Acórdão nº 00352/17.3BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 22 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelPaulo Ferreira de Magalh
Data da Resolução22 de Janeiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I - RELATÓRIO O MUNICÍPIO DE (...), inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, datada de 06 de abril de 2020, pela qual foram julgados procedentes os pedidos deduzidos pela Autora a final da Petição inicial, tendo sido condenada a pagar-lhe [à Autora, ora Recorrida] a quantia de € 12 645,80 acrescida de juros de mora desde 23 de setembro de 2010 e até integral pagamento, em função da taxa fixada pelo Despacho Conjunto n.º 603/2004, de 16 de outubro, assim como condenada a considerar a obra como definitivamente recebida a 29 de agosto de 2015 e a restituir à Autora os décimos retidos no valor de € 4033,00, acrescidos de juros de mora desde 29 de agosto de 2015 e até integral pagamento, em função da mesma taxa, tendo ainda condenado o Réu, ora Recorrente, como litigante de má fé, fixando-lhe multa no valor de 5 UC’s e indemnização a pagar à Autora em igual valor.

*No âmbito das Alegações por si apresentadas [Cfr. fls. 174 dos autos, SITAF], elencou a final as conclusões que ora se reproduzem: “CONCLUSÕES 1. Os factos dados como provados sob os nº 2, 6 e 11 da decisão sobre a matéria de facto devem ser considerados como não provados nos termos do disposto nos artº 662º nº 1 e 2 CPC.

  1. A fundamentação para esta pretendida alteração reside no facto de os documentos nº 3 e 6 juntos com a p. i. terem sido impugnados pelo R. na sua contestação (no artº 54º da contestação).

  2. A sentença recorrida refere que o R. não impugnou esses documentos, o que não é verídico como o evidencia o artº 54º da contestação.

  3. A fundamentação para que a sentença recorrida julgasse como provados os factos nº 2, 6 e 11 reside exclusivamente nos documentos nº 3 e 6 junto com a p. i., pois nenhuma testemunha se pronunciou quanto à existência ou não do contrato escrito.

  4. A sentença recorrida ao dar como provada a existência de contrato escrito sobre os trabalhos a mais, constitui um juízo conclusivo que não se afigura, consentâneo com a realidade factual, pois se o contrato tivesse sido reduzido a escrito, a própria Autora teria em seu poder um exemplar.

  5. A Autora não alegou na p. i. que o contrato tivesse sido reduzido a escrito!!!! 7. Em nenhuma parte do articulado da Autora vem alegado que o contrato de trabalhos a mais tivesse sido reduzido a escrito.

  6. A Autora limitou-se a alegar no artº 6º da p. i. que por despacho da Presidente da Câmara Municipal de 6.05.2009 foram homologados trabalhos a mais no valor de 9.050,00 – doc nº 3.

  7. Ora esse documento nº 3 não constitui um contrato escrito, pois trata-se de um ofício que refere a homologação de trabalhos a mais e em lado nenhum desse ofício é referido que tenha sido reduzido a escrito esse contrato.

  8. Se a Autora não alega que o contrato de trabalhos a mais tivesse sido reduzido a escrito, limitando-se a remeter para o documento nº 3 junto com a p. i. e se o Réu alega que esse contrato não foi reduzido a escrito, e e se a Autora esse contrato escrito (deveria ter em seu poder um exemplar), tem que se concluir necessariamente que deve ser considerado como não provado que o contrato de trabalhos a mais não foi reduzido a escrito.

  9. Deste modo, é impossível, à míngua de prova documental que o contrato escrito exista.

  10. Tal contrato escrito nunca existiu, sendo certo que o mesmo apenas terá sido objecto de trato verbal, coisa que, aliás, nenhuma prova testemunhal mo confirmou.

  11. Ora o contrato em apreço e um contrato de natureza formal, pelo que, nos termos do disposto no artº 219º e 220º a inexistência de contrato reduzido a escrito acarreta a respectiva nulidade.

  12. IA legislação sempre determinou (o art. 26º, nº 1 do Decreto-Lei nº 405/93, de 10 de Dezembro, e artº 26º nº 7 do DL 55/99 e artº 375º CCP) a obrigatoriedade de redução a escrito de trabalhos a mais.

  13. Nesse sentido, não tendo os mesmos sido reduzidos a escrito entre Autora e Réu, nos termos da legislação citada (qualquer que tenha sido a data da sua realização) ocorre a nulidade formal relativa aos alegados trabalhos a mais realizados.

  14. A inexistência de contrato escrito é reconhecida e confessada pela Autora, que, aliás, se limita a invocar o ofício – documento nº 3 que junta com a p. i.

  15. A “perda” do processo administrativo pelo Réu, com a subsequente falta de junção do PA aos autos não resultou uma consequência para o Réu, nos termos do artigo 84º, nº 6 do CPTA, pois se o contrato de trabalhos a mais nunca foi reduzido a escrito, a junção ao processo judicial do PA nunca o poderia conter.

  16. Inexistem razões de facto ou de direito que sustentem a condenação do Réu como litigante de má fé.

  17. O Réu litigou e articulou factos na convicção de que os mesmos eram verdadeiros e convencido de que lhe assistia razão.

