Acórdão nº 4301/19.6T9STB-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 25 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelNUNO GARCIA
Data da Resolução25 de Maio de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

ACORDAM OS JUÍZES QUE INTEGRAM A SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA RELATÓRIO DMCP veio requerer, nos termos do artº 228.º do C.P.P., o arresto preventivo contra ESP, relativamente ao imóvel sito na Rua …, freguesia de …, descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º … e na matriz n.º …, correspondente ao terceiro andar direito da fração autónoma designada pela letra “…”

Em 17/11/2020, sem prévia audição do requerido, foram inquiridas três testemunhas arroladas pela requerente e após tal inquirição foi ditada para a acta decisão decretando o solicitado arresto

No final de tal decisão determinou-se a notificação do requerido “para, querendo, deduzir oposição – artigos 366.º, n.º 6, e 372.º, n.º 1, alínea b), ambos do CPC..” O requerido deduziu oposição, tendo arrolado testemunhas que foram inquiridas em 21/1/2021

Em 2//2/2021 foi proferida decisão declarando a manutenção do arresto

Inconformado com tal decisão, o requerido apresentou recurso da mesma, tendo terminado a motivação e recurso com as seguintes conclusões: “1) O presente procedimento cautelar de Arresto Preventivo está apenso ao processo de inquérito n.º 4301/19.6T9STB, o qual teve origem numa queixa apresentada em 2019; 2) O Recorrente foi interrogado no âmbito do referido inquérito no dia 28 de Janeiro de 2021, ou seja, em data posterior ao Julgamento (21 de Janeiro de 2021) mas anterior à prolação da sentença (02 de Fevereiro de 2021) que ora se põe em crise, não tendo sido constituído arguido; 3) Não tendo o ora Recorrente sido constituído arguido em momento anterior à aplicação do arresto preventivo, a sentença que decretou esta medida de garantia patrimonial é ilegal, tendo violado o n.º 1, do artigo 192.º e a alínea b), do n.º 1, do artigo 58.º, ambos do Código Processo Penal; 4) É certo que, o n.º 4, do artigo 194.º do Código do Processo Penal estatui uma salvaguarda que exclui a constituição como arguido atento os requisitos de urgência do arresto preventivo penal (desde que devidamente fundamentada), conforme impõe o n.º 1, do artigo 192.º do C.P.P., todavia, o Recorrente teria que ser constituído arguido no momento imediatamente posterior ao da aplicação da medida, sem exceder, em caso algum, o prazo máximo de 72 horas a contar da data daquela aplicação, de acordo com o disposto no número 3 do artigo 192.º do C.P.P.; 5) No entanto, não existiu qualquer circunstância que assim o justificasse nem sequer tal foi fundamentado pelo MM.º Juiz “a quo”, assim como não se verificando a excecionalidade prevista no n.º 5 do aludido artigo 192.º do C.P.P., a não constituição do ora Recorrente como arguido determina a nulidade da medida de arresto, nos termos do n.º 4 do citado artigo; 6) Efetivamente, o ora Recorrente não foi constituído arguido porque não se encontram nos autos indícios suficientes do crime denunciado. Sendo que, o arresto preventivo foi decretado sem que tenham sido realizadas diligências que possam fundamentar a existência de indícios suficientes do crime denunciado; 7) In casu, quer a doutrina quer a jurisprudência são maioritariamente unânimes ao considerar que a omissão de um ato obrigatório, a saber a constituição de arguido do ora Recorrente, atento o disposto nos artigos 192.º, n.º 1 e 58.º, n.º 1, da al. b), ambos do C.P.P. consubstanciam a nulidade prevista na primeira parte, da alínea d), do n.º 2, do artigo 120.º do referido diploma legal; 8) Em face do exposto, deverá a presente garantia patrimonial de arresto ser considerada nula e, em consequência, ao ser revogada a douta sentença recorrida e ser decretado o levantamento do arresto preventivo do bem em causa

