Acórdão nº 00090/15.1BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 13 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução13 de Novembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I. RELATÓRIO 1.1.

  1. e I.

, ambos residentes na Rua (…), (…), instauraram a presente ação administrativa especial contra a CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, I.P.

, com sede na Avenida (…), (…), formulando os seguintes pedidos: a) que seja decretada a anulabilidade do ato administrativo impugnado – a decisão da R. de 27/10/2014, que atribuiu a cada um dos AA. uma pensão de sobrevivência no valor de € 81,59 e de € 81,54 –, com fundamento em ilegalidade na aplicação dos pressupostos legais à situação de facto; b) que a R. seja condenada à prática do ato legalmente devido, no sentido de atribuir aos AA. uma pensão de sobrevivência calculada com base em 60% do valor da pensão de velhice a que o falecido pai dos AA. tinha direito; c) consequentemente, que a R. seja condenada a proceder à devolução aos AA. da diferença entre o valor da pensão de sobrevivência a que têm direito e o valor que lhes tem sido indevidamente pago, com efeitos à data do óbito e até que venha a ser alterado o valor da pensão nos termos ora peticionados.

Indicam, como contrainteressada, C., residente na Estrada (…), (…).

Alegaram, para tanto, em síntese, que são filhos de A. e R., os quais nunca foram casados entre si; O pai de ambos era funcionário da Câmara Municipal de Coimbra, tendo passado a auferir, com efeitos a partir de junho de 2014, uma pensão de reforma da Caixa Geral de Aposentações, ora R.; Em 31/07/2014, o pai veio a falecer, no estado de solteiro, tendo sido requerida, na qualidade de herdeiros, a atribuição aos AA., à data menores, de uma pensão de sobrevivência unificada; Por despacho de 27/10/2014, foi atribuída a cada um dos AA. uma pensão de sobrevivência nos valores, respetivamente, de € 81,54 e de € 81,59, correspondente a uma percentagem de 16,66% e 16,67% do montante global da pensão a atribuir aos herdeiros, no valor de € 489,44, já que a R. considerou que os AA. concorriam com cônjuge ou ex-cônjuge de seu pai, razão pela qual lhes foi atribuída uma percentagem de 30% da pensão do contribuinte falecido; Porém, o pai dos AA., sendo solteiro, não vivia em união de facto com quem quer que fosse, presumindo aqueles que a pessoa a quem foi atribuída uma percentagem de 60% da pensão de velhice do seu pai seja a contrainteressada, na medida em que, nos últimos tempos, ambos partilhavam a mesma residência; O seu pai não vivia, à data da sua morte, em situação análoga à dos cônjuges com a contrainteressada, não vivia com ela como se de marido e mulher se tratasse, não viviam em comunhão de mesa nem de leito, faziam vidas separadas, dormindo cada um no seu quarto, e partilhavam única e exclusivamente as despesas com a habitação de que ambos usufruíam, mas sem qualquer grau de convivência e relacionamento análogo ao dos cônjuges; Por isso, o despacho da R. de 27/10/2014 é ilegal, uma vez que aplicou, erradamente, os critérios legais à situação de facto apurada, porquanto os AA. cabem na previsão da alínea b) do art.º 26.º do Decreto-Lei n.º 322/90, de 18/10, ou seja, têm direito a 60% da pensão de velhice de que o seu falecido pai beneficiava, ao invés dos 30% que lhes foram atribuídos, pois que não podia a R. ter considerado a existência de um unido de facto do falecido.

*1.2 Citada, a R. contestou, invocando, em síntese, que o despacho de 27/10/2014 teve por base os elementos de prova carreados para o processo administrativo, no que se refere à existência de uma união de facto entre a contrainteressada e o falecido A., bem como o regime legal em vigor que preside à atribuição das pensões de sobrevivência às pessoas que vivem em situação análoga à dos cônjuges, pugnando pelo julgamento da ação de acordo com a prova que vier a ser produzida.

*1.3. Citada, a contrainteressada também contestou, alegando, em síntese, que viveu em união de facto com o falecido A., desde 2004, situação da qual fez a devida prova junto da R., que, por isso, a considerou como pessoa que vivia com o beneficiário em união de facto, em condições análogas às dos cônjuges, razão pela qual tem o direito legítimo e legal à pensão de sobrevivência que lhe foi atribuída. Pugna, assim, pela improcedência do peticionado.

*1.4.

Proferiu-se despacho saneador.

*1.5.

Realizou-se a audiência final, com observância de todas as formalidades legais (cfr. atas de fls. 275 a 277 e 290 do suporte físico do processo).

*1.6.

Notificadas para alegarem por escrito, a R., os AA. e a contrainteressada apresentaram as alegações, respetivamente, de fls. 293-294, 299-300 e 303 do suporte físico do processo, reiterando e mantendo o que já fora alegado na petição inicial e nas contestações.

*1.7.

