Acórdão nº 291/20.0T8ENT-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 29 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelEM
Data da Resolução29 de Abril de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. n.º 291/20.0T8ENT-A.E1 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[1]♣Acordam os Juízes da 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório No âmbito da execução instaurada pelo exequente “(…) Banco, SA” contra os executados (…) e (…), veio este último deduzir embargos de executado, solicitando, a final, o recebimento dos embargos, devendo os mesmos ser julgados procedentes e o embargante absolvido do pedido, com a consequente suspensão da execução.

Para o efeito, alegou, em síntese, que a letra dada à execução se venceu em 11-11-2009, tendo o exequente dado entrada do requerimento executivo em Janeiro de 2020, pelo que tal letra, enquanto título cambiário, já se encontrava prescrita.

Mais alegou que, apesar de ter aceite tal letra, é alheio à relação que o exequente teve com o co-executado (…), facto, aliás, assumido pelo próprio exequente, ao afirmar que tal letra entrou na sua esfera jurídica em virtude de uma operação de desconto bancário, celebrada entre o referido (…) e o exequente, tendo este creditado na conta daquele a quantia de € 14.500,00, valor este que corresponde ao valor nominal da letra.

Mais alegou que do documento de proposta de desconto, junto ao requerimento executivo, resulta que o embargante não apôs em tal documento a sua assinatura, não tendo tido, assim, qualquer intervenção nesse contrato.

Por fim, alegou que, encontrando-se a letra prescrita, apenas poderá servir de título executivo enquanto quirógrafo, desde que sejam alegados factos constitutivos da relação subjacente, não tendo, porém, o exequente alegado tais factos, tal letra não poderá valer como título executivo, sendo que, de qualquer modo, entre o exequente e o embargante nunca existiu qualquer relação substantiva, pelo que as relações existentes entre ambos sempre estariam fora do âmbito das relações imediatas.

…A exequente “(…) Banco, SA” veio apresentar a sua contestação, solicitando, a final, que os embargos sejam julgados improcedentes, condenando-se o embargante no pagamento da quantia exequenda, tal como peticionado na ação executiva.

Para o efeito alegou, em síntese, que, apesar de prescrita a letra apresentada, vale a mesma como título executivo, nos termos do artigo 703.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil, desde que os factos da relação subjacente constem do próprio documento ou, não constando, desde que o exequente os alegue no requerimento executivo, tendo, no presente caso, a exequente cumprido tal ónus de alegação no requerimento executivo que apresentou.

Mais alegou que na letra dada à execução constam os próprios factos constitutivos da relação subjacente, visto que a letra lhe foi transmitida por endosso, nos termos do artigo 11.º da LULL, sendo, por isso, de aplicar à presente situação o disposto no artigo 14.º do mesmo diploma legal, tendo o embargante se responsabilizado pessoalmente pelo pagamento da letra na data do respetivo vencimento quando após a sua assinatura no lugar do aceite (artigo 28.º da LULL), não podendo invocar os meios de defesa que detinha contra o sacador (…), pelo que, não tendo sido paga a letra na data do seu vencimento, o embargante entrou em incumprimento para com o exequente, podendo ser responsabilizado nos termos dos artigos 798.º e seguintes do Código Civil.

Invocou ainda o disposto no artigo 47.º da LULL para reforço da sua posição.

Por fim, alegou que o embargante é devedor nos precisos termos peticionados, sendo a obrigação certa, líquida e exigível.

…Realizada a audiência prévia, não foi possível resolver por acordo o litígio, tendo, em 11-12-2020, sido proferido saneador-sentença, com a seguinte decisão: Pelo exposto, e decidindo: Julgam-se os embargos de executado totalmente improcedentes, deles, consequentemente, absolvendo o exequente.

***Custas pelo executado/embargante.

…Inconformado com a sentença proferida, veio o embargante (…) recorrer, apresentando as seguintes conclusões: A.

