Acórdão nº 89/18.6GHSTC.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 20 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelMARIA FERNANDA PALMA
Data da Resolução20 de Outubro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a secção criminal do Tribunal da Relação de Évora No Processo Comum Singular nº 89/18.6GHSTC, do Juízo de Competência Genérica de Santiago do Cacém, J2, da Comarca de Setúbal, por sentença de 16-05-2019, foi condenado o arguido HJGN, id. a fls. 203, pela prática de um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210º, nº 1, do Código Penal, na pena de três anos de prisão efetiva

Mais, foi condenado a pagar à Unidade Local de Saúde do Litoral Alentejano, EPE, a quantia de noventa e oito euros e quarenta e um cêntimos, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa anual de 4%, contados desde a data de notificação até integral pagamento. Inconformado com o decidido, recorreu o arguido HJGN, nos termos da sua motivação constante de fls. 216 a 229, pugnando pela sua absolvição e concluindo nos seguintes termos: 1 - Vem o presente recurso interposto da sentença que condenou o arguido pela prática de um crime de roubo, previsto e punido pelo artigo 210º do Código Penal, tendo a pena sido fixada em três anos de prisão efectiva

2 - Entende o arguido que o tribunal “a quo” não procedeu a uma adequada apreciação da prova produzida nas audiências de discussão e julgamento, pois considerou provados factos que, de acordo com a referida prova, nunca poderiam ser dados como provados

3 - Em consequência, a prova produzida nas audiências de discussão e julgamento impunham uma decisão diversa da ora recorrida

4 - Nestes termos existe por parte do tribunal “a quo” erro na apreciação da prova

5 - Já que o tribunal a quo fundamentou a sentença, como se refere na mesma, “no depoimento de HS, cotejada com os demais elementos de prova”

6 - Porém, a prova testemunhal apresentada não só se revela contraditória entre si como nunca permitiria dar como provados os factos que o tribunal “a quo” deu

7 - Desta forma expor-se-ão os concretos pontos de facto que se considera incorrectamente julgados

8 - Considerou o Tribunal “a quo” provados, entre outros, os seguintes factos que relevam para a decisão do presente recurso: 1. O ofendido HJS era proprietário de um objecto com a aparência de um revólver, da marca “Colt Single Action Army revólver .45”, de cor cinzenta, em plástico, com o comprimento total de 29cm, tratando-se de uma reprodução de arma de fogo, classificada como arma de classe A

  1. No dia 25.02.2018, cerca das 03H, o ofendido encontrava-se no bar “…”, em …, tendo a aludida arma na sua posse, guardada dentro do casaco que envergava

  2. No exterior desse bar, o ofendido e o arguido HN estavam a conversar, quando o ofendido abriu o casaco para mostrar a referida arma ao arguido HN

  3. O arguido HN colocou as suas mãos sobre o peito do ofendido e empurrou-o com força, fazendo-o cair ao chão, e retirou-lhe a arma, bem como o telemóvel, da marca Altice, cor preto, apoderando-se de ambos os objectos, que recusou devolver ao seu proprietário

  4. Cerca das 07H15m, a patrulha da GNR deslocou-se ao local e após contacto telefónico feito por JQ, arguido HN e a sua companheira, PN, entregaram a aludida arma e telemóvel aos senhores guardas

  5. Como consequência directa e necessária das referidas agressões, o ofendido sofreu dores no tórax, mais concretamente dor à palpação dos arcos costais posteriores direitos, 6º e 7º, o que lhe determinou 10 dias de doença, sendo 3 dias com incapacidade para o trabalho geral

  6. O arguido HN sabia que os aludidos objectos pertenciam ao ofendido Hélder e que este não lhos entregaria voluntariamente, pelo agiu da forma descrita com a intenção de ofender o corpo e a saúde daquele, de modo a conseguir subtrair-lhe tais objectos, resultados que quis e logrou alcançar

  7. O arguido agiu sempre de forma deliberada, livre e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei”

    9 - Desde logo quanto ao facto do ponto 1 “O ofendido HJS era proprietário de um objecto com a aparência de um revólver, da marca “Colt Single Action Army revólver .45”, de cor cinzenta, em plástico, com o comprimento total de 29cm, tratando-se de uma reprodução de arma de fogo, classificada como arma de classe A.”, o tribunal a quo deu como provado, sem existir nenhum elemento que o permitisse que HS seria o proprietário de tal objecto

    10 - Pelo contrário, no depoimento prestado, HS afirma que o objecto com a aparência de um revólver pertence ao seu neto

    11 - Quanto ao facto constante do ponto n.º 2, segundo o qual “No dia 25.02.2018, cerca das 03H, o ofendido encontrava-se no bar “…”, em …, tendo a aludida arma na sua posse, guardada dentro do casaco que envergava”, e tendo o tribunal a quo baseado a sua convicção no depoimento de HJS, saliente-se que este nunca referiu que se encontrava dentro do bar “…” com a arma na sua posse e, quando questionado sobre a hora, sempre referiu que, apesar das confusões apresentadas pelo seu depoimento, seriam cerca das quatro da manhã

    12 - Termos em que, nunca poderia o tribunal a quo considerar provado que, cerca das 3 horas, o ofendido HS se encontrava no bar “…”, em … com uma arma guardada dentro do casaco que envergava

