Acórdão nº 0847/14.0BEALM-A de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Maio de 2021
Magistrado Responsável | ARAGÃO SEIA |
Data da Resolução | 26 de Maio de 2021 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: A………… e mulher, B…………, notificados do acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo proferido, em 28 de Outubro de 2020, no processo à margem identificado, não se conformando com o seu teor, vêm dele apresentar recurso para o Pleno da referida Secção, visando a uniformização de jurisprudência, nos termos do disposto no nº 1 do artigo 152° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) -de notar que o CPPT contém norma própria e específica para este tipo de recurso, artigo 284º, sendo desnecessária a invocação das normas do CPTA- e da alínea b) do nº 1 do artigo 27º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF).
Alegaram, tendo concluído: I. Os Recorrentes interpõem para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, com base em oposição da decisão proferida no presente processo com o Acórdão proferido em 12.9.2018, pelo Supremo Tribunal Administrativo no âmbito do processo n.º 01094/17, disponível em www.dgsi.pt.
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O Acórdão recorrido buscou inspiração na argumentação jurídica constante do Acórdão do STA emitido em 01.07.2020, no âmbito do processo n.º 1400/13.1BELRA, o qual contende também com o Acórdão proferido em 05.02.2020, pelo Supremo Tribunal Administrativo, no âmbito do processo 0759/14.8BEALM, também disponível em www.dgsi.pt.
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O presente recurso tem como fundamento a circunstância de os Acórdãos em confronto assentarem em situações de facto idênticas nos seus contornos essenciais e em ambas as decisões a questão de direito subjacente dizer respeito à forma de tributação dos rendimentos empresariais e profissionais.
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Com efeito, o Acórdão proferido colide frontalmente com os Acórdãos prolatados pela Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo acima referidos, encontrando-se irremediavelmente inquinado do ponto de vista jurídico por errada interpretação do artigo 28º do Código do Imposto sobre Rendimentos Singulares, na redação conferida pelas Leis n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, e n.º 3-B/2010, de 28 de abril.
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Estão assim em causa diferentes interpretações do artigo 28º do referido CIRS.
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Entendem os Recorrentes, em linha com os Acórdãos de 12.9.2018 e de 05.02.2020, que o período mínimo de três anos previsto no n.º 5 do artigo 28º é aplicável, quer no regime geral da contabilidade, quer no regime simplificado de tributação, e não depende de declaração de opção pelo regime de contabilidade organizada.
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Atento o princípio constitucional da tributação segundo o rendimento (vd. artigo 104º da Constituição da República Portuguesa), não deviam subsistir dúvidas de que o regime regra de tributação é o da contabilidade organizada.
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Consequentemente, o regime simplificado de tributação, criado tendo em vista a comodidade dos contribuintes, tem natureza excecional.
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O n.º 2 do artigo 28º indica as condições para o contribuinte poder usufruir do regime simplificado: os seus rendimentos empresariais e profissionais não terem ultrapassado no período de tributação imediatamente anterior um montante anual ilíquido na categoria de € 150 000,00; X. Os demais normativos, contudo, preveem as situações em que o contribuinte deve retomar ao regime da contabilidade organizada: a) Por opção própria, no final do triénio (n.º 3 do artigo 28°); b) Cessação obrigatória por ser ultrapassado o montante máximo anual (n.º 6 do artigo 28º); c) Por opção própria, e reunidas certas circunstâncias, ainda que não tenha decorrido o período mínimo de permanência no regime simplificado (n.º 9 do artigo 28º); d) Requerimento do sujeito passivo e autorização da DGCI, no caso de reinício de atividade (n.º 12 do artigo 28º).
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Ora, se o legislador previu várias circunstâncias suscetíveis de o contribuinte ver o regime de tributação simplificado que lhe vinha a ser aplicado ser substituído pelo de contabilidade organizada, o legislador nunca previu - exceto no final de cada triénio - a possibilidade de automaticamente passar do regime de contabilidade organizada para o simplificado.
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Deste modo, não existe dispositivo legal que faculte ao contribuinte - ou à Administração Tributária - modificar, no meio do triénio, o regime aplicável de contabilidade organizada para passar a ser tributado pelo regime simplificado.
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Por seu turno, impõe o n.º 6 do artigo 28º do CIRS que a tributação pelo regime de contabilidade organizada se faz a partir do período de tributação seguinte ao da verificação de qualquer desses factos.
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Deste modo, quando, num período tributário, os rendimentos superam os limites do nº 6 do artigo 28º, sempre se inicia novo triénio em que os rendimentos são apurados com base na contabilidade.
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É a letra da lei que o impõe, ao recorrer à expressão ʺa partir".
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Acresce que a Lei n.º 53-A/2006 veio expressamente alterar o n.º 5 do artigo 28º no sentido de aplicar ao regime da contabilidade organizada a regra da permanência por três anos que já vigorava para o regime simplificado.
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Sendo o regime da contabilidade organizada o regime-regra, face ao normativo constitucional supracitado, a interpretação que torna inaplicável o período mínimo de 3 anos de permanência estabelecido pelo n.º 5 do artigo 28º do CIRS no caso de enquadramento do contribuinte no regime da contabilidade por obrigação legal viola a Lei Fundamental e demais preceitos legais.
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Numa outra perspetiva, a referida interpretação, ao favorecer a aplicação do regime simplificado, discrimina os dois regimes de tributação, pois concede prevalência ao regime simplificado ativado ope legis em detrimento do regime da contabilidade adotado, também, por imperativo legal.
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Ora, a exegese levada a cabo pelo Acórdão recorrido, ao pretender resolver uma suposta incoerência relativa à eventual falta de previsão legal da comunicação de alteração do regime da contabilidade para o simplificado, põe em causa o imperativo legal respeitante ao período mínimo de permanência.
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Pelo contrário, vêm os Recorrentes sustentar que, por se mostrar coerente com a Constituição, harmoniosa com o sistema legal tributário instituído e assentar na evidência da letra da lei, deve ser adotada a correção da jurisprudência no sentido de que o período mínimo de anos previsto no n.º 5 do artigo 28º é aplicável, quer no regime geral da contabilidade, quer no regime simplificado de tributação, e não depende de declaração de opção pelo regime de contabilidade organizada.
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Entendem, pois, os Recorridos que, atento tudo o que acima se expôs, decorre encontrar-se o Acórdão recorrido em desconformidade com todos os preceitos e princípios acima referidos, não merecendo, por isso, ser mantido na ordem jurídica, devendo antes ser revogado e substituído por outro, convergente com o entendimento explanado.
Nestes termos e nos demais de Direito, doutamente supridos pelos Venerandos Conselheiros, deve o recurso interposto ser julgado procedente e, em consequência, ser revogado o acórdão recorrido, substituindo-se por um outro que julgue procedente a pretensão da recorrente, com todas as consequências...
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