Acórdão nº 169/20.8BEFUN de Tribunal Central Administrativo Sul, 29 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelMARIA CARDOSO
Data da Resolução29 de Abril de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a 1.ª Subsecção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I - RELATÓRIO 1. M... e M...

vieram interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal que julgou improcedente o recurso contencioso da decisão de fixação do rendimento coletável de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), referente ao exercício de 2017, por métodos indiretos.

  1. Os Recorrentes apresentaram as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: «Ora, no entender dos Recorrentes, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento sobre a matéria de facto e de direito na douta sentença recorrida, uma vez que: a) o Tribunal a quo não devia ter desconsiderado a declaração de substituição do ano de 2017 apresentada pelo Recorrente em 05/08/2020, com a opção de tributação em separado, para efeitos de exclusão da Recorrente mulher M... do procedimento de fixação da matéria coletável do ano de 2017, tendo em conta o seu estado civil de casada no regime de separação de bens; b) ficou provado que os Recorrentes estão casados, desde o dia 23/10/2010, com convenção antenupcial no regime da separação de bens (Facto assente 5); c) ficou comprovado que, face ao regime de bens do casamento do casal, não havia comunhão de contas bancárias dos Recorrentes; d) ficou demonstrado que a Recorrente mulher sempre manteve a sua autonomia patrimonial e sempre se manteve alheia aos assuntos profissionais do seu marido, designadamente nas sociedades “B..., Lda.” e “C... – Restauração, Lda.”; e) a declaração de IRS do ano de 2017, apresentada pelo contabilista dos Recorrentes, em 29/05/2018, com a opção de tributação em conjunto, foi apresentada por mero lapso; f) ficou comprovado que, ao detetarem essa situação, os Recorrentes de imediato submeteram a competente declaração de substituição de IRS do ano de 2017, no dia 05/08/2020, em separado (Facto Assente 20); g) se provou que essa declaração de substituição foi submetida tempestivamente, dentro do prazo de caducidade do IRS; h) a declaração de substituição de IRS, com a opção de tributação em separado, constituía a verdadeira intenção e opção dos Recorrentes no ano de 2017; i) os Recorrentes tinham o direito de optar pela tributação em separado dos seus rendimentos, naquele ano; j) a opção de tributação do IRS em separado no ano de 2017, nada tem que ver com o procedimento de fixação da matéria coletável de IRS com recurso a métodos indiretos, dado que, desde o início, esse procedimento apenas incidiu sobre o Recorrente marido, como aliás o próprio Tribunal a quo reconhece e admite; k) o Tribunal a quo errou ao não determinar a exclusão da Recorrente mulher deste procedimento de fixação da matéria coletável de IRS com recurso a métodos indiretos, referente ao ano de 2017, apenas porque a primeira declaração de rendimentos foi apresentada, por lapso, em conjunto, e não em separado, como viriam posteriormente a corrigir os Recorrentes, dentro do prazo de caducidade e antes da presente ação; l) o Tribunal a quo errou ao não ter considerado justificados os montantes registados contabilisticamente, a débito, na conta do sócio M..., referentes a pagamentos ao sócio, mencionados nos pontos 13) e 14) da matéria de facto dada como provada, como restituição de suprimentos realizados pelo Recorrente nas sociedades “B..., Lda.” e “C... – Restauração, Lda.”, ou como adiantamentos por conta de lucros, no valor de € € 260.880,63 e € 141.568,22, respetivamente; m) os valores constantes da contabilidade das sociedades B..., Lda. e C..., Lda., como pagamentos ao sócio, jamais poderiam ter sido desconsiderados pelo douto Tribunal a quo; n) através dos documentos n.ºs 16 e 17 da pi e dos depoimentos das testemunhas M..., contabilista certificada das duas empresas, e S..., diretor geral da B..., ficou comprovada a natureza e destino daquelas quantias; o) a Administração Fiscal nunca colocou em causa a contabilidade ou escrita de ambas as empresas do ano 2017; p) a Administração Fiscal nunca impugnou qualquer documento juntos aos autos e, em concreto, os documentos n.ºs 16 e 17 que evidenciam claramente os pagamentos realizados ao sócio; q) a Administração Fiscal nunca sequer se dignou a inspecionar a escrita de ambas as empresas, com vista a confirmar os dados registados contabilisticamente e respetivos documentos de suporte, ao abrigo do princípio do inquisitório e da oficiosidade; r) essas quantias deveriam ter sido consideradas justificadas, por se conhecer a origem e o destino das mesmas, seja como restituição de suprimentos feitos pelo sócio às duas sociedades ao longo dos anos, seja como adiantamentos por conta de lucros, ou a qualquer outro título, o que implicaria dar como provado o facto a) da matéria de facto dada como não provada; s) a não se considerarem justificados esses pagamentos ao sócio como restituição de suprimentos, então, pelo menos, deveria o Tribunal a quo ter considerado justificadas essas quantias como adiantamentos por conta de lucros, nos termos do artigo 5.º n.º 2 alínea h) do CIRS, que, por sua vez, estavam sujeitas a retenção na fonte à taxa legal de 28%; t) se demonstrou que, tanto assim foi que, entretanto, a Administração Fiscal viria a liquidar essas retenções na fonte em falta às sociedades B... Lda. e C... Lda.; u) tendo a Administração Fiscal considerado e tributado essas quantias como adiantamentos por conta de lucros, mediante a liquidação das respectivas retenções na fonte, jamais poderia o Tribunal a quo ter desconsiderado tais quantias, sob pena de dupla tributação (na esfera do Recorrente e na esfera das sociedades); v) o Tribunal a quo também errou ao ter desconsiderado as compras, despesas e encargos das sociedades “B..., Lda.” e “C... – Restauração, Lda.”, pagos através da conta pessoal do sócio, no valor de € 216.579,87 e € 212.228,57, respetivamente, para efeitos da determinação da matéria coletável por métodos indiretos (factos 16, 17 e 18 da matéria de facto dada como provada); w) essas saídas (despesas), por nunca terem sido feitas em proveito pessoal ou em benefício do Recorrente, deveriam ter sido deduzidas às entradas verificadas na conta bancária do Recorrente e não podiam ter sido desconsideradas quer pela Administração Fiscal quer pelo Tribunal a quo na determinação da matéria tributável por métodos indiretos, sob pena de violação do disposto na alínea f) do n.º 1 do art. 87.º da LGT, conjugado com a alínea a) do n.º 5 do artigo 89.º-A da LGT; x) o douto Tribunal a quo deveria ter considerado justificado o montante correspondente às saídas (despesas) da conta pessoal do sócio, feitas em nome e por conta das duas sociedades, no valor total de € 428.808,44 (€216.579,87 + € 212.228,57); y) ficou demonstrado que o Tribunal a quo errou no seu julgamento, mediante uma apreciação e valoração inapropriada e incorrecta dos factos e do direito aqui aplicáveis, valoração essa que deveria ter conduzido a uma decisão diversa da encontrada.

