Acórdão nº 044/19.9BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Dezembro de 2019

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução11 de Dezembro de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso para uniformização de jurisprudência da decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa - CAAD no processo n.º 332/2018-T 1. RELATÓRIO 1.1 A Autoridade Tributária e Aduaneira (AT, adiante também Recorrente) veio, ao abrigo do disposto no art. 25.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), tendo apresentado alegações do seguinte teor: «1.ª Vem o presente Recurso por Oposição de Acórdãos interposto da decisão arbitral proferida pelo Tribunal Arbitral Singular, constituído sob a égide do CAAD, no âmbito do processo n.º 332/2018-T, a qual julgou procedente o pedido de pronúncia arbitral, entendendo que as facturas por si só são suficientes a ilidir a presunção de propriedade estabelecida no artigo 3.º do CIUC e, por esse facto, aptas a demonstrar a efectiva transmissão de propriedade dos veículos automóveis; 2.ª A decisão arbitral recorrida colide frontalmente com o acórdão, já transitado em julgado, proferido pelo TCAS, a 2015-03-19, no âmbito do processo n.º 08300/14 (“acórdão fundamento”), encontrando-se irremediavelmente inquinado, do ponto de vista jurídico, por errada interpretação do artigo 3.º do CIUC; 3.ª Assim, enquanto o Tribunal Arbitral Singular entendeu que as facturas, por si só, são suficientes a ilidir a presunção estabelecida no artigo 3.º do CIUC e, por esse facto, aptas a demonstrar a efectiva transmissão de propriedade dos veículos, em sentido totalmente oposto se pronunciou o “acórdão fundamento”, no qual estava igualmente em causa a ilisão da presunção de propriedade através de facturas, tendo considerado que estas últimas são manifestamente insuficientes para ilidir a presunção do artigo 3.º do CIUC, porquanto as facturas consubstanciam documentos particulares e unilaterais com valor insuficiente para, à luz do probatório material, negar a validade dos factos – a propriedade dos veículos – sobre os quais existe uma prova legal – presunção legal – que isenta a Recorrente de qualquer ónus probatórios e que não é contrariável através de uma mera contraprova; 4.ª Verifica-se uma evidente contradição entre a decisão recorrida e o “acórdão fundamento” quanto ao valor probatório das facturas e à ilisão da presunção estabelecida no artigo 3.º do CIUC, isto é, existe uma manifesta contradição sobre a mesma questão fundamental de direito que importa dirimir, mediante a admissão do presente recurso e consequente anulação da decisão recorrida, com substituição da mesma por novo acórdão que, definitivamente, decida a questão controvertida; 5.ª A infracção a que se refere o artigo 152.º/2 do CPTA consiste num erro de julgamento expresso na decisão recorrida, na medida em que o Tribunal Arbitral Singular adoptou uma interpretação da referida norma do CIUC em patente desconformidade com o quadro jurídico vigente; 6.ª Todavia, ficou devidamente demonstrado que a linha de raciocínio adoptada pelo Tribunal Arbitral Singular é ilegal, na medida em que as facturas são manifestamente insuficientes para ilidir a presunção estabelecida no artigo 3.º do CIUC, porquanto as facturas consubstanciam documentos particulares e unilaterais com valor insuficiente para, à luz do probatório material, negar a validade dos factos – a propriedade dos veículos –, sobre os quais existe uma prova legal – presunção legal – que isenta a Recorrente de qualquer ónus probatório e que não é contrariável através de uma mera contraprova; 7.ª Nesse sentido, aponta o “acórdão fundamento”, bem como diversa jurisprudência supra citada do CAAD (cfr. decisões arbitrais n.º 63/2014-T, n.º 150/2014-T e n.º 220/2014-T), ao considerar que «tanto a factura como a nota de débito constituem documentos contabilísticos elaborados no seio da empresa e que se destinam ao exterior. A factura deve visualizar-se como o documento contabilístico através do qual o vendedor envia ao comprador as condições gerais da transacção realizada. Por sua vez, a nota de débito consiste no documento em que o emitente comunica ao destinatário que este lhe deve determinado montante pecuniário. Ambos os documentos surgem na fase de liquidação da importância a pagar pelo comprador, assim não fazendo prova do pagamento do preço pelo mesmo comprador e, por consequência, prova de que se concluiu a compra e venda (somente a emissão de factura/recibo ou de recibo faz prova do pagamento e quitação – cfr. art. 787.º, do C.Civil; António Borges e Outros, Elementos de Contabilidade Geral, 14.ª edição, Editora Rei dos Livros, pág. 62 e seg.). Assim sendo, deve concluir-se que a sociedade recorrida nem sequer produziu prova relativa à alegada venda dos veículos, sendo que teria que provar que não era proprietária das viaturas à data a que dizem respeito as liquidações, o que implicaria, no caso concreto, provar quem era o actual proprietário. E recorde-se que esta prova seria fácil de fazer, bastando à recorrida actualizar o registo, para o que tem a legitimidade como vendedor e de forma unilateral, promovendo o registo dos veículos em nome dos compradores, através de um simples requerimento, nos termos do art. 25.º, n.º 1, al .d), do Regulamento do Registo Automóvel, tudo conforme já mencionado acima. Resumindo, a prova apresentada pela recorrida é constituída, exclusivamente, por documentos particulares e unilaterais, com um valor insuficiente para, à luz do direito probatório material, negar a validade de factos – a propriedade de veículos – sobre os quais existe uma prova legal – presunção legal – que isenta a A.

Fiscal de qualquer ónus probatório, e que não é contrariável através de mera contraprova, que lance dúvida sobre os factos provados pela presunção»; 8.ª Do resumo jurisprudencial citado podemos retirar com razoável certeza que, quer os tribunais arbitrais quer o “acórdão fundamento”, concluem inevitavelmente, em face das razões apontadas, para que as facturas não sejam, por si só, susceptíveis para ilidir a presunção estabelecida no artigo 3.º do CIUC, na medida em que consubstanciam meros documentos particulares e unilaterais, com valor insuficiente à luz do direito probatório para ilidir uma presunção legal, como aquela que goza a Recorrente no caso vertente, para mais quando, in casu, as facturas aqui em causa referem, inequivocamente, que só servem como recibo após boa cobrança.

Nestes termos, nos mais de Direito e...

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