Acórdão nº 315/21 de Tribunal Constitucional (Port, 13 de Maio de 2021

Data13 Maio 2021
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 315/2021

Processo n.º 533/2020

3.ª Secção

Relator: Conselheiro Lino Rodrigues Ribeiro

Acórdão, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação do Porto, em que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público, o primeiro veio interpor recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (LTC), do acórdão proferido por aquele Tribunal no dia 9 de março de 2020, que indeferiu a reforma e a arguição de nulidade requeridas pelo arguido relativamente ao acórdão proferido pelo mesmo Tribunal no dia 8 de janeiro de 2020, que, concedendo provimento parcial ao recurso pelo mesmo interposto da decisão de 1.ª instância, o condenou numa pena única de 2 (dois) anos de prisão.

2. O recurso de constitucionalidade apresenta, na íntegra, o seguinte teor:

«A., recorrente nos autos, notificado do Acórdão de 2020.03.09, do mesmo vem interpor:

RECURSO PARA O TRIBUNAL CONSTITUCIONAL

1 - Recorre o arguido do Acórdão de 09.03.2020, sendo relevante a parte decisória que diz:

"Com efeito, nos termos do art. 380º do CPP a "correção da sentença" penal só é admissível em duas situações: a) quando não tiver sido observado ou integralmente cumprido o disposto no art. 374º do CPP, ou b) a sentença contiver erro, lapso ou obscuridade ou ambiguidade cuja eliminação não importe modificação essencial."

2 - E visa o recurso a declaração de inconstitucionalidade das disposições conjugadas dos arts 4º e 380º do CPP, na medida em que levam a uma interpretação geral e abstrata de inaplicabilidade por remissão do CPP das regras da Reforma do CPC, arts 616º e 617º do CPC.

3 - Suscitou o recorrente a inconstitucionalidade no nº "6 - A Reforma prevista no CPC é possível no âmbito do processo crime, ao abrigo da remissão do Artº 40 do CPP..", pois após extensa abordagem e transcrição de Acórdãos defensores da possibilidade de Reforma (ao abrigo das regras do CPC) no âmbito do processo penal, disse ainda que: "12 - Qualquer interpretação divergente da sufragada nos Acórdãos supra, leva a que havendo um lapso numa decisão judicial de que não caiba recurso se "congele" com o erro, tornando inviável a sua retificação, não sendo possível ao interessado/lesado com o lapso obter a retificação do mesmo, o que torna tal interpretação inconstitucional, pois a aplicação conjugada do artº 380º do CPP se impedir a remissão do artº 4º do mesmo diploma para as regras da Reforma do CPC, arts 616º e 617º do CPC, viola o disposto nos artigos 20º nº 4 e 5 e 32º da Constituição da República Portuguesa."

4 - Por último e à cautela, diga-se que se pretende ver declarada a inconstitucionalidade da interpretação que leva a que de um modo geral e abstrato nunca exista possibilidade de pedido de reforma (nos termos e com os requisitos da lei civil) no âmbito de qualquer processo penal, seja qual for o Tribunal, o crime, o arguido e/ou o momento da decisão, com as consequências daí advindas, não se tratando de uma divergência da decisão concreta em si no caso em apreço, situação que tem sido apreciada e inclusivé com diversas e recentes declarações de inconstitucionalidade como aconteceu no Ac. TC 270/19, de 15 de maio.

5 - O presente recurso é interposto ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15/11.

6 - Verifica-se assim estarem reunidos todos os pressupostos de admissibilidade de recurso, propondo-se o recorrente a melhor definir o conteúdo do recurso na peça própria, as conclusões.

TERMOS EM QUE requer seja admitido o presente recurso ordenada a notificação do recorrente para alegar.»

3. Através da Decisão Sumária n.º 472/2020 foi decidido não conhecer o objeto daquele recurso, com base na seguinte fundamentação:

«4. Compulsados os autos, conclui-se que – além de ser duvidoso que o presente recurso apresente caráter autenticamente normativo (pois ele mostra-se primacialmente dirigido à própria atividade subsuntiva desenvolvida pelo tribunal recorrido em face das idiossincrasias do caso, que o conduziu a não substituir a pena de prisão aplicada ao arguido por uma pena de substituição) – não se encontra preenchido o pressuposto de que tenha sido suscitada prévia e adequadamente perante o tribunal recorrido qualquer questão de constitucionalidade de que este ficasse obrigado a conhecer. De facto, a peça processual invocada pelo recorrente e parcialmente transcrita no seu requerimento de recurso (cf. supra, ponto 2) não satisfaz de modo algum os requisitos exigidos pelo referido pressuposto.

De facto, nessa peça processual (fls. 446 a 461 dos autos) – a peça processual onde deveria ter sido suscitada adequadamente uma questão de constitucionalidade de que o tribunal recorrido ficasse obrigado a conhecer (vd. o artigo 72.º, n.º 2, da LTC) – encontra-se apenas uma vaga e genérica referência à inconstitucionalidade de «[q]ualquer interpretação divergente da sufragada». Ora, o pressuposto da suscitação prévia e adequada não pode considerar-se satisfeito perante tão vagas e ambíguas formulações, mas antes exige que o recorrente formule os enunciados normativos que considera inconstitucionais de modo expresso e claro, especificando assim pela positiva o objeto da sua questão de constitucionalidade perante o tribunal recorrido. Não surpreende, por isso, que o Tribunal da Relação do Porto, na decisão recorrida, se não tenha considerado adstrito a debruçar-se sobre qualquer questão de constitucionalidade. De facto, a decisão recorrida (cf. fls. 470 a 473 dos autos) desenvolve-se exclusivamente num plano de direito ordinário, circunstância a que não será igualmente alheia a razão, acima assinalada, de a pretensão do recorrente constituir uma pura e simples discordância relativamente à não substituição da pena de prisão de dois anos que viu ser-lhe aplicada.

Em suma, não se encontrando reunido o pressuposto de que tenha sido suscitada prévia e adequadamente perante o tribunal a quo uma questão de constitucionalidade de que este ficasse obrigado a conhecer, o recorrente carece – à luz do disposto no artigo 72.º, n.º 1, alínea b), e n.º 2, da LTC – de legitimidade para interpor o presente recurso. Este Tribunal não pode, portanto, conhecer o objeto desse recurso.»

4. Inconformado, o recorrente veio depois reclamar daquela Decisão Sumária para a conferência, o que fez nos seguintes termos:

«(...)

1 - Reclama o Recorrente da Decisão que rejeitou liminarmente o recurso, por ter entendido que não fora devidamente suscitada previamente a questão da inconstitucionalidade.

2 - Urge dizer que, em relação à afirmação "(...) além de ser duvidoso que o presente recurso apresente caráter autenticamente normativo (pois ele mostra-se primacialmente dirigido à própria atividade subsuntiva desenvolvida pelo tribunal recorrido em fase das idiossincrasias do caso, que o conduziu a não substituir a pena de prisão aplicada ao arguido por uma pena de substituição)", não se vislumbra uma única palavra no recurso interposto para este Tribunal acerca do acerto da decisão de manter a pena efetiva.

3 - Parece assim falsa tal afirmação, pois o que se invocou foi a inconstitucionalidade, em abstrato, de em qualquer processo crime, de qualquer natureza, com qualquer arguido, nunca ser possível a Reforma de decisão nos...

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