Acórdão nº 2607/17.8T8BRG.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Novembro de 2020
Magistrado Responsável | CATARINA SERRA |
Data da Resolução | 26 de Novembro de 2020 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. RELATÓRIO 1.
Faria da Costa - peúgas e confecções, Lda.
, com sede na Rua de …, n.º …, freguesia de …, …, intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum contra Inês Oliveira & Filipe Silva, Lda.
, com sede na Travessa do …, n.º …, freguesia de …, …, e Rainha do Kako, Lda.
, com sede na Rua de …, s/n, freguesia de …, …, pedindo que: - se declare a autora legítima proprietária das frações autónomas “C” e “D” e legítima locatária financeira das frações autónomas “A” e “B”, descritas no registo predial sob o n.º 1…6 - …, com a composição referida no ponto 8.º da petição inicial; - se declare que o logradouro comum das frações “A”, “B”, “C” e “D” e a área comum das frações “B”, “C” e “D” descritas no registo predial sob o n.º 1…6 - Ucha, estão oneradas com uma servidão de passagem a favor da fracção “A”, descrita no registo predial sob o n.º 7…3 – …, de que a 1.ª ré é locatária financeira, fracção essa explorada pelas rés; - se declare que essa servidão tem o trajecto / extensão / limites referidos no ponto 40.º da petição inicial, com início na estrada nacional 205 e fim precisamente na entrada da fracção “A”, descrita no registo sob o n.º 7…3; - se condenem as rés por si, seus trabalhadores, clientes, fornecedores e quaisquer pessoas ou entidades que se desloquem às suas instalações no interesse destas, a respeitarem exactamente esse trajeto, não podendo imobilizar, depositar ou aparcar quaisquer veículos ou máquinas nessa servidão de passagem; - se condenem as rés a indemnizarem a autora por cada concreta e individual violação do modo de exercício da servidão de passagem, na quantia unitária de € 500,00 por cada violação que se verifique a partir da citação para a presente acção, seja por si, seja através dos seus trabalhadores, clientes, fornecedores e quaisquer pessoas ou entidades que se desloquem às suas instalações no seu interesse.
Alegou a autora, fundamentalmente, que: - através de escritura pública de constituição de propriedade horizontal outorgada em 8.09.2006, foi constituída a propriedade horizontal do prédio inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 472.º e descrito na C.R.P. sob o n.º 1…6-… (composta por quatro fracções autónomas e respectivas partes comuns), escritura na qual foi ainda reconhecida pelos respectivos outorgantes a existência de uma servidão de passagem a onerar esse prédio, a favor de um outro prédio contíguo descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 7…3-…, o qual por sua vez havia entretanto sido destacado daquele; - no tocante ao prédio descrito na C.R.P sob o n.º 1…6-…, as fracções “C” e “D” foram adquiridas pela autora através de escrituras públicas de 24.03.2017 e 19.01,2011, respectivamente, enquanto que as fracções “A” e “B” foram adquiridas em 8.08.2008 pelo “Banco Bilbao Vizcaya Argentaria (Portugal), S.A.”, o qual as deu de locação nesse mesmo dia à autora; - por sua vez, através de escritura pública outorgada em 19.01.2009, foi constituída a propriedade horizontal do já mencionado prédio descrito na C.R.P sob o n.º 7…3- … (composta por duas fracções autónomas e duas partes comuns de 103 m2 e 49 m2), tendo a fracção “A” sido vendida em 1 de Outubro de 2009 à “Caixa Leasing e Factoring – Instituição Financeira de Crédito, S.A.”, que por sua vez na mesma data a deu de locação à 1.ª ré que, juntamente com a 2.ª ré, ocupam a mesma.
- as rés têm exercido de forma abusiva o direito de servidão atrás referido, reconhecido na escritura de constituição da propriedade horizontal de 8.09.2006 pois a mesma destina-se apenas ao acesso entre a Estrada Nacional e a fracção “A”, locada à 1.ª ré e ocupada por ambas as rés, e estas últimas utilizam-na para imobilizar ou estacionar veículos automóveis, efetuar cargas e descargas, depositar materiais ou aí permanecer de qualquer outro modo, impedindo a autora de usufruir a área comum das 4 fracções onde se situa a servidão.
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As rés contestaram, alegando que: - a servidão engloba não só o acesso e passagem para a fracção locada à 1.ª ré mas também cargas e descargas de matérias-primas e produtos acabados, bem como paragem, estacionamento e manobras de veículos e máquinas, pois tal não pode ser efectuado senão por esse caminho de servidão, sob pena de inviabilidade da atividade industrial exercida na fracção; - a utilização pelas rés da servidão nesses moldes ocorre já desde 2007, altura em que a 1.ª ré começou a desenvolver a sua atividade na secção de pintura, existindo sinais visíveis e permanentes desde então dessa serventia, reconhecida e constituída por destinação do pai de família, embora apenas se tenha tornado efetiva quando houve a separação entre o prédio serviente e o prédio dominante.
