Acórdão nº 8484/15.6BCLSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 31 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelTÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Data da Resolução31 de Outubro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acórdão I. RELATÓRIO L.... - C.....L, Lda (doravante Impugnante) veio apresentar impugnação da decisão arbitral proferida a 30.01.2015, pelo Tribunal arbitral singular constituído no Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), no processo a que aí foi atribuído o n.º 463/2014-T, ao abrigo do art.º 27.º do DL n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem Tributária – RJAT).

Nesse seguimento, a Impugnante apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos: “I) Considerou a decisão recorrida que, improcede parcialmente a pretensão da impugnante quanto à ilegalidade das liquidações impugnadas com base em erro nos pressupostos de Direito, por falta dos pressupostos da incidência subjectiva do Imposto quanto à Impugnante.

II) A Impugnante vem apresentar a presente Impugnação, relativamente à parte da sentença que julgou improcedente o pedido de anulação das notas de liquidação, identificadas nos autos, e a consequente restituição da quantia de 28.553,64 € (vinte e oito mil quinhentos e cinquenta e três euros e sessenta e quatro cêntimos).

III) Em causa nos presentes autos está a interpretação do art.° 3.° do Código de Imposto Único de Circulação (CIUC), nomeadamente no que diz respeito à elisão da presunção estabelecida no referido normativo. Por outras palavras, importa apurar se a presunção estabelecida no normativo supra mencionado, é elidível e se a mesma foi ou não elidida pela Impugnante.

IV) Salvo melhor opinião, a Impugnante considera que a decisão do Tribunal Arbitral Singular padece dos vícios de (1) violação do princípio de contraditório; (2) a não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; (3) a oposição dos seus fundamentos com a decisão em violação do artigo 28.° do RJAT, vícios esses que constituem causas de nulidade da decisão recorrida nos termos do art.° 125.° do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e do art.° 615 do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi alíneas c) e e) do n.° 1 do artigo 29.° do RJAT.

A - DA VIOLAÇÃO DO PRINCIPIO DO CONTRADITÓRIO: V) Na decisão arbitral, ora recorrida, o Tribunal Arbitral pronunciou-se nos seguintes termos: - “ ... o Tribunal Arbitral entende que apenas as facturas referidas na lista constante no ponto 17.10 foram emitidas com todos os requisitos exigidos pelo art.° 36.° do CIVA e por isso constituem meio de prova com força bastante para ilidir a presunção do art.° 3.° do CIUC.” VI) A conclusão que os documentos juntos pela Impugnante não satisfazem os requisitos legais, não havia sido invocada em qualquer momento, sendo que as partes deveriam ter tido a possibilidade de se pronunciarem sobre tal questão antes do Tribunal Arbitral emitir o seu juízo decisório.

VII) A Impugnante protestou juntar outros elementos contabilísticos, conforme resulta do art.° 52.° do pedido de pronúncia arbitral, que o Tribunal Arbitral não considerou ter interesse para a decisão da causa.

VIII) A Impugnante, no curto espaço de uma semana, deparou-se com a notificação de aproximadamente 7.000 (sete mil) Documentos Únicos de Cobrança referentes a liquidações oficiosas do Imposto Único de Circulação, de diversas viaturas, no período compreendido entre os anos de 2009 e de 2013.

IX) A Impugnante, que tem uma frota de cerca de cinquenta mil viaturas, num esforço de recolha documental conseguiu juntar as facturas que estão nos autos, correspondendo algumas dos documentos a meras reimpressões de facturas, sendo que, como é evidente, os respectivos originais obedeceram a todos os formalismos legais.

X) A Autoridade Tributaria em momento algum colocou em causa as formalidades das facturas emitidas pela Impugnante para outros efeitos fiscais, nomeadamente para efeito e de IRC.

XI) As facturas têm a seu favor a presunção de veracidade que lhes é conferida nos termos do disposto no n.° 1 do art.° 75.° da LGT que, assim, se afiguram idóneos e com força bastante para ilidir a presunção em que se suportam aquelas liquidações.

XII) Os extractos contabilísticos cuja junção o Tribunal entendeu não ser adequada, atestariam a contabilização das vendas das viaturas identificadas nos autos e confirmariam a veracidade das vendas corporizadas pelas facturas.

XIII) Atento o teor da sentença, o Tribunal Arbitral exerce uma verdadeira função de inspecção tributária, sem que tenha dado qualquer oportunidade à Impugnante para justificar a alegada insuficiência de algumas facturas, e exercer o direito de audição previsto no art.° 60.° da Lei Geral Tributária.

XIV) Conforme é jurisprudência dos nossos tribunais (Acórdão do STA de 5 de Julho de 2012), em sede de IRC, o documento comprovativo e justificativo dos custos para efeitos do disposto nos arts. 23°, n°1, e 42°, n° 1, alínea g), do CIRC, não tem de assumir as formalidades essenciais exigidas para as facturas em sede de IVA, - cfr. Acórdão STA de 5 de Julho de 2012, in www.dgsi.pt.

