Acórdão nº 326/18.7T9VRL.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelTERESA COIMBRA
Data da Resolução10 de Maio de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da secção penal do tribunal da Relação de Guimarães.

I.

No processo comum com intervenção de tribunal singular que, com o nº 326/18.7T9VRL, corre termos pelo juízo local criminal de Vila Real foi decidido condenar o arguido N. M. como autor material de um crime de ofensa à integridade física por negligência, p.p. artigo 148º, nºs 1 e 3 do Código Penal na pena de 150 dias de multa, à taxa diária de 12€ e, bem assim, nas custas do processo.

*Inconformado com a condenação, recorreu o arguido para este tribunal da Relação concluindo o recurso do seguinte modo ( transcrição):

  1. O anterior acórdão proferido sobre o primeiro recurso interposto decretou anular a sentença proferida e determinar que outra fosse elaborada e que esta contivesse o exame crítico de todas as provas produzidas e contemple as questões enunciadas no corpo do acórdão.

  2. Sucede porém que a nova sentença proferida e da qual ora também se recorre não incluiu um exame critico de todas as provas produzidas, muito menos contempla questões de como determinou a velocidade do ofendido, nem tão pouco a que velocidade este se deparou com a via impedida.

  3. O inconformismo do Arguido com a sentença recorrida baseia-se, na contradição insanável entre a fundamentação e a decisão da matéria de facto bem como erro notório na apreciação da prova, senão vejamos: d) O Tribunal deu como provado que os fatos descritos sob os art.ºs 1º a 6º, nomeadamente que o ofendido F. V. conduzia um motociclo a velocidade não concretamente apurada, mas pelo menos a 50km/h; que o arguido o havia visualizado a cerca de 300metros sem capacete e atravessou-lhe o automóvel que conduzia; que o ofendido F. V. a uma distância que em concreto não é possível apurar, mas pelo menos a 20/30 metros de distância visualizou o veiculo atravessado na via; e por esse motivo não se conseguiu desviar e foi embater com a frente do motociclo na frente esquerda do veículo automóvel, caindo no chão e foi de rastos até embater na parte inferior frontal do automóvel.

  4. Formando a sua convicção no depoimento do ofendido, nas fotografias de fls 8 a 10 e ainda as declarações do arguido e da testemunha J. D..

  5. Salvo o devido respeito, o Tribunal a quo julgou incorretamente os referidos factos, porquanto em relação aos mesmos não foi produzida prova.

  6. Com efeito do depoimento do ofendido prestado em 02/12/2019, em instâncias do D. Procurador disse “Tem ideia a que velocidade é que vinha? A uns 50.”, Questionado pela defensora oficiosa do arguido referiu “Mas a que velocidade é que vinha para conseguir travar e não parar? A uns 20km/h.”, e aquando da reinquirição em 13/10/2020 já altera o seu depoimento para frisar “Não sei dizer precisamente mas por volta de 50km/h.” até porque e embora no primeiro inquirição disse-se que se dirigia para Sabrosa, agora até já refere “ que ia parar no café….que fica quase ao lado do sítio onde foi o acidente, fica praí uns metros depois.” h) Teve o Tribunal a quo para prova do ponto 3º também o depoimento da testemunha M. D., presente no local e momento do acidente que referiu quando questionado pela defensora do arguido: “O Sr. F. V. viria a cerca de 50kms por hora? Tinha de vir a mais, eu penso que vinha a mais, não me é possível dizer a que velocidade é que vinha mas certamente a mais. Mas se ele viesse a 50kms ele conseguiria passar na estrada disponível? Sim passava. Ainda mais tratando-se de uma moto de monte passava de certeza absoluta. Era impossível que ele viesse a 50kms/h? Vinha a mais de certeza.” Apesar da testemunha ser clara e concisa a dizer expressar que seria impossível o ofendido vir a 50km/h, o Tribunal a quo deu tal como provado.

  7. Além de que, apesar de o Tribunal a quo não ter tido em consideração o depoimento efectuado de forma espontânea, da testemunha S. F., que igualmente disse “Eu viro também em direcção ao largo ..., e ele ía na minha rente, mas assim que viro em segundos deixei de o ver, deixei de o ver porque ele ía em velocidade…, tomou a direcção que tomou e acelerou, em principio ele ia com bastante velocidade. Diga-me, está aqui em causa de se ele no mínimo dos mínimos iria a 50km/h? Não, não isso era impossível, até porque eu quase de certeza iria a 40.” j) A prova produzida em relação ao ponto 3 impunha decisão diversa da obtida pelo Tribunal a quo, como dito, do depoimento do próprio ofendido que altera os factos, conjugado com os depoimentos das testemunhas M. D. e S. F., ficou claramente demonstrado que o ofendido conduzia a velocidade não concretamente apurada, mas superior a 50km/h.

  8. Também em relação ao ponto 4º dos factos dados como provados, ficou demonstrado que o arguido ao atravessar o veiculo automóvel que conduzia não ocupou as duas faixas de rodagem da estrada.