O Tribunal “a quo” decidiu erradamente, em termos de Direito e, consequentemente, de facto, ao julgar os embargos improcedentes, entendendo que:  A letra apesar de prescrita pode ser usada como título executivo na qualidade de documento particular contra o aceitante,  O exequente alega como relação subjacente uma operação de desconto bancário, com descrição cabal dos seus termos,  O embargante, ainda que não tenha tido intervenção na relação causal, não pode vir opor ao exequente questões relativas à relação subjacente, que apenas podem ser invocadas pelo subscritor da letra;  O embargante, pese embora tenha alegado que desconhecia se a livrança foi paga e que não faltou a qualquer obrigação perante o Banco, aqui recorrido, não cumpriu o ónus de alegar os factos impeditivos que invoca.

B.

Em termos de Direito, o Tribunal “a quo” apreciou erradamente as normas que aplicou, mais concretamente os artigos 10.º, n.º 5, 46.º, n.º 1, alínea c), 703.º, n.º 1, alínea c), do C.P.C. e 17.º e 70.º da LULL, C.

O que, consequentemente, leva a que jamais pudesse ser dado como provado o ponto 1.3.3.1 da fundamentação de facto, devendo ter-se considerado que a letra não podia ser tida como título executivo relativamente ao recorrente.

D.

Pese embora a letra de câmbio, ainda que prescrita, possa ser considerada como título executivo enquanto documento particular, por encerrar um reconhecimento de uma obrigação pecuniária, já que nela é dada uma ordem de pagamento de um sacador a um terceiro, E.

Apenas subsiste e pode vincular o credor e quem se obrigou na letra como sacador, e não o aceitante.

F.

Estando a letra prescrita não pode o exequente invocar contra o aceitante uma relação cartular que desapareceu em virtude dessa prescrição, G.

Já que nunca existiu entre eles qualquer relação subjacente, H.

E, tanto assim é, que o recorrido, no seu requerimento executivo não a alega, limitando-se a alegá-la relativamente ao sacador, de onde resulta que no ponto 1.3.3.6 da fundamentação de facto, apenas essa se considera provada; I.

Portanto, o contrato de desconto bancário alegado como relação subjacente à emissão do título, no qual o aceitante não teve intervenção e ao qual não se vinculou, não pode ser qualificado como tal relativamente a este, J.

Uma vez que tal operação de desconto apenas envolve uma cedência de crédito cambiário que se encontra extinto; K.

Sem prescindir sempre se dirá que a letra dada à execução não pode ser utilizada como título quirógrafo contra o aceitante, uma vez que o exequente não alegou qualquer acordo no sentido de o mesmo ter assumido o pagamento da dívida fora da relação cambiária, L.

Sendo certo que o ónus de tal alegação lhe incumbia já que os factos constitutivos da relação subjacente não constam do documento dado à execução.

M.

Porque assim é, não resultou provado qualquer facto atinente à relação causal subjacente à subscrição da letra, no que toca à pessoa do aceitante, N.

Pelo que não se pode concluir que pelo facto deste concordar apor o seu aceite na letra, assuma a dívida para lá da responsabilidade que lhe adviria do regime da letra, O.

Uma vez que a assinatura da letra no lugar do aceite apenas vincula ao pagamento da obrigação cambiária nos termos e prazo de prescrição previstos para este tipo de obrigação; P.

Acresce que o Tribunal “a quo” não podia considerar que o embargante não cumpriu o ónus de alegar os factos impeditivos que invoca, Q.

Porquanto, para que pudesse cumprir esse ónus relativamente à inexistência dos factos constitutivos alegados pelo exequente, era necessário que este os tivesse alegado, no que toca à relação causal subjacente da letra, no que ao aceitante pudesse respeitar.

R.

Ora, dentro desta falta de alegação por parte do recorrido, o embargante alegou claramente, os factos que considerou impeditivos e tanto assim é que os embargos foram liminarmente admitidos; S.

Ainda que assim se não entendesse, sempre podia e devia o Tribunal “a quo” ter convidado o embargante a aperfeiçoar a petição de embargos.

T.

Portanto, o Tribunal “a quo” interpretou erradamente e, consequentemente, violou o disposto nos artigos 342.º, 362.º e 798.º do Código Civil, 2.º, 14.º, 17.º, 28.º, 47.º, 48.º, 49.º e 70.º da LULL e 10.º, n.º 5, 46.º, n.º 1, alínea c), 458.º, 527.º, 525.º (ex vi 732.º), 703.º e 732.º do Código de Processo Civil.

Nos termos expostos e nos mais de Direito aplicáveis deve: 1. Dar-se provimento ao presente...

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