Acórdão nº 0134/20.5BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelANÍBAL FERRAZ
Data da Resolução26 de Maio de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa; # I.

A…………., Lda., …, a coberto do disposto nos artigos (arts.) 25.º n.ºs 2 a 4 e 26.º do Decreto-Lei (DL.) n.º 10/2011 de 20 de janeiro, que estabeleceu o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAMT) e 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), interpôs, para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário, do Supremo Tribunal Administrativo, recurso, objetivando uniformização de jurisprudência, da decisão proferida, no âmbito de pedido de pronúncia arbitral, formulado no processo nº 235/2020-T, do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), a qual julgou totalmente improcedente o pedido arbitral (“declaração de ilegalidade e anulação da liquidação de IRC n.º 2020 8310000142, relativa ao exercício de 2018, com o valor a pagar de € 183.328,37, incluindo o valor de € 2.803.20 de juros compensatórios”).

Aponta-lhe contradição/oposição com o decidido na, também, decisão arbitral (colegial), datada de 24 de setembro de 2019, emitida no processo nº 88/2019-T, do CAAD.

A recorrente (rte) apresentou alegação, finalizada com as seguintes conclusões: « A) A douta decisão arbitral aqui recorrida proferida no Processo n°. 235/2020-T está em manifesta oposição com a douta decisão arbitral que serve de fundamento proferida no Processo n°. 88/2019-T; B) Tendo ambos os processos idênticas situações fácticas subsumíveis ao mesmo quadro substancial de regulamentação jurídica, divergem, contudo, quanto às soluções jurídicas propugnadas, pelo que verifica-se a manifesta oposição relativamente à mesma questão fundamental de direito, o que justifica a prossecução do presente recurso jurisdicional para uniformização de jurisprudência por oposição de julgados que deve prosseguir para conhecimento do respetivo mérito, em conformidade com o disposto no n°. 2 do artigo 25° do RJAT e do artigo 152° do CPTA; C) Encontrando-se preenchidos os pressupostos para a admissibilidade do recurso e porque as duas decisões arbitrais aqui chamadas à colação divergem quanto às soluções propugnadas, à que decidir do mérito do mesmo quanto à mesma questão fundamental de direito, designadamente, a de saber do acerto da imputação das despesas não documentadas (que são presumidas sobre a inexistência dos valores monetários reflectidos na conta 11-Caixa) no ano em que é realizada a conferência do saldo de caixa pela inspecção tributária ou se, ao invés, tal imputação dever ser feita nos exercícios onde essas despesas efectivamente ocorreram por aplicação do princípio da especialização dos exercícios; D) Com efeito, tendo a AT realizado de controlo do saldo de caixa da aqui Recorrente, verificou a inexistência de valores monetários em caixa, bem como a falta da relevância contabilística do recebimento de Clientes no valor de 90.000,00€, pelo que considerou que tal divergência no valor de 300.875,29€ (210.875,29€ + 90.000,00€) tinha a natureza de despesas não documentadas sujeitas a tributação autónoma e procedeu à correspondente liquidação adicional de IRC, a qual foi sindicada no pedido de pronúncia arbitral aqui sob escrutínio; E) Em ambas as decisões arbitrais ficou demonstrado que o saldo contabilístico da conta Caixa já vinha com valores muito elevados nos exercícios anteriores ao da imputação da tributação e que, no caso da decisão recorrida, inclusivamente era em 2017 de montantes superior ao do exercício de 2018; F) A decisão arbitral aqui ora recorrida pronunciou-se pela improcedência do pedido com o fundamento (na parte que aqui interessa analisar por se mostra em contradição com a decisão-fundamento) de que a liquidação da tributação autónoma prevista no CIRC não se mostra viciada de ilegalidade na medida em que se pode presumir a ocorrência dessas despesas não documentadas no exercício de 2018 em que ocorreu a ação de verificação de caixa para comprovação do saldo da conta 11-Caixa promovida pela A.T., uma vez que não se aplicam à tributação autónoma prevista no CIRC os princípios e regras constantes do referido Código para a liquidação e cobrança do próprio IRC que se mostram incompatíveis com a natureza da tributação autónoma enquanto imposto incidente sobre certas despesas, e não sobre o rendimento, designadamente, os princípios da periodização do lucro tributável e da anualidade; G) Termos em que na decisão arbitral recorrida conclui-se que se pode presumir que tais despesas não documentadas são imputadas integralmente ao exercício de 2018 em que se realizou a conferência da caixa social, considerando ser este o exercício para a sua tributação autónoma nos termos previstos no artigo 88.°, n.° 1, do CIRC; H) Em contradição com a decisão recorrida, a decisão arbitral fundamento pronunciou-se pela procedência do pedido, anulando a liquidação impugnada com fundamento em fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário nos termos do artigo 100.°, n° 1, do CPPT, concluindo pela verificação de erro nos pressupostos de facto, e consequente erro de direito, com a consequente anulação da liquidação de tributação autónoma, considerando que a tributação autónoma em sede de IRC “está sujeita às normas próprias daquele tributo, que não sejam incompatíveis com a sua natureza, designadamente e no que ao caso importa, no que diz respeito às regras relativas à especialização dos exercícios e periodização do lucro tributável, conforme decorre, para além do mais, dos artigos 8.° e 18.° do CIRC”; I) Com efeito, a douta decisão-fundamento alicerça o seu julgamento no facto de que “não é possível, julga-se, extrair de tais movimentos contabilísticos o momento em que as despesas indiciadas ocorreram, sendo que, à míngua destes elementos, não é possível concluir, para lá de qualquer dúvida razoável, que, e em que dias, naquele exercício de 2015, hajam ocorrido despesas correspondentes ao valor assumido pela AT como base para a liquidação de tributações autónomas, ora em crise”.

J) Ora, em ambas as decisões aqui escrutinadas estão em causa despesas não documentadas e não contabilizadas pelo que, pelo facto de não constarem da contabilidade, não é possível apreender através desta o momento da ocorrência da despesa, mas tão só a sua quantificação; K) O que implica que, para além do mais, a imputação das despesas não documentadas a um determinado exercício não pode ser presumida apenas com base no facto de ter sido nesse ano que ocorreu a conferência do saldo de caixa pela A.T.; L) Com efeito, ao contrário do que foi perpetrado pela A.T. e foi corroborado na douta decisão aqui recorrida, a verificação em 17-12-2018 da inexistência na empresa dos valores correspondentes ao saldo da conta Caixa não permite presumir que nessa mesma data ocorreu a totalidade das despesas não documentadas correspondentes ao valor dessa divergência, de forma que as mesmas sejam susceptíveis de tributação autónoma nesse mesmo ano; M) Ademais, é certo que tais despesas não documentadas poderiam ter igualmente ocorrido em qualquer um dos exercícios anteriores, atendo aos elevados saldos da conta Caixa já verificados nesses exercícios, o que indicia que as despesas já teriam ocorrido muito antes de 2018, o que implicaria sempre a verificação de erro sobre os pressupostos de facto e de direito quanto à quantificação do facto tributário ao imputar ao exercício de 2018 a totalidade das despesas não documentadas ou, mais que não fosse, estar-se-ia, pelo menos, perante uma fundada dúvida quanto a essa quantificação imputada ao ano de 2018 que justificaria a anulação da liquidação, na parte correspondente, por força do disposto no artigo 100.°, n.° 1, do CPPT; N) A não se entender assim, coloca-se em crise o instituto da caducidade previsto no artigo 45° e seguintes da LGT, porquanto a inexistência dos valores correspondentes aos saldos da conta Caixa pode corresponder a exfluxos financeiros ocorridos muito anos antes da verificação levada a cabo pela inspecção tributária, porquanto, em face da experiência comum, é sabido que as empresas não têm à sua disposição esses elevados valores monetários na caixa social; O) A questão aqui sub judice foi igualmente analisada e julgada na decisão arbitral proferida Processo n°. 93/2020-T em 11-10-2020, sendo a situação de facto e de direito absolutamente idêntica à da decisão aqui recorrida e onde se decidiu pela procedência do pedido, anulando parcialmente a liquidação impugnada com fundamento em vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto e de direito por a A.T. ter imputado ao exercício de 2018 a totalidade das despesas não documentadas que são presumidas em resultado da inexistência dos valores monetários correspondentes ao saldo da conta Caixa; P) Também nesta decisão arbitral se entende que se deve atender ao princípio da especialização dos exercícios como decorre do artigo 18.° do CIRC, na medida em que as tributações autónomas também têm de ser efectuadas relativamente ao período fiscal em que ocorreram as despesas não documentadas, tal como vigora quanto a tal tributação o princípio da anualidade enunciado no artigo 8.° do CIRC; Q) Acresce que o próprio artigo 88.° do CIRC, no seu n.° 14, revela expressamente a conexão das tributações autónomas com o período de tributação do rendimento em que em que ocorrem os factos que lhes estão subjacentes, ao estabelecer que um agravamento da taxa quando se verifique a ocorrência de prejuízo fiscal no período a que respeitem as despesas não documentadas, sendo manifesto que em cada ano apenas podem ser tributadas autonomamente despesas que tenham ocorrido nesse mesmo exercício; R) Ora, caso em apreço, porque as despesas não estão documentadas e não se encontram contabilizadas e a A.T. não faz qualquer outra prova, da prova produzida não se pode concluir que todas as despesas que estão subjacentes à falta de meios financeiros correspondentes aos saldos da conta 11-Caixa em 26-12-2018 tenham ocorrido neste ano de 2018 e, pelo contrário, os indícios que...

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