  9. Em diversos pontos da douta sentença, nomeadamente neste, surge contradição entre a descrição dos factos, bem como contradição entre os factos dados como provados e a sua fundamentação e decisão pois nuns pontos refere que o arguido ao atravessar o carro ocupou as duas faixas da estrada (art.º 4º e 6º) noutros diz que ocupou apenas parte da faixa oposta (art.º 14º e alínea a), linha 17 da motivação de facto) o que depois justifica com documentos e depoimentos, que em boa verdade apenas comprovam que ocupou parte da faixa contrária.

  10. Do depoimento do ofendido, resulta, como o mesmo disse “o carro invadiu a minha faixa de rodagem e eu fiquei sem espaço para passar, tinha uma valeta, um muro não ia contra a valeta.” (cfr. respectivo depoimento supra transcrito), não poderemos concluir das suas palavras que o carro tenha ocupado as duas faixas de rodagem ainda corroborado pelo depoimento da testemunha J. D., concluímos que o espaço deixado livre dava para passar “Sim passava. Ainda mais tratando-se de uma moto de monte passava de certeza absoluta” (cfr. respectivo depoimento supra transcrito), e com a demais prova, resulta que o arguido ocupou apenas parte da faixa oposta, conforme, e bem, foi dado como provado no art.º 14º e alínea a), linha 22 e 23 da motivação de facto dos factos provados.

  11. E voltando ao depoimento da testemunha S. F., que o Tribunal a quo não teve em consideração, este foi peremptório em dizer “e eu ultrapasso o carro da guarda pela outra via, paro e dou auxilio aos meus colegas… porque se ele fosse devagar ele conseguiria passar ou por trás do carro da guarda ou até entre o carro da guarda e o passeio.”, assim e em relação ao ponto 4 esteve errado o Tribunal a quo ao considerar provado que o arguido atravessou o veiculo ocupando as duas faixas de rodagem.

  12. Prova diversa também foi feita em relação ao ponto 5º dos factos provados, pois que o ofendido quando inquirido pela defensora oficiosa do arguido na primeira audiência sobre a que distancia estava do carro da GNR quando o viu disse “A cem metros. Só a cem metros? Quando dei conta do carro. E a que distância é que ele se atravessou e se enviusou segundo o Sr. disse à sua frente? 20, 30 metros.” Alternando por completa na reinquirição a instância do seu Mandatário, e apesar de não dever ter sido dada qualquer credibilidade a tal depoimento, foi apenas com base nele que o Tribunal a quo, erradamente considerou provado o ponto 5º.

  13. Até porque do depoimento da testemunha M. D. ficou provado que viram o ofendido “Ao fundo da recta devem ser, sei lá, uns 200, 300 metros, não sei dizer com certeza, no fundo da recta, nos estava a meio da recta.”, se dentro do carro o viram a 200, 300metros, como é que o ofendido em cima da moto só os viu a 20/30metros? Além de que, passando a redundância, a testemunha S. F. que vinha atrás do ofendido, refere que “quando eu entro na recta vejo um carro da guarda a uma distância considerável, com os pirilampos ligados”, Logo, estamos novamente perante uma contradição entre a decisão e a fundamentação.

  14. O Tribunal a quo deu também como provado, no ponto 6, que por “esse motivo que o ofendido não se conseguiu desviar e foi embater com a frente do motociclo na frente esquerda do veiculo automóvel” ora o ofendido no depoimento explicitamente diz viu o carro “A cem metros (…) e que “Eu travei, a moto foi de arrasto um bocado” confirmando que travou, caiu e foi de arrasto bater no carro da GNR “Eles meteram-se a minha frente e eu travei” portanto, o ofendido cai porque travou, conforme também foi explicado pela testemunha J. D. que confirmou que o ofendido tinha de vir a mais de 50km/h “Tinha de vir a mais, eu penso que vinha a mais, não me é possível dizer a que velocidade é que vinha mas certamente a mais” pois se viesse a essa velocidade “Sim passava. Ainda mais tratando-se de uma moto de monte passava de certeza absoluta (…) “vinha a mais de certeza”, acrescentando “Ele caiu antes, a uns 4, 5 metros, não sei bem, como digo é tudo muito rápido, e depois veio de rojo bater no carro da guarda” (cfr. respectivo depoimento supra transcrito).

  15. E errado este o tribunal a quo, ao considerar que o acidente se deveu exclusivamente à conduta do arguido (ponto 9), pois que como visto prova diversa foi feita em relação também a este ponto, conforme demonstrados no pontos anteriores.

  16. Para contraprova em sede de reabertura de julgamento, pelo arguido foi junto aos autos sentença proferida em acção cível intentada pelo Fundo de Garantia Automóvel contra F. V. (neste autos ofendido), proc. n.º 750/19.8T8VRL que correu termos no Juízo Cível de Vila Real, que concluiu pela condenação do aqui ofendido F. V. pois que o acidente se deveu ao facto de este não ter acatado uma ordem de paragem. Bem como foi junto Decisão Final proferido em sede de processo de averiguações desencadeado pelo Serviço de Justiça da Guarda Nacional Republicana Prova que determinaram que o arguido, no exercício das suas funções agiu correctamente. Prova documental, fundamental que o Tribunal a quo, erradamente não teve em consideração para prova dos factos, levando a errada decisão.

  17. Assim, pela prova produzida, testemunhos prestados e...

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