Em 28 de fevereiro de 2020, o TAF de Coimbra proferiu sentença que julgou a ação procedente, constando da mesma o seguinte segmento decisório: «Em face do exposto, julga-se a presente ação administrativa especial procedente e, em consequência: a) anula-se o ato administrativo impugnado, consubstanciado na decisão da R. de 27/10/2014, que atribuiu a cada um dos AA. uma pensão de sobrevivência no valor de € 81,59 e de € 81,54 e que atribuiu à contrainteressada uma pensão de sobrevivência no valor de € 326,31, por óbito do pai dos AA.; b) condena-se a R. à prática do ato devido, em substituição do ato anulado, mediante a atribuição aos AA. de uma pensão de sobrevivência calculada com base em 60% do valor da pensão de velhice a que o seu falecido pai tinha direito; c)condena-se a R. a proceder à devolução e pagamento aos AA. da diferença entre o valor da pensão de sobrevivência a que têm direito, calculada com base em 60%, e o valor que lhes tem sido indevidamente pago, com efeitos à data do óbito e até que venha a ser alterado o valor da pensão nos termos referidos.

Custas pela R.

Registe e notifique».

*1.8.

Inconformada com o assim decidido, a Caixa Geral de Aposentações interpôs recurso jurisdicional da sentença proferida, apresentando as seguintes conclusões: «1.ª Aquando do seu pedido de atribuição da pensão de sobrevivência, a contrainteressada não só fez a prova exigida pelo n.º 4 do art.º 2.º-A da Lei n.º 7/2001, de 11 de maio, aditado pela Lei n.º 23/2010, de 30 de agosto (cfr. 8 e 9 dos Factos Assentes), como ainda juntou os elementos identificativos dos Recorridos, então menores (e certificado de matricula de um deles), a certidão de nascimento do falecido (cfr. fls. 68 e seguintes do Processo Administrativo) e o comprovativo de ter pago as despesas de funeral do malogrado António Elói (cfr. 7 dos Factos Assentes).

  1. Portanto, o ato administrativo praticado pela Direção da CGA em 2014-10-27 observou escrupulosamente o regime de prova da união de facto exigido no n.º 4 do art.º 2.º-A da Lei n.º 7/2001, de 11 de maio, e atribuiu a pensão de sobrevivência de acordo com as regras de repartição previstas no art.º 26.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 322/90, de 18 de outubro.

  2. Nenhuma ilegalidade poderá ser apontada àquele ato administrativo, que repartiu a pensão de sobrevivência devida por óbito de A. entre a contrainteressada, na qualidade de companheira, e os filhos do falecido, ora Recorridos.

  3. Repare-se que só nestes autos os Recorridos vieram colocar em causa a existência dessa união de facto, alegando que a contrainteressada e o seu falecido pai, embora vivessem juntos, não viviam como marido e mulher (cfr. por exemplo, o art.º 19.º da P.I.) 5.ª Pelo que só a eles competia a demonstração dos factos suscetíveis de fazer afastar a prova que a contrainteressada efetivamente fez no contexto do procedimento administrativo.

  4. No entanto, decorre da Sentença recorrida que a prova da existência da união de facto competia à CGA e à contrainteressada (cfr. 3.º parágrafo de pág. 22 da Sentença), explicitando que “…os AA. não se encontram vinculados à demonstração de que esses pressupostos (a união de facto) não existem, bastando que possam pôr em dúvida a validade da posição substantiva adotada pela Administração e que foi favorável aos interesses da contrainteressada.” (cfr. mesmo trecho da Sentença).

  5. É absolutamente indiferente para a CGA se paga a pensão de sobrevivência a uma ou a outra parte nestes autos, desde que a ela tenha efetivamente direito. Mas não pode a CGA ficar indiferente à Sentença proferida nos autos segundo a qual não compete aos Recorridos fazer a prova do direito que invocam.

  6. Foram Recorridos que vieram colocar em causa a prova que a contrainteressada efetuou perante a CGA, sendo que, para tanto, alegaram factos que só a eles competia provar, como por exemplo, entre outros factos que invocaram na P.I., que a contrainteressada e o seu pai, embora vivessem juntos, não viviam como marido e mulher (cfr. art.º 19.º da P.I.), ou explicar porque foi a contrainteressada a pagar o funeral de seu pai e não eles (cfr. 7 dos Factos Assentes).

  7. Cabia-lhes, portanto, o ónus da prova dos factos por si alegados, dado que constituem os fundamentos do direito de que se arrogam (auferir a pensão de sobrevivência sem a concorrência da contrainteressada), nos termos do art.º 342.º, n.º 1, do Código Civil.

  8. Preceito legal que, a nosso ver, a Sentença recorrida violou.

  9. No que concerne à prova testemunhal produzida na audiência de julgamento, cremos que o Tribunal a quo não pesou o facto – mais que evidente e que resulta dos depoimentos prestados, os quais se encontram gravados – de as testemunhas arroladas pelos AA., ora Recorridos, demonstraram muito pouco conhecimento sobre a vida pessoal do falecido, tendo ficado claro na sua inquirição que não eram «visita de casa» (muitas nem sabiam onde morava) que lhes permitisse um depoimento fundamentado sobre se aquele vivia ou não com alguém em condições análogas às dos cônjuges.

  10. Pelo que resta o relato dos Recorridos, o que, manifestamente, nos parece muito pouco para a prova da versão que vieram trazer ao Tribunal.

  11. Da prova testemunhal produzida nos autos, parece-nos que quer a Sra. A...

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