Acórdão nº 4986/15.2T8LLE.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelMARIA DA GRAÇA TRIGO
Data da Resolução14 de Janeiro de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1. AA intentou a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra BB, CC e DD, pedindo a condenação dos RR.: a) A removerem os portões colocados na extrema da sua propriedade que dão acesso único à propriedade da A. e, consequentemente, a repor o muro como anteriormente ali existia; b) A absterem-se de comportamentos que ponham em causa o direito de propriedade da A. sobre os seus prédios identificados no artigo 1.º da petição inicial e a determinar que não invadam ou utilizem qualquer título os ditos prédios; c) A pagar à A. a quantia de € 26.256,00 (vinte e seis mil duzentos e cinquenta e seis euros) a título de danos patrimoniais e morais causados com as suas condutas.

Para o efeito alegou, em síntese: que os caminhos existentes no interior do seu prédio rústico foram abertos unicamente pelo seu avô; que tais caminhos são particulares, não sendo permitida a sua utilização pelos RR.; que o acesso aos seus prédios era unicamente pedonal e que o alargamento do caminho, realizado pelos RR., o foi à sua revelia; e ainda que a propriedade dos RR. se encontra vedada a toda a volta e o acesso à mesma se faz por outros lugares, não necessitando os RR. de utilizar o caminho que passa nos prédios da A., pelo que considera ilegítima a abertura do novo portão, realizada pelos RR. em 2015.

Os RR. contestaram, alegando que os caminhos referidos na petição inicial são públicos ou particulares, mas de utilização pública, e que os portões a que a A. se refere foram abertos pelos RR. para zona do seu próprio prédio e não para o interior do prédio da A., pelo que tal abertura foi lícita e deverá manter-se.

Mais alegaram que, desde inícios de 2015, a A. vem ocupando indevidamente uma faixa de terreno que pertence ao prédio dos RR., com cerca de 222,40 m2 de área e sita no lado poente do seu prédio, que confronta a poente com o prédio da A. e por todos os restantes lados com o prédio dos RR., de que faz parte, deduzindo reconvenção, pedindo que se reconheça a propriedade desta faixa de terreno, dela devendo abrir mão a A., livre e devoluta, e abstendo-se de praticar quaisquer actos sobre essa parcela de terreno.

A A. replicou, impugnando os factos articulados pelos RR. na sua reconvenção.

Em 11.11.2019 foi proferida sentença que julgou a acção improcedente, absolvendo os RR. dos pedidos e julgou igualmente improcedente o pedido reconvencional, dele absolvendo a A..

Desta decisão interpôs a A. recurso para o Tribunal da Relação de Évora, vindo a ser convidada, por despacho de 19.03.2020, a aperfeiçoar as conclusões do recurso de apelação.

Por requerimento de 13.04.2020, veio a A. apresentar novas conclusões.

Considerando que, no recurso relativo à decisão de direito, a apelante nem nas conclusões primitivas nem nas conclusões aperfeiçoadas menciona as normas jurídicas violadas e o sentido em que as mesmas devem ser interpretadas e aplicadas, conforme exigido pelo art. 639.º, n.º 2, alíneas a) e b), do Código de Processo Civil, decidiu a Relação, por acórdão de 21.05.2020, não conhecer do recurso nesta parte e apreciar apenas a impugnação da matéria de facto.

E, concluindo pela não alteração da decisão relativa à matéria de facto, julgou o recurso improcedente, mantendo a decisão recorrida.

  1. Vem a A. interpor recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, invocando a admissibilidade por via excepcional e formulando as seguintes conclusões: «1ª Por douto Acordão do 21/05/2020, o Tribunal da Relação de Évora, decidiu negar provimento ao recurso de apelação apresentado da sentença de primeira instância e nessa medida manteve a decisão recorrida.

    1. O Acordão Recorrido não está devidamente fundamentado, limitando-se a reproduzir a sentença, não fazendo, com o devido respeito qualquer análise crítica da mesma.

    2. Não analisa todas as conclusões das alegações inerentes à matéria de facto alegada, fazendo “tábua rasa” das mesmas; Assim, 4ª O Acordão recorrido não está devidamente fundamentado, pelo que, deverá ser anulado por falta de fundamentação, nos termos dos artigos 674º nº 1, al. a) e c) e 615º nº 1 al. b) do C.P.C..

    3. A falta de fundamentação gera a nulidade do Acordão.

    4. A exigência de fundamentação tem natureza imperativa e constitui um princípio geral consagrado no Art. 205º nº 1 da Constituição da República Portuguesa e que tem obrigatoriamente que ser observado nas decisões judiciais, estando este princípio consagrado no Art. 615º nº 1 al. b) do CPC, o qual com o devido respeito se entende ter sido violado. Deste modo, 7ª Entende-se que no douto Acordão foram violados os artigos 674º nº 1 als. a e c), 615º nº 1, al. b) do C.P.C. e 205º nº 1 da Constituição da República Portuguesa.

    5. Na análise da matéria de facto que diz respeito à questão de estarmos perante ou não de um caminho público, limita-se a reproduzir a sentença, não tendo em conta que para ser proferida uma decisão segura sobre esta matéria, deveria ter sido junto aos autos pelo Recorridos uma Certidão Camarária quanto à utilidade de tal caminho; 9ª No caso concreto dos autos, a prova testemunhal é insuficiente para o Tribunal decidir como decidiu.

    6. Estão em causa direito fundamentais, constitucionalmente consagrados e, o presente recurso é de particular relevância social, uma vez que está em causa o direito de propriedade (art. 62º da CRP) da Recorrente, que ao ser posto em causa apenas com base em prova testemunhal, vai criar insegurança aos cidadãos em geral, aos proprietários em especial e, consequentemente alarme social por se estar a por em causa um direito constitucionalmente consagrado e básico do Estado de Direito Democrático.

    7. O Tribunal da Relação não se pronunciou quanto às questões alegadas nos números 15 a 22 das conclusões, quando tinha obrigação de as conhecer por se tratarem de questões de matéria de facto, pelo que o Acordão é nulo nos termos do art. 615º,nº 1,alínea d) do Código do Processo Civil.

    8. Os poderes conferidos ao Tribunal da Relação demonstram que o julgamento que aí deve ser feito é tão amplo e abrangente quanto o da 1ª Instância (art. 662 do CPC).

    9. O Supremo Tribunal de Justiça, no seu Acórdão de 18 de Fevereiro de 2016 (Secção Social), declarou “que não se exige ao Recorrente, quando impugna o julgamento da matéria de facto, que reproduza exaustivamente nas conclusões da alegação de recurso, o alegado no corpo da mesma alegação;”.

    10. Tal facto, não implica o não conhecimento dos factos.

    11. Na realidade, o Tribunal da Relação abstêm-se de apreciar o mérito da apelação com fundamento no incumprimento do ónus da alegação, quando os factos constantes nos nºs 15 a 22 das conclusões são factos que dizem respeito a matéria de facto que está intimamente ligada à questão apreciada, se estamos perante caminho público ou privado.

    12. - Com o devido respeito pela opinião em contrário, não foi feita prova segura, objetiva e suficientemente forte por parte dos Recorridos para que se possa afirmar e provar que estamos perante caminho público.

    13. Tal prova só seria forte, suficiente e inabalável se os Recorridos tivessem junto aos autos, como lhes competia por ter sido pelos mesmos alegado, documento emitido e Certificado pela...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT