Acórdão nº 0882/12.3BEALM 025/18 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 04 de Dezembro de 2019

Magistrado ResponsávelSUZANA TAVARES DA SILVA
Data da Resolução04 de Dezembro de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1- A A…………, S.A., interpôs recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, em 19 de Setembro de 2019, que julgou totalmente improcedente a oposição, por si deduzida, à execução fiscal n.º 207/2012, que corre os seus termos no Município do Montijo para cobrança de dívidas de taxas, no valor global de 95.199,27€, apresentando, para tanto, alegações que conclui do seguinte modo: 1. Como resulta quer do preâmbulo e do art. 1.º do Regulamento Municipal de Urbanização e Edificação do Concelho do Montijo, publicado na II.ª Série do Diário da República, Apêndice 18, de 20 de Fevereiro de 2006 e do Regulamento e Tabela de Taxas do Município do Montijo, publicado na II.ª Série do Diário da República, n.º 48, de 10 de Março de 2010, não existe fundamento legal para a exigência de uma taxa devida pela instalação das estações de telecomunicações dos autos.

  1. Nos termos dos mesmos preâmbulos e do art. 1.º de Regulamento de 2006, os Regulamentos pretendem concretizar as permissões normativas de exigências de taxas municipais constantes, entre outros, do Decreto-Lei n.º 555/99, na redação em vigor.

  2. A taxa que é devida pela instalação de antenas de telecomunicações não está prevista neste diploma legal, mas antes no Decreto-Lei n.º 11/2003, de 18 de Janeiro.

  3. Os Regulamentos que poderiam ter sido invocados no ato que procedeu à liquidação das taxas exequendas não são aplicáveis à instalação de estações de telecomunicações, por não terem por lei habilitante o art. 6.º, n.º 10, do Decreto-Lei n.º 11/2003, que é o preceito legal que permite a cobrança de taxas devidas pela instalação de antenas de telecomunicações.

  4. Tendo em conta a lei habilitante do Regulamento é manifesto que a Câmara Municipal do Montijo ainda não concretizou a permissão legal, pelo que não existe suporte para a cobrança da "taxa" aqui em causa.

  5. Não existe, assim, qualquer fundamento legal ou regulamentar para a exigência da taxa que foi aplicada pela decisão impugnada, tendo em conta a inaplicabilidade dos Regulamentos do Exequente (ac. plenário do STA de 7.04.2005, Proc. 01108/03).

  6. A pretensão que deu origem à liquidação das taxas objeto da presente execução foi o pedido de autorização municipal das antenas de telecomunicações instaladas pela Oponente no Concelho do Montijo, apresentado ao abrigo do art. 15.º do Decreto-Lei n.º 11/2003, em 1 de julho de 2003, pelo que é esta a data em que ocorreu o facto tributário - facto descrito no ponto 1. da enumeração dos factos provados.

  7. Deste modo, é manifesto que, tendo a pretensão que deu origem à liquidação das mesmas taxas sido formulada em data anterior à entrada em vigor do Regulamento, este não lhe é aplicável, nos termos expressos do seu art. 29.º 9. Não existe, assim, qualquer fundamento legal ou regulamentar para a exigência da taxa que foi aplicada pela decisão impugnada, tendo em conta a inaplicabilidade do Regulamento invocado pelo Recorrido e a data da ocorrência do facto tributário, pelo que estamos perante uma hipótese de ilegalidade abstrata das taxas dos autos.

  8. Como resulta do acórdão do plenário do STA, de 7.04.2005, Proc. 01108/03, a ilegalidade abstrata da taxa constitui fundamento de oposição à execução, nos termos da al. a) do art. 204.º do CPPT.

  9. A sentença recorrida julgou improcedente este fundamento invocando apenas que a liquidação da «taxa» dos autos teve por base o Regulamento de 2006 e não o Regulamento de 2010.

  10. Sucede que, como se demonstrou, esta circunstância é irrelevante para a decisão a proferir nos presentes autos, uma vez que é manifesta a inexistência de fundamento legal ou regulamentar para a cobrança da «taxa» dos autos, quer a liquidação tenha tido por base o Regulamento de 2006, quer tenha tido por base o Regulamento de 2010.

  11. A sentença recorrida, ao decidir como decidiu, violou os artigos 204.º, al. a) do CPT, 10.º, n.º 6, do Decreto-lei n.º 11/2003.

  12. Por esta razão, deve ser revogada e substituída por outra que decida que não existe qualquer lei habilitante que legitime a exigência da «taxa» dos autos e, por esta via, julgue procedente a presente oposição.

  13. Mesmo que este fundamento da oposição não procedesse, o que apenas se admite por mera cautela de patrocínio e sem conceder, sempre se dirá que, se forem aplicáveis os preceitos dos Regulamentos do Exequente, à instalação de antenas de telecomunicações em propriedade privada, o mesmo é organicamente inconstitucional, uma vez que prevê um verdadeiro imposto e não uma taxa, na medida em que a quantia a pagar pela instalação de uma estação de telecomunicações não encontra qualquer contrapartida na actividade do município.

