Acórdão nº 102/20.7BESNT-S1 de Tribunal Central Administrativo Sul, 10 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução10 de Setembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – RELATÓRIO A Entidade Demandada, Metropolitano de Lisboa, E.P.E.

e as Contrainteressadas, S.................., Lda.

e S.................., S.A.U.

, devidamente identificadas nos autos, inconformadas, vieram cada uma por si interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, datada de 21/05/2020, que no âmbito da ação de contencioso pré-contratual instaurada pela T.................., SA e pela C.................., Ltd, julgou verificada a existência de causa prejudicial e declarou a suspensão da instância, até que a sentença a proferir no Processo n.º 1422/19.9BESNT tenha transitado em julgado, mais julgando prejudicada a apreciação do incidente de levantamento do efeito suspensivo automático, o qual se mantém.

* A Entidade Demandada, ora Recorrente, apresentou recurso contra a decisão recorrida, tendo nas respetivas alegações, formulado as seguintes conclusões que ora se reproduzem: “A. Nos termos da Lei e da Constituição a suspensão da instância não pode conduzir ao resultado a que se chegou no despacho recorrido: a manutenção do efeito suspensivo do ato e do contrato e o não conhecimento do incidente de levantamento de efeito suspensivo até que transite em julgado a decisão no processo considerado prejudicial (processo n.º 1422/19.9BESNT).

B. Tal como alegado na contestação, a suspensão da instância ordenada pelo despacho recorrido deveria determinar a interrupção ou levantamento do efeito suspensivo automático, à luz da aplicação conjugada do disposto nos artigos 103.º-A, 103.º-B do CPTA e 272.º do CPC, pelo que o despacho recorrido deveria ter concluído nesse sentido.

C. Não o tendo feito, o despacho recorrido violou aqueles comandos normativos e não atendeu à circunstância de no processo n.º 1422/19.9BESNT ter sido já requerida a adoção de medidas provisórias de cariz suspensivo pelas ora Recorridas.

D. O artigo 103.º-B, n.º 1, do CPTA circunscreve claramente o âmbito de aplicação das medidas provisórias, isto é, em alternativa ou por oposição ao âmbito de aplicação do efeito suspensivo automático: «Nas ações de contencioso pré-contratual em que não se aplique ou tenha sido levantado o efeito suspensivo automático previsto no artigo anterior…» (sublinhado nosso).

E. Não podendo coexistir na mesma situação jurídico-processual pedidos de medidas provisórias e o efeito suspensivo automático, com a suspensão da instância deveria necessariamente considerar-se interrompido esse efeito, que opera apenas e quando estiverem a ser tramitadas as ações de contencioso pré-contratual nos termos previstos no artigo 103.º-A, n.º 1, do CPTA.

F. Pelo que, estando a instância suspensa, deveria o despacho recorrido ter entendido que se interrompia esse efeito suspensivo automático - mantendo-se o status quo anterior à propositura desta ação -, já que a tutela dos direitos das Recorridas deveria ser assegurada através das medidas provisórias de cariz suspensivo já requeridas na causa prejudicial no processo n.º 1422/19.9BESNT.

G. Essa consequência resulta, aliás, da opção processual unicamente imputável às Autoras, que começaram por intentar o processo n.º 1422/19.9BENST e o mantiveram mesmo depois de proporem esta segunda ação (podendo antes ter optado por ampliar o objeto do processo n.º 1422/19.9BENST ao ato de adjudicação e ao contrato).

H. Caso assim se não entenda, como por dever de patrocínio se antecipou perante o tribunal a quo, a salvaguarda do efeito suspensivo nunca poderia ter conduzido a uma situação em que a apreciação do incidente de levantamento do efeito suspensivo ficasse prejudicada - e o ato de adjudicação e o contrato suspensos - até ao trânsito em julgado da decisão no processo 1422/19.9BENST, sob pena de tal conduzir a uma chocante violação de vários princípios e normas constitucionais destinados a assegurar a tutela jurisdicional efetiva e a prossecução do interesse público (artigos 20.º, n.ºs 1 e 4, 268, n.º4 e 266.º, n.º1 da Constituição). Tal tornaria inútil a possibilidade de solicitar o levantamento do efeito suspensivo.

I. A manutenção do efeito suspensivo automático neste caso significa que, por mero efeito da estratégia processual adotada pelas Recorridas (que intentaram uma outra ação na pendência de causa prejudicial), estaria vedado à Recorrente o recurso a um incidente processual essencial à salvaguarda do interesse público (o levantamento do efeito suspensivo automático), o que consubstanciaria uma solução perversamente injusta e manifestamente contrária ao propósito da criação desse incidente.

J. Não existe qualquer fundamento legal para não conhecer o incidente – antes impondo a lei a decisão contrária -, tanto mais que não existe qualquer risco de contradição de julgados entre um e outro processo nesta matéria, nada impedindo ou prejudicando que o tribunal a quo conhecesse autonomamente o incidente do levantamento do efeito suspensivo automático.

