Acórdão nº 2604/20.6T8STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 11 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelCANELAS BR
Data da Resolução11 de Março de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

RECURSO N.º 2604/20.6T8STR.E1 – APELAÇÃO (JUÍZO CENTRAL CÍVEL de SANTARÉM) Acordam os juízes nesta Relação: Os Requeridos/apelantes (…), residente na Rua (…), n.º 19, em (...) e (…), com residência no Beco do (…), n.º 21, r./c., em Santarém, vêm, nos presentes autos de procedimento cautelar de arresto que lhes havia instaurado no Juízo Central Cível de Santarém-Juiz 3, a Requerente “Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de (…), CRL”, com sede na Rua (…), nos 20 e 22, em (…) – e onde foi decretado contra si o arresto peticionado, sem a sua audição (sobre a “fracção autónoma designada pela letra P, correspondente ao 4.º andar A, destinada a habitação, do edifício situado no Largo …, n.º 5, Av. …, n.

os 2 e 4 e Rua …, n.

os 29 e 29-A, em Santarém, descrito na Conservatória do Registo Predial de Santarém sob o nº …/Marvila e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Marvila, concelho de Santarém, sob o artigo …”), por douta sentença proferida em 19 de Novembro de 2020 (ora a fls. 51 a 57 verso dos autos) e onde, depois, se julgou improcedente a oposição por si deduzida contra esse decretamento, mantendo-se a providência, por douta sentença proferida em 06 de Janeiro de 2021 (agora a fls. 93 a 37 dos autos), com o fundamento aí aduzido de que “destinando-se a oposição a infirmar os fundamentos da providência, como preceitua o artigo 388.º, n.º 1, al. b), do CPC, importaria que fossem postos em causa os fundamentos em que assentou o decretamento do procedimento, o que os Requeridos não lograram fazer” –, vêm, dizíamos, tais requeridos interpor recurso desta última douta sentença, ora intentando a sua revogação e que venha a ser julgada procedente a oposição e levantado o arresto decretado, para o que apresentam alegações que rematam com a formulação das seguintes Conclusões: I.

Vem o presente Recurso de Apelação interposto da douta Sentença de fls., que julgou improcedente a oposição, mantendo a decisão de arresto proferida.

II.

Neste sentido, o Tribunal a quo considerou que, nos presentes autos, o crédito alegado pela Requerente, aqui Recorrida, tem a sua existência indiciariamente demonstrada e a situação de periculum in mora não foi afastada pelos Requeridos, acrescentando que as questões suscitadas pelos Requeridos devem ser apenas conhecidas e apreciadas no âmbito da ação principal a intentar pela Requerente, julgando totalmente improcedente a oposição deduzida.

III.

Nessa medida, o entendimento do Tribunal a quo merece a discórdia dos ora Recorrentes e impõe o presente recurso nos termos e fundamentos que infra se expõem, pois tal entendimento resulta de uma incorreta aplicação dos artigos 1692.º, alínea b), 1696.º, n.º 1 e 1724.º, alínea b) e, ainda, das disposições conjugadas dos artigos 365.º, n.º 1 e 392.º, n.º 1 e 372.º do Código de Processo Civil, pelo que, nessa medida, expressamente se impugna.

IV.

Ora, nos presentes autos foi decretado o arresto da fração autónoma designada pela letra "P", destinada a habitação, correspondente ao quarto andar A, no piso quatro, bloco A, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito no Largo (…), n.º 5, Av. (…), n.º 2 e 4 e Rua (…), n.º 29 e 29-A, Santarém, descrito na Conservatória do Registo Predial de Santarém sob o n.º (…)/Marvila e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Marvila, concelho de Santarém, sob o artigo (…), a qual integrava o património comum do casal.

V.

Com efeito, conforme resulta alegado em sede de oposição, a decisão que decretou o arresto olvida, por completo, a circunstância de que o alegado crédito de que a aqui Recorrida se arroga titular é, na própria versão carreada no seu articulado de petição inicial, proveniente de factos ilícitos com relevância criminal, exclusivamente imputados ao Requerido (...), nem tão pouco resulta do elenco dos factos indiciariamente provados que os factos ilícitos com relevância criminal que estão na origem do alegado crédito da Requerente, aqui Recorrida, sejam imputáveis à Recorrente (…).

VI.

