Acórdão nº 1510/19.6T8FAF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 27 de Janeiro de 2020

Magistrado ResponsávelJORGE BISPO
Data da Resolução27 de Janeiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I.

RELATÓRIO 1.

No processo de contraordenação com o NUICO 0009846, a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDRN) proferiu decisão, em 08-04-2019, a condenar a arguida, "R. C., UNIPESSOAL, LDA.", pela prática da contraordenação prevista e punida pelo n.º 1 do art. 13º do DL n.º 78/2004, de 03 de abril (na sua redação atual), e na al. b) do n.º 2 do art. 34º do mesmo diploma, conjugado com o n.º 2 do art. 9º da Lei n.º 50/2006, de 03 de julho (na sua redação atual), na coima de € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros).

  1. Não se conformando com essa decisão, a arguida impugnou-a judicialmente, tendo o Mmº. Juiz a quo, por sentença de 07-10-2019, julgado improcedente o recurso, mantendo a referida condenação.

  2. Mais uma vez inconformada, a arguida interpôs recurso dessa sentença, concluindo a sua motivação nos seguintes termos (transcrição parcial[1]): «Em conclusão (…) D. Inconformada com tal douta decisão, a empresa arguida interpôs o presente recurso, por entender que a decisão recorrida está a violar o estatuído no artigo 7º, n.º 2 do Dec-Lei n.º 433/82, de 27/10, do RGCCO, onde se diz: “As pessoas coletivas ou equiparadas serão responsáveis pelas contraordenações praticadas pelos seus órgãos no exercício das suas funções”.

    1. Na verdade, tendo em conta que na matéria de facto dada como provada, na douta decisão recorrida, no seu Ponto n.º 2, o seguinte: “2) No local verificaram uma queima de resíduos, nomeadamente plásticos, cartão e borracha efetuada por trabalhadores da aqui arguida”, dúvidas não restam de que a referida “queima” foi efetuada por trabalhadores daquela empresa e não por nenhum membro dos seus órgãos, ou por ordens dadas por estes.

    2. Sendo de realçar que, na douta decisão recorrida não se deu como provado que os trabalhadores da empresa arguida tenham agido contra a vontade e sem a autorização da sua entidade patronal, mas também não se deu como provado que os mesmos agiram segundo as ordens e as instruções da sua entidade patronal.

    3. Por outro lado, face ao teor da citada norma, não restam dúvidas de que para que uma contraordenação possa ser imputada a uma pessoa coletiva é necessário que a mesma seja cometida pelos seus órgãos, no exercício das suas funções.

    4. Assim sendo, mostra-se necessário saber qual é o conceito de órgão. Como escreve o prof. Germano Marques, “O conceito de órgão numa sociedade não suscita dificuldades especiais, quando se refere a órgãos de direito. Basta analisar a legislação referente às sociedades e aos respetivos estatutos. Estes órgãos são constituídos por uma ou várias pessoas físicas que atuam colegialmente às quais a lei ou os estatutos atribuem uma função particular na organização da sociedade.” I. Já o conceito de órgão, em termos doutrinais, vem sendo definido como “.....

      o elemento da pessoa coletiva que consiste num centro institucionalizado de poderes funcionais a exercer pelo indivíduo ou colégio de indivíduos que nele estiverem providos com o objetivo de exprimir a vontade juridicamente imputável a essa pessoa coletiva.” – Prof. Germano Marques da Silva, obra citada.

    5. Nesta conformidade, sendo a recorrente uma sociedade por quotas, a sua administração e representação compete aos gerentes, nos termos do disposto no artigo 252º, do Código das Sociedades Comerciais e apenas àqueles que tenham sido designados no seu contrato social.

    6. Aplicando tais ensinamentos ao caso em análise, constata-se que o facto típico foi praticado por funcionários da recorrente, sendo certo que nenhum deles assume ou tem a qualidade de órgão da empresa recorrente.

      L. Não se olvidando que, um simples funcionário é alguém que se integra no conceito de agente ou auxiliar, pelo que o mesmo não manifesta uma vontade que possa ser imputável à pessoa coletiva, pelo que, e consequentemente, não é um órgão nos termos e para os efeitos do estabelecido no artigo 7º, n.º 2, do RGCO.

    7. Nesta conformidade e atentos os factos dados como provados, não é possível concluir que os citados funcionários tenham praticado os factos, no caso – queima de resíduos, nomeadamente plásticos, cartão e borracha efetuada por trabalhadores da arguida - mediante instruções, ainda que genéricas, da gerência da recorrente. Pelo que, não pode a contraordenação objeto dos presentes autos ser imputada à empresa arguida, aqui recorrente, devendo, por isso, a mesma ser absolvida da sua prática.

    8. Pelo exposto, deverá o presente recurso ser declarado procedente e, em consequência, ser revogada a decisão recorrida, sendo a aqui arguida recorrente absolvida da prática da contraordenação, prevista e punida pelos artigos 13º, n.º 1 e 34º, n.º 2, al. b), do Decreto-Lei 78/2004 de 3 de Abril e artigo 9º, n.º 2, da Lei 50/2006.

      » 4.

      A Exma. Magistrada do Ministério Público junto da primeira instância respondeu à motivação da recorrente, entendendo que se deve manter nos seus precisos termos a decisão recorrida, pelos fundamentos sintetizados nas conclusões que formulou e que a seguir se transcrevem: «(…) 2. A contraordenação imputada à arguida é imputada a título de negligência.

  3. Na sentença recorrida não se imputa à recorrente a realização da queima, nem tão pouco que a arguida tenha dado instruções, ainda que genéricas, para se proceder à queima dos resíduos do modo apurado.

  4. O que vem imputado à recorrente é que a mesma não tomou medidas concretas, em momento anterior à data dos factos, no sentido de evitar que os seus trabalhadores realizassem a queima de resíduos do modo apurado.

  5. Daí não fazer qualquer sentido o argumento de que a pessoa coletiva só é responsável pelas contraordenações praticadas...

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