Acórdão nº 141/21 de Tribunal Constitucional (Port, 19 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Gonçalo Almeida Ribeiro
Data da Resolução19 de Março de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 141/2021

Processo n.º 202/2021

3.ª Secção

Relator: Conselheiro Gonçalo de Almeida Ribeiro

I. Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é reclamante A. e reclamado o Ministério Público, o primeiro reclamou, ao abrigo do artigo 76.º, n.º 4, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla «LTC»), do despacho de 8 de fevereiro de 2021, daquele tribunal, que não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional.

2. O ora reclamante, na qualidade de arguido em processo-crime, interpôs recurso para o Tribunal da Relação do Porto da decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª instância que o condenou, pela prática de um crime de homicídio qualificado, a cumprir 17 (dezassete) anos de prisão em estabelecimento destinado a inimputáveis, nos termos do artigo 104.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal.

Por acórdão de 8 de setembro de 2020, o Tribunal da Relação do Porto negou provimento ao recurso, confirmando o acórdão proferido pelo Tribunal de 1.ª instância.

Ainda inconformado, o arguido interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça. Por acórdão datado de 6 de janeiro de 2021, o Supremo Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso, confirmando o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto.

Foi então interposto o presente recurso de constitucionalidade, através de requerimento em se pode ler o seguinte:

«A.. Arguido / Recorrente nos autos à margem referenciados, notificado do "douto" Acórdão proferido peio Supremo Tribunal de Justiça;

-Vêm por este meio. apresentar competente RECURSO AO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL, expondo e requerendo o seguinte:

Têm os presentes autos origem na decisão proferida pela Comarca do Porto - Juízo Central Criminal do Porto - Juiz 2 (Proc. n.° 3563/19. 3 JAPRT), na qual, o aqui Recorrente foi condenado pela prática de:

- 1 (um) crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos artigos 131.° 132.° n.°(s) 1 e 2. alínea fl do Código Penal, na pena de 17 anos de prisão, a cumprir em estabelecimento destinado a inimputáveis, nos termos previstos no art.° 104.°, n.(s) 1 e 2 do mesmo diploma legal;

Assim,

E pese embora o recurso nestes autos já apresentado, nomeadamente também fundamentado em invocadas nulidades e/ou inconstitucionalidades;

Facto é,

Que acabou o Recorrente de "tomar conhecimento", que não obstante a argumentação e/ou fundamentos então invocados, foi decidido pelo Tribunal Supremo Tribunal, ainda assim, confirmar a decisão do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto;

Pelo que,

Em face do exposto e tudo quanto vem estabelecido nos n.°(s) 2 a 4 do artigo 70.° da Lei do Tribunal Constitucional (aprovada peia Lei n.° 28/82 de 15 de Novembro);

Está agora o Recorrente, face à situação de que é inequívoco que nos presentes autos;

Se encontram já "de per si" irremediável e completamente esgotados, todos os meios ou recursos jurisdicionais ordinários, que lhe possibilite reagir contra a interpretação do imposto pelo artigo 127.º, do C.P.P., quando, interpretado no sentido de que essa livre apreciação faz decidir, que Arguido aqui Recorrente deve cumprir a pena a que foi condenado em estabelecimento destinado a inimputáveis, tudo, ao abrigo do artigo 140.º n.°(s) 1 e 2 do Código Penal;

Sem que,

"in casu" e essencialmente em sede de Julgamento e/ou Acórdão proferido, tecer todo e/ou qualquer juízo crítico/confronto, suficientes, com outros elementos de prova constantes dos autos;

Violando com tudo isso o disposto pelo Artigo 32.°, n.°1, da Constituição da República, dado, não estarem então asseguradas as constitucionalmente consagradas garantias de defesa do processo criminal, deslocado que também foi o princípio "in dúbio pró reo";

E cuja inconstitucionalidade,

Está inabalaveímente persuadida, resultando claramente inconstitucional, por violação do princípio da certeza e da segurança jurídica, enquanto trave mestra do Estado

Tudo resultando, numa clara e inequívoca desconformidade com a real intenção do legislador constitucional;

Assim,

E porque está em tempo e para tal tem legitimidade (cfr. al. b) do n.° 1 do art.º 72.° da Lei do T. Constitucional), interpõe-se o presente recurso;

O qual deverá subir imediatamente e nos próprios autos, com efeito suspensivo (cfr. n.° 4 do artigo 78.º da Lei do Tribunal Constitucional);