K. Interpretar as normas da lei processual no sentido de que, neste contexto, o efeito suspensivo automático conservar-se-ia na pendência da suspensão da instância (com a inerente impossibilidade de a Recorrente obter o seu levantamento por via jurisdicional), implica inviabilizar a possibilidade de defesa e ponderação do interesse público, com óbvia violação das normas constitucionais que concretizam esse princípio da prossecução do interesse público e o princípio da tutela jurisdicional efetiva (cf. artigos 20.º, n.ºs 1 e 4, 266.º, n.º 1 e 268.º, n.º 4, da Constituição).

L. Mais significa uma violação do caráter (necessariamente) urgente (urgentíssimo) deste incidente, ao arrepio do estabelecido na lei.

M. Por fim, e em todo o caso, o despacho recorrido deveria ter obrigatoriamente ponderado se haveria fundadas razões para crer que o processo n.º 1422/19.9BESNT foi intentado unicamente para obter a suspensão ou se a causa do processo n.º 102/20.7BESNT estaria tão adiantada que os prejuízos da suspensão superariam as vantagens (artigo 272.º, n.º 2, do CPC).

N. Entendendo (não se sabe com que fundamento) que, no caso de suspensão da instância, a suspensão do ato e do contrato se mantinha e o incidente de levantamento desse efeito não poderia ser conhecida, a concretização dessa ponderação deveria levar a que não tivesse sido determinada a suspensão da instância, e isto porquanto já tinha decorrido a fase dos articulados no processo n.º 102/20.7BESNT e o incidente de levantamento do efeito suspensivo já se encontrava concluso para decisão, pelo que os prejuízos da suspensão superariam claramente as respetivas vantagens.”.

Pede que seja concedido provimento ao recurso e, em consequência, seja revogada a decisão recorrida, substituindo-se por outra que, em virtude da suspensão da instância, reconheça que se deixou de produzir o efeito suspensivo automático previsto no artigo 103.º-A do CPTA ou, caso assim não se entenda, sem prejuízo da suspensão da instância, seja apreciado o incidente de levantamento do efeito suspensivo automático, ou ainda, se assim não se entender, não obstante a existência de causa prejudicial, não ser ordenada a suspensão, por o incidente do levantamento do efeito suspensivo estar tão adiantado que os prejuízos da suspensão superam as vantagens.

* A Contrainteressada, S.................., Lda.

, inconformada, interpôs também recurso jurisdicional contra a decisão recorrida, no âmbito do qual formulou as seguintes conclusões: “1. Por despacho proferido nos presentes autos, determinou o Tribunal a quo que a acção que corre termos na Unidade Orgânica 3 do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra sob o número de processo 1422/19.9BESNT é prejudicial à acção que corre nos presentes autos.

  1. Em consequência, determinou o Tribunal a quo a suspensão da instância nos presentes autos.

  2. Não apreciando o incidente de levantamento do efeito suspensivo automático requerido pelo R. Metro de Lisboa, cuja apreciação considerou «ficar prejudicada».

  3. E mantendo o efeito suspensivo automático da acção que corre termos nos presentes autos.

  4. Sucede, porém, que o Tribunal a quo determinou incorrectamente a suspensão da instância, sendo igualmente incorrecta e ilegal, na forma de omissão de pronúncia e de denegação de justiça, a não decisão do incidente de levantamento do efeito suspensivo automático.

  5. De facto, o Tribunal a quo decidiu a suspensão da instância sem, porém, proceder a uma análise casuística e fundamentada de tal decisão.

  6. Com efeito, nas contestações apresentadas, quer a Ré Metro de Lisboa quer a Contra-Interessada e aqui Recorrente S.................. pugnaram pela litispendência parcial da acção que corre nos presentes autos face à acção n.º 1422/19.9BESNT.

  7. Porém, o Tribunal a quo limitou-se a reproduzir as alegações das partes para, depois, dar o salto (i)lógico para a causa prejudicial.

  8. Na verdade, ao ser improcedente a acção n.º 1422/19.9BESNT, o Tribunal a quo terá de proferir uma decisão na acção a que se referem os presentes autos.

  9. Porém, caso contrário, havendo procedência, ainda que parcial, da acção n.º 1422/19.9BESNT, apenas haverá lugar à inutilidade superveniente da lide nos presentes autos.

  10. Pois, ainda que seja parcial a declaração de ilegalidade pretendida pelas Autoras, sempre serão destruídos todos os actos posteriores do procedimento.

  11. Acresce que a suspensão da instância permite a prática dos actos que sejam urgentes para evitar dano irreparável (primeira parte do n.º 1 do art.º 275.º do Código de Processo Civil ex vi art.º 1.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos).

  12. Ora, o incidente de levantamento do efeito suspensivo automático previsto no art.º 103.º-A do Código de Processo nos Tribunais Administrativos visa exactamente a ponderação dos danos que resultem da suspensão do acto impugnado.

  13. Tal incidente de levantamento do efeito suspensivo automático foi requerido pela Ré Metro de Lisboa em data anterior à declaração...

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