Acórdão nº 01309/05.2BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Março de 2021
Magistrado Responsável | Celeste Oliveira |
Data da Resolução | 11 de Março de 2021 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:*1 – RELATÓRIO Clínica (...), Lda., melhor identificada nos autos, inconformada com a sentença proferida no TAF de Viseu, que julgou improcedente a impugnação judicial intentada contra as liquidações de IRC e juros compensatórios do ano de 2001, deduziu o presente recurso, formulando para tanto as seguintes conclusões: “CONCLUSÕES: 1) É princípio estruturante do processo judicial tributário o Principio do Inquisitório pleno, previsto nos artigos 13° do Código de Procedimento e de Processo Tributário e artigo 99° da Lei Geral Tributária, pelo que o processo judicial tributário não é um processo de partes.
2) Nos termos do qual a Meritíssima Juiz a quo deveria ter ordenado as diligências necessárias para a descoberta da verdade material, não lhe bastando afirmar no princípio da página 6 da Douta Sentença recorrida que: "Com efeito, e embora não se coloque em causa que os serviços e despesas mencionadas nos documentos em causa, possam ter sido prestados, a verdade é que as despesas inerentes aos mesmos, não se encontram devidamente comprovadas".
3) Deste modo, haverá que concluir que, caberia à Administração Tributária alegar e provar, facto a facto, em que consistiu a conclusão de que teriam ocorrido os factos tributários, no caso, as correções em sede de IRC, no valor global de 33.331,93 €.
4) E essa prova teria de ser cabal e desprovida de incertezas, pois em matéria tão delicada, não poderia a julgadora, a Meritíssima Juiz a quo bastar-se com um mero juízo de probabilidade da existência dos factos tributários, o que ela própria colocou em dúvida, ao afirmar que os serviços e as despesas em causa possam ter sido prestados.
5) É que a incerteza sobre os factos tributários, teria e terá, necessariamente de resolver-se a favor da impugnante, ora recorrente, não só por aplicação das regras gerais sobre a repartição do ónus da prova (artigo 74°, n° 1 da L.G.T.), mas também porque hoje em dia o brocardo "in dubio contra fiscum", exprime um princípio estruturante do processo judicial tributário.
6) Pelo que, assim sendo, a decisão recorrida viola o disposto no artigo 100°, n° 1 Código de Procedimento e de Processo Tributário, designadamente, porque competia à Administração Tributária e ao Tribunal a quo (artigos 13° do C.P.P.T. e 99° da L.G.T.), demonstrar a existência dos factos tributários, bem como a sua quantificação, o que não foi feito e isto, porque o processo judicial tributário, como se referiu, não é um processo de partes.
7) Ao proceder à determinação do imposto por via da acção direta, numa situação em que só lhe era permitido o apuramento através de métodos indiretos, a Administração Tributária preteriu formalidade legal essencial do processo de liquidação, o qual conduz à sua anulação.
8) Por outro lado, como se verifica da Nota Demonstrativa da liquidação junto à petição inicial, em Doc. N° 1, a matéria colectável declarada de 3.410,14 C, foi corrigida para o valor de 36.741,52 €.
9) Quer isto dizer que, no exercício de 2001, existe um afastamento da matéria colectável superior a 30%, ou seja, no caso 90,71 %, ou seja: 33.331,38 € : 36.741,50 € = 90,71 %, pelo que, nos termos do artigo 87°, n° 1, alínea c) da Lei Geral Tributária, a Administração Tributária teria necessariamente de proceder à avaliação indireta da matéria tributável, facultando ao contribuinte o pedido de revisão, nos termos do artigo 91° da Lei Geral Tributária.
10) Apesar da prescrição da dívida tributária não constituir fundamento da impugnação judicial, porque não respeita à legalidade do acto de liquidação mas, antes, à sua eficácia, deve conhecer-se dela, mesmo oficiosamente, enquanto pressuposto da decisão sobre a utilidade do prosseguimento da lide.
11) Ora, estamos em Abril de 2016, e nos termos do Regime da Lei Geral Tributária anterior à entrada em vigor da Lei N° 53-A/2006, em 01-01-2007, a prescrição da dívida tributária interrompeu-se com a impugnação judicial apresentada em 30 de Setembro de2005, no Serviço de Finanças de Oliveira do Bairro, com entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu em 13-10-2005.
12) Mas o efeito interruptivo derivado da dedução da impugnação judicial em 30-09-2005, cessou porque o processo esteve parado durante mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, somando-se, neste caso, o tempo decorrido até á data da apresentação da impugnação judicial ao termo daquele prazo de mais um ano.
13) E porque a lei, ao tempo aplicável, não previa interrupções sucessivas da prescrição, deve somar-se todo o tempo que decorre após o período de um ano do processo parado com o período que tiver decorrido até à data da apresentação da impugnação judicial.
14) E tendo, nos termos expostos, sido ultrapassado o prazo de prescrição de 8 anos, está-se face a uma situação em que a liquidação impugnada no valor de 32.647,82 €, com referência ao ano de 2001, acaba por ser atingida por via da dívida tributária estar prescrita, sendo, assim, patente a inutilidade da lide em sede de impugnação judicial, pois estamos nesta data em Abril de 2016.
15) Foram violados os artigos 8°, n°2, 48°, n° 1, 55°, 58°, 77º, n° 1 e 2, 99°, n° 1; da L.G.T., artigo 100°, n° 1 e 13° do C.P.P.T., artigo 23°, n° 1 do Código do IRC e ainda artigo 104°, n° 2 da C.R.P.
Termos em que, nos melhores de direito e com o sempre douto suprimento de V. Exas., entende a recorrente que deverá o presente Recurso ser julgado provado e procedente, e, em consequência, seja proferida DECISÃO que revogue a DOUTA SENTENÇA recorrida, anulando-se por ilegal a liquidação de IRC, objecto dos autos, e ainda se declare a prescrição do imposto do ano de 2001, a bem da JUSTIÇA.”*** ***A Recorrida não contra-alegou.
*** ***O Exmo. Procurador-geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
*** ***Com dispensa dos vistos dos Exm.ºs Senhores Desembargadores Adjuntos, cumpre apreciar e decidir.
*** *** 2- DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que as questões suscitadas resumem-se, em suma, a analisar se a sentença proferida pelo Tribunal a quo padece de (i) erro de julgamento na desconsideração de custos não documentados e no recurso a métodos directos e se ocorre (ii) a prescrição da dívida.
*** *** 3.
FUNDAMENTOS 3.1.
DE FACTO Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte: “FACTOS PROVADOS: 1) A Impugnante, "Clínica (...), Lda.", é uma sociedade por quotas, constituída a 21 de Março de 1997, com capital social de € 86.292,01 (oitenta e seis mil e duzentos e noventa e dois euros e um cêntimos) - cfr. fls. 4 do Processo Administrativo; 2) A impugnante estava coletada em IRC, pelo exercício de "Actividades de prática clínica em ambulatório", CAE 085120 - cfr. fls. 4 do Processo Administrativo; 3) A Impugnante presta serviços de consulta de diversas especialidades médicas, fisioterapia, enfermagem e análises clínicas - cfr. fls. 4 do Processo Administrativo; 4) No exercício da sua atividade a clínica emite as faturas/recibo aos clientes e posteriormente os médicos passam um recibo à clínica relativo às consultas por si efetuadas, ficando a clínica com uma percentagem de 20% sobre o valor dos serviços — cfr. fls. 4 vs. do Processo Administrativo; 5) A contabilidade da Impugnante registava despesas suportadas por documentos internos denominados saídas de caixa" — cfr. fls. 6 do Processo Administrativo; 6) Os documentos que servem de suporte às despesas/custos suportados, referidos em 5., não foram apresentados em sede de inspeção tributária — cfr. fls. 6, ponto 111.2, do Processo Administrativo; 7) Estas despesas, não documentadas, foram tributadas autonomamente, nos termos do disposto art.8 1° do CIRC — cfr. fls. 7 do Processo Administrativo; 8) - Com data de 22 de Março de 2005, foi a impugnante notificada na pessoa de J., para, esclarecer, até ao dia 30.03.2005, a que se referem as despesas identificadas a fls. 74, 75, 76,77,78, 80 verso e 82verso, cfr. fls. 74 a 78 e fls. 80 destes autos e que aqui se dão por reproduzidas.
9) - No seguimento da notificação referida em 8), foi prestada a seguinte informação: "(...)Cabe-nos informar e salvaguardar que o facto de não se ter conseguido identificar e localizar, na contabilidade desta Clinica (...), Lda., os respetivos documentos de suporte destes pagamentos, não significa que os prestadores de serviços em causa não os tenham emitido,(...» cfr. fls. 78 a 80 destes autos e que aqui se dão por reproduzidas.
10 - Dão-se aqui por reproduzidos os documentos juntos aos autos de fls. 88 (verso) e 89 com o título "saídas de caixa".
11 - Dão-se aqui por reproduzidos os documentos de fls. 89 (verso) e 90 com a designação de "almoços".
12 - Dão-se aqui por reproduzidos os documento juntos de fls. 90 (verso) a 96 e 97 (verso) a 143 (verso), com o título de “saídas de caixa”.
13 – Com data de 10 de Maio de 2005 foi remetido ofício em nome da impugnante para exercer o seu direito de audição, cfr. fls. 546 do PA e que aqui se dá por reproduzida.
14 – A impugnante exerceu o seu direito de audição nos termos constantes de fls. 550 a 552 do PA e que aqui se dão por reproduzidas.
15 – A petição inicial deu entrado no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu em 13.10.2005, cfr. fls.3 destes autos.
*Alicerçou-se a convicção do Tribunal na consideração da matéria dada como assente, no teor dos documentos acima identificados e não impugnados e nos factos alegados e igualmente não impugnados.
Não se relevou o depoimento das duas testemunhas, porquanto e no que se refere à testemunha, J. (inspetor tributário), o mesmo se limitou a confirmar o que havia exarado no relatório por si elaborado.
Quanto à segunda testemunha, C., rececionista da...
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