Acórdão nº 232/21 de Tribunal Constitucional (Port, 21 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Presidente
Data da Resolução21 de Abril de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 232/2021

Processo n.º 670/2020

Plenário

Aos vinte e um dias do mês de abril de dois mil e vinte e um, achando-se presentes o Conselheiro Presidente João Caupers e os Conselheiros José António Teles Pereira (intervindo por videoconferência), Joana Fernandes Costa, Maria José Rangel de Mesquita, Maria da Assunção Raimundo, Gonçalo de Almeida Ribeiro, Fernando Vaz Ventura, Pedro Machete, Mariana Rodrigues Canotilho, Maria de Fátima Mata‑Mouros, José João Abrantes e Lino Rodrigues Ribeiro (intervindo por videoconferência), foram trazidos à conferência os presentes autos.

Após debate e votação, e apurada a decisão do Tribunal, foi pelo Exmo. Conselheiro Presidente ditado o seguinte:

I – Relatório

1. Por decisão de 22 de julho de 2020, a Entidade das Contas e Financiamentos Políticos (doravante, «ECFP») condenou o arguido Partido Ecologista «os verdes» (PEV), em coima no valor de 10 (dez) Salários Mínimos Nacionais («SMN») de 2008, perfazendo a quantia de €4.260,00 (quatro mil duzentos e sessenta euros), pela prática de contraordenação prevista e punida pelo artigo 29.º, n.º 1, da Lei n.º 19/2003, de 20 de Junho (Lei de Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais, doravante, «LFP»), e o arguido José Luís Teixeira Ferreira, enquanto responsável financeiro do referido Partido, em coima no valor de 5 (cinco) SMN de 2008, perfazendo a quantia de €2.130,00 (dois mil cento e trinta euros), pela prática de contraordenação prevista e punida pelo artigo 29.º, n.º 1, da LFP.

2. Inconformados, os arguidos recorreram dessa decisão para o Tribunal Constitucional, ao abrigo dos artigos 23.º da LEC e 9.º, alínea e), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (Lei de Organização, Funcionamento e Processo no Tribunal Constitucional, doravante, «LTC»), pugnando pela absolvição, revogando-se a decisão impugnada.

No essencial, a discordância dos arguidos é dirigida à censura contraordenacional pelo registo nas contas anuais de 2012 de receita proveniente de contribuições, correspondentes a prestações tituladas por eleitos locais transferidas para conta bancária do PEV, e pela integração das contas do respetivo grupo parlamentar nas contas anuais partidárias, entendendo que não lhes pode ser imputada qualquer responsabilidade contraordenacional por tais factos.

Relativamente às aludidas contribuições, alegam os recorrentes:

«5º

Antes de mais nada, há que desfazer aqui um equívoco material: o PEV recebeu efetivamente, no ano de 2012, uma contribuição de uma eleita numa Assembleia Municipal no valor de 152,64€ mas esse valor foi transferido pela própria eleita na autarquia do Barreiro e não da Moita.

Com efeito, tendo a questão sido suscitada desde o início pela ECFP, foi a mesma desmentida documentalmente em 05-11-2016, tendo então o PEV declarado que, a contribuição que tinha sido recebida no ano de 2012 nesse valor de 152,64€ foi proveniente da eleita pelo Partido na Assembleia Municipal do Barreiro, Maria Susana Silva (nif 227731638), e não da autarquia da Moita.

Quer os documentos das Contas do Partido quer os documentos prestados adicionalmente em 01-08-2014 e em 05-11-2016 o demonstram cabalmente.

O facto do douto Acórdão do Tribunal Constitucional nº 420/2016, seguindo a alegação da ECFP, referir que existiu uma transferência da CM da Moita, bem como a douta promoção do Ministério Público (MP), não fazem desse facto uma verdade.

Salvo o devido respeito, não basta na douta decisão de que ora se recorre invocar genericamente o "teor dos documentos contabilísticos", sem qualquer referência a documentos concretos, para dar como provado um facto, que esses documentos, e em particular os juntos durante a fase de contraditório, manifestamente não confirmam.

10º

Depois, lamentável e incompreensivelmente, a douta decisão sustenta a sua posição ainda em dois factos incorretos, salvo o devido respeito: a) que o PEV apresentou, como defesa para estas duas pretensas transferências/pagamentos por Câmaras Municipais dois recibos emitidos por si; b) que o PEV, tendo-lhe sido dada oportunidade para se pronunciar ou retificar as contas não o fizeram.

11º

Quanto ao primeiro desses factos, sendo verdade que o PEV apresentou os ditos recibos, a verdade é que o PEV não apresentou APENAS esses dois recibos, facto olimpicamente ignorado pela ECFP, mas também dois extratos bancários da sua conta bancária (Anexo 1 e 2 juntos em 05-11-2016) bem como dois comprovativos de transferências bancárias - precisamente dessas duas transferências! - das contas bancárias particulares e pessoais dessas duas eleitas (Claudia Madeira, eleita na Assembleia Municipal de Lisboa e Susana Silva, eleita na Assembleia Municipal do Barreiro).

