Acórdão nº 00189/17.0BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelRicardo de Oliveira e Sousa
Data da Resolução17 de Abril de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:* *I – RELATÓRIO C.,S.A., com os sinais dos autos, vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença promanada pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, no âmbito da presente Ação Administrativa intentada contra si por INFRAESTRUTURAS DE PORTUGAL, S.A., também com os sinais dos autos, que, em 08.05.2019, julgou a mesma totalmente improcedente, e, em consequência, absolveu a Ré do pedido.

Em alegações, a Recorrente formulou as conclusões que ora se reproduzem, que delimitam o objeto do recurso: “(…) 1.

Vem o presente recurso interposto da sentença que decidiu absolver a Ré, do pagamento de € 5.216,18, decorrente dos danos verificados no veículo XX-PP-XX em resultado do embate do mesmo no javali que se encontrava a atravessar o IP 3 ao km 75,200 sentido Sul/Norte.

  1. Não se pode a Recorrente conformar com esta decisão, pois entende que deveria ter sido feita uma ponderação diferente da matéria de facto o que levaria a uma condenação total da Ré.

  2. Com interesse para a decisão da presente questão, foram dados como provados os factos constantes das alíneas c) a N).

  3. O Tribunal a quo entende que a Lei n.° 24/2007 de 18/07 não se aplica ao caso em concreto e nessa medida não se aplica a presunção prevista no artigo 14.° do mesmo diploma.

  4. A Recorrente não está de acordo com a exclusão da aplicação da Lei n° 24/2007, de 18 de julho, uma vez que os tribunais já decidiram em sentido contrário em situações em tudo idênticas.

  5. Veja-se a título de exemplo o Acórdão do processo n.° 376/09.4TBVRL.G1 do Tribunal de Relação de Guimarães de 19/05/2016, no qual decidiu que a concessionária é responsável pelo pagamento decorrente de um acidente que ocorreu precisamente no IP 3.

  6. E ainda o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, com o n.° 09177/12 de 16-03-2017, que decidiu que num caso em que uma pedra foi arremessada para o IC 19, ainda assim devia ser considerada a responsabilidade da concessionária uma vez que a via onde se registou o acidente está abrangida pelo conceito de autoestrada.

  7. Na ótica da Recorrente se a interpretação feita pelo tribunal de 1ª instância for considerada a correta, estamos a admitir que em duas situações identificas, em que uma ocorra numa autoestrada e outra num IP, no primeiro caso o lesado é indemnizado dos prejuízos que teve e no segundo caso o lesado tem de suportar os prejuízos sofridos sem lugar a qualquer indemnização.

  8. Face ao exposto, a Recorrente entende que a manter-se a decisão conforme proferida pelo tribunal de 1ª instância, existe uma clara violação do princípio da igualmente, previsto na Constituição da República Portuguesa.

  9. Outro argumento usado pelo tribunal é que a Ré demonstrou que cumpriu com os deveres de vigilância e que esse cumprimento por si só é suficiente para a sua absolvição.

  10. Ora, conforme resulta dos Acórdão supra identificados, não chega que uma concessionária faça prova que fez as rondas e inspeções às vedações para garantir que o dever de segurança foi cumprido, porque conforme se viu, isso não impediu que um conjunto de javalis entrasse na via e provocasse um acidente, sendo nesse sentido que a jurisprudência tem vindo a decidir, conforme Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, com o número 00106/15.1BEVIS, de 22-09-2017.

  11. Assim sendo mesmo que se admita que a Lei n° 24/2007, de 18 de julho não tem aplicação ao caso concreto, não existe fundamento para se distinguir a situação dos presentes autos das demais uma vez que também neste caso os animais conseguiram o acesso à via e invadiram a faixa de rodagem o que fez com que o utente fosse surpreendido e não conseguisse evitar o embate.

  12. Face ao exposto, a decisão de 1ª instância deve ser substituída por outra que condenada a Ré no valor do pedido.

NESTES TERMOS, e nos demais de direito, concedendo provimento ao recurso, e alterando a sentença sub judice conforme supra preconizado, farão V. Exas. a costumada VERDADEIRA JUSTIÇA! (…)”.

*Notificada que foi para o efeito, a Recorrida produziu contra-alegações, defendendo a manutenção do decidido quanto à improcedência da presente ação.

*O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos e o modo de subida.

*O/A Digno[a] Magistrado[a] do Ministério Público junto deste Tribunal Superior não emitiu o parecer a que se alude no nº.1 do artigo 146º do CPTA.

*Com dispensa de vistos prévios, cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.

* * * *II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.

Neste pressuposto, a questão a dirimir consiste em saber se a sentença recorrida, ao julgar nos termos e com o alcance explicitados no ponto I) do presente acórdão, incorreu em erro de julgamento de direito.

* *III – FUNDAMENTAÇÃO III.1 – DE FACTO O quadro fáctico [positivo e negativo] apurado na decisão recorrida foi o seguinte: “(…) A) No exercício da sua atividade, a Autora celebrou com J. um contrato de seguro do ramo automóvel, titulado pela apólice n.° (...), relativo ao veículo ligeiro de passageiros de marca SEAT, modelo Leon 1.6 TDI Style Ecomotive, com a matrícula XX-PP-XX, e pelo qual este transferiu para aquela a responsabilidade civil emergente da circulação rodoviária do veículo; B) O contrato identificado em A) incluía a cobertura de danos próprio da viatura, designadamente, choque, colisão e capotamento; C) A 04/02/2016, pelas 21h20m, o veículo identificado em A), conduzido por J., esteve envolvido num sinistro automóvel quando circulava no IP3, ao Km 75,20, sentido (...) - (...), no lugar de (...), concelho de (...); D) O local tem uma curva suave, com inclinação descendente, apresenta um pavimento asfaltado, encontrando-se, à data e hora, seco e limpo, sem qualquer substância gordurosa, verificando-se bom tempo; E) O IP3 tem, nesse local, dois sentidos de marcha, com separador central e pinos na respetiva berma, sem iluminação da via; F) O veículo identificado em A) circulava naquela artéria na faixa mais à direita, a cerca de 80 km/hora; G) O local do sinistro situa-se cerca de 50 metros antes do nó designado de “Lagoa (...)”, onde estão instaladas unidades hoteleiras e de restauração; H) Ao aproximar-se do quilómetro 75,20 daquela via, na localidade de (...), surgiram súbita e...

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