Acórdão nº 1801/10.7TJVNF-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelRAQUEL BATISTA TAVARES
Data da Resolução15 de Outubro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I. Relatório X, S.A., com sede na Rua ...

, Matosinhos, deduziu a presente oposição à execução mediante embargos de executado, por apenso à execução n.º 1801/10.7TJVNF, em que é exequente o Banco …, S.A., pedindo a extinção da execução.

Alega em síntese que os pressupostos da exequibilidade do título apresentado nos autos de execução não se verificam.

Que foi na qualidade de empregadora dos executados V. M. e M. F. que foi notificada para proceder à entrega dos valores penhorados nos vencimentos destes seus trabalhadores, e que foi por não ter procedido à entrega dos valores descontados que foi requerida a reversão contra a entidade patronal dos executados, nos termos e para os efeitos do disposto no referido artigo 777º n.º 3 do Código de Processo Civil.

Aceita que após envio dos primitivos recibos, apenas entraram os valores indicados nos recibos referentes a janeiro e fevereiro de 2014 da executada M. F., e que muito embora tenham sido enviados recibos do executado V. M., com indicação de retenções de penhora, nenhum valor foi creditado na conta do agente de execução, por conta das referidas penhoras.

Mais alega que a responsabilidade dos executados principais ou originários não se confunde com a eventual responsabilidade da embargante, não sendo devedora à exequente da quantia de €55.392,20.

Que deu início aos respetivos descontos mensais e que desde Janeiro de 2014 até à data em que se formou o título executivo, a embargante procedeu ao desconto no vencimento da trabalhadora M. F. da quantia total de €2.330,02, montante que não foi pago à trabalhadora, tendo ficado retido à ordem dos autos de execução em cumprimento da penhora ordenada.

Que apenas entregou ao processo as quantias de €95,71 (correspondente ao desconto de Janeiro de 2014) e de €88,51 (correspondente ao desconto de Fevereiro de 2014), ficando em dívida, relativamente aos descontos da trabalhadora M. F. efetuados nos processamentos de salários de Janeiro de 2014 a 03 de Julho de 2018, a quantia total de €2.145,80.

Que relativamente ao executado V. M., deu início aos respetivos descontos mensais e que desde dezembro de 2014 até à data em que se formou o título executivo, procedeu ao desconto no vencimento do trabalhador da quantia total de €1.617,54, montante que não foi pago ao trabalhador, tendo ficado retido à ordem dos presentes autos em cumprimento da penhora ordenada, mas que não entregou nos ao Agente de Execução. Alega ainda que o valor global ainda não entregue ao Agente de Execução era, à data em que foi extraída a certidão que serve de título executivo, de €3.763,34, e não de €55.392,20.

A Embargada veio contestar invocando, para além do mais, que se deve ter por assente que a Embargante não procedeu ao depósito da quantia correspondente à indicada na penhora, de acordo com o disposto artigo 777º do Código de Processo Civil, colocando-se assim numa situação de incumprimento de um débito seu que, por força da ausência de qualquer esclarecimento da sua parte, se presume corresponder ao valor indicado na notificação que para o efeito lhe foi efetuada, sendo, pois, essa, a exacta quantia exequenda correspondente ao título assim formado.

Terminou pedindo que se julguem improcedentes os Embargos de Executado, prosseguindo os autos os seus normais trâmites.

Foi realizada tentativa de conciliação e dispensada a audiência prévia e foi proferido despacho saneador.

Veio a efectivar-se a audiência de julgamento com a prolação de sentença nos seguintes termos, no que concerne à parte dispositiva: a: “Pelo exposto, e na ausência de qualquer outra questão de facto e de direito, decido: 5.1.- Julgar os presentes embargos à execução parcialmente procedentes e, em consequência, procede-se à liquidação da dívida da embargante nos termos dos valores identificados nos factos 11 (onze) a 136 (cento e trinta e seis) dos factos provados.

5.2.- Custas pela embargante e embargada, na proporção de 50% para cada uma delas.

5.3.- Registe e notifique.

5.4.- Informe o AE do teor da presente sentença.” Inconformada, apelou a Embargante da sentença, concluindo as suas alegações da seguinte forma: “CONCLUSÕES: A – O facto de a embargante, ora recorrente, ter configurado de maneira diversa a existência da obrigação de, enquanto entidade patronal notificada nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 779.º do Código de Processo Civil, proceder à penhora dos vencimentos / salários mensais dos executados, seus funcionários, não pode ter a mesma consequência jurídica da falta de resposta à notificação para a penhora de créditos, conforme vem previsto no n.º 4 do artigo 773.º do mesmo Código.

