Acórdão nº 204/19.2SILSB-L1-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 20 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelANA PAULA GRANDVAUX
Data da Resolução20 de Janeiro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Lisboa I–RELATÓRIO: 1.–No processo abreviado nº 204/19.2SILSB, do Juízo de Pequena Criminalidade de Lisboa, Juiz 4, foi submetido a julgamento, o arguido RB_____, residente na Est... S..., n.°..., C.P. ....-..., A... - M... M..., acusado da prática em autoria material e na forma consumada de um crime de condução sem habilitação legal, p. p. pelo artigo 3° nºs 1 e 2 do Decreto-Lei n° 2/98, de 03.01.

2–A decisão do Tribunal judicial proferida no termo desse julgamento em 06.02.2020, determinou a absolvição do arguido, nos seguintes (transcritos) termos, que foram em súmula exarados em acta: Logo que findas as alegações, a Mm.a Juiz proferiu a sentença, oralmente, nos termos dos artigos 389°-A e 391°-F, ambos do Código de Processo Penal, introduzidas pelo artigo 2° da Lei n.° 26/2010, de 30 de Agosto, determinando-me que fizesse constar da acta o seguinte: Dispositivo (que, nos termos do artigo 389°-A, n° 3 do Código de Processo Penal, ditou): Pelo exposto, julgo improcedente, por não provada, a acusação pública deduzida pelo Ministério Público, a fls. 68 e ss, e, em consequência, decido absolver o arguido RB_____, do crime de condução sem habilitação legal que lhe vinha imputado.

Inexiste lugar a tributação, nos termos dos artigos 513.° e ss., a contrario, do Código de Processo Penal.

3–Inconformado com a decisão, dela recorreu o M.P na 1ª instância, tendo apresentado motivação, a qual termina com a formulação das seguintes (transcritas) conclusões: I)– Bem andou a sentença ao dar como provado, que: 1.- No dia 21 de Fevereiro de 2019, pelas 18H00, na Pª. C... D..., em L..., o arguido RB______ conduzia o veículo ligeiro de passageiros, Ford Fiesta de matrícula .

  1. - O arguido não era titular de carta de condução válida, apenas de uma “provisional driving license ”, emitida no Reino Unido, país onde fixara residência e onde pretendia regressar.

    II)– Mas, andou mal a sentença ao dar como não provado, que: - Inversamente, da discussão da prova não ficou demonstrado que o arguido, ao agir da forma descrita, tivesse noção de que não podia, que não lhe era permitido conduzir aquele veículo na via pública, que o documento em causa não o habilitasse a fazê-lo, ou que tivesse agido voluntária e conscientemente, com liberdade suficiente para se determinar, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.

    III)– Conjugada aos critérios da experiência comum, a livre apreciação do depoimento produzido na audiência de julgamento, nomeadamente quando conjugado aos elementos documentais analisados, impõe que seja dada como provada a demais factualidade veiculada na acusação.

    IV)– Nomeadamente, que: - O arguido não era titular de carta de condução válida ou de qualquer outro documento que o habilitasse a conduzir tal veículo na via pública.

    - Sabia que não lhe era permitido conduzir aquele veículo, na via pública ou equiparada, sem que tivesse documento próprio que legalmente o habilitasse para o efeito.

    - Agiu voluntária e conscientemente, tendo liberdade suficiente para se determinar, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.

    V)– Importando para tanto a adequada leitura do integral sentido do depoimento da testemunha, agente policial autuante, mormente no confronto do significado pelo mesmo efectivamente prestado à informação documental trazida aos autos e sobre a qual largamente se debruçou a sua inquirição, é capaz de conferir o devido cunho de valorização do respectivo contributo probatório, susceptível de conduzir à ultrapassagem da dúvida metódica erigida na asseverada manifestação de surpresa por banda do arguido por ocasião do culminar da operação de fiscalização policial.

