Acórdão nº 2666/14.5BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 17 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelANA PINHOL
Data da Resolução17 de Setembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACÓRDÃO I.

RELATÓRIO A FAZENDA PÚBLICA recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou procedente a oposição que J..................

deduziu à execução fiscal n.°……………… , contra si revertida para cobrança coerciva de dívidas para cobrança de dívidas fiscais relativas a IRC, do ano de 2010, de que é devedora originária a sociedade «E…..

, S.A.».

Concluiu, assim, as suas alegações de recurso: «I - Vem o presente recurso reagir contra a Sentença proferida pelo Douto Tribunal a quo nos presentes autos em 21-11-2019, a qual julgou procedente a oposição à execução fiscal n.°……………, que corre termos no actual Serviço de Finanças de Oeiras 2 (anterior Oeiras 3) e foi instaurada, originariamente, contra a sociedade "E.................., S.A.", com o NIF…………., e posteriormente revertida contra o ora Oponente, para a cobrança de dívidas fiscais relativas a IRC do ano de 2010, já devidamente identificadas nos autos, no valor de € 3.014,25 (três mil e catorze euros e vinte e cinco cêntimos) e acrescido.

II - Em rigor, perscrutada a Sentença recorrida, constatamos que o Douto Tribunal a quo postulou que, quando se verificou a data limite de pagamento voluntário da dívida em cobrança no PEF n.°…………., o Oponente já não detinha poderes de administração e/ou disposição da sociedade devedora originária, pelo que a reversão deveria ter sido efectuada ao abrigo da alínea a) do n.° 1 do artigo 24.° da LGT e nunca nos termos da alínea b) desta disposição legal, competindo à administração tributária a prova de que foi por culpa do Oponente que o património da sociedade se tornou insuficiente para a satisfação dos créditos em execução, o que a AT não logrou fazer.

III - Ora, como resulta dos autos, a administração de facto da sociedade devedora originária nunca havia sido impugnada pelo Oponente; o que apenas se alegou foi que a declaração de insolvência privou o Oponente de tal exercício.

IV - Com efeito, da própria certidão permanente extrai-se que o Oponente era o administrador único da sociedade devedora originária antes e após o termo legal de pagamento da dívida ora em cobrança, só tendo renunciado em 20-08-2014, sendo que, da mesma forma, por perscrutação do § 2.° da p.i., é o próprio Oponente que assume, de forma exclusiva, o comando dos destinos da sociedade originária executada.

V - Tais factualidades merecem dignidade de constar dos factos assentes da Sentença recorrida, pois que reputam relevantes para a decisão da causa e devem ser aditadas ao probatório, nos termos do disposto no artigo 640.° do CPC, ex vi da alínea e) do artigo 2.° do CPPT.

VI - Pois que, "[t]endo o revertido articulado na sua p.i. de oposição à execução fiscal que exerceu as correspondentes funções de gerente da sociedade originária devedora, irreleva que a AT lhe não impute em concreto o exercício das mesmas e nem que as não prove", cfr. Acórdão do TCA Sul de 10-01-2012, proc. n.° 5066/201 1 e Acórdão do TCA Sul de 21-052015, proc. n.° 08445/15.

VII - No fundo o Oponente não impugna que o seja; ele é o administrador de facto, simplesmente em termos de direito (juridicamente) entende que estaria impossibilitado de a exercer por poder conflituar com as funções do próprio administrador de insolvência.

VIII - Contudo, o facto de ter sido nomeado um administrador de Insolvência não significa que o administrador se deva demitir ou dispensar das suas funções; e isto porque o administrador de insolvência é exactamente, como o próprio nome indica, um administrador judicial, estando as suas funções determinadas e limitadas pela natureza da insolvência.

IX - Neste seguimento e porque dentro dos vários actos praticados pelos administradores em representação da sociedade devedora originária, estão os típicos actos de gestão ou administração corrente, actos nos quais o administrador de insolvência não se deve imiscuir, postula o n.° 1 do artigo 82.° do CIRE que, “os órgãos sociais do devedor mantêm-se em funcionamento após a declaração de insolvência, não sendo os seus titulares remunerados, salvo no caso previsto no artigo 227.°".

