Acórdão nº 223/20.6TELSB-B.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 24 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelJORGE GONÇALVES
Data da Resolução24 de Novembro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, na 5.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: I – Relatório 1.

Nos autos com o NUIPC n.º 223/20.6TELSB 88/13.4TELSB foi proferido despacho em 27/04/2020 pela Mm.ª Juíza de Instrução Criminal (JIC) do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa (TIC de Lisboa), que declarou o TIC de Lisboa competente para a prática de actos jurisdicionais no decurso dos presentes autos, e não o Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC), e bem assim julgou não verificada a irregularidade do despacho judicial proferido a 06/04/2020, a fls. 343 dos autos principais e que corresponde a fls. 120 do presente Apenso, vício esse que foi suscitado pela ora recorrente por, no seu entender, não se encontrar tal despacho devidamente fundamentado.

  1. Recorreu EOGB.V., melhor identificada nos autos, do referido despacho de 27 de Abril, finalizando a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição): I. Atento o facto dos factos - atualmente conhecidos - em investigação nos presentes autos estarem relacionados com pessoas e entidades sem residência ou sede no Território Nacional, em concreto (e tanto quanto consta de pronúncia do Ministério Público) relacionados com atos ocorridos em Angola, a competência para a tramitação dos presentes autos cabe ao Tribunal Central de instrução Criminal.

    1. A teleologia do constante no artigo 120.º, n.º 1, da Lei 62/2013, de 26 de agosto é, salvo melhor entendimento, no sentido de conferir, nestes casos (em que há atos praticados no estrangeiro), a competência ao Tribunal Central de Instrução Criminal, razão pela qual a tramitação no Tribunal a quo constitui nulidade, nos termos do disposto no artigo 119.º alínea e), do Código de Processo Penal, artigo 32.º, n.º 1, do Código de Processo Penal e artigos 119.º, n.º1 e 120.º, n.º1, alíneas e) e k) da Lei 62/2013, de 26 de agosto.

    2. O despacho proferido no dia 6 de abril de 2020, que não autoriza o pagamento de despesas requeridas pela recorrente, está ferido de irregularidade, invocada em tempo (artigo 123.º e 97.°, n.º1, alínea b), todos do Código de Processo Penal) uma vez que remete, de forma acrítica, sem qualquer real, efetiva e aprofundada ponderação as questões constantes de pronúncia por parte do Ministério Público do dia 3 de abril de 2020.

      IV. Por outro lado, o despacho proferido a fls. 554 e seguintes, quanto à suscitada irregularidade, remete igualmente in totum para a fundamentação apresentada pelo Ministério Público.

    3. Nesta fundamentação, constante de fls. 543 e seguintes (para onde o Tribunal a quo novamente remete acriticamente, o que não é admissível atento o requerido - e perante o alegado), procede-se a uma nova fundamentação que não constava no primeiro despacho de 6 de abril de 2020, pelo que se acaba por admitir a arguida falta de fundamentação.

      VI. As razões pelas quais não se autoriza o desbloqueio da (única) conta bancária detida pela recorrente, sejam as relativas ao primeiro despacho, sejam as constante do segundo despacho (em ambos os casos, com remissão acrítica para o exposto pelo Ministério Público) são totalmente improcedentes, impedindo o regular funcionamento da recorrente e causando, com o impedimento de pagamento de honorários e despesas devidas a Tribunal Arbitral, enormes prejuízos, mesmo que a razão desses pagamentos tenha tido origem em circunstâncias e processos iniciados antes do bloqueio da conta bancária em curso.

    4. À ora recorrente não é possível, nesta fase, apresentar qualquer pedido de alteração ou revogação da medida atento o facto de não lhe ser facultado o acesso aos autos e, ainda, devido ao facto do despacho que ordenou o bloqueio da conta bancária só ter sido, agora, notificado (ultrapassando largamente o prazo constante do artigo 49.º, n.º 3, da Lei 83/2017, de 18 de agosto), para além de tal despacho remeter (também ele) para a posição e promoção do Ministério Público cuja cópia não foi ainda facultada (apesar de requerida no dia 29 de abril de 2020).

    5. É absolutamente irrelevante o grau de riqueza que o(s) acionista(s) da ora recorrente possa(m) ter uma vez que a mesma tem conta bancária com montantes suficientes para fazer face aos pedidos de pagamento requeridos, não sendo exigível que o(s) alegado(s) acionista(s) se substitua(m) à sociedade in casu, operando-se uma ilegal desconsideração da pessoa coletiva.

    6. Por outro lado, como é do conhecimento funcional do Ministério Público (que alega a circunstância acima indicada), mesmo as contas do(s) alegado(s) acionista(s) encontram-se bloqueadas, pelo que seria objetivamente impossível fazer face a tais pagamentos.

    7. A ora recorrente, ao contrário do que é sugerido pelo Ministério Público, não tem qualquer outra conta bancária, seja onde for, para além da conta arrestada à ordem dos presentes autos.

    8. Não é consonante com um Estado de Direito Democrático afirmar o contrário, nem pode ser considerado um facto que por ser, a ora recorrente, sociedade estrangeira, tem necessariamente de ter contas noutra jurisdição para além da Portuguesa (o que não é verdade).

    9. É absolutamente ilegal entender que apenas poderão ser considerados interesses muito ponderosos pagamentos de salários a trabalhadores Portugueses, Autoridade Tributária Portuguesa e Segurança Social Portuguesa, em clara violação do disposto no artigo 13.°, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.

      XlII. É ilegal considerar que o tipo de despesas cujo pagamento se requereu (nomeadamente honorários a advogado numa Arbitragem Internacional e despesas a pagar a esse mesmo Tribunal Arbitral) não permite despacho de deferimento das mesmas.

    10. É ilegal considerar, sem mais, que o valor das despesas apresentadas (aliás, normal no tipo de arbitragem em causa cuja explicação foi fornecida e documentada após pedido do Ministério Público), não permite o seu deferimento.

    11. Entender que não são admissíveis os pagamentos, no âmbito de um litígio existente (aliás, existente ANTES de ter tido conhecimento ou ser decretado o bloqueio de contas), de honorários devidos a Advogados (estrangeiros) por representação de pessoa coletiva e seu patrocínio, bem como despesas devidas a um Tribunal Arbitral, viola o disposto no artigo 12.º, n.º 2; 13.°, n.º 1 e 2 (na perspetiva de eventual discriminação dos Advogados serem Portugueses ou Estrangeiros); 16.°, n.º 2; 20.°, n.º 1, 2, 4 e 5 - com consequência da sua violação constante no artigo 22.° -, todos da Constituição da República Portuguesa, e ainda o disposto no artigo 6.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos Humanos.

    12. Por outro lado, o não deferimento de tais pagamentos tem como consequência a violação do disposto no artigo 22.° da Constituição de República Portuguesa.

    13. Sendo que, para além disso, a disputa existente é entre a ora recorrente e uma empresa da SL, E.P., a SG, que é precisamente invocada na fundamentação apresentada pelo Ministério Público, mais concretamente a fls. 546, consubstanciando o despacho de indeferimento numa vantagem inadmissível da SL, E.P., em virtude de poder vir a ter vencimento, que não de mérito, numa Arbitragem Internacional por via do não pagamento quer do patrocínio garantido à ora recorrente, quer das despesas normais num Tribunal Arbitral.

    14. A decisão de não autorização de pagamentos requeridos e documentalmente demonstrados viola o disposto no artigo 49.°, n.º 5, da Lei 83/2017, de 18 de agosto, ao não considerar os motivos alegados como atendíveis, pelo que deve, assim, ser revogada e alterada por outra que os autorize atento o supra exposto e as consequências que daí advêm.

      Termos em que a) Deve ser declarada a incompetência do Tribunal a quo e declarado competente o Tribunal Central de Instrução Criminal para a tramitação dos presentes autos; b) Deve ser declarada a irregularidade dos despachos proferidos nos dias 6 de abril de 2020 e dia 27 de abril de 2020, por vício de falta de fundamentação ao remeter, in totum, e sem real e efetiva ponderação, para os argumentos apresentados pelo Ministério Público; c) Deve o pedido de autorização de pagamentos ser deferido, substituindo-se o(s) despacho(s) que os indeferiram, por outro que os autorize, por violação do disposto no artigo 49.°, n.º 5, da Lei 83/2017, de 18 de agosto, evitando-se prejuízos...

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