B – Como resulta dos pontos 4. a 6. dos factos dados como provados, a ora recorrente não só respondeu às notificações para penhora de vencimentos / salários que lhe foram efectuadas, prestando a informação de que os referidos executados eram seus funcionários, como também juntou os respectivos recibos de vencimento – que evidenciavam o início dos descontos e os montantes efectivamente deduzidos e retidos a esse título, de acordo com a fórmula de cálculo que entendeu ser a correcta; C – Tais cálculos jamais mereceram qualquer oposição, impugnação ou reparo, seja por parte do agente de execução, seja do Tribunal ou mesmo da exequente; o que legitima que a recorrente tenha continuado a proceder do mesmo modo, ao abrigo dos princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança.

D – A ora recorrente deu cumprimento ao disposto noartigo773.º n.º 3 do Código de Processo Civil – pelo que a cominação do n.º 4 não é aplicável à presente situação, que só se convoca na hipótese de o devedor nada dizer; que não é o caso; E – O comportamento processual da ora recorrente também não pode ter consequência jurídica que se revela até mais gravosa do que a eventualmente aplicável à hipotética situação de o devedor faltar conscientemente à verdade nas suas declarações – o que, quanto muito, a faria incorrer na responsabilidade do litigante de má-fé, nos termos do n.º 5 do referido artigo 773.º do Código de Processo Civil; F–Em virtude da mera falta de entrega dos montantes que efectivamente deduziu e reteve a título de penhora de vencimentos / salários mensais, a ora recorrente, não pode ficar obrigada a pagar quaisquer quantias para além daqueles montantes, nomeadamente, as que resultariam de diferente entendimento quanto ao cálculo do quantum da penhorabilidade dos vencimentos / salários mensais, diverso do evidenciado nos recibos que foram juntos aos autos, atenta a acessoriedade da obrigação de entrega relativamente à obrigação principal de desconto a título de penhora, e considerando a extensão e amplitude com que esta última foi expressamente reconhecida pela recorrente; G - A obrigação proceder à dedução e retenção a título de penhora de vencimentos/salários mensais nasce das notificações que lhe foram efectuadas nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 779.º do Código de Processo Civil, às quais a ora recorrente respondeu, sendo que, com a resposta e a apresentação dos respectivos recibos, delimitou o conteúdo, extensão e amplitude dessa obrigação principal; H - Pelo que a obrigação de entrega, que é acessória, jamais poderia ir além da obrigação principal de desconto (que a ora recorrente cumpriu) do ponto em que, a parte que excede os valores que foram considerados penhorados – calculados de acordo com entendimento diverso do seguido na douta Sentença recorrida – foi entretanto paga aos funcionários, que, assim, já não detêm esses créditos sobre a entidade patronal; I - Assim, jamais se poderá considerar que, em virtude da omissão de entrega dos montantes deduzidos e retidos a título de penhora de vencimentos/salários mensais, a ora recorrente possa ficar obrigada a pagar quaisquer quantias para além das que foram efectivamente descontadas, em cumprimento da obrigação principal, J - O que extravasaria o conteúdo, extensão e amplitude do reconhecimento expressamente efectuado pela ora recorrente nas respostadas dadas em cumprimento das notificações que lhe foram dirigidas para penhora de vencimentos / salários - uma vez que tais alegados créditos, na parte excedente, pura e simplesmente nunca existiram para a ora recorrente que, sem culpa, configurou de modo diverso a obrigação de desconto; K - E, mesmo considerando uma diferente forma de calcular o quantum da penhorabilidade dos vencimentos / salários mensais, a obrigação de desconto tornou-se impossível a partir do momento em que, com base na fórmula de cálculo que seguiu para o efeito, a recorrente efectuou o pagamento aos seus funcionários do remanescente, tornando, assim, sem culpa, impossível a obrigação de entrega.

L - Nesta situação, o nosso ordenamento jurídico só admitiria que fosse exigido à ora recorrente mais do que houvesse deduzido e retido a título de responsabilidade como litigante de má-fé – o que nem sequer foi peticionado nos presentes autos.

M - A circunstância de os trabalhadores terem acabado por receber, em alguns meses, valor globalmente superior ao salário mínimo nacional não se deveu, pois, a qualquer comportamento doloso ou culposo por parte da ora recorrente, N - Mas apenas ao facto de, cumprindo as notificações que lhe foram dirigidas, ter configurado de maneira diversa a existência da obrigação de, enquanto entidade patronal notificada nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 779.º do Código de Processo Civil, proceder à penhora dos vencimentos / salários mensais dos seus funcionários.

O - O legislador, com a delimitação objectiva do limite mínimo da impenhorabilidade previsto nos n.ºs 1 e 3 do artigo 738.º do mesmo Código de Processo Civil, pretende assegurar ao executado o recebimento do rendimento equivalente a um salário mínimo nacional, rendimento este cujo valor é fixado no pressuposto de ser recebido 14 vezes num ano, configurando uma retribuição mínima anual, P – Deve, assim, ser considerados correctos os...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT