade, nem qualquer nulidade derivada da falta de comunicação da nova incriminação, razão pela qual se manterá...

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