    Termos em que, dando-se provimento ao presente recurso e com o douto suprimento de V. Exas., deverá a douta sentença recorrida ser revogada com todas as consequências legais, assim se fazendo a tão acostumada JUSTIÇA!!!» 3. O recorrido devidamente notificado para o efeito, optou por não contra-alegar.

  2. Recebidos os autos neste Tribunal Central Administrativo Sul, e dada vista ao Exmo. Procurador-Geral Adjunto, emitiu parecer no sentido da improcedência do presente recurso.

  3. Com dispensa dos vistos, atento o carácter dos autos, vem o processo à Conferência para julgamento.

    II – QUESTÕES A DECIDIR: O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

    Assim, considerando o teor das conclusões apresentadas, importa apreciar e decidir se sentença recorrida padece de erro de julgamento da matéria de facto e de direito.

    Como questão prévia apreciar-se-á da admissibilidade legal da junção de documentos com as alegações de recurso.

    * III - FUNDAMENTAÇÃO 1. DE FACTO A sentença recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto: «1. A 02 de outubro de 1990, foi levada a registo, pela Ap. 02, a constituição da sociedade “B..., Lda.”, tendo por objeto o “comércio e indústria hoteleira e similar, mediante a exploração de residencial, bar e restaurante, compra e venda de propriedades e revenda das adquiridas para este fim, indústria de construção civil, obras públicas, construção e exploração imobiliária”, a que corresponde o CAE principal 55112-R3 – cfr. doc. n.º 3 junto com a petição inicial.

  4. Da certidão permanente da “B..., Lda.” constava como sócio e gerente, desde a respetiva constituição, o ora Recorrente, M... – cfr. doc. n.º 3 junto com a petição inicial.

  5. Em 01 de agosto de 2003, foi levada a registo, pela Ap. 19, a constituição da sociedade “C... – Restauração, Lda.”, tendo por objeto a “exploração de restaurantes, bares, snack - bares, gelatarias e pizzarias, venda de comida confecionada, serviço de take - away e catering, organização de eventos”, a que corresponde o CAE principal 56102-R3 – cfr. doc. n.º 3 junto com a petição inicial.

  6. Da certidão permanente da “C... – Restauração, Lda.” constava como sócio e gerente, desde 16 de abril de 2007, o ora Recorrente, M... – cfr. doc. n.º 3 junto com a petição inicial.

  7. No dia 23 de outubro de 2010, os Recorrentes M... e M... casaram com convenção antenupcial, lavrada por auto na Conservatória do Registo Civil do Funchal, em 07 de setembro de 2010, tendo sido estipulado o regime da separação de bens – cfr. assento de casamento n.º 623 do ano de 2010, junto como doc. n.º 10 da petição inicial.

  8. No ano de 2017, a “B..., Lda.” teve um volume de negócios de € 234.416,68 – cfr. doc. n.º 6 junto com a petição inicial, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

  9. Já a “C... –...

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