Acórdão nº 2445/12.4TBPDL.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Fevereiro de 2021
Magistrado Responsável | MARIA CLARA SOTTOMAYOR |
Data da Resolução | 23 de Fevereiro de 2021 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – Relatório 1.
No dia 04-10-2012, ALE-HEAVYLIFT IBÉRICA, SA., com sede na P.L …, …., …, Madrid, Espanha, pessoa coletiva n.° A-78…6, intentou contra FERROVIAL AGROMAN, SA., com sede em Espanha e sucursal em Portugal, no Edifício …, Rua …, n°. … - …, …, com o número único de pessoa coletiva e de matrícula na Conservatória do Registo Comercial de … 98…7, a presente ação declarativa de condenação com processo comum, sob a forma ordinária, pedindo que a Ré fosse condenada:
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A liquidar à Autora a quantia total de €458.517,00, em virtude de ser a Ré responsável pela derrocada em apreço nos presentes autos, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 483° do Código Civil, sendo: i. €74.500,00, correspondente ao valor de trabalhos adicionais realizados pela ALE por motivo da derrocada, acrescida de juros de mora vincendos desde a data da citação até integral pagamento; e ii. €179.129,00, correspondente ao valor de um conjunto de máquinas, ferramentas e materiais auxiliares que se encontravam na zona da derrocada e foram declarados como perda total na sequência da mesma, valor acrescido de juros de mora vincendos desde a data da citação até integral pagamento; e iii. €204.888,00 (€34.900,00 + €169.988,00), correspondente aos sobrecustos resultantes para a ALE da interrupção da obra e consequente alargamento do prazo de execução da mesma, quantia acrescida de juros de mora vincendos desde a data da citação até integral pagamento; b) A liquidar à ALE a quantia total de €75.579,81, que corresponde à quantia de €74.070,00 (€69.750,00 + 4.320,00), acrescida de juros de mora vencidos no montante de €1.509,81 e vincendos até integral pagamento, correspondente aos trabalhos contratualizados e efetivamente executados pela ALE, nos termos do contrato de subempreitada celebrado; c) A pagar as custas e procuradoria condigna.
Para tanto alegou, em síntese: A Autora dedica-se a trabalhos, estudos e atividades relacionadas com a engenharia sobre movimento, transporte, instalação e pesagem de cargas pesadas ou volumosas, assim como todas aquelas atividades que estando relacionadas direta ou indiretamente com o anterior sirvam para a realização das atividades mencionadas.
A Ré dedica-se, entre outras atividades, à execução de grandes obras civis e de infraestruturas.
No exercício da sua atividade, a Ré era agrupada maioritária do VIALSCUT - CONSTRUÇÃO DA SCUT DOS AÇORES, A.C.E., agrupamento complementar de empresas a quem foram adjudicados, mediante a celebração de um contrato de empreitada, todos os trabalhos relativos à conceção, projeto, construção e fornecimento previstos no Contrato de Concessão da Concessão Rodoviária em regime de SCUT na Ilha de …, Açores.
Por sua vez, o VIALSCUT - CONSTRUÇÃO DA SCUT DOS AÇORES, A.C.E. adjudicou à Ré parte dos trabalhos que constituem o objeto do referido contrato de empreitada.
Parte desses trabalhos foi, por sua vez, adjudicada pela Ré à Autora, através de contrato de subempreitada de 8 de Outubro de 2010, tendo-se a Autora obrigado, ao abrigo desse contrato, a projetar e executar os trabalhos de abertura dos Viaduto 06 (V6) Ribeira … 1.6, Variante Água d'Alto, do Eixo Sul da obra da Scut … .
Do ponto de vista técnico, a subempreitada contratada visava a abertura de dois pares de pilares, denominados n.° 1 e n.° 2, ambos conformados por um pilar esquerdo e por um pilar direito (cfr. Anexos III e IV do Contrato, junto como Documento n.° 1).