    VI)– A documentação trazida versa procedimento de consulta da Direcção Nacional da PSP junto do (então) IMTT, todavia em Janeiro de 2009.

    Ocasião em que foi suscitado o pertinente esclarecimento junto dessa autoridade viária em virtude de ter sido então detectado tal tipo de documentos em áreas da responsabilidade da PSP. O que mereceu a cabal resposta, igualmente documentada, recortando claramente a falta de habilitação concernente à “Provisional Driving License”, no confronto distintivo da “Full Driver License” (Além de se advertir aí também, e desde logo, no sentido de se não confundir com as cartas de condução no período probatório).

    Clarificando as características daquela licença provisória, que, designadamente, mesmo no Reino Unido, além de todas as outras restrições, só consente a condução de veículos automóveis ligeiros na via pública ao titular se e quando se fizer acompanhar de condutor com mais de 21 anos de idade e titular de carta definitiva há mais de 3 anos (cfr fls 23).

    VII)– A testemunha descreveu linearmente o acto de condução na via pública por banda do arguido, esclarecendo assertivamente que o mesmo não estava acompanhado, só não conseguindo ser linear na clarificação da manifestação de surpresa atribuída à reacção do arguido. Sem deixar vislumbrar, todavia, qualquer sinal passível de merecer acolhimento a eventualidade de falta de isenção, tanto mais que foi quem desde cedo deu nota da manifestação de surpresa do arguido por ocasião da fiscalização, na esteira do apregoado desconhecimento quanto à falta de habilitação para conduzir em Portugal, já narrada no auto de notícia, por detenção.

    VIII)– O efectivo traço identificador do título invocado pelo arguido é o de se tratar de uma licença de aprendizagem. As explicações documentadas na consulta ao IMT feita pela PSP, distinguindo nitidamente a “Full Driver License” da “Provisional Driving License”, também as mais elementares pesquisas informativas na internet consentem a dilucidação da última sob esse traço de licença de aprendizagem, imbuída do particular sentido prático anglo-saxónico de o aprendiz poder fazer-se acompanhar de condutor encartado experiente, confrontada ao nosso sistema de aprendizagem onde a prática da condução só é permitida quando acompanhada (unicamente) do instrutor da escola de condução. E, conforme as sublinhadas palavras do seu transcrito depoimento, a testemunha também asseverou insistentemente ao tribunal que o arguido seguia só quando conduzia o veículo automóvel fiscalizado, não se fazia acompanhar de qualquer passageiro, e que, além do mais, mesmo no Reino Unido só poderia conduzir se acompanhado de condutor maior encartado.

    Circunstancialismo que aquele seguramente conhecia, inferência necessária, perspectivada também, pese timidamente, no depoimento da própria testemunha.

    Donde, revogando a douta sentença recorrida e substituindo-a por outra que julgue provada toda a matéria de facto da acusação e, consequentemente, determine a condenação do arguido pela prática do crime que lhe é imputado, V. Exas farão JUSTIÇA ! 4-Este recurso foi admitido por despacho proferido em 09.06.2020, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (fls 110).

    5-Devidamente notificado da admissão do recurso, o ilustre mandatário do arguido, nada disse.

    6-Nesta Relação de Lisboa, o Digno Procurador Geral Adjunto quando o processo lhe foi com vista, nos termos e para os efeitos do artº 416º /1 do C.P.P, emitiu o parecer de fls. 117, referindo apenas que acompanha a motivação do recurso interposto pelo M.P na 1ª Instância.

    7-Foi oportunamente cumprido o artº 417º/2 do C.P.P e não foi proferida qualquer resposta.

    8-Efectuado o exame preliminar e colhidos os vistos legais, foi o processo à conferência, cumprindo agora apreciar e decidir.

    *** II–Fundamentação 1-Delimitação do objecto do Recurso ou questões a decidir: Do artº 412º/1 do C.P.P resulta que são as conclusões da motivação que delimitam o objecto do recurso e consequentemente...

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