Acórdão nº 675/04.1BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 09 de Julho de 2020

Magistrado ResponsávelJORGE CORTÊS
Data da Resolução09 de Julho de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acórdão I- Relatório J………………….., melhor identificado nos autos, deduziu impugnação Judicial contra o acto de liquidação adicional do IRS de 1999 e juros compensatórios, peticionando a nulidade da liquidação. O Tribunal Tributário de Lisboa, por sentença proferida em 29 de Outubro de 2019, julgou procedente a Impugnação, determinando a anulação da liquidação de IRS do exercício de 1999. Desta sentença foi interposto recurso pela Fazenda Pública. Nas correspondentes conclusões, a recorrente alega em síntese nos termos seguintes: «A. Visa o presente recurso demonstrar à evidência o desacerto dos supracitados excertos da douta decisão, a qual deriva não só da incorrecta percepção e valoração da factualidade, como também da errónea interpretação e violação do artigo 2.º do CIRS e do artigo 74.º da LGT.

  1. No caso das correções efetuadas, inconforma-se a Fazenda Pública com os segmentos da decisão e sua fundamentação, que estão na base do decaimento da Fazenda nos presentes autos impugnatórios.

  2. Decidiu o douto tribunal a quo, na sentença ora recorrida, que a AT não coligiu os elementos suficientes que permitissem a emissão da liquidação impugnada. É com esta conclusão e com a fundamentação expressa na sentença, de que se recorre que a Fazenda Pública não pode deixar de dissentir.

  3. Ao contrário da decisão recorrida, considera a Fazenda Pública, que não foi produzida prova que, de forma minimamente concreta ou credível, permita estabelecer com fiabilidade que efectivamente estamos perante ajudas de custo, pois estas encontram-se insuficientemente justificadas, pelo Impugnante, que não apresentou provas concludentes que aqueles valores foram pagos por deslocações efetivas.

  4. Acrescendo que a própria entidade patronal interpôs uma ação cível contra o Impugnante, de forma também a poder anular as contrapartidas financeiras nos termos do Acordo Revogatório assinado em 16/04/1997, entre a D………., C.R.L., titular do estabelecimento de ensino "Universidade Moderna", e o ora Impugnante, sendo atribuída ao Impugnante, a título vitalício, uma pensão de reforma, sob a forma de um cartão de crédito no valor de 200.000$00 (€997,60), catorze meses por ano (clausula 3ª), e ainda, entre outras regalias, o pagamento de despesas telefónicas até ao limite de 240.000$00 (€1197,11), com o mesmo carácter vitalício (clausula 5ª), apenas como correspondência disponibilidade para dar pareceres ou elaborar informações, dentro da sua especialidade, quando solicitadas pelo Magnifico Reitor, ou para com este colaborar.

  5. Constata-se que, nunca o tribunal a quo poderia efetuar tal correspondência entre os valores designados e as ajudas de custo, por não se referirem as deslocações efetuadas pelo recorrido, nem de qualquer modo foi feita prova que estas deslocações correspondessem a um qualquer serviço efectuado no interesse da cooperativa, ou sequer, que as mesmas tenham ocorrido, pelo que não se poderá considerar como provado o facto nos termos em que a sentença recorrida considera.

  6. A inexistência de elementos de prova que permitam concluir à AT, no exercício do seu poder/dever de controlo do cumprimento da legalidade fiscal, a realização das deslocações justificativas do pagamento das ajudas de custo, é, no entender da Fazenda Pública e salvo melhor opinião, suficiente para englobar os respectivos montantes nos restantes rendimentos remuneratórios sujeitos a tributação.

  7. Para que tal não sucedesse, o recorrido poderia demonstrar que tais quantitativos correspondiam, efectivamente, à compensação por despesas de deslocação que suportou, fazendo-o mesmo em substituição da sua entidade patronal, o que não ocorreu.

    I. Perante a inexistência de prova que contrariasse a veracidade das correcções realizadas em sede de inspecção, a AT entendeu que o montante recebido pelo Impugnante da sua entidade patronal, era a título de remuneração.

  8. No que concerne à decisão do Tribunal a quo sobre a fundamentação do ato e, em clara discordância com o decidido, reitera-se que quer no relatório de inspecção, quer na contestação apresentada, a AT sempre assentou a sua posição numa fundamentação clara, concreta e concisa, referindo sempre as razões de facto e de direito que justificam as correcções propostas e a decisão levada a cabo, permitindo aos sujeitos passivos perceberem sempre a motivação daqueles actos.

