Acórdão nº 82/07.4IDSTB-B.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 17 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelANA BRITO
Data da Resolução17 de Dezembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Criminal: 1.

No Processo Comum n.º 82/07.4IDSTB-B.E1, da Comarca de Setúbal, foi proferido despacho de revogação da suspensão da pena de um ano e seis meses de prisão, em que o arguido (…) fora condenado nos autos, pela prática de um crime continuado de fraude fiscal qualificada do artigo 104.º n.º 2 do RGIT. A suspensão da pena ficara condicionada ao “dever do arguido, no período da suspensão, efectuar e demonstrar a regularização/pagamento da importância de €226.015,50 de imposto de IRC, a acrescer de legais acréscimos”, pagamento que o arguido não efectuou.

Inconformado, recorreu o arguido, concluindo: “

  1. Vem o recurso interposto do douto despacho que decidiu revogar a suspensão da execução da pena.

  2. Dispõe o artigo 56°, n° 1, alínea a) do Código Penal que "A suspensão da execução da pena de prisão é revogada sempre que, no seu decurso o condenado infringir grosseira e repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos ou o plano individual de readaptação social".

  3. A violação grosseira de que fala o art. 56.°, n.° 1, al. a) do Código Penal, há-de ser uma indesculpável actuação, em que o comum dos cidadãos não incorre.

  4. Ora, resulta do depoimento do recorrente e, ainda dos documentos juntos aos autos, que a capacidade económica do recorrente tem sido insuficiente para satisfazer o pagamento do montante fixado, incumprimento todavia não adveniente de um comportamento relapso e desrespeitador da condenação, mas antes de uma situação económica que não foi querida nem sustentada pelo arguido e que ele, por razões conjunturais e alheias à sua vontade, não tem podido/ conseguido ultrapassar.

  5. Salvo o devido respeito, entende o recorrente haver logrado demonstrar, inequivocamente, mormente com prova de suporte documental, a sua situação de insuficiência e carência económica ao longo dos últimos anos.

  6. Por outro lado, conforme resulta dos documentos junto aos autos e do relatório social pela DGRSP, de fls. 1232-1234, o recorrente padece de vários problemas de saúde, como seja, problemas cardíacos, gota, Diabetes do Tipo 2, Insuficiência Renal Crónica, Hipertensão Arterial, Dislipidemia Mista, Obesidade Mórbida, Apneia do Sono (usa C-PAP -aparelho de ventilação por pressão positiva contínua) e Anemia Ferropenica.

  7. Acresce o facto do recorrente não possuir antecedentes criminais.

  8. Assim, o recorrente não cumpriu as condições de suspensão da pena determinadas nos presentes autos, por manifesta impossibilidade e sem qualquer culpa sua.

  9. O recorrente não infringiu grosseiramente, os deveres que lhe foram impostos.

  10. Desta forma, o tribunal recorrido violou o disposto no artigo 56°, n° 1, alínea a) do Código Penal por considerar que não se verificaram razões que determinem a alteração do juízo que havia formulado em sede de sentença, não se mostrando cumprida a condição de cuja verificação o tribunal fez depender a suspensão da execução da pena de prisão motivo pelo qual determinou a revogação da suspensão da execução da pena de 1 ano e 6 meses de prisão.

  11. Com efeito, deveria Mmo. Juiz a quo decidir não revogar a suspensão da execução da pena de prisão em que o recorrente foi condenado, e ao abrigo do disposto no arte 57.° n.° 1 do Código Penal, julgar extinta essa pena.

  12. Por outro lado, o disposto no artigo 56° n.º 1, al a) do Código Penal é claro ao prever que a suspensão da pena é revogada sempre que. no seu decurso, o condenado infringir grosseira e repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos.

  13. Ora, consta do despacho recorrido sob o título "Cumpre decidir" "Foi feita, em sede de sentença. a necessária indagação, tendo o Tribunal concluído estar o mesmo em condições de vir a cumprir, como condicionante da suspensão da pena, o pagamento de €226.015,50 (. . .). " N) Quer isto dizer que o Tribunal recorrido fundamentou a sua decisão revogatória com base na "indagação" formulada na sentença condenatória, a qual foi proferida antes do decurso do prazo da suspensão.

  14. Logo, o tribunal recorrido não cuidou, como lhe impunha o citado art. 495.°, n.° 2 do C.P.C, de coligir elementos de facto que lhe permitissem ajuizar se o arguido teve ou não possibilidades económicas para cumprir a obrigação e se, tendo-as, só a não cumpriu porque o não quis fazer, ou ainda, para poder ajuizar, se o incumprimento ocorreu porque o arguido dolosamente se colocou na situação de o não poder fazer.

  15. A decisão recorrida não apreciou a conduta do recorrente, nem elencou factos que justificassem a revogação da suspensão, pelo que violou o princípio da culpa, elemento estruturante do sistema penal português e explicitado, nomeadamente, no n.º 2 do art. 40° do C.P., cuja norma foi violada.

  16. Além disso, não tendo sido feita a prova de que o recorrente podia pagar as quantias devidas, não podia o Tribunal concluir pela existência de violação grosseira para os efeitos do artigo 56° n.º 1, al a) do Código Penal.

  17. Atenta a ausência de prova que permitisse censurar a conduta do arguido, deveria o Mmo. Juiz a quo ter ordenado a não revogação da suspensão da execução da pena de prisão em que o recorrente foi condenado, e ao abrigo do disposto no art. 57.° n.° 1 do Código Penal, julgado extinta essa pena.

  18. Por fim, considera o recorrente que o cumprimento da pena de prisão em que foi condenado nos presentes autos dificilmente satisfaria a almejada finalidade da ressocialização do arguido, podendo prejudicá-la.

  19. A simples ameaça da privação da liberdade que pendeu sobre o recorrente durante todo o período de suspensão da pena de prisão, de per si, cumpriram a finalidade da punição.

  20. Logo, o Tribunal recorrido violou o estatuído no disposto no artigo 56.°, n.º 1, alínea a), bem como, ademais, no artigo 57.°, n.º 1, do Código Penal.

  21. Atenta a ausência de prova que permitisse censurar a conduta do arguido, deveria Mmo. Juiz a quo ter ordenado a não revogação da suspensão da execução da pena de prisão em que o recorrente foi condenado, e ao abrigo do disposto no art. 57° n° 1 do Código Penal, julgado extinta essa pena.” O Ministério Público arguido respondeu ao recurso pronunciando-se no sentido da improcedência, e concluindo: “A decisão recorrida, que determinou a revogação da suspensão da execução da pena de prisão em que o recorrente foi condenado nestes autos, não se baseou num juízo automático, sustentado na constatação do não cumprimento da condição imposta em sede de sentença condenatória.

Com efeito...

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