Acórdão nº 316/21 de Tribunal Constitucional (Port, 13 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Lino Rodrigues Ribeiro
Data da Resolução13 de Maio de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 316/2021

Processo n.º 853/20

3.ª Secção

Relator: Conselheiro Lino Rodrigues Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação do Porto, em que é recorrente A. e são recorridos o Ministério Público e o Instituto da Segurança Social, I.P., o primeiro veio interpor recurso de constitucionalidade ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (LTC), da decisão proferida por aquele Tribunal no dia 1 de julho de 2020, que negou provimento ao recurso interposto pelo arguido da decisão de primeira instância que, para o que aqui releva, o condenou numa pena de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de prisão, a cumprir em regime de permanência na habitação com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, pela prática de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, p. e p. pelo disposto no artigo 107.º, n.º 1, por referência ao artigo 105.º, do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT).

2. O recurso interposto para o Tribunal Constitucional apresenta o seguinte teor:

«A., arguido nos autos supra identificados não se conformando com o douto acórdão que lhe foi notificado vem dele interpor recurso para o Tribunal Constitucional, o que faz nos seguintes termos:

O recurso é interposto ao abrigo da Al. b) do nº1 do artigo 70º da Lei nº 28/82 de15 de novembro na redação dada pela Lei nº 04/2009, de13.09

Pretende-se ver apreciada a inconstitucionalidade do segmento da norma do artigo 379 nº 1 al. c) do C.P.P., no entendimento que o Tribunal não está obrigado a discriminar a que trabalhadores, e a que montantes se reportam os descontos não entregues à Segurança Social, e que tal não configura a nulidade aí prevista, por violação do disposto no artigo 32 nº 1 e 5 da CRP.

Esta inconstitucionalidade foi invocada nas Motivações de recurso para o Tribunal da Relação.

Pretende-se ver, ainda, apreciada a inconstitucionalidade do segmento da norma do artigo 417 nº 3 do C.P.P. no entendimento de que na ausência de conclusões ou com conclusões incompletas não é obrigatório o convite à formulação de novas conclusões que corrijam o vicio das anteriores.

Tal viola o disposto nos artigos 32º e 112 da CRP.

Esta inconstitucionalidade foi invocada aquando das nulidades invocadas no Acórdão.

Pretende-se ainda ver apreciada a inconstitucionalidade do segmento da norma do artigo 43 nº 1, 2 e 3 do CP no entendimento de que não é o tribunal que julga que tem de se pronunciar sobre a autorização da ausência da habitação para exercer atividade profissional, não havendo omissão de pronuncia se não fizer em sede de apreciação de recurso apesar da correspondente motivação e conclusão no recurso interposto, mas sim porque essa medida está prevista no Código Penal e tem de ser ponderada pelo Tribunal de Recurso aquando da ponderação da medida adequada da pena por violação do artigo 32 da C.RP por se tratar de uma verdadeira pena.

Esta Inconstitucionalidade é agora invocada atento o uso inesperado de tal interpretação o que levou a que só agora possa ser possível essa invocação por ausência de articulado no processo tendo o Tribunal da Relação tomado a posição na decisão das nulidades da justeza da não pronúncia sobre tal matéria no seu acórdão

Só perante esta decisão se viu o recorrente na possibilidade de arguir a inconstitucionalidade dessa interpretação, sendo certo que essa matéria vem invocada nas motivações de recurso, reiterada nas nulidades invocadas no Acórdão

Nestes termos, requer a V. Exa se digne admitir o presente recurso e feito o mesmo subir, com o efeito próprio, seguindo-se os demais termos legais.»

3. Através da Decisão Sumária n.º 668/2020, foi decidido não conhecer o objeto desse recurso, com base na seguinte fundamentação:

«4. Compulsados os autos, conclui-se pronta e inequivocamente que o objeto deste recurso não pode ser conhecido, desde logo porque não apresenta caráter normativoi.e., não incide sobre autênticas normas, pressuposto este que visa delimitar a competência do Tribunal Constitucional perante outras ordens jurisdicionais (cf. e.g. o Acórdão n.º 361/98), impedindo que a fiscalização concreta da constitucionalidade resvale na sindicância das decisões dos tribunais judiciais em si mesmas consideradas – i.e., numa apreciação dos concretos termos em que aí foram aplicadas certas normas de direito ordinário (cf. e.g. o Acórdão n.º 466/2016). Competência do Tribunal Constitucional num recurso como o que se aprecia é, única e exclusivamente, apreciar a possível desconformidade de uma norma de direito ordinário com a Constituição.

A questão trazida pelo recorrente a este Tribunal, porém, não supõe uma apreciação desta natureza, expressando única e exclusivamente uma discordância quanto à forma como o tribunal recorrido subsumiu em dados preceitos de direito ordinário as circunstâncias concretas do seu específico caso. É certo que o requerimento de recurso apresentado procura fazer revestir de teor normativo a pretensão do recorrente, mas não foi essa a questão colocada perante o tribunal recorrido. A questão colocada pelo recorrente ao Tribunal da Relação (a fls. 879 dos autos foi a seguinte: «Existe uma omissão de pronúncia, o que acarreta uma nulidade da sentença nos termos conjugados art 379 n.º 1 al. c) do CPP, o que viola o princípio constitucionalmente consagrado na Constituição da República Portuguesa 32.º n.º 1 e n.º 5». E ainda, logo após: «face [à] prova testemunhal produzida em sede de audiência [de] julgamento, apenas um trabalhador reconheceu o arguido como sendo a entidade patronal, os restantes imputaram tal qualidade ao pai do arguido, já falecido. Nessa medida, salvo melhor entendimento, a sentença está incompleta, não permite uma compreensão discriminada das infrações imputadas ao arguido».

Quer dizer, é visivelmente no plano do direito ordinário que a questão se situa. A referência feita à Constituição é incidental e serve apenas para reforçar a ideia de que houve uma nulidade (o que configura uma questão de direito ordinário). Não está realmente em causa de uma questão de constitucionalidade. Não surpreende, por isso, que a decisão recorrida, tendo apreciado detidamente a referida questão da nulidade, não se tenha no entanto considerado adstrita a ponderar qualquer questão de constitucionalidade (cf. fl. 953).

Por outro lado, não há dúvidas de que é assim que a questão deve ser entendida, e não à luz do requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, de modo isolado, pois de outro modo nunca poderia considerar-se que se trate de uma questão suscitada previamente perante o tribunal a quo e nunca poderia, pois, logo à partida, ser conhecida, já que esta constitui uma condição de legitimidade para a interposição de recursos ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC (cf. o artigo 72.º, n.º 1, alínea b), e n.º 2, da LTC).

Assim, e em...

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