Acórdão nº 161/20 de Tribunal Constitucional (Port, 04 de Março de 2020

Magistrado ResponsávelCons. Teles Pereira
Data da Resolução04 de Março de 2020
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 161/2020

Processo n.º 51/2020

1.ª Secção

Relator: Conselheiro José António Teles Pereira

Acordam, em Conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – A Causa

1. A., Inc. apresentou, junto de tribunal arbitral necessário, contra B., BV (ora Recorrente) um pedido de condenação desta sociedade a abster-se de, em território português, ou tendo em vista a comercialização neste território, importar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender ou oferecer o medicamento genérico bortezomib, durante a vigência das patentes europeias e certificado complementar de proteção dos quais a Demandante invocou ser titular.

1.1. Foi proferida decisão arbitral, datada de 29/06/2017, pela qual a ação foi julgada procedente.

1.1.1. A B., BV interpôs recurso de apelação desta decisão para o Tribunal da Relação de Lisboa, que, por acórdão de 16/10/2018, julgou o recurso parcialmente procedente, revogando a decisão arbitral quanto à condenação da Demandada no pagamento de sanção pecuniária compulsória e quanto à repartição dos encargos com o processo arbitral, confirmando, no mais, a decisão recorrida.

1.1.2. Desta decisão pretendeu a Demandada recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça (STJ). Por acórdão de 11/04/2019, o STJ decidiu não admitir a revista excecional e determinou a remessa dos autos à distribuição como revista normal.

1.1.3. Distribuído o recurso como revista normal, o relator proferiu despacho, datado de 05/06/2019, no sentido da notificação da Requerente para, no prazo de dez dias, se pronunciar sobre a questão da inadmissibilidade da revista.

1.1.4. Ouvida a Recorrente, o relator proferiu despacho, em 09/07/2019, no qual concluiu pela inadmissibilidade da revista.

1.1.5. Desta decisão reclamou a Recorrente para a conferência, que, por acórdão de 24/10/2019, confirmou o despacho do relator.

1.2. A Recorrente interpôs, então, recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC – cfr. requerimento de fls. 1932 a 1937, que aqui se dá por integralmente reproduzido –, tendo em vista a apreciação da norma contida no artigo 344.º, n.º 2, do Código Civil, interpretados no sentido de que o tribunal pode inverter o ónus da prova na sentença, sem advertência expressa prévia da ré/demandada.

Do referido requerimento consta, designadamente, o seguinte:

“[…]

Ex.mo Senhor Conselheiro

Relator do Supremo Tribunal de Justiça

B. BV, Recorrente nos autos à margem referenciados em que é Recorrida A. Inc., vem nos termos do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), e da Lei do Tribunal Constitucional, (…) interpor recurso de constitucionalidade para o Tribunal Constitucional, do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça no dia 24 de outubro de 2019.

violação dos princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança, decorrente dos princípios do Estado de Direito Democrático consagrado nos artigos 2°- e artigo 20º, n.°- 4 da CRP.

[…]” (sublinhados acrescentados).

1.2.1. O recurso para o Tribunal Constitucional foi objeto de um despacho de não admissão, datado de 27/11/2019 – que constitui a decisão reclamada –, em suma, porquanto a norma indicada como objeto do recurso “[…] não foi aplicada pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de outubro de 2019, do qual se pretende agora recorrer para o Tribunal Constitucional”.

1.2.2. A Recorrente reclamou, então, para o Tribunal Constitucional da decisão que não admitiu o recurso, invocando o seguinte (transcrição parcial do requerimento de fls. 1953 a 1961, que aqui se dá por integralmente reproduzido):

“[…]

A B. interpôs o recurso de constitucionalidade ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC, requerendo a apreciação da constitucionalidade da interpretação feita pelo Tribunal da Relação do artigo 344.º, n.º 2, do Código Civil, no sentido de que o tribunal pode inverter o ónus da prova na sentença, sem advertência expressa prévia da ré/demandada.

Na Decisão Reclamada considerou-se que o recurso deverá ser rejeitado porque o Supremo Tribunal de Justiça não chegou a conhecer do objeto de revista e naturalmente ficou prejudicada a apreciação da norma do art. 344º, n.º 2, do Código Civil, e a sua conformidade com a Constituição da República Portuguesa.

Acontece que, analisado o requerimento de interposição do recurso resulta claro que as normas legais cuja constitucionalidade é questionada pela B. foram aplicadas pelo Tribunal da Relação de Lisboa no seu acórdão de 16 de outubro de 2018.

Desde a prolação do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23.06.2016, proferido no processo n.º 1248/14.6YRLSB.S1 , a jurisprudência daquele Tribunal tem entendido de forma unânime que cabe recurso revista de acórdãos do Tribunal da Relação proferidos em sede de recurso de decisões finais de tribunais arbitrais constituídos ao abrigo da Lei n.º 62/2011 nos casos em que o recurso é sempre admissível, e em particular nas situações previstas no artigo 629.º, n.º 2 do Código de Processo Civil (“CPC”).

Inconformada com o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 16 de outubro de 2018, a B. recorreu dessa decisão ao abrigo dos artigos 671.º e 672.º, n.º 1, al. c), do CPC, tendo invocado, nas suas alegações de revista, a inconstitucionalidade da interpretação conjugada do artigo 344.º, n.º 2, do Código Civil feita no acórdão ali recorrido.

A questão de inconstitucionalidade não foi apreciada pelo Supremo Tribunal de Justiça apenas porque este Tribunal entendeu que a revista não era admissível e rejeitou o recurso, primeiramente por...

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