  14. As normas constantes dos nº 33 do Quadro VI do Anexo ao Regulamento de 2006 e do art. 21º, n.º 30, da Tabela Anexa ao Regulamento de 2010 são inconstitucionais, por violação dos princípios da legalidade tributária, consagrado no art. 165.º, n.º 1, al. i) da Constituição, na medida em que prevêem um verdadeiro imposto, inconstitucionalidade que expressamente se invoca, para todos os efeitos 17. Nos termos do art. 2.º, n.º 4, da mesma Lei Geral Tributária, as taxas assentam na prestação concreta de um serviço público, na utilização de um bem do domínio público ou na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares.

  15. Daqui resulta que as taxas terão sempre origem num vínculo de carácter sinalagmático, donde resulta a sua natureza bilateral, a exigir uma equivalência - embora jurídica, e não apenas económica -, entre a prestação e a contra prestação em causa, que ultrapasse o teste da proporcionalidade e que lhes garante a sua natureza de taxa (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 558/98) 19. Não existe qualquer vínculo sinalagmático na exigência de uma taxa devida pela instalação de uma antena de telecomunicações, porque esta exigência não tem qualquer contrapartida na prestação de algum serviço por parte do município.

  16. Nem se venha dizer que o pagamento da quantia exigida pelo Exequente a título de taxa teria contrapartida na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento do particular, como se diz na sentença recorrida.

  17. Na verdade, o Tribunal Constitucional tem decidido uniformemente que só é legítima a imposição de uma taxa, como contrapartida da remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento do particular, quando com essa remoção se vier a possibilitar a utilização de um bem público ou semipúblico (Acórdão do Tribunal Constitucional 558/98) 22. Por estas razões, a exigência constante do n.º 33 do Quadro VI do Anexo ao Regulamento de 2006 e do art. 21.º, n.º 30, da Tabela Anexa ao Regulamento de 2010, constitui um verdadeiro imposto e não uma taxa (Acórdãos 513/97, 558/98 e 339/04 do Tribunal Constitucional) 23. Deve assim concluir-se que a norma do n.º 33 do Quadro VI do Anexo ao Regulamento de 2006 e do art. 21.º, n.º 30, da Tabela Anexa ao Regulamento de 2010, na interpretação segundo a qual seria exigível o pagamento anual de uma determinada quantia, devida pela mera instalação de uma antena de telecomunicações, sem que exista qualquer contrapartida na actividade da Câmara Municipal, nem a utilização de bens públicos ou semipúblicos, prevê um tributo que não pode ser qualificado como taxa, e antes deve ser objecto do tratamento jurídico- constitucional reservado aos impostos.

  18. Em consequência, a norma do n.º 33 do Quadro VI do Anexo ao Regulamento de 2006 e do art. 21.º, n.º 30, da Tabela Anexa ao Regulamento de 2010, são inconstitucionais, por violação do princípio da legalidade tributária, consagrado no art. 165.º, n.º 1, al. i) da Constituição, na medida em que prevêem um verdadeiro imposto, inconstitucionalidade que expressamente se invoca, para todos os efeitos.

  19. Por outro lado, a exigência de uma taxa no montante dos autos, para a instalação de antenas de telecomunicações da Oponente, é manifestamente desproporcional, tendo em conta o custo da atividade administrativa do município e grau de utilidade prestada ao particular.

  20. Em consequência, os mencionados n.º 33 do Quadro VI do Anexo ao Regulamento de 2006 e o art. 21.º, n.º 30, da Tabela Anexa ao Regulamento de 2010, prevêem, não uma taxa, mas um verdadeiro imposto, tendo em consta a sua unilateralidade, em virtude da manifesta desproporção do valor em causa, o custo do serviço prestado pela autarquia e a utilidade retirada pelo particular.

  21. Pode assim concluir-se que a exigência deste valor, a título de taxa, para a instalação de estações de telecomunicações, traduz uma «desproporção manifesta ou flagrante com o custo do serviço e com a sua utilidade para» o utente, afectando claramente a relação sinalagmática que a taxa pressupõe - Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 610/2003, disponível em www.tribunalconstitucional.pt.

  22. Esta conclusão é reforçada pela circunstância de o montante a pagar, nos termos do n.º 33 do Quadro VI do Anexo ao Regulamento de 2006 e do art. 21.º, n.º 30, da Tabela Anexa ao Regulamento de 2010, estar dependente da área ocupada pelas antenas de telecomunicações, logo «"completamente alheio" ao custo daquele serviço concretamente prestado, pois que nada na forma de cálculo permite supor uma ligação entre este custo e aquele montante» - Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 610/2003, já citado.

  23. Daqui resulta que o valor da prestação prevista como taxa no n.º 33 do Quadro VI do Anexo ao Regulamento de 2006 ou no art. 21.º, n.º 30, da Tabela Anexa ao Regulamento de 2010, não tem qualquer correspondência com o custo do serviço prestado e sua utilidade para a Impugnante, quer atendendo à manifesta desproporcionalidade entre ambos, quer atendendo à ausência de quaisquer critérios determinadores do respetivo montante, que atendam ao custo do serviço efetivamente prestado, o que o torna num montante absolutamente arbitrário e discricionário.

  24. Deve assim concluir-se que as normas do n.º 33 do Quadro VI do Anexo ao Regulamento...

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