A manobra de abertura dos pilares - a cargo da Autora - consistia em levar cada um dos pilares esquerdo e direito, construídos pela Ré em posição vertical, a uma inclinação de 12° em relação à posição vertical original, até alcançar a geometria pretendida em "V".
As partes acordaram que a subempreitada seria realizada em regime de Valor Global, pelo valor estimado de € 155.000,00, de acordo com a discriminação constante da Lista de Preços, que constitui o Anexo I do Contrato.
De acordo com a Cláusula Quinta do Contrato, os trabalhos teriam início no dia 28 de janeiro de 2011 e o prazo total seria de 9 semanas e 4 dias.
Os trabalhos tiveram início no dia 2 de fevereiro de 2011.
Na madrugada do dia 12 de março de 2011, pelas 1H30 horas, ocorreu um deslizamento do talude contíguo ao par de pilares n.° 2, provocando um deslocamento de terras de tal magnitude que deu origem ao colapso da grua torre instalada junto aos pilares.
E, por extensão, deu origem ao colapso destes pilares e à sua queda e impacto sobre o próprio talude.
Por fax enviado à Autora a 17 de março de 2011, que se junta como Documento n.° 2, a Ré qualificou a ocorrência nos seguintes termos: "Como é do conhecimento de V. Ex. as ocorreu na madrugada do passado dia 12 de Março de 2011, pelas 1:30 horas (...) um desastre natural e imprevisível, conduzindo ao deslizamento de terras na sequência do qual caíram dois pilares 2E e 2D do V6. O desastre ocorrido foi externo e alheio à vontade de ambas as partes do contrato e, por isso, deve cada uma delas assumir os riscos inerentes ao mesmo (...). Finalmente, reiteramos que o evento acima identificado decorreu de um facto natural, imprevisível e inevitável, ocorrendo os seus efeitos independentemente da vontade das partes e que é nesse âmbito que deve ser analisado e tratado".
O que a Autora refutou, por fax de 21-03-2011, considerando adicionais ao contrato todos os custos e trabalhos tornados necessários pela derrocada.
Com o objetivo de (i) serem analisadas e avaliadas as várias circunstâncias que concorreram para a ocorrência, assim como de (ii) serem quantificadas e valoradas as perdas sofridas pela Autora, nomeadamente no que toca à maquinaria, ferramentas e material auxiliar instalados na obra, a Autora solicitou à empresa C… & Company (Espana), S.A. a realização de uma perícia ao local do acidente, que deu origem ao relatório pericial que se junta como Documento n.° 4.
De acordo com o referido relatório pericial, pág. 20, o sinistro ocorrido não pode ser qualificado, nem caracterizado, como desastre natural imprevisível ou extraordinário.
Antes foi resultado direto das atividades de construção do viaduto, a cargo da Ré.
Por motivo da derrocada, revelaram-se necessários trabalhos adicionais, que a Autora realizou, cujo valor total ascendeu a € 74.500,00.
A derrocada deu causa à perda total, por danificação, de um conjunto de máquinas, ferramentas e materiais auxiliares que se encontravam na zona do deslizamento de terras, cujo valor total ascendeu a € 179.129,00 (cfr. orçamento que se junta como Documento n.° 6.
Verificaram-se também sobrecustos ocasionados pela interrupção da obra, desde o momento do deslizamento as terras até à retoma dos trabalhos a 12 de setembro de 2011, com o consequente alargamento do período efetivo de execução da mesma, que ascenderam a € 34.900.00 + € 169.988,00.
Autora e Ré chegaram a encetar negociações com vista ao pagamento de uma indemnização no valor de € 136.000,00, para cobrir os trabalhos adicionais, os sobrecustos e os prejuízos incorridos pela Autora com o ocorrido no dia 12 de março de 2011, a ter lugar com a faturação da conclusão dos trabalhos contratados à Autora.
