Acórdão nº 189/19.5JELSB-G.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 25 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelANA BACELAR
Data da Resolução25 de Maio de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação do Évora I.

RELATÓRIO No processo de inquérito que, com o n.º 189/19.5JELSB, corre termos pela 3.ª Secção de (...) do Departamento de Investigação e Ação Penal dos Serviços do Ministério Público de (...), em 30 de dezembro de 2020, foi proferida decisão judicial a declarar a excecional complexidade do respetivo procedimento criminal.

Inconformado com tal decisão, o Arguido (…) dela interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões [transcrição]: «1. O presente recurso vem interposto do despacho que declarou a excecional complexidade do presente procedimento criminal.

  1. O despacho recorrido fundamenta a decisão com base numa alegada “teia de contactos”.

  2. O conteúdo do fundamento é completamente alheio ao ora recorrente.

  3. O direito do recorrente à liberdade não pode estar dependente de tais circunstâncias.

  4. Nem a legislação vigente nem a jurisprudência apontam um critério inequívoco para definir em que consiste a excecional complexidade.

  5. Mas devem ser seguidas regras de proporcionalidade e razoabilidade.

  6. Tendo em conta o princípio da presunção da inocência consagrado no artigo 32.º da CRP, o recorrente tem direito a uma decisão em prazo razoável que ponha termo ao inquérito.

  7. Tendo em conta o princípio da presunção da inocência consagrado no artigo 32.º da CRP, o recorrente tem direito a que não seja prorrogado o prazo máximo de duração da prisão preventiva.

  8. A excecional complexidade deveria ter por referência os elementos existentes nos autos até ao momento, mas o despacho recorrido aponta para uma factualidade incerta quando refere: “(…) podendo surgir novos elementos envolvidos na prática dos factos em investigação”.

  9. Esta incerteza sobre o que ainda poderá surgir e o tempo que será necessário para investigar toda essa eventualidade representam uma indefinição sobre a situação processual do recorrente.

  10. As indefinições sobre o tempo de prisão preventiva que ainda restará não são compatíveis com os direitos, liberdades e garantias consagrados da CRP.

  11. Para que seja declarada a excecional complexidade, não é suficiente que a investigação seja complexa. Tem que ser também excecional.

  12. Será a presente investigação excecional? 14. Não se vislumbra como excecional uma investigação onde se prevê que venha a surgir “uma teia de contactos” ou “novos elementos envolvidos”; é do conhecimento comum que são situações frequentes nas investigações.

  13. É também do conhecimento geral que por diversas vezes decorrem várias investigações que dão origem a diversos processos.

  14. Verificando-se a conexão deles, recorre-se à figura da apensação, prevista no artigo 29.º do Código de Processo Penal.

  15. Se o que sucede in casu for a necessidade de investigar novos factos, será mais compatível com aplicação do princípio in dubio pro reo que corram termos outros processos.

  16. O recorrente está plenamente convicto de que as alegadas questões complexas e morosas não são sobre a sua atuação nem de sua responsabilidade.

  17. O princípio da presunção de inocência tem o seu cumprimento mais garantido se em vez de existir um inquérito complexo, existirem vários inquéritos.

  18. Assim poderá verificar-se a celeridade processual que se impõe quando há pessoas que se presumem inocentes até prova em contrário e que se encontram privadas da liberdade.

    Termos em que o presente recurso deve ser julgado procedente e o despacho que declara a excecional complexidade do presente procedimento criminal deve ser revogado, com as legais consequências.» Inconformado com tal decisão, o Arguido (…) dela interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões [transcrição]: «1. O Ministério Público requereu a declaração de excecional complexidade do inquérito.

  19. Por despacho datado de 14-12-2020 foi o arguido notificado para exercer o contraditório.

  20. O arguido, ora Recorrente por requerimento datado de 18-12-2020 veio aos autos exercer o contraditório e referir que não há sequer um único fundamento se é porque é necessário ouvir mais pessoas, se é por haver suspeitas de mais arguidos e/ou suspeitos, por prova pericial, ou seja ser carreado algum facto, pois não nos podemos pronunciar nem responder a algo cujo fundamento se desconhece aliás temos pelo menos que ser notificados do teor nem que seja de parte da promoção do Ministério Público.

  21. Por despacho datado de 30-12-2020 o tribunal “a quo” decidiu que inexiste qualquer irregularidade invocada e declara a excecional complexidade do procedimento criminal a que se reportam os presentes autos, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 215.º, n.ºs 2, 3 e 4 do Código de Processo Penal.

  22. O arguido, ora Recorrente não se conforma com o despacho de que ora se recorre.

  23. O tribunal “a quo” não fundamenta a decisão que declarou a excecional complexidade dos presentes autos, nem justifica o porquê de declarar a excecional complexidade do processo, o que consubstancia a nulidade do despacho recorrido por padecer do vício da falta de fundamentação, nos termos do artigo 97.º, n.º 5 do Código de Processo penal.

