Acórdão nº 2573/20.2T8PTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Maio de 2021

Data13 Maio 2021

Processo n.º 2573/20.2T8PTM.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Faro – Juízo Central de Competência Cível de Portimão – J2 * Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: * I – Relatório: Na presente providência cautelar não especificada, “(…) – Construções, Unipessoal, Lda.” e “(…) – Construções, Lda.” vieram requerer providência cautelar comum contra “(…), Lda.”.

* As Requerentes alegaram que, ao abrigo de contrato de empreitada celebrado com a Requerida, edificaram duas moradias em dois lotes de terreno, uma das quais concluída, mas que a Requerida, em violação do contrato, não pagou integralmente a obra realizada, ficando um crédito de € 125.024,34. Em função disso, arrogam-se o direito de retenção sobre a obra, nos termos do artigo 754.º do Código Civil.

Em adição, afirmaram que a Requerida lhes veda o acesso ao estaleiro, onde ficaram contentores, materiais de construção, ferramentas, maquinaria diversa.

* Por sentença decretada nestes autos, sem audiência da Requerida, foi decidido que não houvesse adjudicação da obra dos autos a terceiras pessoas, sem que antes fossem pagos os serviços efectuados pelas Requerentes; a proibição de entrada na obra de quaisquer empreiteiros ou subempreiteiros, que não as Requerentes; o reconhecimento sumário do direito de retenção, a favor das Requerentes, sobre a obra (ou estaleiro), até efectivo e integral pagamento às Requerentes, com a proibição de a Requerida ofender tal direito.

* Ouvida a Requerida, veio esta oferecer oposição, negando ser devedora de qualquer quantia, invocando a existência de defeitos na obra e dizendo que o contrato de empreitada dos autos foi celebrado, exclusivamente, com a Requerente (…). Mais adianta que as Requerentes não têm posse sobre os imóveis objecto da empreitada e não beneficiam assim do direito de retenção.

* Realizada a produção de prova da oposição apresentada por “(…), Lda.” foi decidido revogar a providência cautelar anteriormente decretada no âmbito destes autos.

* Inconformadas com tal decisão, as recorrentes apresentaram recurso de apelação e formularam as seguintes conclusões: «I. Entendem as recorrentes que os pontos dados como provados na douta sentença, a saber pontos 1 e 2, e dados como não provados – alíneas a) e b), devem ser reapreciados, pois, II. Com o devido respeito, o tribunal a quo valorou, de forma errónea a prova produzida, descurando o depoimento das testemunhas das requerentes e declarações do representante legal das mesmas.

  1. Das declarações de parte e de ambas as testemunhas, a primeira que prestou serviços de supervisão de obra e a segunda, na qualidade de funcionário das requerentes (encarregado de obra desde 1994) consegue-se extrair precisamente o que efetivamente as requerentes, na pessoa do seu representante legal e funcionários têm se dirigido ao local, tendo-se deparado com a mudança de cadeados e colocação de uma rede.

  2. As requerentes não se retiraram das obras, tendo-se deparado com os cadeados, pelo que foi o motivo que levou ambas as requerentes a exigir judicialmente contra a requerida.

  3. Face ao não pagamento das facturas e dos trabalhos realizados em ambas as obras, as requerentes viram-se obrigadas a suspender a execução dos trabalhos, o que se verifica por toda a prova testemunhal provida pelas requerentes.

  4. Toda a prova testemunhal produzida adveniente das requerentes reportou o material existente e alvo da presente providência, como dois contentores, sendo um deles escritório, betoneiras, réguas, cimento, areia, entre outros.

  5. As requerentes não se retiraram do estaleiro em finais de 2019, a saída das obras não foi voluntária, não correspondendo à verdade o vertido na motivação da decisão de facto.

  6. Em momento algum, as requerentes descuraram a sua responsabilidade que lhe incumbiam no âmbito dos contratos de empreitada, inexistindo qualquer inércia quanto aos materiais existentes no local.

  7. Deverá dar-se como não provados os pontos 9 e 10.

  8. Não atendeu o Meritíssimo Juiz a quo quanto aos factos dados como não provados – alíneas a) e b), aos meios de prova apresentados e admissíveis necessários e pertinentes para a boa decisão da causa.

  9. Entendem as Recorrentes, ao contrário da convicção do Tribunal a quo, ter ficado provado, não só por prova testemunhal, como por prova documental, que ambas as empresas tiveram intervenção na execução dos contratos de empreitada.

  10. A testemunha (…) interveio em ambas as obras, supervisionando, realizando os autos de medição, prestando serviços para a requerida, tanto que até teve que rescindir o seu contrato com a requerida por falta de pagamentos e exigir judicialmente tais créditos.

  11. A referida testemunha tinha conhecimento pleno que ambas as requerentes tinham intervenção nas obras e tais factos são plausíveis no seu discurso, que foi assertivo e conciso.

  12. Deve-se dar como provado que a requerente “(…), Construções, Lda.” interveio nas empreitadas em apreço, em consórcio informal com a requerente (…).

