Acórdão nº 364/21.2T8STB-C.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 29 de Abril de 2021
Magistrado Responsável | TOM |
Data da Resolução | 29 de Abril de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Processo n.º 364/21.2T8STB-C.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal – Juízo de Comércio de Setúbal – J1 * Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório: Por decisão datada de 02/03/2021, na sequência do pedido de insolvência formulado por “(…), SA” em que é requerida “(…) Medic, SA”, o Tribunal «a quo» declarou a insolvência da mesma.
* Na petição apresentada a “(…), SA” requereu a declaração de insolvência de “(…) Medic, SA”, alegando que, para o efeito, detém um crédito sobre a Requerida no montante de € 61.445,71, a título de capital e juros, proveniente de vendas que fez à Requerida.
No artigo 11º da petição inicial, a requerente afirmou que, ao valor referido, acrescem outros credores, sendo que a Requerente tem conhecimento de vários outros créditos: i) “Leite de (…), SA” titular de um crédito no montante de € 7.405,94.
ii) “Obras (…) – Construções e Remodelações, Lda.” titular de um crédito no montante de € 1.760,74.
iii) “Douro (…), Lda.” titular de um crédito no montante de € 2.227,20.
iv) “(…) – Produtos Químicos e (…), SA” titular de um crédito no montante de € 17.558,21.
v) “(…) – Produtos de Saúde, Lda.” titular de um crédito no montante de € 22.517,41.
vi) “(…) e (…), Lda.” titular de um crédito no montante de € 114.358,11.
E conclui que a requerida se encontra em situação de insolvência nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 20.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
* A dívida reclamada funda-se em título executivo (Injunção n.º 96057/20.1YIPRT), onde a reclamante exigiu o pagamento da quantia de € 61.405,71.
Devidamente notificada para os seus termos, a devedora não pagou nem deduziu oposição e, consequentemente, foi aposta a fórmula executória na referida injunção.
* Regularmente citada para os termos da insolvência, a requerida deduziu oposição. * Em 11/02/2021, o Meritíssimo Juiz de Comércio de Setúbal lavrou o seguinte despacho: «Conforme consta da carta de citação e dispõe o artigo 30.º, n.º 2, do CIRE, com a oposição, o devedor junta, sob pena de não recebimento, a lista dos seus cinco maiores credores, com exclusão do requerente, com indicação do seu domicílio.
A Requerida deduziu oposição, mas não juntou essa lista.
Assim, notifique-a para, em 5 dias, dar cumprimento ao disposto no artigo 30.º, n.º 2, do CIRE, sob pena de não recebimento da oposição».
* Devidamente notificada, a sociedade requerida nada disse nem apresentou a lista dos cinco maiores credores.
* Em função disso, por decisão proferida em 03/02/2021, o Tribunal recorrido lavrou a seguinte decisão: «Uma vez que a requerida não juntou aos autos a lista dos seus cinco maiores credores, com exclusão da requerente, mesmos depois de notificada para o efeito, não recebo a oposição apresentada nos autos, o que equivale à sua não dedução – artigo 30.º, n.º 2, do CIRE».
* E, nessa sequência após avaliar os pressupostos legais de uma situação de insolvência, a decisão recorrida concluiu que «decorre da factualidade apurada, tendo em conta o valor do passivo já determinado, não só quanto à Requerente, mas igualmente em relação a outros credores, alguns deles já com cobrança coerciva em processo executivo e não sendo conhecidos bens à Requerida, que esta se encontra impossibilitada de cumprir as obrigações vencidas (cfr. artigo 20.º, n.º 1, alíneas a) e b), do CIRE)».
Em função deste raciocínio, a decisão recorrida declarou a insolvência de “(…) Medic, SA”.
* A sociedade recorrente não se conformou com a referida decisão e o articulado de recurso continha as seguintes conclusões: «1. Veio o douto Tribunal a quo promover sentença de insolvência da recorrente, o que o fez, não com base numa decisão de mérito, mas outrossim, com base num fundamento unicamente processual inválido, ilegal e até mesmo inconstitucional.
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“Uma vez que a requerida não juntou aos autos a lista dos seus cinco maiores credores, com exclusão da requerente, mesmos depois de notificada para o efeito, não recebo a oposição apresentada nos autos, o que equivale à sua não dedução – artigo 30.º, n.º 2, do CIRE”.
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Citada que foi da petição inicial de insolvência, a requerida aqui recorrente, de forma oportuna e tempestiva apresentou a oposição à mesma, através de articulado juridicamente admissível e apto a proteger e a requerer a tutela do direito de que se arrogava e ainda arroga titular, i e, da inexistente situação de insolvência da mesma, aguardando assim uma decisão de mérito sobre Oposição à Insolvência.
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Na verdade, com base em quatro fundamentos mal andou a sentença ora em crise.
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No primeiro dos fundamentos, estamos perante um convite ao aperfeiçoamento estendido pelo Tribunal a quo à recorrente, a qual não respondeu ao mesmo e não estava sequer obrigado a fazê-lo, sem que daí pudesse ser retirada a ilacção de desconsiderar a Oposição stricto sensu.