Pedem a improcedência da acção e, em sede de reconvenção, que: - se declare que se acha constituída a favor do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, sito no lugar de …, da freguesia da …, do concelho de …, descrito na C.R.P. de …sob o n.º 7…3/… e inscrito na matriz respectiva sob o artigo 876, por destinação de pai de família, um direito de servidão para acesso, a partir da Estrada Nacional …, de pessoas, veículos automóveis e máquinas de diversos tipos e para cargas e descargas de matérias primas e produtos acabados e para paragem, estacionamento e manobras de veículos automóveis e máquinas no espaço identificado no artigo 13.º da contestação / reconvenção, que onera o prédio, em regime de propriedade horizontal, identificado no artigo 69.º do mesmo articulado; - a autora / reconvinda seja condenada a tal reconhecer e a abster-se de, por qualquer forma, criar quaisquer obstáculos ao livre exercício de tal servidão.
A autora apresentou réplica a fls. 106, impugnando a factualidade alegada pelas rés respeitante à constituição da servidão por destinação do pai de família, alegando que as mesmas alteraram indevidamente o projeto inicial, tendo construído na área destinada a logradouro do seu prédio e impedindo, dessa forma que as cargas e descargas, manobras e parqueamento se fizessem nesse local.
Na sequência de convite do tribunal (despacho de 7.11.2017 - fls. 146 a 148), a autora a fls. 149 a 151 deduziu incidente de intervenção principal provocada de “Banco Bilbao Vizcaya Argentaria (Portugal), S.A.” e de “Caixa Leasing e Factoring – Instituição Financeira de Crédito, S.A.”.
Admitida a intervenção das mesmas (fls. 154 e 155) apresentaram os seus próprios articulados a fls. 159 e fls. 173 referindo que: - “Banco Bilbao…” – desconhece os factos em causa nos autos; - “Caixa Leasing…” – confirma o contrato de locação financeira que celebrou com a 1.ª ré e que a servidão em causa tem de englobar cargas e descargas de produtos e paragem / estacionamento de máquinas e veículos, devendo a acção ser julgada como apresentado pela 1.ª ré.
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Em 1.03.2018 (fls. 182 e 183), as rés / reconvintes ampliaram o pedido reconvencional inicialmente deduzido (que retificaram por requerimento de 15-03-2018), aditando os seguintes pedidos: - se declare que o tempo e o modo do exercício da servidão cuja declaração se peticiona sob a al. a) é o que vem referenciado nos arts. 3.º, 4.º e 5.º desse requerimento; - a autora seja condenada a tal reconhecer como ínsito ao direito de servidão cujo reconhecimento se pretende e, consequentemente, a manter desligado e levantado o aludido portão / barreira, de modo a continuar a permitir o livre acesso à fracção “A” da ré / reconvinte assim lhe permitindo usufruir plenamente todas as utilidades decorrentes da mesma servidão.
A autora opôs-se a essa ampliação do pedido conforme fls. 185 e 186 do processo físico.
A fls. 195 a 198 foi admitida a ampliação do pedido requerida pelas rés / reconvintes, tendo sido proferido despacho saneador e despacho de fixação do objecto do litígio e de enunciação dos temas da prova.
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As rés em 27.11.2018, a fls. 246 e 247, vieram requerer a junção aos autos de uma nova planta, em substituição da anteriormente apresentada com a contestação, pretendendo que todas as referências feitas nesse articulado para esta última passem a considerar-se feitas para aquela, pretensão que teve a oposição da Autora (fls. 250 e 251).
Por despacho de 18.02.2019 foi considerado que se estava perante um novo requerimento de ampliação do pedido reconvencional, ampliação que foi admitida, tendo sido determinado que passe a constar na parte final do artigo 13.º da contestação / reconvenção (para o qual remete o pedido reconvencional) “…tracejado rosa na planta junta em 27.11.2018 (fls. 247-vº do processo físico).”.
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Procedeu-se a julgamento e, em 8.05.2019, foi proferida sentença em que se decidiu: “IV - Por tudo o exposto, decide-se: a) julgar a acção parcialmente procedente e, em consequência: - declarar a autora proprietária das frações autónomas “C” e “D” e locatária financeira das frações autónomas “A” e “B”, que integral o prédio descritos na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 1…6 - …, com a composição referida no ponto 8º da petição inicial; - absolver as Rés do restante pedido.
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julgar a reconvenção totalmente procedente e, em consequência: - declarar que se acha constituída a favor do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, sito no lugar de …, da freguesia da …, do concelho de …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 7…3/… e inscrito na matriz respectiva sob o artigo 876º, por destinação do pai de família, um direito de servidão para acesso, a partir da Estrada Nacional …, de pessoas, veículos automóveis e máquinas de diversos tipos e para cargas e descargas de matérias primas e produtos acabados e, ainda, para paragem, estacionamento e manobras de veículos automóveis e máquinas no espaço comum identificado a tracejado rosa na planta junta em 27-11-2018 (a fls. 247-vº do processo físico), que onera o prédio, em regime de propriedade horizontal, identificado no art. 69º da contestação; - condenar a Autora a tal reconhecer e a abster-se de, por qualquer...
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