9) Consideramos ainda que a sentença ora recorrida carece da prova de outro requisito essencial para que o arresto preventivo possa ser declarado, a saber o periculum in mora, ou seja, o justo receio do credor perder a garantia patrimonial do seu crédito; 10) É um facto provado que o Recorrente colocou à venda o apartamento objecto do presente arresto, todavia só por si este facto não poderá ser suficiente para justificar um alegado receio, que deverá consubstanciar um perigo “sério”; desde logo, porquanto também ficou provado o facto N.º 24 em que “No dia 25.10.2019, o Requerido pediu à sua irmã (CSP) para devolver 15.000,00 Reais à Requerente, o que aquela fez.”; 11) E também deverá ser considerado provado o facto confessado pela própria Requerente no artigo 35.º do Requerimento Inicial em que a ora Recorrida depois de ter recebido o dinheiro por parte do Requerido “devolveu novamente os €15.000,00 Reais” ao ora Recorrente.; 12) Efetivamente, o justo receio de perda de garantia patrimonial tem de ser objetivamente sério e credível para quem o alega, o que atento o comportamento supra descrito e provado de ambas as partes, a devolução do dinheiro (o que se verificou por repetidas vezes) por parte da Recorrida ao ora Recorrente dilui a veracidade alegada pela Recorrida de um “justo receio”; 13) Por outro lado, a Recorrida intentou um processo judicial contra o Recorrente no Brasil, conforme iremos adiante referir, e ambas as partes são brasileiras pelo que também o podia ter feito quanto ao alegado crédito; 14) Acresce que, o prejuízo que resultou para o Recorrente do decretamento do arresto preventivo atendendo a que, conforme referido pela testemunha UA aos minutos 11:42 da gravação efetuada no dia 17/11/2020, que teve início pelas 15h56min11s, de 00:00:00 a 00:20:56, o imóvel já estava vendido, é superior ao crédito que o Recorrente tem para com a Recorrida (o Recorrente perdeu €12.500,00); 15) Por outro lado, não é despiciendo contextualizar que o Recorrente apenas colocou o apartamento à venda após ter contraído Covid 19 e ter sido internado, bem como teve outras ofertas abaixo do valor de venda e não aceitou, cfr. a testemunha UA referiu aos minutos 20:35 a 20:51 da gravação, sendo a vontade do Recorrente voltar ao Brasil determinada pela sua saúde estar debilitada aumentar as saudades da família 16) No presente processo aquando da oposição foram juntos documentos que são por si só suficientes para darem como provados os factos relevantes para a alegados pelo ora Recorrente nos termos seguintes: a. O Recorrente tem nacionalidade portuguesa (foi junto cópia do cartão de cidadão – documento N.º 10 ); b. O Recorrente foi piloto comercial (foi junto cópia do cartão da Agência Nacional de Aviação Civil – documento N.º 4); c. Antes de conhecer a Sr.ª D, ora Recorrida, o Recorrente já andava à procura de um apartamento para comprar e já tinha efetuado simulações para obter um crédito à habitação (Foram juntos os documentos de uma visita a imóvel em 3 de Julho de 2018 e a simulação do crédito – Doc. N.º 1 e Doc. N.º 2. E a testemunha SB, agente imobiliária, também o confirmou que era sua a assinatura aposta no documento N.º 1.); d. O Recorrido foi infetado pelo SARS-COV2 em 24/05/2020, tendo sido internado no Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central desde o dia 02/06/2020 ao dia 07/06/2020. (Documentos N.º 11 e N.º 12 - declarações hospitalares); e. A ora Recorrida intentou contra o Recorrente um processo judicial que correu termos na 9.ª Vara de Família da Comarca de … (Brasil), que tem o N.º…, para reconhecimento de uma união de facto entre ambos. (cfr. cópia do processo que se juntou como documento N.º 13)

17) E, caso dúvidas existam quanto a este último facto, sempre deverá a prova ser renovada quanto ao mesmo, ouvindo-se a ora Recorrida quanto a ele

18) O arresto preventivo foi decretado sem audição do Requerido pelo que quando o mesmo apresentou a sua oposição ainda não tinha ouvido a produção de prova testemunhal apresentada pela Requerente, que veio corroborar a versão do Recorrente e não da Recorrida, pelo que não se entende como pode o Mm.º Juiz “a quo” ter formado a sua convicção com base nos depoimentos das testemunhas arroladas pela Recorrida

19) Dos factos vertidos na oposição do ora Recorrente consideramos que existe prova mais do que indiciária para considerar os mesmos provados. Vejamos: a. Artigo 3.º “(...)nunca houve intenção de adquirirem o mesmo imóvel em compropriedade.” (sublinhado nosso)

A testemunha UA que conhece ambas as partes e mediou a compra e venda do apartamento em causa é fulcral para a descoberta da verdade. Assim, a testemunha UA aos minutos 02:56 da gravação da gravação que teve inicio pelas 15h56m11s à pergunta da Advogada da Recorrida se a intenção da compra do imóvel era sozinho ou conjuntamente com uma companheira: “- Não, sozinho.”; E continuando a instâncias da Advogada da Recorrida que pergunta se o Recorrente nunca lhe referiu a Sr.ª D na qualidade de promitente compradora. A testemunha refere aos minutos 05:48Min: “- Não, o Senhor E não.” Mas mais refere a testemunha que a Recorrida lhe disse diretamente que estava a acompanhar o processo de venda do imóvel e quando a Advogada da mesma pretendeu saber o motivo pelo qual a mesma o faria, a testemunha respondeu aos minutos 06:21Min: “- Até porque ela disse também que tinha intenção de comprar um imóvel comigo.” Igualmente questionado pelo Mm.º Juiz “a quo” aos minutos 15:59 se o imóvel foi comprado pelo senhor E e pela senhora D, ou só por ele a testemunha respondeu: “ – Só por ele.” E confirmou ainda a testemunha que a escritura pública e o contrato promessa de compra e venda foram celebrados apenas pelo o ora Recorrente

Mas a testemunha esclareceu aos minutos 16:52 da gravação que foi apenas a Recorrida que falou que “iria ver com o E uma situação da compra do imóvel, desse imóvel.” Aliás, a própria Recorrida nunca se intitulou perante a testemunha da sociedade de mediação imobiliária que também era compradora do imóvel em causa colocando sempre tal possibilidade na decisão unilateral do Recorrido, o que nunca aconteceu

Segundo as regras de experiência comum, conhecendo a Recorrida o vendedor, in casu, mediador da venda, caso fosse verdade que a mesma ia comprar o imóvel com o Recorrente, seria sempre como compradora...

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