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A própria noção do convite ao aperfeiçoamento determina que a anomalia – indicação dos cinco maiores credores – não colocava em causa o conhecimento da questão jurídica – existência ou não de uma situação de insolvência, cfr. Ac. TR de Coimbra, Proc. n.º 203848/14.2YIPRT.C1.
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Neste mesmo sentido segue o entendimento de Alberto dos Reis in “Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, 3ª ed. – Reimpressão, 1982, pág. 309, naquela sua obra (pág. 372), sobre a distinção entre petição inepta ou deficiente.
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É assim este o entendimento por nós sufragado, i e, que a Oposição à Insolvência, contém os factos essenciais que nos permitem individualizar a pretensão material deduzida pela ora recorrente, sendo que qualquer insuficiência ou dúvida que pudesse suscitar-se, sempre seria objecto de outra decisão, que não a declaração, imediata, de considerar como não apresentada a Oposição à insolvência.
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Reitera-se na matéria de facto alegada, não no suprimento de uma deficiência meramente instrumental/processual de indicação de cinco maiores credores, que aliás em nada prejudicaria a decisão de mérito do Tribunal a quo, uma vez que que neste tipo de acções não há sequer lugar à citação dos credores da Requerida aqui recorrente nesta fase inicial do processo, como bem resulta do artigo 29.º do CIRE, cfr. Ac. TR de Guimarães, Proc. n.º 3714/17.2T8VNF-A.G1.
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Reitera-se: se a parte não corresponder ao convite ao aperfeiçoamento, a acção deverá prosseguir, correndo por parte da requerida, aqui recorrente, o risco de que a decisão de mérito lhe seja desfavorável, i e, a decisão de mérito! 11. E dúvidas existissem: “Acresce que, não obstante a menção feita no primitivo despacho de aperfeiçoamento ao regime do artigo 27.º, n.º 1, alínea b), do CIRE, a verdade é que não se encontrava o juiz vinculado pela cominação assinalada naquele preceito legal (10) (e que não foi expressamente exarada no despacho), além de que, como já vimos, a sua imediata aplicação comportaria uma decisão ilegal, pois que a não correção duma petição deficiente não determina o não prosseguimento da causa (11).” 12. Mais acresce que inexistia fundamento para a recorrente indicar os cinco maiores credores, isto porquanto, embora conste do artigo 23.º, nºs 1 e 2, alínea b), do CIRE (aprovado pelo D.L. n.º 53/2004, de 18/03, na redacção do D.L. n.º 200/2004, de 18/08), que “… o pedido de declaração de insolvência é feito por meio de petição escrita, na qual são expostos os factos que integram os pressupostos de declaração requerida e se conclui pela formulação do corresponde pedido”, devendo o requerente, além do mais, “identificar os administradores do devedor e os seus cinco maiores credores, com exclusão do próprio requerente”, dispõe o n.º 3 que o requerente deverá solicitar tal pedido de informação.
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O que não acontece volvida e analisada a petição inicial do requerente.
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Assim e na verdade, em bom rigor, se peça processual existia que por não indicação dos cinco maiores credores, cfr. determina a Lei, deveria ser desentranhada, sempre seria a petição inicial e por não ter reconhecido essa necessidade – que não reconheceu porquanto não a concebeu conforme infra melhor se indicará – não veio lançar mão do disposto no artigo 23.º CIRE, número 3.
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Por outro lado, mais acresce ainda que a requerente aqui recorrida não lançou mão do disposto no artigo 23.º/3, CIRE, porquanto a mesma identificou desde logo os cinco maiores credores, bastando para tanto analisar o artigo 11º da petição inicial.
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Logo, inexistia fundamento para que viesse o Tribunal a quo ordenar a identificação dos cinco maiores credores, sob pena de indeferimento de toda a Oposição, quando aliás tal entendimento é por demais inconstitucional.
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“Aplicando este dispositivo, o acórdão recorrido entendeu que deve ser desentranhada a oposição que não se mostra acompanhada de informação sobre a identidade dos cinco maiores credores do requerido, uma vez que não tendo essa informação sido prestada no momento fixado na lei, tal falta já não é susceptível de ser suprida. Ora, não respeitando a falta assim sancionada aos elementos essenciais componentes da defesa apresentada, mas sim a dados úteis a uma eventual ulterior fase processual que o legislador, por razões de simplicidade e celeridade, entendeu deverem ser prestados conjuntamente com a oposição ao pedido de declaração de insolvência, a aplicação fulminante de tal cominação revela-se flagrantemente desproporcionada à falta cometida” In Ac. Tribunal Constitucional, Processo n.º 50/08, 2ª Secção, Relator: Conselheiro João Cura Mariano (Conselheiro Benjamim Rodrigues).
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Estamos assim perante uma decisão proferida por este douto Tribunal que se apresenta como enformadora de um entendimento inconstitucional, conforme supra melhor exposto, devendo assim e na verdade, a Oposição ser liminarmente deferida e ulteriormente tramitada, impondo-se também por esta razão promover-se à revogação da decisão ora em crise e a sua substituição por outra que de facto e de Direito aplique a douta Justiça! 19. No requerimento inicial, a requerente não logrou provar, de todo...
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