12º

Infelizmente, as entidades bancárias recusam-se, em cumprimento das regras do sigilo bancário, a prestar prova documental de que aquelas contas bancárias pertencem às duas eleitas, mas um dos documentos indica o nome da ordenante (Cláudia Madeira) e o outro apenas o nome próprio da eleita (Susana) sendo porém, como o documento indica, proveniente de uma "Caixajovem".

13º

Não temos conhecimento que Câmaras Municipais tenham acesso a contas bancárias do género "Caixajovem"...

14º

Mas, como se vê, existem no processo documentos oriundos de instituições bancárias a titular as ditas transferências, e não apenas recibos emitidos pelo próprio partido.

15º

De resto, no processo contra-ordenacional, como no processo-crime, deve o tribunal pautar-se pela busca da verdade material, como o MP na sua promoção, razão pela qual se requer que sejam os bancos BPI e Caixa Geral de Depósitos notificados para prestar informação sobre as ditas transferências para a conta do PEV NIB 00350121000008630 a partir das contas bancárias tituladas por Cláudia Madeira, com o nif 224543385, domiciliada na CGD, no valor de 134,30€ em Julho de 2012 e por Maria Susana Silva, com o nif 227731638, domiciliada no BPI, no valor de 152,64€ em Outubro de 2012.

16º

Por outro lado, deve-se assinalar que, ao mesmo tempo que o MP não se sente obrigado a concretizar a prova documental a que deveria estar obrigado - pois é seu o ónus de provar que a infração foi cometida pelos agentes -, como se existisse uma presunção, não de inocência, mas de culpa contra os aqui Arguidos, ignora a prova feita pelos Arguidos no processo bem como as alegações do mesmos prestando a mesma explicação que ora se volta a dar e que a ECFP, parece dar como inexistente referindo que estes, instados a tanto, nem sequer se pronunciaram, o que é falso, como já fiou supra dito.

17º

Os pagamentos das quantias referidas fo[am] feit[os] por eleitas do PEV, das suas contas bancárias pessoais e não foram feitas pelas Câmaras Municipais de Lisboa ou Barreiro.

18º

Finalmente, em relação a esta matéria, cumpre assinalar o valor reduzidíssimo em causa no total da conta de 2012 do PEV.

Por seu turno, e quanto à integração das contas do grupo parlamentar, dizem o que segue:

«(...)

[V]erifica-se que [a] integração das contas do grupo parlamentar dos Verdes (GPPEV) nas contas do Partido é apenas aparente, e não efetiva, mantendo-se a sua autonomia e perfeita separação.

27º

Com efeito, as contas do GPPEV, cujas receitas consistem unicamente em duas subvenções públicas, fazem parte de um "centro de custo próprio" onde são alocadas as despesas do mesmo.

28º

Ou seja, as contas do GPPEV encontram-se separadas, literalmente autonomizáveis das contas do PEV, não se confundindo nem as receitas nem as despesas de um e de outro, existindo total transparência e separação contabilística.

29º

Assim, não nos parece que tenha sido violado o artº 12º da Lei 19/2003.

30º

Por outro lado, parece-nos que deve existir uma separação entre a consideração de que as contas contêm uma irregularidade, no caso das contas de 2012 do PEV, pela questão meramente formal de "colocar" as contas do GPPEV num "centro de custo próprio" autónomo em vez de as colocar num "anexo" das contas do PEV, quase parecendo que se cai num formalismo gramatical excessivo e desproporcionado face à ratio legist o bem jurídico que se pretende acautelar - a transparência contabilística - e a decisão de que essa irregularidade conduz a uma sanção contraordenacional.

31º

isso mesmo veio dizer o TC no seu Acórdão nº 420/2016: "Uma vez que o que vem de dizer-se tem repercussões restritas ao juízo relativo à regularidade das contas [na medida em que os partidos tenham incluído subvenções e/ou despesas dos grupos parlamentares nas suas contas anuais], outro poderá vir a ser o julgamento a realizar, em momento oportuno, em matéria de responsabilidade contraordenacional."

32º

Ou seja, não decorre apenas da conclusão que existiu "integração", sem prescindir no que se disse supra, das contas do GPPEV nas contas do Partido, para se concluir peia responsabilidade contraordenacional: esta implica um juízo concreto de censura e culpa e a violação clara das regras de organização contabilística em violação de uma norma concreta para concluir pela existência de infracção contraordenacional.

33º

No nosso caso, não existiu violação do artº 12º nº 1 e, em bom rigor, nem do nº 8 desse mesmo artigo da Lei 19/2003 na redação em vigor à época.

34º

Com efeito, o nº8 do referido art0 12º, o que prevê é a obrigação de anexar as contas dos Grupos Parlamentares com a preocupação de que essa informação seja prestada pelos Partidos Políticos e em conjunto com as contas dos Partidos Políticos.

35º

É essencialmemte uma norma de sentido positivo, de obrigação de facere, e não de conteúdo negativo - de proibição de integração das contas dos Grupos Parlamentares nas Contas dos Partidos Políticos.

36º

O que o legislador...

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