Acórdão nº 030/20.6BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 20 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelSUZANA TAVARES DA SILVA
Data da Resolução20 de Janeiro de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: I - Relatório 1 –A……… Portugal Lda., com os sinais dos autos, vem, nos termos dos artigos 25.º e 26.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), interpor recurso para a uniformização de jurisprudência para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo da decisão arbitral n° 321/2019-T, proferida em 5 de Fevereiro de 2020, pelo Cento de Arbitragem Administrativa, por considerar que esta decisão colide com o decidido no acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 14 de Março de 2018 (processo n.º 716/13), apresentando, para tanto, alegações que concluiu do seguinte modo: A. A decisão arbitral recorrida está em oposição com o acórdão do STA de 14 de Março de 2018, proferido no âmbito do processo n.º 0716/13.

B. A manifesta oposição do acórdão recorrido a este acórdão fundamento refere-se a uma questão essencial: o critério temporal para aferir da prevalência do princípio da justiça sobre o princípio da especialização dos exercícios.

C. No Acórdão de que ora se recorre, foi decidido que «não se verifica a alegada violação do princípio da justiça», por se ter considerado - no momento em que cometeu o erro, em 2016 - que a Recorrente ainda estava em tempo para deduzir reclamação graciosa contra o acto de autoliquidação referente ao exercício de 2013 e, dessa forma, imputar a esse exercício os benefícios fiscais em apreço (no fundo, ainda estava em tempo de observar o princípio da especialização dos exercícios).

D. Note-se porém que, de acordo com o Acórdão-fundamento, a prevalência do princípio da justiça face ao princípio da especialização dos exercícios deve ser aferida no momento em que o sujeito passivo tem conhecimento do erro que cometeu, ou seja, no momento em que a AT faz as correcções e não - tal como no Acórdão recorrido - no momento em que inadvertidamente viola o princípio da especialização dos exercícios. Resulta do exposto que o Acórdão recorrido e o Acórdão fundamento têm na sua base a mesma questão fundamental de direito, a saber, o critério para determinar a prevalência do princípio da justiça vs.

princípio da especialização de exercícios.

E. Acresce que os factos em ambos os Acórdãos são substancialmente idênticos: nos dois casos estão em causa contribuintes que, de modo não intencional e sem intuito doloso, deixaram de considerar gastos no ano a que os mesmos respeitam (1989, no Acórdão fundamento; 2011,2012 e 2013, no Acórdão recorrido) mas noutro exercício (2004, no Acórdão fundamento; 2014, no Acórdão recorrido).

F. Para além disso, os princípios que os referidos Acórdãos chamam à colação não se alteraram, nem a regulamentação que deles faz a ordem jurídica.

G. NÃO OBSTANTE, e por último, os dois acórdãos encontram-se em manifesta contradição: sendo certo que essa oposição não é colateral, ou implícita, nem se encontra restrita aos argumentos enformadores das decisões mencionadas; pelo contrário, é justamente a thema decidenda nos dois Acórdãos e que está na base das decisões pelos mesmos adoptadas.

H. Em suma, considerando o que ficou exposto, afigura-se notório que existe uma manifesta oposição entre o Acórdão recorrido e o Acórdão fundamento, razão pela qual deve o presente recurso ser considerado admissível.

  1. Caso o critério enformador adoptado pelo Tribunal Arbitral, no Acórdão recorrido, respeitasse a jurisprudência do STA, ter-se-ia concluído que, em 2018, quando a AT procedeu à correcção acima identificada, a Recorrente já não tinha meio de imputar os gastos em apreço ao exercício de 2013, o que teria determinado inevitavelmente a anulação da liquidação.

  2. DO PEDIDO Nestes termos, requer-se a V. Exas., ao abrigo do n.º 2 do artigo 25.º do RJAT e observado o regime do recurso regulado no artigo 152.º do CPTA aplicável ex vi n.º 3 do artigo 25.º do RJAT, a uniformização de jurisprudência, atenta a identidade da mesma questão fundamental de direito: Que seja fixado o entendimento do acórdão do STA de 14.03.2018, proferido no processo n.º 0716/13, relativamente ao critério temporal relevante para efeitos de aplicação do princípio da justiça sob o princípio da especialização de exercícios; esse critério deve corresponder não ao momento no qual o erro é cometido (e o gasto é imputado a um exercício incorrecto), mas àquele no qual o mesmo é detectado por via da correcção realizada pela AT.

