Acórdão nº 393/12.7TBAGH-B.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 24 de Novembro de 2020
Magistrado Responsável | MARIA ADELAIDE DOMINGOS |
Data da Resolução | 24 de Novembro de 2020 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam na 1.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa I – RELATÓRIO Na reclamação de créditos tramitada no Apenso B do processo de insolvência onde foi decretada a insolvência de I… COMBUSTÍVEIS, LDA, a credora reclamante CEPSA – PORTUGUESA PETRÓLEOS, SA, deduziu impugnação à lista de créditos reconhecidos e não reconhecidos (requerimento de 28-09-2012 - Ref.ª Citius 11187955- fls. 64-92), invocando que o crédito por si reclamado, no montante de €35.321,48, a título de capital e juros vencidos até à declaração de insolvência, com natureza comum, e juros vincendos desde então, com natureza subordinada, foi indevidamente excluído da lista dos créditos reconhecidos.
Alegou que o crédito reclamado encontra-se titulado pela fatura n.º 5110013162, de 31-12-2011, no valor de €450.874,34 (doc. fls. 76-82); valor que se encontra pago parcialmente, encontrando-se em dívida o valor reclamado.
A insolvente respondeu à impugnação através do requerimento de 04-10-2012 (Ref.ª Citius 11240170- fls. 126-142) invocando que pagou integralmente o crédito reclamado.
Alegou concretamente que a fatura n.º 5110013162, de 31-12-2011, no valor de €450.874,34 junta com a reclamação da CEPSA, foi paga antes de ser decretada a insolvência através da execução de garantias bancárias a benefício da impugnante.
Juntou um documento – balancete detalhado – para comprovação do alegado (doc. fls. 128-141).
No despacho saneador (Ref.ª 49080811 – fls. 487-491), em relação à impugnação da CEPSA foi definido o objeto do litígio como «o reconhecimento do crédito de CEPSA- Portuguesa Petróleos, S.A. sobre a I… Combustíveis, S.A., no valor total de €38.754,12» e como tema de prova «apurar o cumprimento contratual pela devedora I.. Combustíveis, S.A. mediante a execução de garantias bancárias prestadas a favor da CEPSA – Portuguesa Petróleos, S.A.».
Em 23-07-2020, foi proferida sentença (Ref.ª 49953841 – fls. 521-534) que julgou parcialmente procedente a impugnação, nos seguintes termos: «
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Reconheço ao Credor CEPSA – Portuguesa Petróleos, S.A., um crédito com natureza comum no valor de € 16.678,83 de capital, acrescido de juros de mora calculados à taxa legal aplicável aos créditos de que sejam titulares empresas comerciais desde 31 de janeiro de 2012 e até 26 de abril de 2012, com natureza comum, e vencidos e vincendos desde então e até efetivo e integral pagamento, com natureza subordinada.
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Determino que os créditos reconhecidos sejam pagos conjuntamente com os da mesma natureza e de acordo com os critérios estabelecidos no plano de insolvência homologado.» Inconformada, a insolvente I… – …COMBUSTÍVEIS, LDA interpôs recurso de apelação apresentando as seguintes CONCLUSÕES: 1. A impugnante não alegou que o valor total da dívida da insolvente à data da execução das garantias bancárias fosse superior a 3 000 000,00 €.
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Não alegou que, após a execução das garantias bancárias, ficassem em dívida 35 321,48 €.
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Não alegou a existência de outras facturas de capital em dívida nos valores de 67,69 €, 726,96 €, 7 643,00 € e 10 205,00 €.
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Não alegou a existência de uma suposta factura de juros moratórios, muito menos qual o seu valor, calculado sobre que capital (o capital da factura em causa, ou outro?), nem desde quando, nem qual o seu fundamento, contratual ou legal.
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Sem que nada disso tivesse sido alegado, a douta sentença recorrida tomou em consideração que, à data da execução das garantias bancárias, a dívida da insolvente era superior a 3 000 000,00 € e que, após a execução das garantias, ficou ainda por pagar um valor de 35 321,48 €, repartidos por quatro facturas de capital e uma de juros moratórios.
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Tais factos eram tão essenciais que a própria sentença o reconhece quando afirma (e bem) serem os mesmos de “grande relevância na solução dos autos”.
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Tomar tudo isso em consideração como factos a partir dos quais se decide a causa, com base apenas nas declarações prestadas por uma testemunha, na mais absoluta ausência de alegação dos mesmos, implica necessariamente relegar todos esses pressupostos de facto para a categoria de meros factos instrumentais, apesar de necessários à caracterização da causa de pedir e de reconhecidamente decisivos.
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A douta sentença recorrida procedeu, assim, a um indirecto suprimento do ónus de alegação previsto pelo nº 1 do art. 5º do CPC.
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Na falta de alegação de que a dívida total da insolvente, à data da execução das garantias bancárias, era superior ao valor liquidado de 3 000 000,00 € e que, após a execução das garantias, quedou por satisfazer o valor de 35 321,48 € repartido por quatro facturas de capital e uma de juros moratórios, a outra conclusão não poderia chegar a douta sentença que não fosse a de dar por provado o pagamento integral da factura em causa – com base no doc. de fls. 128 e ss. e no depoimento da testemunha arrolada pela insolvente – e julgar improcedente a impugnação deduzida.
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A douta sentença recorrida violou o disposto no nº 1 do art. 5º do CPC e encontra-se ferida de nulidade nos termos das alíneas d) e e) do nº 1 do art. 615º do CPC, devendo ser o presente recurso julgado procedente e a douta sentença recorrida revogada.
Foi apresentada resposta ao recurso pela credora reclamante defendendo a improcedência do recurso (Ref.ª Citius 36331808).
O recurso foi admitido por despacho de 22-09-2020 (Ref.ª Citius 50198129), tendo o Tribunal a quo emitido pronúncia nos termos do artigo 617.º, n.º 1, do CPC, no sentido da não verificação das arguidas nulidades da sentença.
Foram colhidos os vistos.
II- FUNDAMENTAÇÃO A- Objeto do recurso Delimitado o objeto do recurso pelas conclusões apresentadas, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso e daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras (artigos 635.º, n.ºs 3 e 4, 639.º, n.º 1 e 608.º, n.º 2, do Código de Processo Civil -CPC), não estando o tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito (artigo 5.º, n.º 3, do CPC), a questão essencial a apreciar é saber se a sentença recorrida violou o artigo 5.º, n.º 1, e 615.º, n.º 1, alíneas d) e e), do CPC.
B- De Facto A 1.ª instância deu como provada a seguinte factualidade: FACTOS PROVADOS 1. A Reclamante é uma sociedade comercial que se dedica à atividade de comercialização de combustíveis, óleos, lubrificantes e produtos similares.
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No exercício da sua atividade, a Reclamante estabeleceu com a Insolvente relações comerciais, mediante as quais lhe forneceu produtos do seu comércio por esta recebidos e aceites, que constam na fatura n.º 5111013162 [junta a fls. 76 e ss. e aqui dada por integralmente reproduzida], emitida em 31 de dezembro de 2011 e vencida em 31 de janeiro de 2012, no montante total de € 450.874,34.
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Mediante a execução de garantias bancárias prestadas a favor da Reclamante foi liquidado por conta do valor total aludido no ponto 2, o valor de € 434.195,51.
FACTOS NÃO PROVADOS
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Que a execução das garantias bancárias referidas no ponto 3 dos factos provados permitiu a satisfação total no montante referido no ponto 2 dos factos provados.
C- De Direito Como supra enunciado a...
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