Acórdão nº 160/20.4PDVFX-B.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 10 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelGUILHERME CASTANHEIRA
Data da Resolução10 de Dezembro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa I. RELATÓRIO: No nuipc 160/20.4PDVFX-B.L1, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte, Juízo Local Criminal de Vila Franca de Xira - Juiz 2, foi proferido despacho judicial em 2020.09.16, pelo qual, na sequência de promoção do Ministério Público, se aplicou a AA, “além das obrigações decorrentes do T.I.R., as seguintes medidas: - Proibição de contactar, por qualquer meio, com a sua filha BB, nem frequentar os meios em que esta esteja, como a escola e na residência onde esta habita; - Obrigação de permanência na habitação com meios de vigilância eletrónica, sujeita a vigilância eletrónica, caso assim o arguido o consinta; - Prisão preventiva, até ao momento de se encontrarem reunidas as condições necessárias para aplicação da medida de obrigação de permanência na habitação com meios de vigilância eletrónica”.

Posteriormente, em 2020.10.08, e tendo o arguido dado “consentimento para aplicação da medida de obrigação de permanência na habitação, sujeita a fiscalização por meios electrónicos de controlo à distância” foi proferido despacho, pelo qual, e verificando-se “os requisitos de aplicação da medida na residência sita na ………………… São João dos Montes”, foi determinado que o arguido AA aguarde “os ulteriores termos do processo sujeito à obrigação de permanência na habitação sujeita a vigilância por meios eletrónicos”, devendo “permanecer na habitação sita na Rua ………….., São João dos Montes, 24 horas sobre 24 horas, não se podendo dela ausentar em caso algum sem expressa autorização do Tribunal”, desde logo ficando “autorizadas as saídas da habitação com vista a comparência a diligências policiais, judiciais ou junto do Ministério Público, para consultas ou tratamentos médicos e outras que se mostrem justificadas, desde que comunicadas antecipadamente à DGRSP e que por esta seja confirmada a necessidade de comparência, a inexistência de inconveniência grave à saída e se assegure a presença efetiva do arguido e a limitação da ausência às finalidades comunicadas e verificadas”, sendo ordenada a entrega de “mandados de libertação do arguido e condução do mesmo à morada acima indicada”.

* Inconformado com essa medida de coacção, interpôs AA o presente recurso, formulando em sustentação da respectiva pretensão as seguintes conclusões (transcrição): “1. Por douto despacho proferido em sede de Primeiro Interrogatório de Arguido detido, foi aplicada ao arguido/recorrente a medida de coacção de prisão preventiva seguida da obrigação de permanência na residência.

  1. Ora, salvo o devido respeito por opinião contrária, não pode o arguido/recorrente conformar-se com tal despacho.

  2. Considera ainda, o arguido/recorrente que o despacho recorrido violou o princípio da adequação, proporcionalidade, subsidiariedade e necessidade, disposto no art.º 193.º do C.P.P.

  3. Tendo por base o artigo 32.º n.º 2 da Constituição da República, segundo o qual todo o Arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação e atendendo ao normativo penal vigente é forçoso sublinhar o caracter excecional de uma medida de coação privativa da liberdade.

    5. Efetivamente, na senda da presunção de inocência se situam as disposições do artigo 27º e do artigo 28º da CRP e o Código de Processo Penal em vigor.

    6. De facto, estipula o art.º 27º da C.R.P. que, "Ninguém pode ser preso, ou estar privado da liberdade, senão em consequência de sentença condenatória ou de aplicação judicial de medida de segurança".

  4. Bem como, dispõe nº 2 do art.º 28º da C.R.P. "que a prisão preventiva tem natureza excecional, não sendo decretada nem mantida sempre que possa ser aplicada caução ou outra medida mais favorável prevista na lei".

  5. Para além desta natureza excecional, subsidiária e provisória das medidas de coação privativas da liberdade tais como a prisão preventiva, ou a obrigação de permanência na habitação prevista na Lei Fundamental, o C.P.P. consagra também, o Principio da legalidade, o Principio de adequação, o Principio da proporcionalidade e o Principio da subsidiariedade que devem ser respeitados e que transpõem que a só é de aplicar a prisão preventiva quando se mostrem inadequadas ou insuficientes as demais medidas de coação.

  6. Qualquer medida de coação que seja privativa da liberdade não tem em vista uma punição antecipada.

  7. A medida de obrigação de permanência na habitação mesmo nos casos do artigo 209.º do Código de Processo Penal, só é admissível quando se verificam os pressupostos do artigo 204º do Código de Processo Penal.

  8. Acresce que, algumas das restantes medidas de coação não se revelam insuficientes ou inadequadas a este caso concreto, sendo que a ressocialização do arguido requer a substituição da medida de coação aplicada, uma das previstas 12. Revela-se perfeitamente adequada e suficiente a aplicação das medidas de coação, de Termo Identidade e Residência ou Obrigação de Apresentação periódica, ainda que com a aplicação da obrigação de não contactar, por qualquer meio, com determinadas pessoas, ficando acauteladas as finalidades de prevenção geral e especial; 13. De facto, se as finalidades processuais visadas com a imposição de uma medida de coação, puderem ser acauteladas por uma outra medida menos gravosa, é esta que deve ser sempre aplicada, ainda que a prisão preventiva seja proporcional à gravidade do crime e às sanções que previsivelmente venham a ser aplicadas; 14. Os pressupostos enunciados para aplicação da medida de coação pelo ora despacho recorrido, inexistem.

  9. A menor à data da detenção já se encontrava a residir com o pai, inexistindo perigo de continuação da atividade criminosa.

  10. As proibições ou imposições de condutas eram suficientes para não existir perturbação do inquérito.

  11. A aplicação da medida em concreto não acautelou sequer a subsistência do agregado familiar, colocando em perigo os dependentes do arguido.

  12. Os indícios recolhidos não são suficientes para aplicação de uma medida tão grave que vise privar a liberdade do arguido.

  13. Mormente não foi averiguada a idoneidade da denunciante, ainda que menor; 20. Os indícios recolhidos electronicamente do telefone da denunciante podem ter sido manipulados.

  14. O arguido residia também com uma filha com 13 anos a seu cargo.

    22. Em virtude desta situação que injustamente foi alvo, foi obrigado a pedir uma alteração da guarda da sua filha para a sua mãe e avó materna da menor, processo que corre termos no Juiz 1 do Tribunal de Família e Menores de Vila Franca de Xira processo XXXX/12.9TBVFX, para poder salvaguardar a menor de vivenciar este processo que está injustamente a ser alvo o seu pai.

  15. A menor estava a seu cargo pois a mãe é toxicodependente e não tem capacidade de sustentar a sua filha.

  16. Nem sequer pagava a pensão que estava obrigada.

  17. É o arguido que providencia grande parte do sustento para o agregado familiar.

  18. A medida de coação aplicada faz perigar e ruir toda a sua vida financeira e familiar, deixando de poder trabalhar e prover sustento ao seu agregado familiar”.

    Termina por dever ser “a medida de coação aplicada obrigação de permanência na habitação substituída por uma medida não privativa da liberdade, tendo a possibilidade de ter acesso a uma defesa condigna e em liberdade.

    ” * Respondeu o Ministério Público ao recurso, formulando as seguintes conclusões (transcrição): “1 - O recorrente, apresentou nas suas conclusões, essencialmente, discordância face a tal despacho judicial por, no seu entender, não existirem indícios fortes da prática dos factos nesta fase e por considerar que bastaria, para acautelar as finalidades de prevenção geral e especial, face ao crime em causa, a aplicação ao arguido de T.I.R e a obrigação de não contactar, por qualquer meio, com determinadas pessoas uma vez que o arguido e a denunciante já não residiam juntos desde 11/9/2020 pelo que considera o recorrente, que ao lhe ser aplicada a medida de coação de obrigação de permanência na habitação, foram violados os princípios da adequação, proporcionalidade e necessidade, conforme os artigos 18º nº 2 da C.R.P e 193º do Código de Processo Penal.

    2 - Como recentemente referiu o Tribunal da Relação de Évora, no acórdão de 24/5/2018, relator João Amaro, disponível em www.dgsi.pt: "Deve considerar-se existirem "fortes indícios" da verificação do crime por parte de um arguido se puder concluir-se, com segurança, pela probabilidade elevada de a tal arguido, por força deles, vir a ser aplicada uma pena de prisão por esse mesmo tipo legal de crime. Ou seja, e em síntese, os "fortes indícios" significam o conjunto de elementos que, relacionados e conjugados, persuadem da culpabilidade do agente, fazendo nascer a convicção segura de que virá a ser condenado pelo crime que lhe é imputado." 3 - Considerando as declarações prestadas pela vítima BB, em mais de uma ocasião e neste momento ainda mais reforçadas porque já foi inquirida em sede de declarações para memória futura tendo confirmado, com credibilidade, emoção, pormenor e ressentimento, todos os factos imputados ao arguido, em conjugação com a prova documental junta aos autos e testemunhal até então produzida, concretamente as declarações de CC, progenitor da ofendida, e de DD, madrasta da mesma, é possível formular um juízo de forte indiciação em relação aos factos imputados ao ora recorrente pelo crime imputado.

    4 - Não se nos mostra credível, nesta fase enjugando tais provas, a versão apresentada pelo arguido AA, em sede de 1.º interrogatório judicial, onde refutou todos os factos a si imputados, negando a sua prática. A justificação para a denuncia da vítima em relatar tais factos por nunca ter aceite a sua relação com a mãe dela, visto pretender que os seus pais voltassem a estar juntos, não terá qualquer concretização na realidade, uma vez que foi a própria menor a referir que a relação com o ora arguido, até terem começado tais abusos era cordial, pelo que tais argumentos, e bem a nosso ver, não lograram convencer o...

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