    Mais se requer a V. Exas. que se dignem a determinar a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do n.º 7 do artigo 6.º do regulamento das custas processuais.

    2 - A recorrida, Autoridade Tributária, contra-alegou concluindo nos seguintes termos: 1. No presente recurso não se verificam os pressupostos, contemplados nos arts. 25º n° 2 do RJAT, 152° n° 2 do CPTA e 27° n° 1, al. b) do ETAF, que permitam a apreciação de recurso para uniformização de jurisprudência interposto por A………… Portugal, Ld.ª.

    1. Na verdade, não há, desde logo, identidade de situações de facto, ou seja, não há identidade substancial das situações fácticas, pressuposto necessário para que haja soluções diferentes quanto à interpretação da mesma questão de direito.

    2. Efectivamente, a circunstância de no Ac. recorrido os factos se reportarem a uma situação distinta, a da dedução à colecta de benefícios fiscais e da forma como se pode fazer o reporte dos benefícios não utilizados, da do Ac. fundamento em que estava em causa a consideração de custos, constituição de provisões para processos judiciais em curso, leva a que os Acórdãos, recorrido e fundamento, não perfilhem solução jurídica diferente quanto à mesma questão fundamental de direito.

    3. No Ac. fundamento o princípio da justiça foi considerado prevalecente sobre o princípio da especialização dos exercícios, porque "a seguir o entendimento da Fazenda Pública, no sentido de que a referida provisão haveria de ser criada desde 1989, no ano de 2009, em que a Administração Fiscal procedeu às correcções impugnadas, já a impugnante não poderia proceder à revisão da autoliquidação de 1989, por há muito estar ultrapassado o respectivo prazo para o fazer, vendo-se assim impossibilitada de efectuar a dedução desse custo em qualquer dos anos.

      Numa situação destas, em que não seja possível a "correcção simétrica”, por razões de tempestividade, a doutrina (Neste sentido Lei Geral Tributária Anotada, Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, 4a edição, Encontro da Escrita, pág. 454 e Rui Duarte Morais, ob. citada, pag. 70.) e a jurisprudência supracitadas vêem afirmando que o custo, ainda que indevidamente contabilizado, deve ser aceite, nomeadamente quando a respectiva imputação não tenha resultado de omissões voluntárias e intencionais, com vista a operar transferência de resultados entre exercícios.” 5. Pelo contrário, no Ac. recorrido entendeu-se que, com base no regime de benefícios fiscais do RFAI e "Relativamente aos períodos de tributação que estão em causa, no caso em análise (2011 a 2014), subsiste, por conseguinte, uma regra de imputação do benefício fiscal ao exercício em que ocorreu o investimento e que surge apenas mitigada pela possível repercussão das importâncias a deduzir nos exercícios seguintes, quando não seja possível deduzir integralmente o benefício no ano em que tenha sido realizado o investimento.” 6. E que, sendo esse o regime legal, a AT encontrava-se " igualmente vinculada ao princípio da legalidade (artigo 55.º da LGT)” não podendo "desrespeitar a previsão legal e, mormente, as normas de incidência dos benefícios fiscais, apenas podendo fazer intervir o princípio da justiça em situações de que possa dispor de alguma margem de livre apreciação. E, nesse condicionalismo, cabia ao sujeito passivo accionar os mecanismos procedimentais que permitissem uma reavaliação da situação fiscal por parte da Administração Tributária." 7. Ou seja, foi porque a AT estava legalmente vinculada às regras de atribuição do benefício que in casu se considerou que não havia violação do princípio da justiça, por a ele não poder recorrer a AT no caso em concreto.

    4. Ora, esta consideração, de um regime legal do benefício fiscal, tendo em conta o princípio da justiça, não foi nem poderia ter sido considerada no Ac. fundamento, por aqui não estar em causa a “periodização” de um benefício fiscal e nem o regime legal pelo qual essa mesma “periodização” se rege.

    5. Não tem, pois, a recorrente qualquer razão quando alega que Ac. recorrido e Ac. fundamento decidiram diferentemente quanto ao critério /momento para determinar a...

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