XV) O princípio da liberdade do Juiz no tocante à indagação, interpretação e aplicação do direito (art.° 664.° do CPC), aplicável ex vi alínea e) do n.° 1 do art.° 29.° do RJAT deve ser compatibilizado com a proibição das decisões surpresa, atendo o disposto no n.° 3 do art.° 3.° do CPC.

XVI) O princípio do contraditório está igualmente vertido na alínea a) do n.° 1 do art.° 16.° do RJAT, sendo que o princípio do contraditório é assegurado através da faculdade conferida às partes de se pronunciarem sobre questões de facto ou de direito suscitadas no processo.

XVII) Caso o Tribunal Arbitral tivesse considerado necessário, face às dúvidas que tinha, poderia ter promovido a realização da reunião, consagrada no art.° 18.° do RJAT, convidando a Impugnante a corrigir as peças processuais e a juntar documentação, que na sua perspectiva seria necessária para a decisão a proferir e para esclarecer quem seriam os proprietários à data do facto tributário.

XVIII) Tendo o julgador decidido com fundamento não considerado previamente pelas partes, cujos factos que a sustentam não foram alegados em momento algum pelas partes, e não tendo efectuado o convite à Impugnante, a decisão arbitral é nula, que se vem arguir desde já.

XIX) A violação do princípio do contraditório inclui-se na cláusula geral sobre as nulidades processuais, constante do n.° 1 do art.° 201.º do CPC – aplicável ex vi alínea e) do n.° 1 do art.° 29.° do RJAT - e uma vez que inquina a decisão recorrida, como é o caso dos autos, a invocação da nulidade pode ser feita nas alegações da impugnação judicial que se interpuser, como é o caso em apreço. Sendo a decisão arbitral nula, fica prejudicada a apreciação das demais questões.

Sem prejuízo do exposto, à cautela e sem conceder.

B - DA FALTA DE ESPECIFICAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DE FACTO: XX) A decisão impugnada padece do vício de omissão de especificação de fundamentos de facto.

XXI) Face ao entendimento do Tribunal Arbitral, devia ter sido igualmente considerada, como preenchendo os requisitos formais do art.º 36.º do CIVA, a factura relativa à viatura 43-CH-19, pelo que o valor de 33,44 €, titulado pelo DUC n.° 2009 626889703 deve igualmente ser objecto de restituição (de notar que os documentos ora juntos constam no processo administrativo).

XXII) A sentença deveria enunciar de forma clara quais os requisitos que não são cumpridos pelas facturas, por forma que ficasse claro qual a insuficiência que cada um dos documentos juntos padecia, à luz do entendimento do Tribunal.

XXIII) De acordo com o preceituado no artigo 123.° do CPPT na sentença, o juiz deve discriminar a matéria provada da não provada, fundamentando as suas decisões.

XXIV) A nulidade abrange por um lado a falta de discriminação dos factos provados e não provados, exigida pelo n.° 2 do art.° 123.° do CPPT, mas igualmente a falta de exame crítico das provas, prevista no n.° 3 do art.° 659.° do CPC.

XXV) Verifica-se, pois, que a decisão impugnada, não só não procedeu á indicação exaustiva da matéria de facto provada, como não procedeu, como lhe era exigido ao exame crítico das provas apresentadas.

XXVI) Resulta assim do exposto, face á falta de discriminação dos factos provados da decisão impugnada e à falta de exame critico das provas, que a decisão do Mm.° Árbitro do Tribunal Arbitral Singular do Centro de Arbitragem Administrativa deve ser declarada nula nos termos do artigo 125°, n°1 do CPPT, tal como o 615.° n.° 1 alínea b), do CPC aplicável ex vi alíneas c) e e) do n.° 1 do artigo 29.° do RJAT.

Á cautela e sem conceder.

C - DA FALTA DE ESPECIFICAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DE DIREITO: XXVII) O Tribunal Arbitral na análise empreendida se as facturas corporizam ou não meios de prova com força bastante para elidir a presunção fundada no registo, concluiu que as mesmas não podiam ser aceites como meios de prova, por não cumprimento dos requisitos exigidos pelo art.° 36.° do CIVA.

XXVIII) Não se compreende em que medida é aplicável o disposto no CIVA, à elisão da presunção estabelecida no art.° 3.° do CIUC, porque o Tribunal não fundamenta a aplicação de tal dispositivo.

XXIX) A Autoridade Tributaria, em momento algum, colocou em causa a formalidade das facturas emitidas pela Impugnante, até porque as aceitou para outros efeitos fiscais, nomeadamente para efeitos de apuramento de IVA e de IRC.

XXX) Se para efeitos de IRC, a exigência de prova documental não se esgota na exigência da factura, bastando um documento escrito com menção das características fundamentais da operação (cfr. Acórdão do STA, de 5 de Julho de 2012, já citado), não se entende porque razão os documentos juntos não são suficientes para elidir a presunção.

XXXI) A documentação junta aos autos é mais do que suficiente para elidir essa presunção, não se compreendendo a fundamentação constante da decisão.

XXXII) O Decreto-Lei n.° 177/2014, de 15 de Dezembro de 2014 veio regular a alteração dos procedimentos para registo de propriedade por contrato verbal de compra e venda. Ou seja, a legislação em causa confirma-se que é suficiente um mero contrato verbal para a...

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