  24. A não ponderação de todos os elementos concretos do presente caso, nomeadamente a não quantificação do número real de arguidos, a total omissão quanto às diligências de obtenção de prova, representa uma violação do dever de fundamentação a que o Juiz está adstrito.

  25. Ao que acresce que não foram comunicados aos arguidos todos os concretos fundamentos deduzidos pelo Ministério Público, o facto de na fase do inquérito o princípio do contraditório não funcionar na sua plenitude e o facto de os autos se encontrarem em segredo de justiça não pode servir de fundamento para não terem sido comunicados ao arguido, ora Recorrente pelo menos as circunstâncias que determinaram a excecional complexidade dos presentes autos.

  26. Deveria o Tribunal “a quo” ter comunicado ao Arguido ora Recorrente esses concretos fundamentos invocados pelo Ministério público para requerer a declaração de excecional complexidade do processo.

  27. Estamos em crer que o prazo legalmente previsto para a conclusão do inquérito é mais do que suficiente para realizar todas as diligências que o Ministério Público entender convenientes à prolação do despacho final do inquérito sem que seja necessário atribuir aos autos tal classificação.

  28. Entendemos assim que em concreto, não se encontram reunidos os pressupostos necessários à atribuição do carácter de especial complexidade aos presentes autos pois conforme já foi referido a morosidade, ou mesmo a eventual complexidade de uma determinada diligência não se confunde com a excecional complexidade do processo.

  29. Não podemos confundir a demora na realização das diligências de produção de prova durante o inquérito com a complexidade das mesmas, sob pena de, na maior parte dos casos, terem todos os processos em fase de inquérito de ser considerados de especial complexidade.

  30. Não vislumbramos assim nenhuma razão para que, neste momento, se justifique a declaração de excecional complexidade do processo.

  31. A decisão recorrida violou e interpretou erroneamente o disposto no artigo 215.º, n.ºs 2, 3 e 4 e os artigos 20.º, n.º 1 e 32.º, n.º 1 e 2 ambos da C.R.P.

  32. Termos em que deverá o despacho ora recorrido que declarou a excecional complexidade do procedimento criminal a que se reportam os presentes autos ser revogado por violação dos supra mencionados preceitos legais e consequentemente deverá ser proferido outro que não declare a excecional complexidade dos presentes autos.

    Nestes termos e nos melhores de direito, deverá ser concedido provimento ao presente recurso e deverá ser o despacho recorrido revogado e consequentemente deverá ser proferido outro que não declare a excecional complexidade dos presentes autos, assim se fazendo justiça!» Inconformado com tal decisão, o Arguido (…) dela interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões [transcrição]: «I.

    OBJETO DO RECURSO A DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE 1. O Ministério Público promoveu a declaração de excecional complexidade do inquérito, nos presentes autos.

  33. Por despacho datado de 20-12-2020 o tribunal “a quo” declarou a excecional complexidade do procedimento criminal a que se reportam os presentes autos, nos termos e para os efeitos previstos.

  34. O arguido, ora Recorrente não se conforma com o despacho de que ora se recorre, por entender que a leitura que o Despacho ora recorrido fez do citado artigo 215.º, n.ºs 2, 3 e 4 do Código de Processo penal viola a Lei Fundamental, concretamente o artigo 32.º da CRP ao considerar que não precisa de dar conhecimento – a não ser de forma muito genérica e vaga – ao(s) arguido(s) dos motivos que levam o Ministério Público a requerer a determinação da especial complexidade.

  35. DO DIREITO VIOLADO A decisão recorrida violou e interpretou erroneamente, o disposto no artigo 215.º, n.ºs 2, 3 e 4 do CPP e os artigos 20.º, n.º 1 e 32.º, n.º 1 e 2 ambos da C.R.P.

    II.

    DO VÍCIO DA FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO 5.

    Mesmo que assim não o tribunal “a quo” não fundamenta a decisão que declarou a excecional complexidade dos presentes autos, nem justifica o porquê de declarar a excecional complexidade do processo, o que consubstancia a nulidade do despacho recorrido por padecer do vício de falta de fundamentação, nos termos do artigo 97.º, n.º 5 do Código de Processo penal.

  36. A não ponderação de todos os elementos concretos do presente caso, nomeadamente a não quantificação do número real de arguidos, a total omissão quanto às diligências de obtenção de prova, representa uma violação do dever de fundamentação a que o Juiz está adstrito.

  37. Deveria o Tribunal “a quo” ter comunicado ao Arguido ora Recorrente esses concretos fundamentos invocados pelo Ministério Público para requerer a declaração de excecional complexidade do processo.

  38. Estamos em crer que o prazo legalmente previsto para a conclusão do inquérito é mais do que suficiente para realizar todas as diligências que o...

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