  9. Afigurando-se-nos que a liquidação controvertida respeita os requisitos de fundamentação legalmente exigidos, permitindo perceber a sua natureza, as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e aos destinatários a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pela entidade decidente e defender-se nos termos em que o fizeram.

    L. No caso sub judice, torna-se evidente que as verbas mensais, abonadas a título de ajudas de custo, não se destinavam a reembolsar o impugnante por despesas que tivesse de efectuar em serviço e a favor da sua entidade patronal, constituindo antes uma prestação regular e periódica, quando muito um complemento, expressivo de uma forma de retribuição, sujeita a tributação em sede de IRS, de acordo com o artigo 2.º do CIRS.

  10. Deste modo, para ficar afastada a incidência do imposto sobre aquele montante, seria necessário que, o mesmo, não só fosse “qualificado” como ajudas de custo pela entidade patronal, como também que preenchesse os requisitos legais indispensáveis a ser considerado como ajuda de custo, de molde a sair do campo de incidência previsto no art. 2° do CIRS.

  11. A sentença recorrida, ao assim não entender, apresenta-se ilegal por desconformidade com os preceitos acima assinalados, não merecendo por isso ser confirmada.

    Termos em que com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve o presente recurso ser provido e, consequentemente ser revogada a sentença proferida pelo Douto Tribunal “a quo”, assim se fazendo a costumada Justiça!»X O impugnante, J........., contra-alegou, expendendo conforme segue: «A. Vêm as presentes Alegações apresentadas no âmbito do recurso interposto pela Fazenda Pública da sentença proferida no processo n.º 675/04.1BELSB do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou totalmente procedente o pedido formulado pelo Impugnante, ora Alegante, que aí pugnava pela anulação do ato tributário de liquidação adicional de IRS e juros compensatórios, referente ao período de tributação de 1999, no valor global de € 7.482,55.

  12. Pretexta a Fazenda Pública que não se conforma com a douta decisão por considerar que “(…) a douta sentença sob recurso padece de erro de julgamento da matéria de facto, já que a douta sentença errou nos factos considerados provados e no juízo sobre os mesmos, com base nos elementos tidos no processo, tendo valorado erradamente a prova produzida, no que tange à verdadeira natureza das verbas recebidas pelo recorrido a título de ajudas de custo.”.

  13. Ao invés da posição assumida pela Representante da Fazenda Pública, entende a Recorrida ser justa, adequada e legalmente fundamentada a decisão proferida pelo Tribunal a quo, pelo que a parte da sentença objeto de recurso não merece qualquer censura, devendo ser mantida qual tale.

  14. No que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao Recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, designadamente, como sanciona o n.º 1 do artigo 640º do Código de Processo Civil, exige-se que o Recorrente delimite o âmbito do recurso indicando claramente os segmentos da decisão que considera padecerem desse erro e por outro, que e fundamente as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa.

  15. Efetivamente, a Fazenda Pública não especifica criticamente os concretos meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa o recurso não pode deixar de improceder na parte em que impugna a decisão da matéria de facto por manifesta falta de cumprimento do ónus previsto n.º 1, do artigo 640.ºdo CPC.

  16. Ademais, da tese recursiva apresentada pela Fazenda Pública, tanto em sede de alegações, como em sede de conclusões, não se consegue concluir, quais os pontos de facto que concretamente considera erradamente julgados, o que determina tout court a rejeição imediata do recurso quanto à matéria de facto, e consequente não conhecimento do mesmo.

    G.

    Adicionalmente e sem prescindir, esclareceu o Supremo Tribunal Administrativo, no Acórdão proferido no âmbito do processo n.º 039405, de 19-10-2005, que “O Tribunal de recurso só deve modificar a matéria de facto quando a convicção do julgador, em 1ª instância, não seja razoável, isto é, quando seja manifesta a desconformidade dos factos assentes com os meios de prova disponibilizados nos autos, dando-se assim a devida relevância aos princípios da oralidade, da imediação e da livre apreciação da prova e à garantia do duplo grau de jurisdição sobre o julgamento da matéria de facto.” De modo que, o tribunal de recurso deve limitar a modificação da decisão de facto para os casos em que a mesma seja arbitrária por não se mostrar racionalmente fundada ou em que for evidente, segundo as regras da ciência, da lógica e da experiência que não é razoável a solução da primeira instância.

  17. Da tese recursiva apresentada pela...

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