X - Nos termos do disposto nos n.°s 1 e 4 do artigo 81.° do CIRE, a declaração de insolvência priva de imediato o insolvente e respectivos administradores dos poderes de administração e disposição dos bens integrantes da massa insolvente. Não se afirma que a declaração de insolvência priva, tout court, os respetivos administradores dos poderes de administração e disposição como é afirmado na Sentença recorrida.

XI - E, tendo presente o disposto no artigo 65.° do CIRE, existe, em nosso modesto entendimento, uma deliberada intenção do legislador em estabelecer uma separação entre aquelas que são as obrigações e deveres do Administrador da Insolvência por referência à própria massa falida, daquelas que persistem na esfera do administrador da devedora originária ainda que insolvente, em tudo o que não colida com os deveres e funções do primeiro XII - Assim sendo, como foi dado por provado na Sentença recorrida, a dívida é posterior à declaração de insolvência, pelo que a discussão sobre a gestão patrimonial é inócua, tanto mais que o órgão de execução fiscal está impedido de reclamar os créditos no processo de falência. Se assim não fosse e ao arrepio do n.° 6 do artigo 180.° do CPPT, seria a massa insolvente quem ilegalmente responderia pelos créditos objeto da presente oposição.

XIII - Afigura-se-nos, assim que a coexistência dos dois Administradores (o da sociedade e o administrador da massa falida) não é ilegal. Inexiste, aliás, disposição legal que o proíba. Pelo contrário.

XIV - Por manifestamente conclusivo para o que ora nos ocupa, convidamos à leitura do entendimento postulado no Acórdão do TCA Sul, de 21-05-2015, proc. n.° 06381/13, segundo o qual "[a] qualidade de gerente de uma sociedade ou as funções que do ponto de vista da legislação comercial lhe estão cometidas por força da sua nomeação nessa qualidade, não se confundem com a qualidade de administrador de insolvência nem com as funções a este atribuídas nos termos do Código de Insolvências e Recuperação de Empresas (cfr., em especial, artigos 252.° e 259.° do Código das Sociedades Comerciais e artigo 55.° do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas).

XV - Portanto, não corresponde à verdade que o Oponente se encontrava impedido juridicamente de exercer a administração da sociedade devedora originária por força da nomeação do Administrador da Massa Insolvente, precisamente porque a Administração da sociedade ainda que insolvente e a sua Massa não se confundem e, nesta conformidade, impunha-se ao Douto Tribunal a quo, perante a causa de pedir esgrimida, o comportamento processual do Oponente e a prova produzida pela Fazenda Pública, que não logrou ser contrariada pelo Oponente, convencer-se que este foi seu administrador de facto e que, como tal, a reversão operada pelo órgão de execução fiscal recaiu sobre pessoa responsável pelo pagamento da dívida.

XVI - Assim sendo, comprovado que ora se encontra que o Oponente exerceu a administração da sociedade no prazo legal de pagamento voluntário da dívida ora em cobrança, era sob a égide da disciplina legal prevista na alínea b) do n.° 1 do artigo 24.° da LGT que importava fundamentar a presente reversão, pois que foi este o regime jurídico no qual o órgão de execução fiscal fundamentou a reversão, cfr. alínea h) do probatório fixado na sentença recorrida.

XVII - Portanto, era ao abrigo de tal regime legal que a Sentença recorrida deveria ter ponderado a disciplina jurídica relativa à culpa do Oponente na insuficiência patrimonial da sociedade devedora originária. Assim não diligenciou o Douto Tribunal a quo; pelo contrário: o que fez foi furtar-se ao aprofundamento da apreciação da questão relativa à administração de facto da sociedade devedora originária após a declaração de insolvência para, de forma muito singela, inverter o regime jurídico constante do n.° 1 do artigo 24.° da LGT e proceder à apreciação de matéria jurídica que não consta do mecanismo de reversão.

XVIII - Destarte, com o devido e muito respeito, a Sentença sob recurso, ao decidir como efectivamente o fez, estribou o seu entendimento numa inadequada valoração da matéria de facto e de direito relevante para a boa decisão da causa, tendo violado o disposto nas supra mencionadas disposições legais.

Termos em que, e com o douto suprimento de vossas excelências, deve ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogada a sentença ora recorrida, com as demais e devidas consequências legais, assim se fazendo a...

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