Acórdão nº 912/13.1BELLE de Tribunal Central Administrativo Sul, 22 de Outubro de 2020
Magistrado Responsável | ANTÓNIO ZIEGLER |
Data da Resolução | 22 de Outubro de 2020 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam em conferência os Juízes que constituem a Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I Relatório A F.P,vem deduzir recurso da sentença proferida pelo TAF de Loulé, que julgou procedente a oposição deduzida pela oponente S..... , por reversão da execução contra si dirigida, formulando para o efeito as seguintes conclusões: “ 1 - A, aliás douta sentença recorrida, enferma de erro de julgamento porque os elementos fornecidos pelo processo impunham uma decisão diversa.
2 - Versão dos factos disponível a partir dos documentos junto ao processo, coincidente com a gerência de direito plasmada no pacto social.
3 - Por outro lado, ofende preceitos do direito substantivo, como sejam as disposições do art.º 24 da LGT e dos artºs. 252º, 259º, 260º e 261º, do CSC.
4 - Desde logo a assinatura de cheques é um acto que se subsume integralmente à noção de gerência de facto.
5 - Porque dessa forma se vincula e viabiliza a actividade económica da empresa, que supõe necessariamente o estabelecimento de relações jurídicas com terceiros.
6 - Pelo que, mal se concebe não os interpretar como exercício efectivo da gerência.
7 - Suporte bastante para a legal efectivação da responsabilidade subsidiária da oponente.
8 - Por outro lado, tal como vem sendo jurisprudencialmente decidido, provada a gerência de direito, como no caso acontece, infere-se a gerência de facto, por presunção judicial.
9 - Ora, face aos dados de facto emergentes do material produzido, independentemente de terem ou não resultado por impulso da parte sobre que pesava o ónus de as produzir, quer por impulso da parte contrária, quer por iniciativa do tribunal, (art.º 413 CPC), parece-nos, que essa presunção não foi abalada.
1O - Daí vem que, na hipótese sub judice, se verifica o requisito do efectivo exercício das funções de gerente, legalmente exigido à responsabilização subsidiária.
11 - Assente o qual, é claro que não podia ser julgada procedente a oposição em causa.
Assim, pelo exposto, e, principalmente, pelo que será suprido pelo Douto Tribunal, deve ser revogada a sentença recorrida, como é de JUSTIÇA.” * A recorrida não apresentou contra-alegações.
* O D.M.M.P. emitiu douto Parecer em que sustenta a procedência do recurso, com base no seguinte entendimento fundamentador: “A Fazenda Pública veio recorrer da douta sentença do TAF de Loulé que julgou procedente a Oposição deduzida por S...... contra a reversão operada no proc. executivo .....
, nos termos do artigo 24°, nº 1, alínea b) da LGT - cfr. fls. 114.
Os fundamentos do recurso constam dos termos conclusivos de fls.180 a 182 ....; cujo teor aqui se reproduz, invocando o recorrente que a sentença padece de erro de julgamento porquanto, face à prova produzida não podia o Tribunal " a quo" ter concluído não resultar demonstrado que a oponente exercia de facto a gerência da sociedade originária.
Invoca o Recorrente a contradição entre os factos dados como provados e a fundamentação da decisão, defendendo designadamente, que a subscrição dos cheques pela Oponente, não obstante a circunstância de ser sobre a indicação de outrem, configura " ... um acto que se integra no acervo de funções de um gerente de facto, que faz parte do núcleo básico dos poderes dos gerentes, no desenvolvimento que forma o objecto social. ....".
Com relevância, tendo em conta que são as conclusões extraídas pela Recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto do recurso, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer ficou provado designadamente, que: - foi instaurado processo executivo contra a devedora originária para cobrança de IRC do ano de 2010, cujo prazo limite de pagamento ocorreu em 7.9.2011 - alíneas A) a E) do probatório; - a devedora originária foi declarada insolvente por sentença proferida em 6.2.2013 - alínea B) do probatório; - a oponente foi nomeada gerente da devedora originária desde da constituição desta em 27.03.2009 – alínea A ) do probatório; - para obrigar a sociedade bastava a intervenção de qualquer dos gerentes - alínea A ) do probatório; - a devedora originária pagou rendimentos a I..... e à Oponente durante os anos de 2009 e 201O - alínea G) do probatório; - a oponente ficou impedida de aceder ao estabelecimento da sociedade devedora originária no ano de 2011 - alínea H) do probatório; -., - a Oponente assinou os cheques juntos a fls. 68, da conta bancária na CCA de que era titular a devedora originária em 30.07.2011, 30.08.2011 e 30.09.2011 - alínea C) do probatório; - o I..... é que pagava aos funcionários e em numerário, as compras aos fornecedores eram feitas por ele e as ordens de pagamento vinham dele, limitando-se a oponente a preencher e assinar os cheques - alínea J) do probatório; - durante o ano de 2011 a oponente foi trabalhar para o Pingo Doce - alínea K) do probatório.
Como resulta da sentença recorrida, não se provou que a oponente tenha ficado impedida de aceder ao estabelecimento a partir de Abril de 2011.
Face à prova produzida concluiu a douta sentença não ficou provado que a oponente tenha exercido a gerência de facto no termo do prazo legal de pagamento e que foi por culpa sua que se verificou a insuficiência do património societário e o incumprimento das obrigações tributárias.
" O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação "sub judice" que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida." cfr., douto Ac. do TCA Sul de 30.10.14.
Como se escreve no douto Ac. do TCA Sul de 30.10.14. : " ... A gerência é, por força da lei e salvo casos excepcionais, o órgão da sociedade criado para lhe permitir actuar no comércio jurídico, criando, modificando, extinguindo, relações jurídicas com outros sujeitos de direito. Estes poderes não são restritos a alguma espécie de relações jurídicas; compreendem tantas quantas abranja a capacidade da sociedade (cfr.objecto social), com a simples excepção dos casos em que as deliberações dos sócios produzam efeitos externos (cfr.artºs.260, nº.1, e 409º, nº.1, do C.S.Comerciais). O gerente/ administrador goza de poderes representativos e de poderes administrativos face à sociedade. A distinção entre ambos radica no seguinte: se o acto em causa respeita às relações internas entre a sociedade e quem a administra, situamo-nos no campo dos poderes administrativos do gerente. Pelo contrário, se o acto respeita às relações da sociedade com terceiros, estamos no campo dos poderes representativos. Por outras palavras, se o acto em causa tem apenas eficácia interna, estamos perante poderes de administração ou gestão. Se o acto tem eficácia sobre terceiros, verifica-se o exercício de poderes de representação (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 8/5/2012, proc.5392/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6732/13; Raúl Ventura, Comentário ao Código das Sociedades Comerciais, Sociedades por Quotas, Ili, Almedina, 1991, pág.128 e seg.; Rui Rangel, A vinculação das sociedades anónimas, Edições Cosmos, Lisboa, 1998, pág.27 e seg.)...".
Verifica-se, assim, que o gerente tem poder para praticar uma série de actos...
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