  13. Percorrendo novamente as declarações da testemunha (…) extrai-se que a requerida sabia efetivamente da existência da requerente “(…), Lda.”.

  14. A referida testemunha era a “ponte” / elo de ligação, entre o dono da obra e a requerentes.

  15. A requerida sabia e tinha conhecimento da existência da empresa “(…), Construções, Lda.” e da sua intervenção nas empreitadas, devendo assim o tribunal ad quem decidir dar com provado a alínea a) e que a requerida conhecia de todo a existência da empresa “(…), Lda.”.

  16. Perante o ante exposto, as alíneas c) e d) dado como não provados, encontram-se devidamente valorados pelo tribunal a quo.

  17. O tribunal a quo deveria ter mantido a sua decisão de decretar a providência cautelar, tendo descurado por completo a prova produzida por parte das requerentes.

  18. Encontram-se preenchidos todos os requisitos para a manutenção do presente procedimento cautelar.

  19. Resulta evidente a existência de fumus boni iuris, em que é lícito ao empreiteiro reter a obra até pagamento do preço devido pelo dono da obra.

  20. Não existem dúvidas quanto à existência do crédito vencido e não pago, facturas estas que não foram devolvidas nem recusadas pela requerida.

  21. Por outro lado, a manutenção da providência cautelar assegura a segurança do estaleiro e o direito de propriedade e o bom estado dos bens e equipamentos.

  22. Não existem dúvidas quanto ao direito de retenção peticionado, pois as requerentes em momento algum abriram mão do estaleiro e material. A requerida é que decidiu arbitrariamente colocar cadeado nas obras e vedar acesso às mesmas.

  23. As requerentes de momento têm a receber o montante de € 125.024,34 (cento e vinte e cinco mil e vinte e quatro euros e trinta e quatro cêntimos), acrescido de juros de mora vincendos, calculados à taxa legal e até efectivo e integral pagamento, sendo que a demora do processo, isto é, a demora do decorrer da acção principal, prejudicaria de forma drástica as requerentes, atento ao valor em causa, bem como todo o material e estaleiro que se encontram na obra, pertença das requerentes.

  24. A decisão recorrida não permite acautelar o direito das requerentes, tanto que se reitere que da obra já desapareceu material e equipamento, bem como o detrimento do material com o decorrer da ação principal, bem como o perigo de dissipação de património.

  25. Pelo que está preenchido o requisito do periculum in mora.

  26. Conclui-se que com a matéria factual levada a audiência de julgamento, a recorrida não provou que as requerentes se retiraram do lote em 2019 e que abriram mão de ambas as obras.

  27. Pelo que, deve o Venerando Tribunal da Relação de Évora revogar a decisão proferida em 1.ª Instância, mantendo a providência cautelar.

Face ao exposto, deverá a sentença do tribunal a quo ser anulada e, consequentemente, substituída por outra em que:

  1. Mantenha a primeira decisão, isto é revogar a sentença que revogou a providência cautelar anteriormente decretada e julgar procedente, por provado, o procedimento cautelar comum; b) Ordene prosseguir aos presentes autos os seus ulteriores termos até final fazendo-se assim a costumada Justiça!».

    * A parte contrária não apresentou contra-alegações. * II – Objecto do recurso: É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do Tribunal ad quem (artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do mesmo diploma).

    Analisadas as alegações de recurso, o thema decidendum está circunscrito à apreciação da existência de: a) erro na apreciação da matéria de facto.

  2. erro na aplicação do direito.

    * III – Factos com interesse para a decisão da causa: 3.1 – Dos factos apurados na fase preliminar: 3.1.1 – A requerida é a legítima proprietária de dois lotes de terreno, designados por lotes 3 e 4, localizados em (…), Praia da (…), Lagos.

    3.1.2 – As requerentes são duas sociedades comerciais que pertencem ao mesmo grupo empresarial e são ambas geridas pelo seu sócio (…).

    3.1.3 – A requerente “(…) – Construções Unipessoal, Lda.”, na data de 9 de novembro de 2017, celebrou, com a requerida, contrato de empreitada inerente à construção de duas moradias unifamiliares (uma em cada lote).

    3.1.4 – Quanto ao lote 3, as partes estipularam o preço de empreitada a quantia total de € 476.076,00 (quatrocentos e setenta e seis mil e setenta e seis euros) acrescido do respectivo IVA, à taxa legal em vigor, e quanto ao lote 4, as partes convencionaram a quantia total de € 520.868,00 (quinhentos e vinte mil e oitocentos e sessenta e oito euros), acrescido de IVA calculado à taxa legal em vigor.

    3.1.5 – As requerentes obrigaram-se a executar a globalidade dos trabalhos no prazo máximo de 15 (quinze) meses, conforme o teor da Cláusula 5.ª do contrato.

    3.1.6 – Conforme acordado na Cláusula 4.ª desse contrato, “O preço a pagar seria após a entrega da...

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