Acórdão nº 155/19.0BCLSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 13 de Fevereiro de 2020

Data13 Fevereiro 2020
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1998_02

ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA 1.ª SECÇÃO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I – RELATÓRIO S.........-F........., SAD intentou no T.A.D. processo arbitral “necessário” contra FEDERAÇÃO PORTUGUESA DE FUTEBOL, sendo Contrainteressado F..........

A pretensão formulada perante a instância arbitral foi a seguinte: - anulação da deliberação proferida pela Secção Profissional do Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol proferida a 2 de abril de 2019, no âmbito do Recurso Hierárquico Impróprio n.° …../19, que absolveu o Arguido F......, aqui Contrainteressado, da prática da infração disciplinar prevista e punida no artigo 141º do Regulamento Disciplinar da Liga Portuguesa de Futebol Profissional, doravante RDLPFP, por violação dos deveres previstos no artigo 19º, n.° 1, do mesmo Regulamento e no artigo 51º do Regulamento de Competições da Liga Portuguesa de Futebol Profissional, adiante RCLPFP.

Por DECISÃO ARBITRAL COLEGIAL, a instância arbitral privada (cf. assim o Acórdão do TC nº 543/2019) recorrida decidiu absolver a ré do pedido impugnatório.

* Inconformada, a impugnante S…….. - SAD interpôs o presente RECURSO DE APELAÇÃO URGENTE contra aquela decisão, ao abrigo da Lei do Tribunal Arbitral do Desporto, formulando na sua alegação o seguinte quadro conclusivo: 1.

O Aresto Recorrido não efetua uma correta ponderação da prova constante dos Autos, nem a submete às regras da experiência comum na análise que efetua da factualidade em causa nos mesmos.

  1. A análise dos elementos de prova documental constante dos Autos, nomeadamente a Decisão proferida pela Entidade Reguladora da Comunicação Social (ERC), relativamente ao programa "Universo Porto Da Bancada", exibido no Porto Canal, analisada à luz das regras da experiência comum, permite concluir sem margem para dúvidas, que o fito do Recorrido foi, não o de exprimir uma opinião, mas o de (mais uma vez) insultar a Recorrente.

  2. A desconsideração da prova referida em sede de Alegações é um vicio da Decisão cognoscível por este Tribunal em sede de Recurso, 4.

    Impõe-se dar como provados os seguintes factos: a) "a conduta descrita é manifesta e objetivamente inapropriada e, portanto, contrária à cortesia que deve pautar as relações entre os diversos agentes desportivos"; e, bem assim, b) "o Arguido F...... agiu de forma livre, consciente e voluntária bem sabendo que o seu comportamento - ao transmitir a ideia que a S.......-F....... SAD não era séria - era descortês e desrespeitoso para com a S.......-F....... SAD, sendo punida pelo ordenamento jusdisciplinar desportivo, porém, não se absteve de o realizar." 5.

    E, em consequência, atentos os fundamentos jurídicos melhor detalhados em sede de Alegações, impõe-se considerar que o Recorrido praticou a contra-ordenação em causa nos Autos.

    Nestes termos e nos mais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá o presente Recurso ser considerado inteiramente procedente e, em consequência, anulada a Decisão Recorrida, com todas as legais consequências, designadamente a condenação do Contra-interessado pela prática da infração disciplinar prevista e punida pelo artigo 141.° do RDLPFP, por violação dos deveres previstos no artigo 19.°, 1 e 2 do mesmo RD LPFP e no artigo 51.° do Regulamento de Competições da Liga (RCLPFP).

    * O recorrido F.........

    contra-alegou, concluindo assim: A.

    A decisão recorrida não merece qualquer reparo ou censura porquanto não se mostram preenchidos os requisitos exigíveis para a punição pelo ilícito disciplinar p. e p. pelo art. 141.° do RD, em virtude de estar em causa um juízo crítico plenamente reconduzível ao legítimo exercício da liberdade de expressão que assiste ao contrainteressado.

    B.

    Uma avaliação isenta e imparcial da afirmação reduzida a escrito conduzirá a uma única conclusão: a declaração vertida na página Twitter pelo contrainteressado não colide com a honra e bom nome de quem quer que seja, nem se manifesta como um comportamento incorreto ou indecoroso de tal modo inapropriado que manifesta e objetivamente viola os deveres de lealdade, probidade, verdade e retidão - revelando-se, pois, como disciplinarmente atípica.

    C.

    Não é despiciente relembrar que estamos in casu perante uma afirmação emitida em resposta a uma provocação provinda da própria Demandante, ora Recorrente, fundando-se em factos que são demonstradamente públicos e notórios.

    D.

    Sendo certo que, na sua declaração, o contrainteressado usou até um tom mais brando do que o das afirmações a que respondia, não tendo agido com o propósito de ofender, ou faltar à urbanidade e correção para com quem quer que seja.

    E.

    Pelo que, não se trata de uma qualquer reação inopinada ou gratuita do contrainteressado, levada a cabo com um intuito puramente difamatório, mas antes de uma concreta resposta à afronta feita publicamente pela Recorrente ao F….. . Afronta essa que - até pelo descaramento que revela - mereceu, por parte do contrainteressado, a denúncia que as suas palavras exprimiram.

    F.

    Limitou-se, pois, o contrainteressado, a recordar um par de factos objetivamente verdadeiros: é verdade que a S……-F……, SAD estava, à data, acusada de um crime de corrupção e de um crime de recebimento indevidamente de vantagem, designadamente, no chamado processo E-toupeira; e também é verdade que a S….. — F….., SAD estava a ser investigada por pagar a adversários para perderem, nomeadamente, no caso conhecido como "processo dos e-mails”.

    G.

    Ora, quem à data se encontrava nesta posição de arguida acusada por várias dezenas de crimes no processo e-toupeira e como suspeita num esquema de corrupção desportiva no processo n.° 5340/17.7T9LSB veio a público lançar insinuações de corrupção sobre a F.....- F....., SAD. Face a tal desplante, o contrainteressado limitou-se a recordar publicamente que, vindas de quem vinham, insinuações dessa natureza não mereciam qualquer credibilidade.

    H.

    Exerceu, pois, enquanto representante do F……, o "direito ao contra-ataque" inerente à liberdade de expressão na arena do debate público (cf. Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código Penal, 3 a ed., Univ. Católica, 2015, Art. 180).

    I.

    Sendo certo que - e com especial relevância para o caso em apreço - "aquele que no debate público de ideias provoca um juízo negativo, terá de suportar urna reação particularmente violenta, mesmo que diminua a sua consideração- (Ac. do Tribunal Constitucional Federal alemão de 13-05-1980, no caso Kunstkritik, apud COSTA ANDRADE, Liberdade de Imprensa e Inviolabilidade Pessoal. Uma Perspectiva Jurídico Criminal, Coimbra Editora, 1996, pág. 310).

    J.

    Por muito que possa ferir suscetibilidades alheias, criticar implica censurar negativamente. Censura essa que - enquanto manifestação da liberdade individual - só deixa de ser legítima quando exprime uma antijuricidade objetiva, violando direitos que são personalíssimos. O que claramente não sucede in casu.

    K.

    Quando estão em causa condutas expressivas adotadas em contexto futebolístico - em particular no que concerne a debates que confrontam clubes rivais e que se consubstanciem em denúncias de práticas de atos ilícitos ou censuráveis para conquistar competições nacionais ou internacionais - deve, inclusive, ser atribuída uma garantia reforçada ao exercício da liberdade de expressão (TEDH: Axel Springer AG V. Germany, 2012, § 90).

    L.

    Face aos factos que lhe estão subjacentes, a opinião emitida não deixa de ter, pois, uma base factual mínima (dir-se-á, inclusive, mais do que suficiente). Pelo que, sendo este o circunstancialismo contextual que envolveu a publicação em apreço nos autos, não poderia o Tribunal a quo deixar de o valorar positivamente a favor do contrainteressado, assim fazendo prevalecer o direito à liberdade de expressão que ao mesmo assiste.

    M.

    Até porque, como vem sublinhando o TEDH, o único...

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