Acórdão nº 03522/15.5BESNT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução10 de Março de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1. – Relatório Vem interposto recurso jurisdicional por Banco A…………, S.A., melhor sinalizado nos autos, visando a revogação da sentença de 19-12-2019, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou improcedente a impugnação que intentara contra os actos de autoliquidação da contribuição sobre o sector bancário prevista no regime aprovado pelo artigo 141.° da Lei n.° 55-A/2010, de 31 de Dezembro, e regulamentada pela Portaria n.°121/2011, de 30 de Março, consubstanciados nas declarações modelo 26 n.ºs26000003250, 26000005245 e 26000006403 relativas, respectivamente, aos anos de 2012, de 2013 e de 2014 e na qual peticionara o reembolso do valor global de €965.387,15, acrescido de juros indemnizatórios.

Irresignado, nas suas alegações, formulou o recorrente Banco A…………, SA.

as seguintes conclusões:

  1. O presente Recurso tem por objeto a Sentença proferida em 18 de dezembro de 2019 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, decisão que declarou a improcedência da impugnação judicial apresentada pela ora RECORRENTE e que, em consequência, manteve na ordem jurídica os atos - impugnados - de autoliquidação da contribuição sobre o setor bancário prevista no regime aprovado pelo artigo 141.° da Lei n.° 55- A/2010, de 31 de dezembro, e regulamentada pela Portaria n.° 121/2011, de 30 de março, consubstanciados nas declarações modelo 26 n.ºs 26000003250, 26000005245 e 26000006403 relativas, respetivamente, aos anos de 2012, de 2013 e de 2014.

  2. A Sentença recorrida padece do vício de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos previstos no artigo 125.° do Código de Procedimento e Processo Tributário e no artigo 615.°, n.° 1, alínea c), do Código de Processo Civil, em virtude de o Tribunal a quo não ter apreciado o vício de ilegalidade invocado pela ora RECORRENTE nos artigos 166.° a 195.° da sua p.i. de Impugnação Judicial, recortado em torno da circunstância de a Portaria n.° 121/2011, de 30 de março, encontrando-se subordinada ao regime aprovado pelo artigo 141.° da Lei n.° 55-A/2010, de 31 de dezembro, ser contraditória e, nessa medida, desconforme com esse regime regulamentado, devido à fixação — de forma totalmente inovadora - de taxas de tributação fixas e proporcionais, em vez de taxas variáveis e progressivas.

  3. Por seu turno, verifica-se que os vícios apreciados no acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo no processo n.° 20340/13 (para o qual o Tribunal a quo remeteu de forma exclusiva a sua fundamentação) apenas na sua aparência (i.e., numa formulação genérica e, nessa medida, necessariamente descaracterizante) correspondem aos vícios imputados pela RECORRENTE aos atos impugnados, já que os fundamentos de direito apreciados pelo Supremo Tribunal Administrativo naquela sede (e que mereceram, na sua globalidade, o juízo de improcedência que o Tribunal a quo entendeu dever replicar nestes autos) não coincidem com os fundamentos de direito concretamente invocados e aprofundados pela RECORRENTE nos presentes autos.

  4. Por esta razão, o Tribunal a quo encontrava-se legalmente impedido de fundamentar o juízo de improcedência que fez incidir sobre cada um dos vícios invocados pela ora RECORRENTE por exclusiva - e acrítica - remissão para a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Administrativo no processo n.° 02340/13, já que, nos termos do artigo 608.°, n.° 2, do Código de Processo Civil, se encontrava obrigado a «resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação».

  5. Acresce ao que antecede que a decisão por simples remissão apenas é admitida pelo ordenamento jurídico no âmbito de Acórdãos proferidos em sede recursiva e em que a respetiva decisão «não tenha sido impugnada, nem haja lugar a qualquer alteração da matéria de facto», conforme prescreve o atual artigo 663.°, n.° 6, do Código de Processo Civil (anterior artigo 713.°, n.° 5, do mesmo diploma), circunstâncias que não se verificam no caso vertente.

  6. Por conseguinte, encontrando-se o Tribunal a quo liminarmente impedido de fundamentar a sua decisão por exclusiva remissão (encontrando-se, ao invés, vinculado a apreciar fundamentadamente todos os vícios submetidos à sua apreciação nos termos e com os fundamentos invocados pela ora RECORRENTE, conforme imposto pelo artigo 608.°. n.° 2. do Código de Processo Civil), deve concluir-se que a Sentença recorrida, ao remeter a fundamentação dos juízos de improcedência concretamente formulados nos presentes autos para a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Administrativo no âmbito do processo n.° 02340/13, violou o disposto no artigo 205.°, n.° 1, da Constituição da República Portuguesa, devendo W. Excelências, em conformidade, promover a sua revogação.