  18. O Réu não atuou com dolo ou com negligência grave, sabendo da falta de fundamento da sua pretensão, encontrando-se numa situação em que se lhe impunha que tivesse esse conhecimento.

  19. Não estão verificados os pressupostos da condenação do Réu como litigante de má fé, exigidos pelo artigo 542º, 1 e 2 do CPC.

  20. A sentença recorrida viola as disposições conjugadas do artigo 542º, 1 e 2 do CPC.

  21. A sentença recorrida viola o direito de defesa do Réu, consagrado no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa, implicando tal decisão um dever de não contestar a acção, de confessar os factos articulados pela Autora e ainda de só alegar factos que possa comprovar, o que é manifestamente inadmissível atendendo à circunstância de que o Réu estava absolutamente convencido da veracidade dos factos que alegou na contestação.

  22. A sentença recorrida deve ser anulada e improceder a acção.

Termos em que, Com o douto suprimento do omitido, deve ser concedido provimento ao presente recurso, anulando-se e revogando-se a sentença recorrida nos termos que vêm alegados, assim se fazendo JUSTIÇA.”**A Recorrida não apresentou Contra alegações.

**O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos.

**O Ministério Público junto deste Tribunal não emitiu parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional.

*** Com dispensa dos vistos legais, tendo para o efeito, nos termos do artigo 657.º, n.º 4 do CPC, sido obtida a concordância dos Meritíssimos Juízes Desembargadores Adjuntos [mas com envio prévio do projecto de Acórdão], cumpre apreciar e decidir.

*** II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas alegações - Cfr. artigos 144.º, n.º 1 do CPTA, e artigos 639.º e 635.º n.ºs 4 e 5, ambos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigos 1.º e 140.º, n.º 3 do CPTA [sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem deva conhecer oficiosamente], sendo que, de todo o modo, o Tribunal ad quem não se limita a cassar a decisão judicial recorrida pois que, ainda que a declare nula, sempre tem de decidir “… o objecto da causa, conhecendo do facto e do direito.” [Cfr. artigo 149.º, n.º 1 do CPTA], reunidos que estejam os necessários pressupostos e condições legalmente exigidas.

Assim, as questões suscitadas pelo Recorrente e patenteadas nas conclusões das suas Alegações resumem-se, em suma e a final, em apreciar e decidir sobre se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento em torno da matéria de facto [Cfr. conclusões 1 a 4 e 5 a 17 das Alegações], e bem assim, numa incorrecta interpretação dos factos e aplicação do direito [Cfr. conclusões 18 a 23 das Alegações].

** III - FUNDAMENTOS IIIi - DE FACTO No âmbito da factualidade considerada pela Sentença recorrida, dela consta o que por facilidade para aqui se extrai como segue: “[…] IV.1 – DE FACTO IV.1.1 – Factos Provados Com interesse para a decisão da causa consideram-se como provados os seguintes factos: 1) A entidade demandada adjudicou à autora a empreitada denominada por “Construções de muros no caminho agrícola de Cedões à Sardoeira, em (...)”, em 26.10.2008, pelo valor de € 43 210,00, mais IVA, tendo a obra sido consignada a 06.01.2009; Docs. 1 e 2 juntos com a p.i.

2) Por ofício de 02.07.2009, com a referência S/8427/2009, assinado pelo Presidente da Câmara Municipal de (...), o autor foi notificado que fora homologada a execução dos trabalhos a mais na empreitada referida, no montante de € 9050,00; Doc. 3 junto com a p.i.

3) Durante a execução da empreitada, a entidade demandada reteve décimos para garantia da boa execução da obra no valor total de € 4033,00; Docs. 7 e 8 juntos com a p.i.

4) A 20.07.2010, a obra foi recebida provisoriamente; Doc. 4 junto com a p.i.

5) A 22.07.2010, foi feita a medição geral dos trabalhos no valor de € 52 260,00, tendo resultado o valor ilíquido de € 11 930,00 a pagar à autora; Doc. 5 junto com a p.i.

6) A autora emitiu a fatura com o n.º 20100019, de 22.07.2010, no valor total de € 12 645,80, correspondendo € 11 930,00 ao preço base e € 713,80 a IVA, com vencimento a 22.09.2010; Doc. 6 junto com a p.i.

7) Que entregou nos serviços administrativos da entidade demandada; Depoimento de N.

8) Por requerimentos entregues nos serviços da entidade demandada a 18.07.2014 e 19.12.2014 a autora solicitou a liberação das cauções; Docs. 9 e 10 juntos com a p.i.

9) Por requerimento entregue nos serviços da entidade demandada a 29.07.2015 a autora solicitou a realização da receção definitiva, bem como o cancelamento da garantia bancária e a restituição dos décimos retidos; Doc. 11 juntos com a p.i.

10) Os trabalhos a mais referidos em 2) foram objeto de contrato escrito; 11) A fatura referida em 6) encontra-se por pagar.

IV.1.2 – Factos não provados Inexistem factos com interesse para a decisão da causa, que importe dar como não provados.

IV.1.3 – Fundamentação da matéria de facto A convicção do Tribunal baseou-se na análise dos documentos juntos aos autos. Os documentos em causa...

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