Tais negociações não foram bem-sucedidas, pelo que os trabalhos adicionais realizados, os prejuízos e os sobrecustos suportados pela Autora com o ocorrido no dia 12 de Março de 2011, no valor total de € 458.517,00 (6 458.517,00 = € 74.500,00 + € 179.129,00 + € 34.900,00 + € 169.988,00), ficaram por ressarcir.
Encontram-se ainda por pagar à Autora os seguintes valores: (i) € 69.750,00, referente à conclusão dos trabalhos contratualizados, conforme consta do Auto de Medição n.° 3, que se junta como Documento n.° 14, e do auto de medição final da obra, junto como Documento n.°8; (ii) € 4.320,00, referentes à realização de trabalhos adicionais que se prenderam com o fornecimento e colocação de cabos adicionais de pré-esforço, conforme consta do Auto de Medição n.° 3, junto como Documento n.°14 e do auto de medição final da obra, junto como Documento n.° 8; Na qualidade de empreiteiro geral da obra, cabia à Ré assegurar que o referido talude estava em condições de suportar a construção do viaduto em causa, maxime o peso dos pilares, bem como a operação de abertura dos mesmos.
Estando preenchidos os pressupostos da responsabilidade, civil estatuída no art. 483.°, n.° 1 do C. Civil.
A Ré contestou, tendo alegado, também em síntese: A celebração do contrato entre as partes teve como pressuposto o facto de a Autora exercer uma atividade de natureza muito especializada, com elevado grau de complexidade, e que consiste na movimentação de peças pesadas ou volumosas.
Para o efeito, a Autora procedeu à verificação das condições e especificações técnicas pressupostos do contrato, tendo declarado (Cláusula Terceira das Condições Particulares do Contrato): 1. (..).ter verificado o local, bem como os planos, plantas, condições e especificações técnicas, antes de apresentar a sua proposta, e que aceitou as condições de realização dos presentes trabalhos, bem como a natureza destes, e todas as dificuldades que, de qualquer modo, possam influenciar o cumprimento do objecto do contrato.
2. (...) reconhece ter tido tempo suficiente para conhecer exactamente as implicações, consequências e dificuldades derivadas do cumprimento do presente contrato.
3. (...) declara ainda que teve em consideração todos os elementos relativos à execução das diferentes partes da Empreitada, pelo que se obriga no âmbito da execução do presente Contrato a colaborar e praticar todo os actos que se revelem necessários para a coordenação de todos os trabalhos da Empreitada ".
No que respeita ao prazo de execução da Subempreitada (cfr. Cláusula Quinta das Condições Particulares do Contrato) ficou estabelecido que: "7.
O trabalho terá início no dia 28 de Janeiro de 2011 e realizar-se-á de acordo com os seguintes prazos parciais: - Montagem dos Equipamentos: 2 semanas; - Abertura do Primeiro Pilar: 2 dias; - Mudança para o segundo...
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Acórdão nº 2715/16.2T8VFR.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Dezembro de 2022
...Civil, 5ª ed., págs.434-436. [7] Disponível em www. dgsi.pt [8] Disponível em www.dgsi.pt. [9] Cfr. Ac. STJ de 23-02-2021- Revista n.º 2445/12.4TBPDL.L1.S1 (Maria Clara Cfr., ainda, os acórdãos de 25.11.2014, no processo n.º 6629/04.0TBBRG.G1.S1 (Pinto de Almeida), de 29.09.2016, no process......
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Acórdão nº 00332/12.5BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 05 de Novembro de 2021
...em que é admitida a prova testemunhal (artigos 351.º, e 396.º do CC, e 607.º, n.º 5, do CPC)” – Ac. do STJ, de 23-02-2021, proc. n.º 2445/12.4TBPDL.L1.S1. A recorrente remete para os depoimentos de J. e de J., dos quais até faz Atente-se nas passagens do depoimento de J. que a autora chama ......
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