Acórdão nº 92/18.6BCLSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 22 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelANA PINHOL
Data da Resolução22 de Outubro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACÓRDÃO I.

RELATÓRIO A AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA veio, ao abrigo do preceituado nos artigos 26.º e 27.º, ambos do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem Voluntária, doravante apenas designado por RJAT), impugnar a decisão do Tribunal Arbitral proferida no processo arbitral nº 674/2017-T que, julgou procedente o pedido de pronúncia arbitral formulado pela sociedade denominada «M..........., LDA» e consequentemente anulou do acto de liquidação de AIMI de 2017, com a condenação da Administração Tributária à restituição da importância paga em 27 de Setembro de 2017, de € 125.490,96, acrescida de juros indemnizatórios contados até integral e efectivo reembolso do imposto.

No articulado inicial, a Impugnante formulou as seguintes conclusões: «A.A Impugnante não concorda nem se pode conformar nos termos legais com a decisão proferida pelo Tribunal Arbitral, porquanto se pronunciou sobre questão que não cabia na sua competência [artigo 28.º/1-c), 1.ª parte, do RJAT], e porque, é manifesta a oposição dos fundamentos com a decisão [artigo 28.º/1-b), 1.ª parte, do RJAT].

B.No âmbito das nulidades susceptíveis de serem escrutinadas, não se duvida da integração da questão da incompetência material do Tribunal Arbitral no conceito de pronúncia indevida enquanto fundamento de impugnação de decisão arbitral.

C.O Tribunal arbitral, ao decidir de mérito a questão referente à inscrição matricial do prédios em dissídio e sobre os quais recaiu a incidência objectiva do AIMI, imiscuiu-se em matéria para a qual é materialmente incompetente, isso quer a análise da lei recaia sobre o RJAT, quer recaia sobre a Portaria de Vinculação.

D.A natureza de um prédio (que é aquilo que mediata ou imediatamente pretendeu ver nos presentes autos questionado a Requerente, ora impugnada) não é passível de ser discutida em sede arbitral, pois para tal existem procedimentos próprios constantes no normativo jurídicofiscal, ademais, a natureza do prédio está fixada documentalmente nos autos e, bem assim, nos dispositivos referente aos factos dados como provados.

E.A Impugnada pretendeu, mediata ou imediatamente, foi que, face à liquidação de AIMI que lhe foi notificada, fosse sindicada a avaliação/inscrição matricial - por si requerida nos exactos termos em que está vertida nas certidões juntas ao autos - dos prédios em causa e que consubstancia o facto tributário que se subsume à liquidação do imposto em causa.

F.De acordo com a vontade expressa do legislador, no n.º 1 do artigo 2.º do RJAT "fixam-se, com rigor quais as matérias sobre as quais se pode pronunciar o tribunal arbitral", sendo que o rigor dessa fixação exprime-se através da enunciação taxativa da competência desta jurisdição, a saber: pretensões relativas à declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e pagamentos por conta, e pretensões relativas à declaração de ilegalidade de actos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de actos de determinação da matéria colectável e de actos de fixação de valores patrimoniais.

G.A natureza de um prédio (que é aquilo que mediata ou imediatamente pretendeu ver questionado a Requerente) não é passível de ser discutida em sede arbitral, pois para tal existem procedimentos próprios constantes no normativo jurídico-fiscal e a natureza do prédio está fixada documentalmente nos autos.

H.A redacção do artigo 134.º, n.º 3 do CPPT refere que «As incorrecções nas inscrições matriciais dos valores patrimoniais podem ser objecto de impugnação judicial, no prazo de 30 dias, desde que o contribuinte tenha solicitado previamente a correcção da inscrição junto da entidade competente e esta a recuse ou não se pronuncie no prazo de 90 dias a partir do pedido.» I.A redacção do artigo 129.º do CIMI, refere que «Os sujeitos passivos do imposto, para além do disposto no tocante às avaliações, podem socorrer-se dos meios de garantia previstos na Lei Geral Tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário.» J.Não está ao dispor dos contribuintes optarem por reclamar preventivamente da matriz junto dos serviços da AT sobre cujo prédio incidirá o acto de liquidação ou, ao invés, aguardar a posterior notificação a final do correspondente acto de liquidação do período pretendido contestar.

K.Quem pretenda a correcção da matriz, in casu, a correcção da classificação dos prédios urbanos em apreço, deve com carácter de obrigatoriedade reclamar administrativamente, nos termos do disposto no artigo 130.º do CIMI e apresentar acção administrativa de anulação de acto administrativo e de condenação à prática de acto devido, que, ante um indeferimento de reclamação matricial apresentado pelos contribuintes, consubstancia o meio de reacção idóneo.

L.O regime da reclamação de matrizes patente no artigo 130.º do CIMI consubstancia um verdadeiro ónus - e não uma faculdade - que deve ser observado pelos contribuintes, caso pretendam fazer prevalecer o direito de que se arrogam, i.e., a necessidade justificada de promover a alteração na matriz do prédio ou prédios de que são proprietários.

M.É também esta a única conclusão que se retira da leitura do artigo 130.º, n.º 8 do CIMI, quando aí se refere que «os efeitos das reclamações, bem como o das correcções promovidas pelo chefe do serviço de finanças competente, efectuadas com qualquer dos fundamentos previstos neste artigo, só se produzem na liquidação respeitante ao ano em que for apresentado o pedido ou promovida a rectificação.» N.Existe uma obrigatoriedade subjacente no artigo 130.º do CIMI que se traduz na apresentação de recurso administrativo, com natureza imperativa, junto dos serviços competentes da AT, por forma a ver corrigidas as inscrições matriciais e os consequentes efeitos vertidos nos actos de liquidação correspondentes.

O.A impugnação judicial prevista no artigo 129.º e 130.º do CIMI não é passível de substituição pela impugnação arbitral prevista no RJAT, dado que, enquanto no âmbito do CIMI o acto a sindicar se situa no indeferimento de um acto administrativo-tributário que não comporta a apreciação a legalidade de uma liquidação, nos termos do disposto no artigo 2.º do RJAT, o Centro de Arbitragem Administrativa é competente para apreciar, restritivamente, a legalidade de actos de liquidação e/ou de actos de fixação d a matéria tributável que não dêem lugar ao pagamento de imposto.

P.Os factos sobre os quais a Impugnada pretendeu com o seu pedido de pronúncia arbitral questionar, sem que o tenha feito tempestivamente e em sede própria, deixando precludir todos os prazos que tinha ao seu dispor, estão sedimentados na ordem jurídica.

Q.Não é consentâneo com o RJAT, nem com quaisquer normas processuais tributárias, que a Requerente se proponha e ensaie contraditar aquilo que está vertido em documentos oficiais e cujos prazos de reacção já precludiram todos.

R.Ainda que se considerasse, por mero dever de patrocínio, que estivéssemos perante um facto susceptível de sindicância no CAAD, o mesmo haveria que, nos termos e para os efeitos do n.º 7 do art.º 134.º do CPPT, ver esgotados todos os meios graciosos previstos para o procedimento de avaliação, o que não aconteceu, donde resulta clara a incompetência material do tribunal arbitral.

S.No elenco de competências do CAAD, não cabe a apreciação de actos de indeferimento de natureza administrativa-tributária de correcção de matrizes cadastrais, dado que em substância não se subsume a um acto de liquidação.

T.Leia-se então, por contraponto à Portaria e ao RJAT, o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, artigo 49.º ETAF, a propósito da competência dos tribunais tributários, onde, no seu n.º 1, i) e iv), se estipula que, para além de apreciarem os actos de liquidação, têm também competência para apreciar actos administrativos respeitantes a questões fiscais que não sejam atribuídos à competência de outros tribunais.

U.O ETAF, ao positivar o limite das suas competências, não apenas muniu os Tribunais Administrativos e Fiscais do poder de decidir de actos de liquidação, como também de decidir outros actos administrativos que versam sobre questões fiscais, ainda que não recaiam sobre actos que versam sobre tributos.

V.Contrariamente, quer na Portaria de Vinculação, quer no RJAT, somente se faz referência à declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamentos por conta e à declaração de ilegalidade de actos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de actos de determinação da matéria tributável e de actos de fixação de valores patrimoniais.

W.Esta jurisdição arbitral não é competente para conhecer da pretensão que subjaz ao pedido efectuado pela Requerente, que implica a correcção/alteração das matrizes dos prédios aqui em discussão, já que a dita rectificação - ainda que tivesse sido atempadamente requerida pela Requerente, que não foi - não traduz um acto tributário de liquidação.

X.A decisão que ora se impugna e que expurgou estes elementos que nunca foram contestados teve o condão de eliminar da ordem jurídica as avaliações feitas pela AT e que nunca foram colocadas em causa pelo sujeito passivo, e ao fazê-lo, extravasou manifestamente a competência material daquele Centro de Arbitragem, porquanto se não tratam de actos de apuramento de imposto a pagar, como, por concepção, acontece com os actos de liquidação.

V.Resulta inequívoco que estamos perante um acto administrativo em matéria tributária que, por não apreciar ou discutir a legal idade do acto de liquidação, não pode ser sindicável através de impugnação judicial, nos termos previstos na alínea a) do n.º 1do artigo 97 .º do CPPT.

Z.Por se verificar a incompetência material do tribunal arbitral, a qual prejudica o conhecimento do mérito da causa, está-se perante um verdadeiro vício de sentença, por pronúncia indevida, que se...

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