Acórdão nº 1840/06.2BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 29 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelSOFIA DAVID
Data da Resolução29 de Outubro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul I - RELATÓRIO E........... intentou no Tribunal Administrativo de Círculo (TAC) de Lisboa acção administrativa especial contra a Universidade de Lisboa (UL), impugnado o acto proferido pelo Vice-Reitor da (UL), datado de 06/04/2006, através do qual foi denunciado o contrato de Professora Auxiliar, que vinculava a A. à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (FLUL).

Por Acórdão do TAC de Lisboa, foi a presente acção julgada improcedente.

Em alegações são formuladas pelo Recorrente, as seguintes conclusões:”1. A Recorrente, intentou a presente Acção Administrativa Especial de Impugnação do Acto administrativo do Vice-Reitor da Universidade de Lisboa, de 06.04.2006, pelo qual foi denunciado o contrato que a vinculava, enquanto Professora Auxiliar, à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

  1. Findos os articulados, o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa proferiu Sentença nos presentes, pela qual julgou improcedente a Acção.

  2. Não se conformando com a decisão daquele Douto Tribunal, vem a Autora apresentar o presente Recurso.

  3. O Despacho impugnado, pelo qual o Vice-Reitor da Universidade de Lisboa, “considerando o teor das actas das reuniões do Conselho Científico da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa de8e15 de Março de 2006”, decidiu “Concordo. Autorizo a denúncia do contrato, é nulo por manifesta violação de lei.

  4. Porém, a votação realizada na reunião do Conselho Cientifico de 08.03.2003 e aprovada na reunião de 15.03.2003, a qual originou a “Proposta” de renúncia feita ao Reitor da Universidade e, consequentemente, a decisão final de renúncia, é nula por manifesta violação do Artigo 23.° do CPA.

  5. O Artigo 23.° do CPA dispõe expressamente que: “No silêncio da lei, é proibida a abstenção a todos os membros dos órgãos colegiais que estejam presentes à reunião e não se encontrem impedidos de intervir”.

  6. No caso sub judice, verificou-se que 15 dos 126 votantes que estavam presentes no início da reunião de 08.03.2012 e que participaram na 1.a votação e na decisão da respectiva anulação, “deixaram de estar presentes” no momento da 2.a votação, realizada “de imediato.

  7. Ainda que a reunião do Conselho Científico de 08.03.2006 se tenha iniciado com 126 presenças — cfr. assinaturas constantes da lista de presenças —, na 2.a votação houve apenas 111 votos, sendo que 15 dos votantes que assinaram como estando presentes no início da reunião, surgem depois com as suas assinaturas “traçadas/riscadas”, tendo sido aposto, à frente do seu nome e assinatura, a indicação da palavra “FALTA”.

  8. A “ausência súbita” daqueles votantes, verificada na 2.a votação de 08.03.2006, configura uma verdadeira abstenção, proibida por lei.

  9. Ao contrário do que foi decidido pelo Tribunal a quo, não existindo qualquer justificação para a “ausência súbita” daqueles votantes ou qualquer contabilização das abstenções verificadas, aquela 2.a votação do Conselho Científico é necessariamente nula por violação de lei.

  10. Ao contrário do que foi decidido pelo Tribunal a quo, a votação do Conselho Científico sub iudice estava sujeita ao supra citado Artigo 23.° do CPA.

  11. O Conselho Científico da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, ao contrário do que foi decidido pelo Tribunal a quo, não é meramente “um órgão de gestão”.

  12. Aquele Conselho Científico é um órgão que acumula competências deliberativas e competências consultivas, assumindo estas últimas um papel de destaque.

  13. Tais competências mistas do Conselho Científico resultam expressamente do Artigo 50.° dos Estatutos da Faculdade de Letras, onde são elencadas todas as competências daquele órgão (cfr. Despacho n.° 10 139-A/2003, DR n.° 117, II Série, Suplemento, 21.05.2003).

  14. Este Conselho Científico, na situação sub judice, actuou no âmbito das suas funções meramente consultivas.

  15. De facto, ao votar sobre a situação contratual da Recorrente, o Conselho Científico da Faculdade de Letras actuou no âmbito das suas competências consultivas, consagradas na Alina r) do Artigo 50.° que aqui se transcreve: “r) Propor a contratação de outros docentes e investigadores, bem como a renovação ou rescisão dos respectivos contratos”.

