Acórdão nº 1299/16.6T8TMR.E2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelTOMÉ GOMES
Data da Resolução25 de Fevereiro de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório 1. CC (A.) intentou, em 06/09/2016, contra DD (R.), ação de divórcio sem consentimento do outro cônjuge, alegando, no essencial, que: .

Nos 20 anos anteriores à propositura da ação, A. e R., apesar de viverem na mesma casa, passaram a fazer vidas totalmente independentes como se não fossem marido e mulher, não partilhando o mesmo leito, não convivendo um com ou outro nem tomando refeições juntos; . Além disso, ocorreram violações do dever de respeito, de coabitação e de assistência, por parte do R., que implicam rutura definitiva do casamento.

  1. O R. contestou, impugnando, de forma motivada, os factos alegados pela A. e dizendo que requereu a interdição desta por se mostrar incapaz para reger a sua pessoa e bens.

  2. Tendo, entretanto, a A. falecido em 02/12/2016, foram habilitados AA e BB para, em representação daquela, prosseguiram com a presente ação para efeitos patrimoniais.

  3. Realizada a audiência final, foi proferida a sentença de fls. 339-355, de 19/06/ 2019, a julgar a ação improcedente, por não provada, com a consequente absolvição do R. do pedido.

  4. Inconformados, os habilitados recorreram para o Tribunal da Relação …, em sede de impugnação de facto e de direito, tendo sido proferido o acórdão de fls. 412-435, de 05/12/2019, aprovado por unanimidade, em que, não obstante a alteração parcial da decisão de facto, se julgou a apelação improcedente, mantendo-se a decisão recorrida.

  5. Desta feita, vêm os mesmos habilitados pedir revista, em primeira linha, em termos de revista normal por entenderem que o acórdão recorrido assentou em fundamentação essencialmente diferente da sentença da 1.ª instância e, subsidiariamente, em sede de revista excecional ao abrigo das alíneas a), b) e c) do n.º 1 do artigo 672.º do CPC, formulando as seguintes conclusões: 1.ª - O presente recurso de revista é admissível, nos termos do artigo 671º, n.º 1, do CPC, não tendo aplicação ao caso o disposto no respetivo n.º 3, porquanto a procedência parcial da impugnação da matéria de facto, com a alteração do facto 8.º da matéria provada e a consequente eliminação do facto i) do rol dos factos não provados, impôs ao tribunal recorrido que avançasse com uma nova fundamentação, essencialmente diferente da constante da sentença da 1.ª instância, designadamente apreciando a aplicabilidade cláusula geral prevista na alínea d) do artigo 1781.º do CC – rutura definitiva do casamento – à luz dos novos factos provados: a separação de facto desde 13/08/2016 e o firme propósito da A. de não restabelecimento da vida em comum com o R., conjugados com os demais factos provados.

    2.ª – Com efeito, no acórdão recorrido, considerou-se, ao contrário da sentença de 1.ª instância, que a situação dos autos tinha enquadramento no conceito de separação de facto constante da alínea a) do artigo 1781.º do CC, embora se concluísse que, à data da entrada da ação e do falecimento da A., não estava decorrido o prazo de um ano aí previsto.

    3.ª - Considerou-se, ainda, que a situação não tinha enquadramento na alínea d) do citado art.º 1781.º, mas por razões essencialmente divergentes das avançadas pelo tribunal de 1.ª instância, ou seja, por se ter entendido que, nesta norma, se contemplam «necessariamente situações distintas da mera separação de facto, sob pena de inutilidade da previsão desse fundamento na alínea a) e da subversão do prazo nela fixado que é o período de tempo que o legislador reputou como necessário ao amadurecimento e consolidação da situação que, depois, permite presumir acerca da irreversibilidade do rompimento da comunhão conjugal.» 4.ª - Ou seja, o acórdão recorrido, embora mantendo a sentença de 1.ª instância, fê-lo com uma fundamentação essencialmente diferente da constante daquela, o que obsta à verificação da dupla conforme, nos termos do artigo 671.º, n.º 3 do CPC.

    5.ª – Ainda assim, a revista é admissível a título excecional ao abrigo das alíneas a), b) e c) do n.º 1 do art.º 672.º do CPC, uma vez que a questão em apreço, no respeitante à rutura definitiva do casamento a que alude a alínea d) do art.º 1781.º do CC, pode ser demonstrada através da prova de quaisquer factos, incluindo os passíveis de preencher as previsões das alíneas a) a c) do mesmo preceito, sem que esteja decorrido o período temporal neles previsto, desde que se demonstre, atentas as circunstâncias do caso, que cessou de forma irreversível a comunhão conjugal, o que se traduz em questão jurídica e socialmente relevante, nos termos e para os efeitos de revista excecional, estando ainda a decisão em oposição com o acórdão convocado como acórdão fundamento; 6.ª - Com efeito, no acórdão recorrido entendeu-se que a alínea d) do referido artigo 1781.º do CC contempla «necessariamente situações distintas da mera separação de facto, sob pena de inutilidade da previsão desse fundamento na alínea a) e da subversão do prazo nela fixado que é o período de tempo que o legislador reputou como necessário ao amadurecimento e consolidação da situação que, depois, permite presumir acerca da irreversibilidade do rompimento da comunhão conjugal”, ao passo que, no acórdão fundamento, se entendeu que «funcionando sendo a al. d) como uma “cláusula geral”; 7.ª – Porém, não se justifica uma interpretação que comporte essa exclusão, já que “não há fundamento legal que impeça que uma situação de separação de facto por período não apurado possa ser valorada, para se aferir se existe ou não uma rutura do casamento, o que é relevante é que os factos provados sejam graves e reiterados e demonstrativos que objetivamente e com carácter definitivo deixou de haver comunhão de vida entre os cônjuges.

    8.ª – Quando essa separação tem a duração de 1 ano consecutivo, o legislador presume “iuris et de iure” que a rutura definitiva do casamento se consumou, não sendo necessário provar outros factos, mas da não prova do decurso desse prazo não se pode tirar a ilação oposta, ou seja, que não há rutura definitiva»; 9.ª – Ao contrário do entendimento do acórdão recorrido e como é hoje jurisprudência maioritária, a rutura definitiva do casamento a que alude a alínea d) do artigo 1781.º do CC pode ser demonstrada através da prova de quaisquer factos, incluindo os passíveis de preencher as previsões das alíneas a) a c) do mesmo preceito sem que esteja decorrido o período temporal neles previsto, desde que sejam graves, reiterados e...

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