  7. Sem prejuízo de o que fica exposto até ao presente momento impor a VV. Excelências a revogação da Sentença recorrida, a RECORRENTE não deixará de demonstrar de seguida os concretos erros de julgamento que ferem a Sentença recorrida na apreciação (ainda meramente remissiva) que fez das várias questões decidendas suscitadas pela RECORRENTE nos presentes autos, demonstrando a manifesta ilegalidade dos atos impugnados e, em consequência, a necessidade da sua anulação.

    1. Questão (A contribuição sobre o setor bancário deve ser qualificada, em termos jurídico-constitucionais, como uma contribuição financeira, conforme decidiu no passado este Supremo Tribunal e como assumiu o Tribunal a quo? Na hipótese de a contribuição sobre o setor bancário se encontrar sujeita ao regime jurídico-constitucional dos impostos, ter-se-á verificado uma violação do princípio da não retroatividade da lei fiscal determinativa da ilegalidade abstrata - e da consequente declaração de nulidade/anulação - dos vertentes atos de autoliquidação da contribuição sobre o setor bancário?) H) Neste domínio, verifica-se que o Tribunal a quo, aderindo ao entendimento firmado no acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo no processo n.° 02340/13, acabou por assumir e apontar à contribuição sobre o setor bancário a «natureza jurídica de contribuição financeira» (cf. p. 61 da Sentença recorrida). Todavia, como a RECORRENTE irá demonstrar de seguida, tanto aquela conclusão (assumida pelo Tribunal a quo), como a fundamentação utilizada pelo Supremo Tribunal Administrativo para a justificar, encontram-se erradamente fixadas, na medida em que a contribuição sobre o setor bancário deve ser perfilada como uma contribuição por maiores despesas que, à luz do sentido normativo do conceito de contribuições financeiras introduzido pela revisão constitucional de 1997, se deve considerar sujeita ao regime jurídico-constitucional dos impostos.

  8. Em face do teor da discussão realizada no seio da Comissão Eventual para a IV Revisão Constitucional, verifica-se que a redação que viria a ser introduzida, em 1997, na alínea i) do n.° 1 do artigo 168.° da CRP, resultou de uma proposta do grupo parlamentar do Partido Socialista apresentada com o seguinte objetivo: «a proposta explica-se por si: visa, em grande medida, alargar o elenco das matérias que são da competência exclusiva do Parlamento e, naturalmente, é uma extensão do regime geral da criação de impostos do sistema fiscal, que é já matéria da reserva da Assembleia, ao regime das taxas e demais contribuições financeiras a favor das entidades públicas, com o sentido de que o cidadão não pode ser objeto de um dever público sem que isso seja fixado em termos da matriz definida por lei da Assembleia da República» (cf.

    Diário da Assembleia da República, VII Legislatura, 2.

    a Sessão Legislativa (1996-1997), II Série-RC - Número 46, p. 1380).

  9. No referido contexto, observou-se, em particular, que «A expressão “contribuições financeiras” foi aquela que se encontrou para ser mais neutra, para não se falar em contribuições especiais, em contribuições parafiscais, que é aquilo a que a doutrina normalmente se refere: são as chamadas taxas dos antigos institutos de coordenação económica, as atuais chamadas taxas das comissões vitivinícolas regionais, ou seja, toda uma série de contribuições financeiras que não são taxas em sentido técnico mas que são contribuições criadas para e a favor de determinadas entidades reguladoras e para sustentar financeiramente as mesmas» (cf.

    Diário da Assembleia da República, VII Legislatura, 2.

    a Sessão Legislativa (1996-1997), II Série-RC - Número 46, p. 1381; destacado da Recorrente).

  10. Por seu turno, no debate parlamentar que antecedeu a aprovação da referida alteração normativa sublinhou-se, adicionalmente, que «Há um dédalo de taxas e de outros tipos de contribuições financeiras; como bem foi observado, não se quis tipificar os tipos de contribuições que estão abrangidas, mas a verdade é que são todas, isto é, são as contribuições financeiras que, sem terem caráter fiscal, sejam atribuídas ou beneficiem os cofres das entidades públicas de todos os tipos» (cf.

    Diário da Assembleia da República, VII Legislatura, 2.ª Sessão Legislativa (1996-1997), I Série - Número 101, Reunião Plenária de 24 de julho de 1997, p. 47; destacado da Recorrente).

  11. A alínea i) do n.° 1 do artigo 165.° da CRP, deverá continuar a ser lida à luz do seu preciso significado histórico, contextualizado pela intenção de acoplar ao regime das taxas as demais «contribuições financeiras que não são taxas em sentido técnico mas que são contribuições criadas para e a favor de determinadas entidades reguladoras e para sustentar financeiramente as mesmas», e tendo simultaneamente presente que algumas dessas contribuições, em particular as contribuições especiais de melhoria e de maiores despesas, se encontravam sujeitas, ab initio, ao regime dos impostos.

  12. A contribuição sobre o setor bancário é exigida com o duplo propósito de reforçar o esforço fiscal do setor financeiro e de mitigar o risco sistémico resultante do seu endividamento excessivo (o qual, a concretizar-se, será suscetível de provocar a...

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