  16. O Conselho Científico não proferiu uma resolução definitiva nesta matéria, emitindo antes uma “Proposta” ou um “Parecer” destinado ao Reitor da Universidade de Lisboa.

  17. Pelo que, ao contrário do entendimento do Tribunal, a votação sub judice está necessariamente sujeita à proibição definida pelo Artigo 23.° do CPA.

  18. Com efeito: “Pela redacção do preceito no Decreto-Lei n.° 6/96 [artigo 23.° do CPA], dir-se- ia que a proibição da abstenção é restrita aos membros dos órgãos consultivos, enquanto que, na respectiva Lei de autorização legislativa (a Lei n.° 34/95, de 18. VIII) a proibição estava reportada às funções consultivas, sugerindo que aos membros dos órgãos deliberativos, quando chamados a dar ‘pareceres’ também está vedada a abstenção.

    Parece-nos preferível a solução dessa lei e interpreta-se o preceito do Decreto- Lei n.° 6/96 em conformidade com ela, não apenas por ser uma sua interpretação convalidante, mas também por a ratio da proibição alcançar manifestamente os dois casos”. — in Código do Procedimento Administrativo Anotado, Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco de Amorim, Almedina, 2.a edição, Junho/2010, pag 172.

  19. Assim se conclui que, ao contrário do que decidiu o Tribunal a quo, a votação do Conselho Científico da F.L. da U.L. sobre a situação contratual da aqui Recorrente estava vinculada ao Artigo 23.° do CPA, tendo esta norma sido manifestamente violada por aquele órgão.

  20. E aquela norma define uma efectiva proibição, a qual não pode ser contornada nos termos defendidos pelo Tribunal a quo, defraudando o elemento teleológico da lei.

  21. A fraude à lei é proibida porque ilegal e a sua permissão e condescendência com a mesma, perverte o próprio estado de direito.

  22. Com efeito, o Tribunal a quo na Sentença recorrida decidiu (erradamente, salvo o devido respeito) que: “(...) mesmo que se tratasse de um órgão consultivo e valesse a regra da proibição de abstenção prevista no artigo 23. ° do CPA, considera-se, tal como a doutrina citada pela R. que se trata de ‘uma proibição de abstenção e não de uma proibição de se ausentar da reunião. E, portanto, um membro de um órgão consultivo, que não pretenda manifestar-se num dos sentidos possíveis de votação, poderá ausentar-se no momento em que se procede à votação”.

  23. Assim, propugna o Tribunal a quo que os votantes daquele órgão, caso não pretendam exercer o seu direito de voto, devem ausentar-se da reunião.

  24. O que o Tribunal faz ali é uma verdadeira demonstração de como pode ser defraudada a lei, consagrando um direito à à ilegalidade.

  25. Todos os presentes nas reuniões do Conselho Científico têm que exercer o seu voto nos termos do Artigo 23.° do CPA, ou seja, têm que votar num dos sentidos possíveis, não podendo limitar-se a “sair da sala’ sempre que, por algum motivo, pretendam abster-se de votar uma qualquer matéria.

  26. Ainda que o votante tenha o direito se ausentar da sala de reunião — não está efectivamente “preso” dentro da sala —, a ausência com o propósito de se abster de votar configura abuso de direito, proibido pelo art. 334.° do CC.

  27. Com efeito, tal comportamento, configura uma verdadeira abstenção e, como tal, é ilegal porque contrário ao Artigo 23.° do CPA.

  28. Assim: “A lei parece, na verdade, querer apenas evitar a assunção de uma posição de abstenção, referindo a obrigatoriedade de voto ao titulares que ‘estejam presentes na reunião’. Esta referência, a ter alguma utilidade, significaria que o legislador se quis referir à existência da obrigação de voto, se o titular estiver presente no momento da votação.

    Sob pena, porém, de se permitir a institucionalização de uma verdadeira situação de ‘fraude à lei’, parece preferível arreigarmo-nos aos interesses e fins que ela pretendeu satisfazer, para considerar ilícita tal conduta (...)” — negritos nossos. — in Código do Procedimento Administrativo Anotado, Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco...

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