Importa realçar que a aqui Recorrente (…) é totalmente alheia aos factos ilícitos que a Requerente imputa ao Requerido (…), desconhecendo, em absoluto e por completo, a veracidade de tal factualidade e ainda qual o destino das aludidas quantias de que o Requerido (…) alegadamente se apropriou, não resulta sequer indiciado nos presentes autos que as aludidas quantias tenham integrado o património comum do dissolvido casal, nem tão pouco resulta indiciado o alegado benefício ou enriquecimento do património comum em consequência dos factos ilícitos alegadamente praticados pelo Requerido (…).

VII.

Ora, resulta do disposto no artigo 391.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, que o procedimento cautelar de arresto depende, essencialmente, da verificação cumulativa de dois requisitos, a saber: da probabilidade da existência do crédito e da existência de justo receio de perda da garantia patrimonial.

VIII.

Destarte, o primeiro requisito que se impõe considerar no procedimento cautelar de arresto prende-se com a existência de um crédito na esfera jurídica do Requerente em relação ao Requerido, o qual não necessita de ser certo e exigível, bastando-se a indiciária probabilidade ou verosimilhança da sua existência.

IX.

Em primeiro lugar, a Requerente, aqui Recorrida, alega que o crédito em crise emerge de atos alegadamente praticados pelo Requerido (…), no sentido da apropriação ilícita de quantias monetárias, através dos quais o mesmo logrou acorrer aos encargos normais da vida familiar e em proveito comum do casal, nos termos do disposto no artigo 1691.º, n.º 1, alíneas a), b) e c), do Código Civil.

X.

Em segundo lugar, sustenta ainda a Recorrida que, não obstante tais atos estarem sujeitos a eventual responsabilidade criminal apenas do Requerido (…), tais atos implicam responsabilidade meramente civil, por estarem abrangidos pelo n.º 1 do artigo 1691.º do Código Civil, concluindo pela responsabilidade de ambos os Requeridos, aqui Recorrentes, na satisfação do seu alegado crédito.

XI.

Ora, atenta a fundamentação aventada pela Requerente, impõe-se considerar que, ao abrigo do disposto no artigo 1692.º, alínea b), do Código Civil, são de exclusiva responsabilidade do cônjuge a que respeitam as dívidas provenientes de crimes e as indemnizações, restituições, custas judiciais ou multas devidas por factos imputáveis a cada um dos cônjuges, salvo se esses factos, implicando responsabilidade meramente civil, estiverem abrangidos pelas razões enunciadas pelo disposto nos n.º 1 ou 2 do artigo 1691.º do referido diploma, sendo que, em conformidade com o preceituado pelo artigo 1696.º do Código Civil, pelas dívidas da exclusiva responsabilidade de um dos cônjuges respondem os bens próprios do cônjuge devedor e, subsidiariamente, a sua meação nos bens comuns.

XII.

No sentido da responsabilização da aqui Recorrente (…), a Recorrida invoca o disposto no artigo 1691.º, n.º 1, alíneas a), b) e c), do Código Civil, alegando que, através de atos ilícitos alegadamente praticados pelo Requerido (…), este fez ingressar as quantias no património comum do dissolvido casal e através das mesmas acorreu aos encargos normais da vida familiar e em proveito comum do casal.

XIII.

Sucede, porém, que compulsado o elenco de factos que se julgaram indiciados e na parte que aqui interessa, não resulta evidenciado que a atuação do Requerido (…) tenha ocorrido com o conhecimento e consentimento da aqui Recorrente (…), nem tão pouco resulta qual a afetação dada aos montantes alegadamente subtraídos pelo requerido (…), não se afigurando que a constância do matrimónio seja suficiente para extrair as conclusões no sentido em que o faz a Recorrida quanto à afetação dada aos valores alegadamente subtraídos pelo Requerido.

XIV.

Ora, é certo que no âmbito dos presentes autos, não se exerce a responsabilidade criminal, mas apenas a responsabilidade civil; no entanto, daí não resulta que os factos em questão passem a implicar responsabilidade meramente civil, o que, aliado ao facto de não se mostrar indiciado que o Recorrente (…) atuou em proveito comum do casal, demonstra indubitavelmente que nenhuma responsabilidade civil ou criminal pode ser assacada à aqui Recorrente (…).

XV.

Com efeito, dúvidas não subsistem que, no caso em concreto, o direito de crédito de que a Recorrente se arroga titular consubstancia-se no valor indemnizatório (ainda ilíquido) pelos alegados danos sofridos e emergentes da responsabilidade por factos ilícitos com relevância penal, em que se encontra incurso apenas o Recorrente (…), não se vislumbrando, assim, fundamento, de facto ou de direito, que...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT