Acórdão nº 433/07.1BELRA de Tribunal Central Administrativo Sul, 16 de Janeiro de 2020

Magistrado ResponsávelPEDRO NUNO FIGUEIREDO
Data da Resolução16 de Janeiro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul I. RELATÓRIO J….. intentou ação administrativa comum contra a E..................., S.A., na qual pede a condenação da demandada no pagamento da quantia de € 9.

900, a título de indemnização determinada por responsabilidade extracontratual por danos causados no exercício da atividade administrativa.

Alega, em síntese, que no dia 20 de março de 2006, cerca das 14h10, na estrada A23, ao Km 16, no Entroncamento, a sua filha teve um acidente com um veículo de sua propriedade, devido a um lençol de água que cobria toda a faixa de rodagem, sem que existisse qualquer sinalização da existência de lençóis de água e a sua existência apenas se pode dever ao deficiente escoamento das águas e ao mau estado da conservação da estrada, a cargo da entidade demandada.

Citada, a entidade demandada apresentou contestação, na qual se defendeu por impugnação, alegando, em síntese, que o local onde se terá dado o acidente caracteriza-se por ser uma reta com inclinação, o que não permite a acumulação de água sobre o pavimento, o escoamento das águas é facilitado e permitido pela configuração, conceção e natureza da estrada, a conservação e a limpeza dos órgãos de drenagem são executadas de forma permanente e a obviar qualquer entupimento, pelo que não teve qualquer culpa no acidente; na altura do acidente chovia copiosamente, apresentando o piso a água que naturalmente dele escoa, o suficiente para produzir o “aqua-planning”, atenta a velocidade a que seguia o veículo, o veículo não tinha o valor comercial referido, nem o autor sofreu qualquer prejuízo pela privação do mesmo.

Por sentença de 29/09/2008, o TAF de Leiria julgou a ação parcialmente procedente por provada e consequentemente condenou o réu a pagar ao autor indemnização a fixar em execução de sentença pelos danos patrimoniais sofridos.

Inconformada, a ré interpôs recurso desta decisão, terminando as alegações com a formulação das conclusões que de seguida se transcrevem: “1. A decisão sobre a matéria de facto, é concomitante com a sentença e daí o recorrente não ter tido possibilidade de reclamar contra a deficiência, obscuridade ou contradição da decisão ou contra a falta da sua motivação, A sentença recorrida viola pois o disposto nos artigos 653° nº 4 e 5 e 694° do CPC 2. Referindo a sentença na Matéria de facto dada como não provada que "Não se provou que os órgãos de drenagem das aguas pluviais estivessem a funcionar de forma deficiente", há que concluir que o Autor não logrou provar a base da presunção da culpa que impendia sobre a Ré, nos termos do disposto no artigo 493°, nº 1 do C. Civil, que assim se mostra violado.

  1. No seu art° 14° da contestação a Ré alegou que "Estando os órgãos de drenagem completamente limpos e desobstruídos, sem nada que impedisse o livre escoamento das aguas "e no art° 15° do mesmo articulado que "escoamento das águas que é facilitado e permitido pela configuração, concepção e natureza da estrada ( uma recta, com inclinação, pavimento e órgãos de drenagem ) ", matéria a que o Tribunal não respondeu, omitindo pronúncia que devia efectuar.

    A sentença viola aqui, igualmente o disposto nos artigos 653°, nº 1, 2, 511°, n° 1, 513° e alínea d) do nº 1 do artº 668° do CPC.

  2. Em resposta aos artigos 12°, 13°, 14° e 23º da p.i., e 26° e 27° da contestação, respondeu o Tribunal ( 3 ), dando como provado, na parte que aqui importa: " 3 - Tinha chovido muito, e o piso estava cheio de agua, atravessando o mesmo, vindo do separador central...’ Tal resposta, tem de ser lida, com o sentido de que a água vinha " do lado " do separador da estrada, ou seja a água da chuva, que era muita, no seu movimento atravessava a estrada, do lado do separador central, para o outro lado, a berma. Este o sentido a reter da resposta e não outro.

    Interpretar a resposta como a água da chuva, vinda do "interior "do separador central, nisso há excesso de pronúncia, pois isso não constitui matéria alegada pelo Autor e Ré, violando por aqui também a sentença o disposto nos artigos 511°, nº 1, 660º, nº 2 e alínea d), nº 1 do art° 668° tudo do CPC.

  3. O documento, único documento de prova, que fundamenta a resposta (2) 123a matéria de facto impugnado pela Ré, é uma mera declaração de uma entidade ( EXPOFOR - Comércio e reparação de automóveis ), produzida em 10 de Julho de 2008, que não é, nem nunca foi dono ou proprietário do aludido veículo e por isso não o poderia vender.

    Face à existência nos autos de certidão do registo automóvel na respectiva Conservatória, único que titula a propriedade e portanto, com força probatória superior, aquele outro documento, não o pode afastar e ilidir a presunção de propriedade que dele decorre.