    13 - Relativamente ao facto provado contante do ponto n.º 3, segundo o qual “No exterior desse bar, o ofendido e o arguido HN estavam a conversar, quando o ofendido abriu o casaco para mostrar a referida arma ao arguido HN”, o mesmo não poderia ser dado como provado

    14 - Já que nenhum dos depoimentos prestados permitiriam concluir que o ofendido e o arguido estavam a conversar se o ofendido abrisse o casaco para mostrar a arma ao arguido. O arguido exerceu o seu direito ao silêncio e HS nunca referiu que o arguido estivesse a conversar consigo nesse momento, tendo ainda dito que nunca mostrou a arma ao arguido

    15 - Foi ainda dado como provado que “o arguido HN colocou as suas mãos sobre o peito do ofendido e empurrou-o com força, fazendo-o cair ao chão, e retirou-lhe a arma, bem como o telemóvel, da marca Altice, cor preto, apoderando-se de ambos os objectos, que recusou devolver ao seu proprietário”, nos termos do facto provado constante do ponto n.º 4 da sentença recorrida

    16 - Porém, dos testemunhos prestados não se logrou provar que o arguido tenha colocado as suas mãos sobre o peito do ofendido, o tenha empurrado com força de forma a que este caísse no chão, lhe tenha retirado a arma bem como o telemóvel da marca Altice, se tenha apoderado de ambos os objectos e se tenha recusado a devolvê-los

    17 - As testemunhas JMSG e FTC não se encontravam presentes no momento da alegada prática dos factos

    18 - A testemunha JSQ refere que nunca presenciou nenhum problema ou discussão entre o arguido e o ofendido

    19 - A testemunha PB testemunhou dizendo que HS não estava no chão, estando antes este e o arguido ao mesmo nível, que nunca viu o arguido fazer nada ao casaco do ofendido e, nas declarações prestadas à GNR em 20/04/2018 referiu que nunca viu o arguido agredir o ofendido

    20 - A testemunha MARS afirma que não viu nada do que se passou no exterior do café nem nunca viu o arguido a bater, a empurrar ou a tirar alguma coisa ao ofendido

    21 - Pelo que a prova do facto constante do ponto n.º 3 apenas se poderia dar com base no testemunho de HS, sendo que o depoimento deste apresenta de tal forma contradições e uma manifesta confusão que nunca poderia ser considerado credível

    22 - Durante o seu depoimento são evidentes as confusões de HS e os seus lapsos de memória

    23 - E não só o testemunho de HS é confuso como se apresenta como contraditório, alterando o discurso do que se passou ao longo do depoimento

    24 - Para mais, o próprio HS refere que nem se apercebe bem como tudo se passou, que nem viu o arguido e que teve que ir ao café confirmar quem era o arguido, sendo que foi aí que lhe passaram um guardanapo com o suposto nome do arguido

    25 - Ora, quem estaria no café na suposta altura dos factos seriam PB e MS. E, conforme decorre do supra referido, nenhuma destas duas testemunhas referiu qualquer agressão do arguido a HS

    26 - Acresce que os lapsos de memória são evidentes em todo o depoimento de HS, sendo que este não se recorda do nome do arguido, não tem a certeza de que reconhece o arguido e nem se recorda do nome do café que dista, como o próprio refere, a seis metros de sua casa

    27 - Saliente-se ainda que é o próprio HS que faz questão de salientar diversas vezes que sofreu um AVC antes de 25/02/2018 e que por isso sofre de uma incapacidade permanente, de forma a tentar justificar esses lapsos de memória

    28 - Importa não olvidar que o tribunal “a quo” motivou a sentença com base no testemunho do ofendido HS o único interessado em que a versão de que o arguido o agrediu e lhe subtraiu a arma e o telemóvel fosse considerada válida

    29 - Pois o facto de HS apontar a arma ao arguido, como estava a fazer a várias pessoas segundo o depoimento de PB, poderia constituir um crime de ameaça e o próprio ofendido sabia disso, já que diversas vezes durante o seu depoimento esteve preocupado em garantir que a arma era falsa e que era tudo uma brincadeira

    30 - Em suma, a insanável contradição entre os testemunhos de HS e das restantes testemunhas, a inconsistência do depoimento daquele, o facto do mesmo ser o único interessado na versão que apresentou e os seus notórios lapsos de memória, em consequência por hipótese do acidente vascular cerebral que sofreu, impossibilitam que se considere provados os factos constantes do ponto 4 da sentença ora recorrida

    31 - Pelo que o tribunal a quo apreciou erroneamente a prova produzida ao considerar provado que “o arguido HN colocou as suas mãos sobre o peito do ofendido e empurrou-o com força, fazendo-o cair ao chão, e retirou-lhe a arma, bem como o telemóvel, da marca Altice, cor preto, apoderando-se de ambos os objectos, que recusou devolver ao seu proprietário”

    32 - Refere o facto dado como provado no ponto 5 que “cerca das 07H15m, a patrulha da GNR deslocou-se ao local e após contacto telefónico feito por JQ, arguido HN e a sua companheira, PN, entregaram a aludida arma e telemóvel...

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