Nesta consonância,

Ao abrigo da alínea b) do n.° 1 do art.º 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro;

Pretende-se ver apreciada a constitucionalidade da forma como a norma legal atrás identificada foi interpretada pelo Tribunal "a quo";

Entendendo-se sublinhe-se, que o "douto" Acórdão recorrido fez uma interpretação materialmente inconstitucional do artigo 127.º, do C.P.P., quando, interpretado no sentido de que de que essa livre apreciação faz decidir, que Arguido aqui Recorrente deve cumprir a pena a que foi condenado em estabelecimento destinado a inimputáveis, tudo, ao abrigo do artigo 140.º n.º(s) 1 e 2 do Código Penal;

Violando com tudo isso o disposto pelo Artigo 32.º, n.º 1, da Constituição da República, dado, não estarem então asseguradas as constitucionalmente consagradas garantias de defesa do processo criminal, deslocado que também foi o princípio "in dúbio pró reo";

Sempre se diga, que o ora Recorrente em sede de Audiência de Julgamento, logo ali esperou especificadamente as "provas" que no seu entender importariam uma decisão que justificasse a sua reclusão em estabelecimento destinado a inimputáveis;

Acresce que,

No Acórdão ora recorrido em momento algum também se acrescenta algo ao esperado/solicitado;

Tal omissão de pronúncia constitui uma nulidade sanável consagrada na alínea c) do número 1 do artigo 379.º, aplicado por remissão do número 4 do artigo 425.°, ambos do CPP;

Não se pronunciando o Tribunal "a quo" acerca das questões que foram expressamente invocadas pelo Recorrente, existe omissão de pronúncia, o Acórdão recorrido é nulo, o que se pretende ver declarado e sanado;

Atente-se pois,

Que no acto de julgar não é bastante a mera opinião emanada pelo julgador;

Existe e encontra-se por detrás um dever essencial de fundamentação, importante o bastante para a sua falta ou deficiência constituírem uma nulidade;

A fundamentação é o elemento que dá vida à decisão final, é o substrato material que legítima a decisão final;

Como ensina Paulo Saragoça da Matta, este dever de fundamentação das decisões jurisdicionais "Decorre, em última instância, do dever que recaí sobre o Estado de banir a arbitrariedade do exercício dos poderes públicos (...)" (In A livre apreciação e o dever de fundamentação da sentença, Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais, Coordenação Científica de Maria Fernanda Palma, Almedina, 2004, p. 261);

Em concreto, diga-se que a fundamentação terá de ser uma convicção objectivável e motivável capaz de se impor aos outros de forma lógica e segura;

E tal exigência de fundamentação, entende-se maior quando nos encontramos na área criminai, pois, o destinatário último juízo valorativo, o Arguido, deverá entender de que forma foi formada a convicção do Tribunal que o julgou, realizando e reproduzindo o juízo crítico do julgador;

Ora,

Após todos os considerandos acerca da necessidade e essencialidade, do dever, da fundamentação, olhando para o Acórdão recorrido, facilmente se chega à conclusão que esta é inexistente concernante ao ponto em análise (reclusão em estabelecimento destinado a inimputáveis);

As situações que cabem na previsão desta norma do Artigo 104.º do nosso Código Penal, são referentes aos casos usualmente designados de imputabilidade diminuída. o que, da analise crítica da medida da pena, tão pouco foi declarada e/ou assumida pelo Acórdão aqui recorrido;

Por outro lado,

Também pode resultar deste Art.º 104.º do C.P., uma eventual dificuldade de adaptação ou de compreensão do regime dos estabelecimentos prisionais comuns, o que, "in casu" também não colhe, pois que, até à data em prisão preventiva a decorrer no Estabelecimento Prisional Central do Norte (Porto/Custóias), nenhuma notícia aos autos veio a chegar;

É que,

Mesmo dando-se como provado que o Arguido sofre de afecção psíquica, a mesma forçosamente também lhe teria de diminuir a imputabilidade e, em consequência tal medida de execução poderia mostrar-se adequada, permitindo a individualização da execução da pena, com possibilidade de melhor prognóstico etc, etc.;

Contudo,

Não tendo sido sequer nos autos suscitada a necessidade de avaliar medicamente a situação do recorrente à data dos factos e, apenas sendo referido em exame um problema de foro...

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