    Aquele documento, impugnado pela Ré, é uma mera declaração de pessoa que não é dono do veículo, e que não titula a sua propriedade, ao contrário da certidão da conservatória, sendo pois, a resposta a tal matéria em contradição com a prova produzida e por isso deve ser alterada, nos termos da alínea a) do n° 1 do artº 712° do CPC, violando a sentença, ainda o disposto nos artigos 369°, n° 1, 371°, 376°, 377°, 523°, 526º do C. Civil e 490º, nº 1 do CPC.

  4. Ora como se disse, o Autor alegou que era ao Km 16 que estava o lençol de água, e o acidente ocorreu ao Km 15,9, ou seja, a água no pavimento está pelo menos 100 metros mais à frente do que o local do despiste, que conforme resposta 1 da matéria de facto ocorreu ao Km 15,9 "No dia 20 de Março de 2006, cerca das 14h10m, ocorreu um embate, na A23, ao Km 15,9 Não há assim, nexo de casualidade entre a água no pavimento (Km 16 ) e o local do acidente (Km 15,9) pelo que a sentença está em contradição com os seus fundamentos, sendo nula nos termos do artº 668º, nº 1 alínea c) e bem assim viola igualmente o disposto o artº 659°, nº 3, 488°, 489º, 490º e 3º A, entre outros do CPC.

  5. Fundamenta a sentença como dela se transcreve igualmente da sua página 7 : " Tinha chovido muito e o piso estava cheio de água que escorria do separador central Em lado algum, da petição ou da matéria de facto seleccionada, vem alegado que a água existente no pavimento "... escorria do separador central" enfermando a decisão de excesso de pronúncia.

    A sentença, é também por aqui nula, violando as disposições dos artigos 660º, nº 2, 664º, 665º, nº 2 alínea d) e c) do artigo 668º.

  6. Ao contrário do que sustenta a douta sentença, considerando a estrada, e as condições atmosféricas, chuva, não se passou de uma situação normal, " de repente " para um " local que se encontrava cheio de água ".

    A sentença, conclui, pois diferentemente da matéria provada e em oposição com os fundamentos, pelo que também por aqui, viola entre outros o artigo 659º e alínea b) e c) do CPC, entre outros.

  7. Por outro lado, em lado algum da matéria provada se deu por assente que " a grande acumulação de água naquele local apenas se deveu ao mau funcionamento do sistema de drenagem da estrada A sentença recorrida, também por aqui, está em contradição com os fundamentos, com a matéria provada, sendo igualmente nula, nos termos da alínea c) do artº 668º do CPC.

  8. Ora vendo a condutora do veículo a água ao longe, como via e ela própria afirmou, não foi colhida de surpresa, e por isso, independentemente do local ser ou não uma auto-estrada, a condutora tinha que reduzir e moderar especialmente a velocidade como o impõe o art° 24, nº 1 e 25°, n° 1 alínea h) do Código da Estrada.

    Não há pois qualquer nexo de causualidade entre o acidente e a água no pavimento, pois aquele ficou a dever-se à velocidade da condutora do 65-29-XI que violou o disposto no art° 24°, n° 1 e 25, n° 1 alínea h) do Código da Estrada.

  9. Muito embora, tenha sido dado como provado ( 7) que "Não havia no local qualquer sinalização de aviso de formação de lençol de água " a verdade é que, como é referido na fundamentação à resposta da matéria de facto (3) a condutora do veículo diz " que a água se podia ver ao longe”.

    Se via a água ao longe, estava avisada e devia efectuar uma prática de Condução consentânea, de forma a evitar o acidente e o disposto naqueles artigos 24°, n° 1 e 25° n° 1 alínea h) do C. Estrada.

    Efectivamente a Autora assim não provou, a base da presunção de culpa que impendia sobre o recorrente estatuída no artigo 493°, n° 1 do CC, a presunção de culpa esta que não se repercute sobre o ónus da prova do nexo de causualidade (Pleno - Acord. de 27.04.99 e de 29.4.98, nos recursos 41712 e 36463).

  10. Os elementos factuais dados como provados, nomeadamente a existência de muita água no pavimento da estrada, não são causa adequada à produção do acidente, nem permitem estabelecer a relação de causa/efeito, de ligação entre a lesão e o dano.

  11. Como vem sendo decidido pelo STA, não há o dever de indemnizar por ausência de nexo causal entre o facto ilícito e o dano, quando se não possa concluir - como acontece no caso presente - em face das prova coligida, que o acidente não teria ocorrido se não fosse a existência daquela quantidade de água no pavimento.

  12. A presunção de culpa não se repercute sobre o ónus da prova do nexo de causalidade, entendido como relação de causa/efeito, de ligação positiva entre a lesão e o dano, através da previsibilidade deste em face daquele, a ponto de poder afirmar-se que o lesado não teria sofrido tal dano se não fosse a lesão (cfr. art° 563° do C. Civil).

  13. A presunção de culpa estabelecida no artigo 493° n° 1 do C.C. é aplicável à responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos culposos praticados no exercício de gestão pública. Neste caso, contudo, ao Autor lesado cabe, primeiramente, o ónus de alegação e prova da base de presunção, ou seja, da...

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